O último capítulo é todo negativo. Não tornei-me famoso entre burgos, não fui ministro, não fui grande líder nem Alexandre. Não tive casamento. Verdade é que, ao lado dessas omissões, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. E mais, não padeci a morte de Dona Plácida, nem o surtos de loucura de Quincas Borba. Ao chegar ao limbo do mistério, deparei-me com surpresa agradável: havia um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo difícil e último: não tive filhas ou filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria.

O fato é que, dizem por aí, ressucitei. Ou melhor, que levo uma alma de Cristo. Mas não tenho crista pra galo. Não mando em terreiro algum, só me divirto com toda essa história. Estar do lado de cá não é tão diferente assim... É um exercício excêntrico, ditosos, ser imortal nas letras e vir parar aqui... Já topei com gente boa nessas paragens: Wolf, Wilde, Lispector, Proust e... Eu. Pense você que não queria ser escritor "mulato", criado por dondoca e canastrões que viviam se enfurnando na tropipieguice carioca à la françàise nos idos de XIX.

O problema é que minha epilepsia de nada adiantava: lá estava eu, a sonhar como republicanos cafeeiros, tudo serviria...

No fundo, talvez eu tenha sido um grande marginal heróico, bem antes do Macunaíma. Só pelo fato de estar do lado daquelas figuras abastadas e pseudo-intelectualizadas já era motivo de euforia.

Digo que não me arrependo mais desse livro. Ele não me cansa. Escrevi-o a mais de 100 anos e, se pudesse, o faria de novo. Mas livros são enfandonhos mesmo, cheiram a sepulcro. Ainda sinto aquelas contrações cadavéricas... Mas o maior defeito desse livro foi você leitor! Você ama a narração direta e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e meu estilo são como ébrios, guinando à direito e à esquerda... Sem endereço certo.

Não é o que buscas na tal rede?

Não quero ser presunçoso, mas não substituiria a leitura de minhas obras por isto a que chamam "internet". No tempo do império não lembro de D. João Trapalhão VI ter trazido semelhante cousa. Também não acredito nessa idéia de "outro mundo". Na república velha os folhetins eram levados as praças onde moçoilas e rapazolas transitavam num mar erótico de ruralismos urbanos. Quando nasci, sabia das dificuldades da vida.

Transitava entre clérigos, tradicionalistas, progressistas, monarquistas (todos farinha do mesmo saco) e não era visto como um deles. Fico feliz por ter produzido incessantemente às gerações do futuro, hoje capazes de refazer as esperanças de uma nação-livro por outras formas...