Literatura infantil: Instrumento pedagógico ou brinquedo?

Tâmila Carolini Trindade Tavares

A grande discussão acerca da literatura infantil e sua utilização na sala de aula é se ela é lúdica ou apenas um passatempo. Esse artigo trata de como a literatura infanto-juvenil pode e deve ser utilizada na sala de aula de modo a enriquecer o processo de ensino-aprendizagem.
A localização das origens da literatura infanto-juvenil em remotas expressões da literatura adulta por si só não explica as diferentes formas que ela vem assumindo desde que, no século XVII, começou a ser escrita especificamente como tal: literatura para crianças.
Diante das tendências que a literatura vem seguindo nestes pouco mais de três séculos de produção, é que um dos primeiros problemas a suscitar polêmica quanto à sua forma ideal, teria sido o de sua natureza específica: a literatura infantil pertenceria à arte literária ou a arte pedagógica? Desde a Antiguidade Clássica se discute a natureza da literatura (didática ou lúdica?) e a finalidade da literatura destinada aos pequenos (instruir ou divertir?), um questionamento longe de ser respondido.
Muitos autores conceituados possuem opiniões divergentes em relação a essa problemática. Para Maria Antonieta Cunha a literatura infanto - juvenil é estritamente lúdica, assinalando não ser necessária sua pretensão a pedagogia. Para Cecília Meirelles, a literatura não é como muitos pensam um passatempo, a literatura é nutrição, que auxilia na formação infantil. Já Nelly Novaes Coelho tem uma opinião mais conciliadora, como objeto que provoca emoções, prazer ou diverte e, acima de tudo, modifica a consciência de mundo de seu leitor, a literatura infantil é arte. Entretanto, como instrumento manipulado por uma intenção educativa, a literatura se inscreve na área pedagógica.
Seguindo a vertente de Coelho, se analisarmos algumas grandes obras que através dos tempos classificaram-se como literatura infantil, iremos observar que elas pertencem simultaneamente a essa duas áreas distintas.
Nestas duas vertentes, há uma variedade enorme de tipos de literatura, em que as duas intenções estão sempre presentes, embora em doses diferentes. O título literatura infantil engloba modalidades bem distintas de textos: desde os contos de fadas, fábulas, contos maravilhosos, lendas, histórias do cotidiano... Até biografias romanceadas, romances históricos, literatura documental ou informativa.
Pode-se dizer que a Literatura Infanto-Juvenil é o resultado da interação entre intenção pedagógica do texto ficcional ? a qual estimula o aprendizado ? e sua intenção lúdica ? que, por sua vez, estimula a criatividade de uma forma geral, tudo, evidentemente, mediado pela natureza estética da literatura, que, no limite, fundamenta a própria concepção do que seja a arte: a estética acaba sendo, neste sentido, o princípio e fim de toda atividade artística.
Para efeito didático, podemos dividir em três os aspectos nos quais essa literatura incide, contribuindo para a formação/desenvolvimento da criança e do adolescente e permitindo, providencialmente, uma franca interação entre o lúdico e o pedagógico. O primeiro aspecto que ressaltamos é o psicofísico, no sentido de que a Literatura Infanto-Juvenil atua como estímulo às funções motoras e intelectuais das crianças, além contribuir com a formação de sua personalidade, com o desenvolvimento do imaginário infantil e de seu espírito crítico.
O segundo aspecto sobre o qual a Literatura Infanto-Juvenil age é de natureza social, já que, por meio dela, a criança adquire melhores condições de formar sua identidade social, aperfeiçoar seu processo de sociabilidade e estabelecer categorias de valor ligadas à ética. O terceiro aspecto, a que podemos chamar de lingüístico, liga-se à capacidade, promovida pela Literatura Infanto-Juvenil, de contribuir para o desenvolvimento do vocabulário, para a aquisição de estruturas lingüísticas, para a distinção de registros discursivos e desenvolvimento da escrita e da narratividade.
Atualmente, a confusão é muito grande. Em geral, uma das atitudes (literária ou pedagógica) tem predominado sobre a outra. Daí os excessos e os equívocos que proliferam em certas produções infantis mais recentes, que revelam livros que no lugar de serem divertidos, como se pretendem, são tolos e maçantes, ou então, são fragmentados e sem sentido. Ou ainda são sobrecarregados de informações corretíssimas, mas que, despidas de fantasia e imaginação, em lugar de atrair o jovem leitor o afugenta.
As produções que com rara felicidade conseguiu equacionar os dois termos do problema mostra uma literatura para divertir, dar prazer, emocionar e que ao mesmo tempo, ensina modos novos de ver o mundo, de viver pensar, pensar, agir, reagir... E principalmente se mostra consciente de que é pela invenção da linguagem que essa intencionalidade básica é atingida. A literatura contemporânea, expressão das mudanças em curso e que, longe de pretender a exemplaridade ou transmissão de valores já definidos ou sistematizados, busca estimular a criatividade, a descoberta ou a conquista dos novos valores em gestão.
Com toda essa discussão muitos professores se perdem na utilização da literatura infanto-juvenil na sala de aula, o uso de metodologias inadequadas e textos que se mostram muitos superiores ou inferiores ao nível lingüístico em que se encontram os alunos.
Enfim, entre esses dois pólos, está oscilando a produção atual da literatura, resta aos escritores tornarem-se conscientes das forças atuantes em seu tempo e conquistarem a fusão ideal, já que verdadeiro sentido de uma ação pedagógica que é mais do que ensinar o pouco que se sabe, é estar de prontidão para aprender a vastidão daquilo que não se sabe e a arte literária é um dos caminhos para esse aprendizado.
REFERÊNCIAS
COELHO, NELLY NOVAES. Literatura Infantil: Teoria, Análise, Didática. 1. Ed. São Paulo: Moderna, 2000.
CADEMARTORI, Lígia. O que é literatura infantil. 7. ed. São Paulo: Brasiliense, 2006.