RESUMO

Este artigo tratará de questões que relacionam a música como uma forma de linguagem de expressão cultural, social, religioso e individual. Buscaremos esclarecer como a música está presente na história do desenvolvimento humano e como ela influência nos mais diferentes aspectos. Sabemos que a presença da música no decorrer da história da humanidade é incontestável, sobretudo nas mais diversas épocas e raças, sendo uma linguagem que está além do tempo e do espaço. Não existe dentro de qualquer cultura um fenômeno mais expressivo e complexo do que a música, pois incorpora em si aspectos fisiológicos (órgão dos sentidos), físicos (estrutura musical) e psíquicos.

Nesta pesquisa poderemos observar como a manifestação da música é para alguns estudiosos um atributo inato do ser humano, necessário para sua expressão subjetiva. A música é composta por notas que podemos atribuir como símbolos, mas estes não são dotados de significação, esta significação é atribuída subjetivamente por cada indivíduo que faz contato auditivo com a música.

É importante ressaltar que a musicalidade atravessa diversos sentidos pela concatenação das palavras e dos gestos, produzindo um efeito social diferente em cada grupo. Isto se dá pela natureza individual e psicossocial que a linguagem tem que, por vezes, se torna símbolo geral de identificação nas relações interpessoais. Desta maneira, cada grupo é constituído por um estilo que é comum a todos os membros participantes. Por exemplo, grupos religiosos, de crianças, de bandas com ritmos específicos, dentre outros.

Explanaremos como é possível vislumbrar em cada indivíduo características de sua subjetividade que se mostram através das relações com os grupos formados a partir de gostos e afinidades musicais e a possibilidade de enxergar, também, como o individuo é capaz de relembrar e reviver momentos e pessoas marcantes através da emoção que foi atribuída a um significante no símbolo musical.

Como conclusão, busca-se demonstrar como a música pode ser um referencial importantíssimo para o entendimento da mente e suas emoções e, principalmente, da sua subjetividade.

Palavra-chave: Psicologia. Música. Psicoterapia.


ABSTRACT

This article will address issues that relate to music as a form of expression language, cultural, social, religious and individual. We will seek to clarify how the music is present in the history of human development and how it affects in many different aspects. We know that the presence of music in the course of human history is undeniable, especially in the most diverse ages and races, being a language that is beyond time and space. There is within any culture a phenomenon more expressive and complex than the music, it incorporates it self physiological aspects (sensitive organ), physical (structure musical) and psychic.

In this study we can observe how the expression of music is for some students an innate attribute of the human need for subjective expression. The music consists of notes that can be attributed as symbols, but these are not endowed with meaning, this meaning is assigned subjectively by each individual who makes contact with hearing the music.

Importantly, the musicality across different senses by concatenation of words and gestures, producing a different effect in each social group. This is done by individual and psychosociety nature of the language is that sometimes becomes general symbol of identification in interpersonal relationships. Thus, each group consists of a style that is common to all participating members. For example, religious groups, children, bands with specific rhythms, among others.

We will explain how you can discern each individual characteristics of its subjectivity that show through relationships with groups formed from musical tastes and affinities and the ability to see, too, as the individual is able to remember and relive moments and people marked by the emotion that was attributed to a significant symbol in the musical.

In conclusion, we seek to demonstrate how music can be an important reference for understanding the mind and emotions, and especially of its subjectivity.

Keyword: Psychology. Music. Psychotherapy.


Saussure apud Penna (2003) conceitua a linguagem como "um sistema de signos distintos correspondendo a idéias distintas". Será com este conceito que este artigo trabalhará acerca da linguagem através da música.

Para Chomsky (1998) não apenas o léxico e a gramática exercem influência sobre a língua, mas os signos lingüísticos têm forte representação nas estruturas mentais e na visão de mundo do indivíduo.

A linguagem é constituída de dois componentes que Saussure apud Penna (2003) os nomeou de a 'imagem acústica' de significante e a 'estrutura conceitual' de significado. Estes são constituintes de todas as palavras que chegando a um plano individual passam a compor um signo.

Na música observa-se três aspectos importantes para a linguagem. Os aspectos físicos, que é a estrutura musical, o fisiológico de quem a recebe, que são os órgãos do sentido, e o psicológico.

Penna (2003) apresenta dois tipos de linguagem: a denotativa e a conotativa. Sendo a primeira caracterizada pelo caráter científico e ideal e a segunda pela impregnação emocional. Diante disto podemos caracterizar a música como uma linguagem predominantemente conotativa.

Para Chalhub (1995) podemos ainda inferir que a música é uma função referencial, pois há predomínio de fatores imbricados de emoções. Sendo que para qualquer comunicação ocorrer é necessário que haja uma primeira pessoa que emita sentires, lembranças, expressões e confissões a uma segunda pessoa a qual será a pessoa apontada como receptor.

Chalhub (1995) destaca que as canções populares provocam emoção pelo fato de exprimir-se através da subjetividade do indivíduo, através do modo como se fala. Por isso, nos contextos de novela podemos observar o núcleo de ação ligada à expressão dramática de sentimentos e afetos, utilizando-se da música para co-mover o telespectador.

Vygotsky apud Campos (2001) afirma que o homem se constitui em sua relação, e que seu funcionamento psicológico é modelado pela cultura, deste modo, torna-se natural do humano no decorrer do desenvolvimento, pois está inserido num contexto histórico.

A música representa atualmente umas das maiores expressões da sociedade moderna, onde diferentes significantes e sentidos são demonstrados nos mais diversos setores do cotidiano, desta forma também se caracteriza por ser uma forma de linguagem.

O indivíduo que vive nessa sociedade atual é cada vez mais sistematizado e categorizado conforme o ritmo ou estilo musical que aprecia, conforme o histórico-cultural que se estruturou a psique nos símbolos musicais.

Existem diversas ferramentas, testes e abordagens para o entendimento da dinâmica cognitiva e emocional do homem, lançamos a música como mais uma proposta para este entendimento.

Vygotsky apud Campos (2001) compreende que a representação mental é mediada através do uso dos símbolos que têm origem no social através das interações com o meio, sendo, portanto, construídas de fora para dentro.

É o que Piaget apud Penna (2003) apresenta em seu construtivismo, ressaltando que é necessária uma estruturação das atividades do indivíduo para que obtenha o conhecimento, já que as estruturas cognitivas não são inatas.

Albano (1990) exemplifica isto quando trás a representação da sonoridade das palavras através da criança começando a interagir com o mundo através da linguagem, utilizando-se apenas de balbucios de sílabas.

Sabemos que a música é um dos constructos fundamentais da cultura com influência bastante significativa em suas decisões, crenças, mitos e visão diante o mundo. A força com que a música consegue penetrar dentro de uma cultura ou sociedade e, por fim, no indivíduo é fato conhecido desde a idade média.

Através da música o homem não apenas codifica ou decodifica a mensagem, mas também busca por ela um próprio direcionamento para seu comportamento, refletindo a cerca da realidade, Campos (2001).

A música considerada sagrada, também chamada de música sacra, era produzida e destinada a poucos, em ambientes especiais e representando significados de louvor, devoção e agradecimento Divino. Aos poucos foram surgindo músicas pagãs ou músicas populares que falavam do dia-a-dia dos camponeses e trabalhadores, contando histórias de amor, traição, amizade e alegria.

Alguns historiadores da música acreditam que o processo foi inverso, onde, primeiramente, surgiram às músicas pagãs (músicas populares) e posteriormente a igreja tentou apropriar-se do poder e influência da música.

Contudo esta guerra ainda continua, onde ambos os lados disputam o grande poder de influência da música, por um lado as igrejas se especializaram na música como ferramenta para atrair e manter seus fiéis, do outro lado grandes indústrias da música promovem grandes hits e astros musicais que de igual maneira levam multidões.

Dentro deste quadro é importante entender como o homem atual se encaixa nesses contextos, como se processa esta experiência social musical compartilhada, onde valores e sentimentos são expressos e internalizados.

Podemos citar, ainda, o modo de vivenciá-la, seja escutando diariamente sua rádio favorita, escutando um cd enquanto dirige um carro, ou até mesmo cantarolando enquanto está no banho, enfim, são enumeras formas que se pode experienciar a música.

Bock (1999) afirma que a identidade é composta pela representação e sentimento que envolve o indivíduo, portanto, a consciência está em movimento sempre acrescentando novos atributos a identidade. Por isso, cada indivíduo tem seu modo, seu jeito e horário, revelando assim muitos significados para estas ações, algumas vezes solitárias.

Portanto, podemos inferir que a música ganha significação a partir do subjetivo do indivíduo. Desta forma, podemos perceber que a mesma música é representada por cada pessoa de modo diferente, já se utiliza das vivências de cada sujeito.

Bock (1999) coloca ainda que quando as ações se dão em grupo, então temos um grupo social, constituído a partir de objetivos comuns. Desta forma, a música é um atributo que liga as pessoas à outras, seja pelo momento, pelo estilo musical, ou mesmo pela melodia.

Qualquer movimento corporal, seja através da dança e de gestos, provocam um efeito no meio social, atingindo o outro através de uma linguagem diferente. Conseqüentemente, a música não mexe com as pessoas apenas pelo aspecto sonoro, mas também pelo aspecto corporal que o indivíduo responde ao estímulo a ele apresentado, dando ao outro possibilidade de comunicação.

Questionamentos relacionados a gostos e tipos musicais provocam nos outros sentimentos de empatia, confiança e demonstração de interesse. Notemos como indivíduos que se conhecem há pouco tempo, em seus primeiros diálogos, conversam sobre o gosto musical, sendo este um fator muito importante a se conhecer, pois, inconscientemente, sabe-se que pode ser revelado muito do caráter do outro e de certa forma, encontrar no outro algo que lhe seja comum.

É interessante pontuar como a música pode despertar sentimentos e estado de humor totalmente diferente em indivíduos específicos, tornando-se relevante onde, como e quando determinada música foi experienciada, fazendo com que adquira sentido e significados diferentes para quem a ouve.

Dentro do contexto do setting terapêutico, algumas perguntas podem ser colocadas para o cliente, dentro da especificidade de cada caso, a cerca da música, investigando o gosto e os sentimentos provocados pela música, a importância dela na vida do cliente, dentre outras.

É interessante perceber como nos pode ser revelado muito do mundo subjetivo do paciente, assim como seu estado de humor naquele dia e como costuma ser, revelando, também, seus valores e representações sobre a vida, o amor, a amizade, a auto-estima, relação familiar, dentre outros.

A partir do pressuposto que a música reuni composto biológico e social, é possível inferir que ela é um instrumento de investigação e entendimento das estruturas individuais do paciente. Pois quase sempre o indivíduo apresenta resistência, dissimulação e falsos valores, que sempre dificultam o trabalho do psicoterapeuta, principalmente nas psicoterapias que chamamos de breves.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base em toda argumentação exposta no decorrer deste artigo, podemos constatar a relevância dos aspectos emocionais, sócio-culturais e cognitivos presentes na interação objetiva e subjetiva do homem com a música.

A partir deste novo olhar construímos um ponto de vista sobre o funcionamento e organizações das relações internas e externas, formadas no decorrer do desenvolvimento, sejam elas de uma criança, de um adulto ou idoso, todos interligados no que chamaríamos de rede musical.

Compreender através da escuta significaria também escutar o que o outro escuta, sentir o que o outro sente, representar o que o outro representa, criando não só um melhor entendimento, mas também, numa visão Humanística, um laço mais intimo e afetuoso com o outro.

REFERÊNCIAS

ALBANO, Eleonora Cavalcante. Da fala à linguagem tocando de ouvido. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 1990.

BOCK, Ana Mercês Bahia (org.). Psicologias: Uma introdução ao estudo de psicologia.13. ed. São Paulo: Ed. Saraiva, 1999.

CAMPOS, Dinah Martins de Souza. Psicologia e Desenvolvimento Humano. 2. ed. Petrópolis: Ed. Vozes, 2001.

CHALHUB, Samira. Funções da Linguagem. 7. ed. São Paulo: Ed. Ática, 1995.

CHOMSKY, Noam. Linguagem e mente. Ed. UnB, 1998.

PENNA, Antonio Gomes. Introdução à psicologia da linguagem e do pensamento. Rio de Janeiro: Ed. Imago, 2003.