O HOMEM COMO SER DE LINGUAGEM E DE PALAVRA  

A língua falada e escrita têm uma base cultural, pois são ligadas a uma forma de vida, uma cultura determinada. Ao mesmo tempo em que a cultura é gerada pela língua, ela também gera a língua. A língua é o “saber coletivo” fundamental de um povo. É fundamental por que com ela os grupos humanos formam sua identidade, se organizam e nomeiam atividades de sobrevivência, crenças, valores e artes. A língua é um saber coletivo dinâmico: todos nós aprendemos a língua constantemente e a ensinamos também.

         Desafio: Explique a um extraterrestre, que desconhece os objetos e as línguas da Terra, o significado da palavra “caneta”. Algumas dificuldades podem advir desta tentativa. Mostrar, descrever, gesticular, tudo isso não garante que o visitante reconheça as representações associadas ao objeto. Ele pode considerar que se trata de um objeto adorado pelos terráqueos; pode achar que a palavra caneta seja o ato de apontar alguma coisa; ou então, que seja o nome do material de que ela é feita (plástico, tinta); ou que é o nome da forma da caneta (cilíndrico); que seja a maneira de designar um ponto no espaço; pode achar que é o nome de uma dança que consiste em apontar para algo e repetir o mesmo som: “caneta, caneta, caneta”.

         As possibilidades de interpretação do extraterrestre são virtualmente infinitas. O certo é que, se no planeta dele houvesse um objeto como uma caneta, um instrumento que lá também serviria para escrever, seria mais provável que ele entendesse o significado da palavra.

         Usamos palavras que herdamos de uma cultura já consolidada. É com essas palavras que construímos nosso modo de ler e dizer o mundo.

 

PLATÃO E A LÍNGUA COMO PHARMACON

         Em um diálogo escrito por Platão (428–348 aC, aproximadamente) chamado Fedro, o filósofo afirmou que a língua é como pharmacon, que significa ao mesmo tempo veneno, cosmético e remédio.

         A língua como veneno é relativa ao discurso irônico, agressivo, provocador de rupturas, discórdias e mágoas. A língua como cosmético é marcada pelo discurso superficial, que não oferece condições e fundamentos para se pensar as consequências das afirmações; é o discurso que pretende agradar e esconder conflitos, maquiando fatos. A língua como remédio pode ser associada aos discursos que ajudam os homens a compreenderem melhor a si mesmos e aos outros. A psicologia, a arte e a religião podem ser tomadas como áreas que contam com a língua como remédio.