Gracielen Costa do Nascimento²

Julia Motta Costa³

Ana Carolina Cardoso4

 

SUMÁRIO: Introdução; 1 Flexibilização no direito do trabalho; 2 Limites à flexibilização; 3 Direitos fundamentais do trabalho; 3.1 Direito do trabalho e o principio da dignidade da pessoa humana; Conclusão; Referências.

 

RESUMO: O paper tem como base o Direito do Trabalho, a partir de um enfoque quanto o princípio da dignidade humana, uma vez que o indivíduo em tais relações trabalhistas se insere em uma condição de desigualdade perante o trabalhador. Nesse sentido, tem-se que o processo de globalização econômica serviu como impulso para esse diapasão entre os polos das relações trabalhistas, enfatizando o caráter rígido das normas trabalhistas ao demonstrar a necessidade de adequação destas conforme a condição do homem enquanto os princípios à ele inerentes, como o da dignidade humana. Assim, surgiu a necessidade de se criar um mecanismo que pudesse permitir que as normas alcançassem tanto o empregado – atendendo os anseios mínimos enquanto indivíduo e trabalhador – quanto o empregador, no sentido de permitir a manutenção da máquina econômica através do vínculo empregatício. Desta forma, apresentou-se a flexibilização como solução plausível capaz de conter os atos que violem o mínimo do trabalhador, sem que ao mesmo tempo caracterizasse um exercício subjetivo e exacerbado de um direito. 

Palavras-chave: Dignidade humana. Direitos. Flexibilização.

 

INTRODUÇÃO

O Estado fixa direitos por meio da legislação, estabelecendo parâmetros de condições mínimas aos empregados, tornando o direito do trabalho rígido. No entanto, em decorrência da dinâmica das relações de trabalho, em que a oferta de emprego é insuficiente, o trabalhador – para não perder a oportunidade de subsistência – abdica de direitos mínimos referentes ao exercício da profissão. Desta forma, em decorrência das transformações sofridas no âmbito social e econômico, exigiu-se que o direito do trabalho se adequasse à nova realidade de mercado, culminando na proposta de flexibilização dos direitos fundamentais do trabalho (GROSSO, 2007, p. 7).

Destarte, tendo em vista a essencialidade do poder econômico e das atividades de mercado, em que há uma busca constante de lucratividade em detrimento do respeito às exigências mínimas de trabalho, questiona-se a possibilidade da flexibilização, sob a condição

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¹ Paper apresentado à disciplina de Direito do Trabalho, da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

².Aluna do 7º período do Curso de direito vespertino, da UNDB, email:<[email protected]>

³ Aluna do 7º período do Curso de direito vespertino, da UNDB, email:<[email protected]>

4 Professor orientador.

da limitação do princípio da dignidade da pessoa humana, de modo a constituir um instrumento de contenção de atos que violem a garantia do mínimo sem que caracterize um exercício subjetivo e exacerbado de um direito.

Nesse sentido, apesar de o Estado estipular preceitos e fixar postulados mínimos inerentes ao exercício do direito do trabalho, há uma flagrante incompatibilidade entre os atores sociais e as ofertas de trabalho e o próprio exercício desse direito, que materializa a dignidade da pessoa humana. Isto porque não existem meios efetivos e instrumentos que viabilizem a igualdade substancial nas relações de trabalho, exceto por meio da flexibilização – que se apresenta como uma medida excepcional mais hábil à garantir que se atenda aos limites mínimos exigidos (GROSSO, 2007, p.10).

 Entretanto, para que haja a flexibilização, é preciso que esta seja observada sob dois aspectos: o respeito à dignidade da pessoa humana – tendo em vista a manutenção do vínculo empregatício – e redução de direitos tão somente em casos excepcionais, quando comprovada a necessidade econômica para fins de sobrevivência da empresa (CASSAR, 2011, p.46). Sendo assim, a flexibilização se apresenta como a melhor solução, no âmbito do direito do trabalho, para redução do desemprego e fortalecimento da economia, uma vez que é o mecanismo mais harmônico que permite a garantia de direitos constitucionais, estipulados pelo principio base da dignidade da pessoa humana, e da proteção da parte mais vulnerável.

Desta forma, o estudo do primeiro tópico fará a abordagem da concepção do mecanismo da flexibilização para o Direito do Trabalho, que se apresenta como uma solução tendente a objetivar redução de custos de produção, melhora da competitividade empresarial e aumento da lucratividade, conforme os preceitos constitucionais e os princípios norteadores do Direito do Trabalho. E de forma subsequente, será delineado para a abordagem geral do Direito do Trabalho, conforme os direitos elencados constitucionalmente ou de forma infraconstitucional, os limites que ensejam o reconhecimento desses direitos em face do trabalhador, observado o princípio da dignidade da pessoa humana.

E por fim, será estabelecida uma breve análise sobre os direitos fundamentais, de modo a ensejar o alicerce que norteia o direito do trabalho, enquanto a concepção dos direitos garantidos constitucionalmente e de forma infraconstitucional; Sendo assim, delinear acerca da importância do princípio da dignidade da pessoa humana na relação de trabalho, uma vez que este norteia outros princípios do Direito do Trabalho, pois é ele que mais protege o empregado de condições desfavoráveis, e também graças a ele que o Direito do Trabalho veio para mudar a situação do trabalhador desde a Revolução Industrial até os dias de hoje.

1 FLEXIBILIZAÇÃO NO DIREITO DO TRABALHO

O processo de globalização gerou diversas modificações nas relações de trabalho, que vão desde o surgimento de novas formas de organização econômica e social, culminando no paradigma entre a necessidade de manter o Estado social de direito e a crise econômica das empresas, até a própria superação do padrão típico das relações de emprego. A partir desse contexto de transição do direito do trabalho, em que se reafirma a necessidade de rearranjo das relações e flexibilidade consciente da legislação, é que a flexibilização se apresenta como o mecanismo mais hábil a promover a solução para os conflitos sociais gerados (SUIAMA, 2005, p. 2-4).

É nesse liame que a flexibilização se apresenta como um novo modelo do Direito do Trabalhado a ser seguido, com regras um pouco mais flexíveis, passíveis de mudanças e adaptáveis as circunstâncias apresentadas com as novas situações vivenciadas pelo contexto atual. Para tanto, essa proposta pressupõe a manutenção da intervenção estatal na estipulação de condições mínimas de trabalho, sem as quais não se pode conceber a vida do trabalhador com dignidade, ao mesmo tempo em que autoriza – em determinados casos – exceções ou regras mais brandas, permitindo a manutenção da empresa e dos empregos (CASSAR, 2011, p. 35-37). 

O termo “flexibilização” é ainda usado de forma genérica para contemplar as diversas modificações do direito do trabalho, uma vez que está intrinsecamente ligada à instabilidade da política econômica, assim como às persistentes crises contemporâneas, que conforme a corrente flexibilista, são geradas pelo modelo tradicional das leis trabalhistas – que é acusado de constituir fator de rigidez do mercado de emprego e do alto custo do trabalho, contribuindo assim para o decréscimo de emprego. Dentre as modificações impostas ao direito do trabalho, por meio da flexibilização, tem-se a mobilidade geográfica e funcional dos trabalhadores, maleabilidade nos custos da mão de obra, gestão dos recursos humanos, organização do tempo de trabalho, entre outras (GROSSO, p. 93).

Destarte, a flexibilização se fundamentaria no aumento da produtividade e da competitividade, uma vez que sua proposta consiste em abrandar a proteção trabalhista clássica, na qual se justificaria o fenômeno flexibilizador do direito do trabalho principalmente em razão do denominado “custo Brasil”, que engloba a majoração dos níveis elevados e dos encargos sociais legais (GONCALVES, 2004).

A flexibilização, portanto, deve ter aceitação como forma de não obstar o desenvolvimento econômico, promovendo melhorias no mercado de trabalho, uma vez que a falta de regulamentação pode ter gerado um aumento significativo no desemprego, em decorrência de fatores gerados pela crise econômica, transformações tecnológicas e melhor qualidade de vida. Diante disso, concebe-se a flexibilização como uma forma de geração de emprego - embora não seja o único e exclusivo problema que regra o direito do trabalho, uma vez que há ainda questões relativas à ordem tributária, bem como o sistema burocrático previdenciários e os encargos sociais (CARLI, 2005, p. 50).

Tem-se, desta forma, que a flexibilização das normas do direito do trabalho se apresenta como o mecanismo mais hábil a ser adotado, conforme corroborado o posicionamento por Arion Sayão Romita (2008, p.30):

A corrente favorável à flexibilização das normas de Direito do Trabalho justifica seu ponto de vista otimista alegando que as medidas adotadas em razão da crise, tais como reorganização do tempo do trabalho e acordos derrogatórios, podem ser benéficas à sociedade, aumentando o número de empregos e permitindo que a empresa se ajuste, sem gastos adicionais, às exigências da nova realidade econômica.

Cumpre salientar ainda que o processo de flexibilização das normas trabalhistas integra um processo maior de flexibilização do mercado de trabalho, que abrangem um conjunto de medidas cujo ofício é estabelecer novos mecanismos capazes de compatibilizar o direito do trabalho com as mudanças sofridas em razão de fatores de ordem econômica, social, tecnológica ou de outra natureza. Portanto, a flexibilização se apresenta como um fenômeno que não se exaure em uma só medida, mas sim na totalidade – aquilo que é mais abrangente, e concebido não somente no que tange as estratégias jurídicas, mas também as políticas, sociais e econômicas (NASSAR, 1991, p. 76).

2 LIMITES À FLEXIBILIZAÇÃO

É sabido que desde a Revolução Industrial houve uma grande mudança na situação daquele que desempenha o papel de trabalhador. Contudo, hoje em dia ainda há uma revolução tecnológica, a qual causa certo prejuízo ao empregado, pois este vem sido substituído por máquinas. Por consequência disso, acontece a flexibilização das condições trabalhistas, uma vez que as empresas buscam reduzir custos por conta da competição do mercado, assim, as condições de trabalho oferecidas ao empregado são muito precárias, atingindo muitas vezes a dignidade humana através de trabalhos excessivos, baixos salários, grandes jornadas etc. (ZAMBOTTO, 2012, online).

O art. 468 da CLT impõe esses limites, dispondo que:

Art. 468 - Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.

A alteração de normas e acordos é permitida desde que para melhorar a situação do empregado (princípio da condição mais favorável), por isso que quando houver duplicidade de normas, a que será aplicada é a mais benéfica ao trabalhador. (VECCHI, 2007, p.204 apud ZAMBOTTO, 2012, online). Esse princípio acaba por ser desrespeitado por conta da flexibilização, pois muitas vezes o empregado se submete a condições totalmente desfavoráveis para manter ou arranjar um emprego.

Segundo Zambotto (2012, p. [?]), o uso da negociação coletiva deve ser estimulado para beneficiar o trabalhador, não para retirar dele um direito que foi conquistado ao longo da sua história. “Se se permitir que, mediante negociação coletiva, os percentuais ou valores, correspondentes a cada direito ou parcela, sejam, reduzidos os direitos ali consagrados serão, na prática, anulados, perderão efetividade, tornar-se-ão meramente simbólicos. Seria um desvirtuamento do prece constitucional. Criar-se-iam , por via oblíqua, outras exceções, que, ao em vez de visarem à melhoria dos direitos sociais, redundariam em prejuízo destes.” (Bomfim 2003, p. 18  apud ZAMBOTTO, 2012).

Por isso que deve haver limites a essa flexibilização, para que não haja a destruição de direitos e garantias fundamentais, uma vez que esses limites são impostos na própria Constituição Federal, tendo todos como base o princípio da dignidade da pessoa humana. Sendo assim, a flexibilização não pode acontecer de forma desenfreada, sem que ao menos seja garantido um piso mínimo de direitos a serem protegidos. A possibilidade de se flexibilizar as normas vigentes diz respeito às hipóteses de redução de salário e jornada de trabalho, sendo estes os limites, (NOVAIS, RIBEIRO, 2011, online) que serão tratados com mais afinco nesse tópico.

3 DIREITOS FUNDAMENTAIS DO TRABALHO

                

                 Primeiramente, tem-se que a compreensão dos direitos fundamentais do trabalho se aproxima da própria noção de direito trabalho, conforme entendimento:

O Direito do Trabalho consolidara-se, respeitadas as peculiaridades nacionais européias, como o patamar fundamental de afirmação da cidadania social da grande maioria das pessoas que participavam do sistema econômico, mediante a oferta de seu labor e, nessa medida, veio a se constituir em um dos principais instrumentos de generalização da democracia no plano daquelas sociedades. É que o Direito do Trabalho se mostrou, por décadas, um dos mais eficientes e disseminados mecanismos de distribuição de renda e de poder no plano da sociedade capitalista: distribuição de renda principalmente por meio das normas reguladoras do contrato de emprego (Direito Individual do Trabalho); distribuição de poder por meio das normas e dinâmicas inerentes ao Direito Coletivo Trabalhista, embora, normalmente, as duas dimensões desse ramo jurídico atuassem do modo combinado (DELGADO, 2007, p. 14)

Desta forma, a relação empregatícia, enquanto fenômeno sócio-jurídico é resultado da síntese de um diversificado conjunto de fatores reunidos em um dado contexto social ou interpessoal. Nesse sentido, o direito do trabalho surge como uma conjugação de cinco elementos, presentes em uma relação sócio-econômica: prestação de trabalho por pessoa física a um tomador qualquer; prestação efetuada com pessoalidade pelo trabalhador; caráter não-eventual da prestação;prestação efetuada sob subordinação ao tomador dos serviços; prestação de trabalho efetuada com onerosidade (DELGADO,2009, p. 269-270).

Configurado a relação de trabalho, o direito à este, que apresenta caráter atuante na sociedade, constitui-se de princípios, institutos e regras, que explanam direcionamento a determinadas condutas humanas, de forma a promover a alteração e vedação, ou ainda instituindo sanções às práticas arroladas ao ambiente de trabalho (GROSSO, 2007, p.12). Apresenta-se ainda como uma relação de subordinação, que visa assegurar melhores condições de trabalho e sociais do trabalhador, conforme as medidas que lhe são asseguradas (MARTINS, 2002, p. 45).

Sendo assim, a aplicação de direitos fundamentais nas relações privadas – vinculação entre os particulares – é necessária, uma vez que a sua observância é indispensável para a configuração do Estado democrático de direito, uma vez que a exclusão desses direitos em tais relações culminariam na cisão da ordem jurídica, uma vez que não há razão para que haja diferenciação entre a aplicação desses direitos na esfera pública e privada, já que o que se protege é a dignidade da pessoa humana, como valor supremo (LOBATO, 2006, p?).

A inserção do empregado no ambiente de trabalho não lhe retira os direitos de personalidade. Contudo, não é nenhuma ameaça ao empregado impedi-lo de usar meios da empresa em benefício próprio ou em prejuízo da empresa. Os valores pessoais devem prevalecer sobre os valores materiais (dignidade da pessoa humana x prejuízo no furto de mercadorias na revista íntima). A dignidade da pessoa humana deve ser afirmada como valor supremo (CALVO, 2009, p?).

Nesse sentido, dispõe-se que o direito fundamental é todo aquele que em decorrência de seu conteúdo e importância, estejam integrados à Constituição Federal – retirado assim da esfera de disponibilidade dos poderes constituídos – bem como em razão do objeto e significado a que possam ser equiparados, havendo ou não assento na Constituição (SARLET, 2001). Tem-se, no entanto, que só a partir da promulgação da Constituição de 1988 – onde estabeleceu os direitos fundamentais do Estado Brasileiro – que houve a consagração de diversos direitos trabalhistas como direitos fundamentais, de modo a fortalecer os direitos individuais dos trabalhadores. Contudo, os direitos concebidos como fundamentais não se exaurem nas hipóteses previstas na Constituição, abrangendo todos aqueles com conteúdo finalístico, em virtude do alicerce no princípio da dignidade humana, independente da posição que ocupam na estrutura normativa.

Sendo assim, a Constituição de 1988, do art. 5º ao 11º, dispõe sobre os direitos mínimos indisponíveis garantidos aos trabalhadores - direitos estes irrenunciáveis e preservadores da dignidade da pessoa humana – constituídos por disposições basilares, que funcionam como parâmetro e instrumento de proteção dos hipossuficientes nas relações de trabalho (CASSAR, 2011, p.50). 

Esse rol de direitos trabalhistas, configurados como fundamentais, ocorre uma vez que não é possível haver a prestação em uma relação de trabalho sem que haja comprometimento e envolvimento da pessoa do trabalhador, de forma que ao ingressar na relação de trabalho, além de trazer consigo todos os direitos inerentes à condição de pessoa, traz também aqueles que a lei garante enquanto trabalhador, repercutindo tanto na execução do próprio contrato quando na organização social da empresa (GEMIGNANI; GEMIGNANI, 2009, p. 25).

Ademais, o art. 7º da Constituição arrola os direitos fundamentais do trabalho, embora haja a consignação de forma expressa da natureza exemplificativa do dispositivo, compreendida em razão da expressão “visem à melhoria da condição social”. Desta forma, o dispositivo demonstra que além dos direitos previstos constitucionalmente nesse rol, há existência de outros direitos, tanto na própria Constituição quanto em leis esparsas (ALVAR, 2011, p?).

Portanto, apresentam-se enquanto pertencentes ao ramo dos direitos fundamentais, os direitos sociais – pertencentes à categoria de “direitos positivos”, uma vez que ensejam direitos à uma prestação do Estado ou particular –  elencados na Constituição, como disposto no art. 5º e 7º. Tem-se ainda que a “Declaração Universal de Direitos Humanos”, quanto aos direitos laborais (artigos XXIII e XXIV), tratou de três questões como básicas para todo o trabalhador: salário justo, limitação da jornada de trabalho e a liberdade de associação sindical, para fins de proteção desses direitos. No entanto, se por um lado houve apenas a transferência daquilo previsto anteriormente na CLT para o texto constitucional, por outro a Constituição de 1988 ampliou muito das vantagens estabelecidas, tais como: salário mínimo mais amplo, de modo a abranger a educação e lazer (IV), jornada semanal de 44 horas (XIII), adicional de 50% para as horas extras (XVI), abono de 1/3 sobre as férias(XVII), entre outros (FILHO, 1999, p?).

Contudo, como o direito do trabalho sofreu alterações positivas da Constituição, alargando direitos já existentes e criando novas positivações ao trabalhador, ao mesmo tempo que estabelecia parâmetros desfavoráveis nas condições de trabalho – não atendendo, portanto, o mínimo dos direitos fundamentais do indivíduo enquanto pessoa e na condição de empregado – é que a Constituição precisou albergar a flexibilização das normas trabalhistas, de maneira a atender aos novos anseios surgidos com as modificações nas relações trabalhistas.

3.1 DIREITO DO TRABALHO E O PRINCIPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O principio da dignidade da pessoa humana tem sido bastante importante devido à carga histórica dos trabalhadores, desde a escravidão até os dias de hoje. Não só na escravidão, como também na servidão, o trabalhador não tinha seus direitos reconhecidos muito menos respeitados, por isso esse principio veio para proteger também esses trabalhadores que sempre estiveram em uma condição de extrema vulnerabilidade. Explica o autor Cristiano Grosso:

Dentre todos os princípios norteadores do direito do trabalho eis que se destaca, o princípio da dignidade de pessoa humana, estando ele inserido na Lei Maior, como fundamento do Estado Democrático de Direito. Diante disso vê-se que ao mesmo tempo que é um princípio norteador do direito, é também um direito, ou seja, existe uma unidade de sentido, ao passo que dignidade da pessoa humana é um princípio e também se constitui no fundamento do Estado. Resulta, daí dizer que a todo ser humano deve ser respeitado o princípio da dignidade da pessoa humana, sendo que no âmbito do Direito do Trabalho deve ser respeitado o direito de todos os trabalhadores no que diz respeito às condições justas, eqüitativas e satisfatórias de trabalho, pois numa relação de trabalho deve esta ser estruturada sob a forma de um contrato, não deverá ser examinada sob uma ótica, devendo ser pesado o aspecto humanitário que caracteriza tal relação. (GROSSO, 2007, p. 49-50).

Segundo dispõe Alice Monteiro de Barros (2008, p. 168), o direito do trabalho é orientado por “linhas diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das relações de trabalho conforme critérios distintos dos que podem encontrar-se em outros ramos do Direito”. Nesse sentido, tem-se que as relações de trabalho precisam ser analisadas em consonância com os princípios norteadores do Direito do Trabalho, e essencialmente ao da dignidade da pessoa humana – uma vez que deste decorrem todos os demais.

Girotto explica:

Com o princípio do respeito à dignidade da pessoa não há distorção em sentido e fim, pois ele se encontra em t odo o sistema jurídico brasileiro e nada pode existir sem a sua existência, de modo que, sob um prisma limitador, qualquer proposta flexibilizadora de direitos trabalhistas deve ser observada, em relação aos seus efeitos, com o devido enfoque à dignidade da pessoa humana, encarnando neste princípio verdadeiro limite à possí vel implantação de tal modificação no sistema normativo justrabalhista. Assim, antes de adentrar em qualquer apreciação, seja no ato de legislar, executar, julgar, pesquisar e estudar o direito ou com base nele, o sujeito que age e pensa deve primar sua tarefa pela observação da existência dos princípios, principalmente daqueles advindos da Constituição, que figuram acima dos demais, influenciando desde a criação das normas hierarquicamente inferiores, passando pela aplicabilidade e interpretação do Direito. O princípio da dignidade da pessoa humana tem efetiva garantia constitucional, mas suas influências no mundo jurídico não podem ser relativizadas, sob pena de a comunidade humana, enquanto sujeito de direitos e do processo histórico, bem como fim da proteção estatal, perder sua autonomia. Sem a dignidade o homem perece como ser autônomo, sujeito da ação política, jurídica, cultural, social e econômica, e o Direito subsistiria como pecha de inumano, opressor, indigno, violador da vida e injusto. (GIROTTO, 2012, online, p. [?]).

Sendo assim, os limites à flexibilização são baseados pelo princípio da dignidade da pessoa humana, pois ele compreende um núcleo material elementar composto pelo mínimo necessário à existência: renda mínima, saúde básica, educação fundamental e acesso à justiça. (CUNICO, OLIVEIRA, 2010 apud NOVAIS, RIBEIRO, 2011, online).

Esse processo de flexibilização das leis trabalhistas só poderá acontecer se forem observado os direitos e as garantias fundamentais dos cidadãos, seja ele trabalhador ou não. Esse ajuste de normas jurídicas aplicáveis ao Direito do Trabalho não pode ser feito como forma única de propiciar um incremento na geração de empregos, com a finalidade de combate ao desemprego, somente visando o desenvolvimento econômico social, pois se for assim poderá ocasionar riscos aos trabalhadores, uma vez que tira do Estado o poder intervencionista, ou seja, a proteção aos trabalhadores. (GROSSO, 2007, p. 53).

Por isso que o processo de flexibilização feito de uma forma descuidada (não se nortear pelo principio da dignidade da pessoa humana) poderá resultar na descaracterização do próprio Direito do Trabalho, devido a que o mesmo é apreendido como instrumental necessário à proteção do trabalho humano. (GROSSO, 2007, p. 53).

CONCLUSÃO

           

Conforme já estudado, muitos trabalhadores vêm abrindo mão de direitos seus, os quais são essenciais para a sua mínima dignidade no trabalho, com visto que aceitam condições de trabalho que não são das melhores, para poder não perder o emprego ou ao menos arranjar um. A justificativa é o desemprego, essa flexibilização vem para diminuir o alto índice de desemprego no Brasil.

Porém, é sabido que desde muito tempo os trabalhadores vêm lutando por condições melhores no trabalho, e por reivindicação de seus direitos, por isso que a aceitação dessas flexibilizações acaba por tornar essa luta rarefeita.

Devido a isso, existe os limites da flexibilização, que são baseados nos princípios do Direito do Trabalho, visando manter a dignidade mínima desses trabalhadores no seu local de trabalho. O principal principio a ser respeitado é o da Dignidade da Pessoa Humana, que é base de todos os outros princípios do Direito, principalmente o direito do trabalho.

Sempre deverá ser respeitada a dignidade da pessoa humana, assim como o principio da condição mais benéfica, o trabalhador não pode ser alvo de acordos que o coloque em posição mais vulnerável ainda, em condições piores do que a que ele já se encontra, ou seja, o direito visa sempre colocar o empregado em uma situação mais favorável, por isso que a flexibilização está limitada a essa condição.  Não somente o Estado deve respeitar a dignidade humana, como também os próprios humanos, em virtude de seus semelhantes, no caso a relação de empregador-empregado.

Esse princípio juntamente com os outros do Direito do Trabalho servem como um vetor para o intérprete do direito, indicando os caminhos a serem seguidos quando se depararem com uma situação de flexibilização extrema e desrespeitosa dos direitos dos trabalhadores. Não basta que seja visado o crescimento econômico sem que sejam observados os princípios e garantias constitucionais, de forma que nunca sera atingido esse desenvolvimento se não forem garantidos os direitos dos trabalhadores.

Portanto, conclui-se que não se pode haver a flexibilização, apenas como modo de desenvolvimento econômico e social, se não forem respeitados os direitos mínimos dos trabalhadores.

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