LIBERTAR ANTES QUE NÃO SEJA TARDE.

A Cidadania democrática e a comunidade política

Justificativa.

A escolha do tema presente de deve à sua relevância na atualidade. Acompanha-se aqui a idéia da própria autora, que expressa:

[...] a crescente tomada de consciência da necessidade de uma nova forma de identificação em torno da qual organizar as forças que lutam por uma radicalização da democracia. (p. 83).

Introdução.

Neste trabalho acadêmico, será abordado o texto A cidadania democrática e a comunidade política, (MOUFFE, Chantal, O Regresso Político, 1996, Ed. Gradiva). O objetivo aqui é apresentar as idéias de Chantal Mouffe no que se refere à teoria da democracia liberal, em que a autora afirma que o liberalismo[1] tem sido incapaz de compreender as questões políticas na atualidade que apresenta uma forma deficiente de conceber a identidade política.

A disputa entre os princípios da igualdade e da liberdade[2] leva à importância do político da democracia moderna. Uma forte oposição às teorias liberais é a dos representantes do comunitarismo. Estes ligam as questões sobre a justiça política à questão sobre vida real dos indivíduos na comunidade política, recusando as abstrações e suposições dos liberais, que inclui Rawls, (RAWLS, John, Uma Teoria da Justiça, 1970).

Rawls e outros liberais concebem a cidadania é a capacidade de cada pessoas realizar a sua concepção de bem. Os comunitaristas concebem o cidadão como alguém capaz de realizar o bem comum. Ou seja, diferente de Rawls, comunitárias defendem que o bem não é o que cada pessoa concebe ou deseja mas o bem deve ser público. Que significa? Significa que a comunidade é capaz de enfatizar a noção de bem público, independente dos desejos e interesses pessoais.

Realmente, a atualidade apresenta a ausência de um bem comum. (P. 88, A Cidadania democrática e a comunidade política).Enquanto o liberalismo coloca o direito sobre o bem, sendo o bem uma idéia presente na lei (Cf. p. 88), o comunitarismo sobrepõe o bem ao direito, visando à construção do bem comum. Simplificando, os liberais valorizam os direitos individuais, e os comunitaristas valorizam a vida comunitária.

Cidadania não é fruto de um estatuto legal, mas, antes, identidade política. (P.90).

O que é o cidadão?Trata-se de identidade política, ou seja, de identificação com a república, com a coisa pública, por assim dizer.Ser cidadão não é ser uma pessoa que goza de seus direitos, assegurados pela lei, como espera o liberalismo (p. 95). CHANTAL enfatiza que a idéia de "nós", e não de "indivíduo", somada à idéia de valores comuns e buscados por todos importa à democracia radical. Desejos e interesses são individuais, pessoais, claro está. Entretanto, o modo com se chega às decisões individuais é público, pois os indivíduos vivem na república. Assim, a idéia de privado e público não se separa da idéia de indivíduo e cidadão. Ou seja, não se pode dizer "Ora sou cidadão, ora sou indivíduo.". Não se separam essas esferas numa democracia radical. Desse modo, os princípio de igualdade e liberdade são vividos, não como um ordem autoritária mas como condição de uma vida plena de cidadania numa real democracia.

Liberalismo.

A teoria liberal é, desde as suas origens, uma doutrina pluralista. Vários clássicos interagem com os primeiros passos dessa doutrina. Dar-se-á destaque à obra Ensaio Sobre a Liberdade, redigida por John Stuart Mill, publicada pela Ed. Escala, 2006, em que o autor sustenta, entre outros pontos importantes, que a liberdade e a felicidade não são complemento uma da outra mas são reciprocamente necessárias. Ou seja, ambas, a liberdade e a felicidade, devem caminhar de mãos dadas e convir em igualdade. Já no início do Ensaio, Stuart Mill expõe os termos da questão:

            "O tema deste ensaio trata [...] dos limites do poder que pode ser legitimamente exercido pela sociedade sobre o indivíduo". (MILL, John S., Ed. Escala. 2006, p. 100).

Um ponto que se pode por em relevo aqui é a "comparação" que faz Stuart Mill entre natureza e liberdade. Vê-se no Ensaio que a natureza é comum a todos os seres humanos, mas cada um a realiza de diferentes modos, exibindo assim uma pluralidade de formas de viver.Afirma a obra que o indivíduo deve ser necessariamente livre para ser um cidadão que possa gozar a felicidade de sua individualidade.

Para Stuart Mill, a individualidade é um fim em simesmo e não um meioquevisaalguma outra coisa que não a liberdade da pessoa, uma vez que afirma que aquilo que caracteriza a natureza humana não é a uniformidade mas a criatividade da diversidade Assim, a comparação à natureza se observa na citação que se segue.

"Toda parte da natureza humana que se sobressai proeminentemente [...] tende a tornar a pessoa marcadamente diferente, fora do perfil humanamente comum." (Op. cit.).

Reafirma-se que, assim como a natureza é diversificada no indivíduo, o indivíduo também o é na sociedade:

"O indivíduo é a pessoa mais interessada no seu bem estar que qualquer outra pessoa, [...] e sobre os seus próprios sentimentos ou circunstâncias, o homem ou a mulher possui meios de conhecê-los com muito mais profundidade do que outras pessoas." (Op. cit.,p. 109).

No seu Ensaio Sobre a Liberdade, Stuart Mill diz que o poder vinculado à democracia não seria, por si só, suficientemente capaz de impedir a tirania opressora que se impõe pela maioria ao indivíduo. Para evitar esse tipo de opressão, Stuart Mill afirma a importância de se permitir a existência de um espaço que permita a liberdade de consciência, de expressão, de gosto etc., dos indivíduos, afim de que essas liberdades possam refletir na vida das pessoas realmente. Entretanto, ele não deixa de dar importância às normas gerais ao lado da liberdade de cada pessoa, caracterizando o pensamento liberal, em que se observa:

"Na conduta dos seres humanos, em relação aos outros, é necessário que regras gerais, leis cívicas, sejam propostas e observadas, para que as pessoas possam saber o que esperar umas das outras, mas nos próprios interesses de cada pessoa, na sua espontaneidade individual e em livre direito de exercício.

Assim como Rawls e outros liberais, John Stuart Mill concebe a cidadania como sendo a capacidade de cada pessoa realizar a sua concepção de bem, em benefício de seus interesses pessoais, respeitados os limites da liberdade dos outros.

 

By Sérgio Fontana


[1] "O mal começa quando, ao invés de excitar a atividade e a energia dos indivíduos e grupos, o governo troca sua atividade pela deles - quando, ao invés de informar, aconselhar e, na oportunidade, censurar, ele os faz viver sob grilhões ou lhes determina fiquem de lado e faz o que é deles em seu lugar".(MILL,John S., Op. Cit.).

[2] A luta entre a Liberdade e a Autoridade é a característica mais consciente da história, desde a Grécia até a Inglaterra, passando por Roma. (MILL, John S., Ed. Escala. 2006, p. 17).