Ler ou não ler: eis a questão 

PAULO, Rosangela Jizuato

Resumo

Reconhecendo a importância do ato de ler e compreendendo que ensinar leitura nos dias de hoje é desenvolver habilidades de ler, compreender, interpretar diferentes tipos e gêneros de textos e interagir com diferentes portadores de textos, não conseguindo pensar numa aula de Língua Portuguesa e assuntos afins que não parta desta unidade lingüística (texto). Nos dias atuais é reconhecido o grande número de portadores diferenciados tipos de escrita na nossa sociedade (revistas, jornais, volantes, outdoors, contatos, contas, notas fiscais, cartazes, a tela do computador), mediante tudo isso a escola deve assumir a responsabilidade de desenvolver nos alunos habilidade de leitura e interpretação dos textos veiculados por estes diferentes portadores, já que cada portador carrega tipos ou gêneros específicos de textos exigindo, portanto, formas especiais de leitura. Para isso, a escola deve criar oportunidades para que os alunos descubram o prazer da leitura, mas sempre sabendo que podem ou não descobrir esse prazer e se, apesar de tudo, não descobrirem só podemos lamentar que estejam perdendo essa maravilhosa forma de lazer e prazer que é a leitura. Através deste artigo é reforçado mais uma vez o quanto a leitura é essencial na vida do cidadão, mostrando os pontos principais da leitura e revelando o papel de cada um (aluno/professor) que estão envolvidos no tema abordado.

Palavras-chave: Leitura. Motivação. Escola.

 1. Introdução

     Ler um texto é atribuir significações que pressupõe uma reconstrução do texto que é apresentado, colocando em ação todo conhecimento e conduzindo a construção do real, a uma interpretação do mundo, pois a leitura é a ponte inconsútil, suspensa no ar, sustentada na razão e no sentimento, que conduz ao outro e a nós mesmos.

 O leitor deve dominar o código, a informação mais rápida e depois a deslinda, observando as várias partes do discurso: nota seleção de palavras empregadas pelo autor, observando-as na organização da frase, na construção do parágrafo e volta a fixar-se no todo.

A leitura depende da vontade de um eu e da capacidade de posicionar-se diante do discurso do outro, cabe ao professor atuar como mediador, comentando aspectos da organização do discurso e transmitindo informações que possam auxiliar o aluno a enveredar por esse intrincado mundo de letras, criando oportunidades que permitam o desenvolvimento do processo cognitivo.

Na segunda seção são apresentadas as variações lingüísticas, textuais, conhecimentos parciais e estruturados, a leitura e aprendizagem, concepção da leitura na escola. Na terceira apresenta a leitura como avaliação, e a concepção autoritária. Na quarta seção fala-se da leitura, à escrita e o dizer. Na quinta a escola deve saber como fazer para formar leitores.

O objetivo é despertar o interesse pela leitura para formar cidadãos leitores e críticos, através de pesquisas e oficinas de leitura.

2. Conhecimento prévio da leitura

Para a compreensão de um texto, é necessário que o leitor utilize seu conhecimento prévio, e isso lhe permitirá fazer as inferências necessárias para relacionar diferentes partes discretas do texto num todo coerente. É mediante a interação de diversos níveis de conhecimento, como conhecimento lingüístico que é aquele conhecimento implícito, ele abrange desde falar português, passando pelo conhecimento de vocabulários e regras, até o conhecimento sobre o uso da língua, o conhecimento textual é o conjunto de noções e conceitos sobre o texto, quanto mais conhecimento textual mais fácil será sua compreensão e o conhecimento do mundo que é o conhecimento adquirido informalmente, através das nossas experiências e convívio numa sociedade.

O conhecimento lingüístico textual de mundo deve ser ativado durante a leitura para chegar ao momento da compreensão.

Outro caminho para compreensão de um texto é o estabelecimento de objetivos e propósitos claros para a leitura, que melhoram significativamente nossa capacidade de processamento e de memória.

Não há um processo de compreensão de textos escritos, mas há vários processos de leitura, tantos quantos forem os objetivos do leitor, muitas vezes estes últimos determinados pelos tipos ou formas de textos. Essa capacidade de estabelecer objetivos da leitura é considerada uma estratégia meta cognitiva.

A leitura que não surge de uma necessidade para chegar a um propósito não é propriamente leitura, quando lêem sem a explicitação de um objetivo, estão apenas exercendo atividades mecânicas que nada tem a ver com significado e sentido. Uma das atividades do leitor, fortemente determinada pelos seus objetivos e suas expectativas, é a formulação de hipóteses de leitura.

Ao formular hipóteses de leitura independentemente, utilizando o conhecimento prévio com elementos formais mais visíveis e de alto grau de informação, a leitura passará a ter caráter de verificação de hipótese, e o leitor estará predizendo temas, estará também postulando uma possível estrutura textual; na predição estará ativando seu conhecimento prévio, e na testagem estará enriquecendo, refinando, checando esses conhecimentos, que leva a compreensão do texto.

Nas séries iniciais, a compreensão não se dá necessariamente durante o ato de ler da criança, mas durante a realização das tarefas definidas pelo professor, as quais criam condições para o leitor em formação retomar o texto e, na retomada, compreendê-lo.

A aprendizagem é construída na interação de sujeitos cooperativos que têm objetivos comuns, por isso, adulto e criança, conjuntamente, deverão construir um contexto de aprendizagem mediante a interação, cabendo ao adulto definir tarefas significativas, segundo objetivos pré-definidos em comum acordo.

As concepções de texto e leitura que permanecem nas práticas de sala de aula é uma das causas da desmotivação e desinteresse do aluno pela leitura. Essas concepções não questionadas e perpetuadas na prática não têm fundamentação teórica consciente, nem do ponto de vista da teoria da linguagem nem da teoria sobre a leitura social.

A atividade árida e tortuosa de decifração de palavras é chamada de leitura em sala de aula, nada tem a ver com a descrição de leitura do parágrafo anterior, pois ninguém gosta de fazer aquilo do qual não consegue extrair sentido, por isso para alguns alunos, ler é difícil demais.

A experiência de leitura que a maioria dos alunos tem, são frustrantes cópias de palavras, recorte de palavras com a letra J. Enfim, letras, sílabas, dígrafos, encontros consonantais, encontros vocálicos, “dificuldades” imaginadas e reais substituem o aconchego e o amor para esses alunos, entravando assim o caminho até o prazer de ler.

Após esse primeiro e desapontador contato com a palavra escrita, a desilusão continua, e o fracasso se instala como uma constante na relação com o livro e a leitura desse aluno, que logo passa a ser mais um não leitor em formação.

As práticas desmotivadoras, perversas, provêm de concepções erradas sobre a natureza do texto e de leitura, e, portanto, da linguagem, pois são práticas sustentadas por um entendimento limitado e incoerente do que se seja ensinar português. Sendo comum alunos de o terceiro colegial reivindicar o ensino das regras gramaticais, porque será a que determinará a sua inclusão ou exclusão no banco, na repartição publica, na faculdade e alunos do curso supletivo de alfabetização reivindicar a leitura como decifração e cópias de letras e sílabas, como um fim em si, sem perceber que atividades é apenas prelúdio para atividade de leitura, porque nunca ninguém desvendou para eles o verdadeiro significado da atividade de ler.

É por isso que uma das primeiras barreiras do professor ao ensinar a ler é a resistência do aluno, dos pais e até do diretor da escola. Muitas vezes o professor recém-chegado ou recém-formado quer desenvolver uma proposta inovadora e renovadora, mas acaba desistindo, pois sua proposta está baseada apenas numa convicção da necessidade de mudança, mas sem formação necessária para ela.

3. A leitura como decodificação

Compõe-se uma série de automatismos de identificação e pareamento das palavras idênticas numa pergunta ou comentário, que para responder algo sobre o texto, o leitor só precisa o passar do olho pelo texto à procura de trechos que repitam o material já decodificado da pergunta.

Essa atividade passa por leitura, e também aquele que consiste em solicitar uma opinião dos alunos sobre o assunto logo após a “leitura” do texto, sem sequer ter discutido o assunto tal como ele é tratado pelo autor, mas sobre a opinião do autor. O Professor queima a etapa da leitura quando não pergunta sobre a opinião do autor, mas sobre a opinião do aluno, neste caso, a “interpretação” precede a leitura.

A leitura como avaliação é outra prática de leitura que inibe, ao invés de promover a formação de leitores. Nas primeiras séries, essas práticas ocorrem em freqüência, pois o professor insiste na leitura em voz alta como forma de perceber a compreensão do aluno, apesar de ser mais fácil o fio da estória quando estamos prestando atenção à forma, à pronúncia, à pontuação, considerados aspectos relevantes na leitura em voz alta.

[...] As crianças que lêem pior tendem a se apoiar no contexto; elas também são as piores ”decodificadoras”. Não será então arriscado dizer que ler é fazer antecipações sobre o sentido, adivinhar até, se não se articular melhor a compreensão e as atividades de decodificação [...]. (FOUCAMBERT, 1994, p. 87)

A carga cognitiva é agregada quando o dialeto da criança não é o dialeto padrão, pois ele deverá ainda traduzir o que lê para o seu dialeto; e se o professor exigir a pronúncia padrão, então essa carga aproxima dos limites do intolerável do ponto de vista cognitivo.

A leitura em voz alta pode ser considerada a melhor forma de avaliar, quando for dado tempo para o aluno realizar a leitura silenciosa antes, sendo o objetivo de o professor verificar se o aluno conhece as letras, se autorizou as correspondências entre som e letra, se conhece o valor dos símbolos usados para a pontuação. Entretanto, se o objetivo do professor for ampliar o vocabulário visual de reconhecimento instantâneo, ou desenvolver os hábitos típicos do leitor proficiente na leitura solitária, a leitura em voz alta não é sempre necessária.

Quando o objetivo da leitura em voz alta for à apreciação estética da linguagem, o professor pode auxiliar seus alunos para que, nas suas leituras, percebam e façam perceber a beleza da linguagem, (através de aliterações, onomatopéias).

Uma avaliação desmotivadora é a leitura que é cobrada mediante resumos, relatórios e preenchimentos de fichas, ou medidas mediante números de páginas, pois o aluno lê objetivo, lê apenas porque o professor mandou e será cobrado, desvirtuando efetivamente o caráter da leitura com prazer.

A Integração numa concepção autoritária de leitura parte do pressuposto de que há apenas uma maneira de abordar o texto, e uma interpretação a ser alcançada, ou seja, a análise de elementos discretos seria o caminho para chegar a uma leitura autorizada, a contribuição do aluno e sua experiência é indispensável, e a leitura torna-se uma avaliação do grau de proximidade ou distância entre a leitura do aluno e a interpretação “autorizada”.

No entanto, leitura é totalmente o contrário, pois são os elementos relevantes ou representativos os que contam, em função do significado do texto, a experiência do aluno é indispensável, e não há leituras autorizadas, mas apenas reconstruções de significados, algumas mais e outras menos adequadas, de acordo com os objetivos e interações do leitor. As concepções sobre o método de que o professor geralmente reproduz a proposta de trabalho na maioria dos livros didáticos, organizando suas atividades em torno de um texto, não propiciando a interação entre professor e aluno, porque primeiramente realiza a leitura silenciosa ou em voz alta do texto, e depois, uma série de pontos a serem discutidos, por meio de perguntas sobre o texto, que não levam em conta que o aluno de fato compreendeu.

Sabe-se, que é durante a interação que o leitor mais experiente compreende o texto, onde há conversa sobre aspectos relevantes do texto, pois muitos aspectos que o leitor não conseguiu perceber ficam salientes nessa conversa e muitos pontos obscuros são iluminados na construção conjunta da compreensão. Portanto, não é qualquer conversa que servirá de suporte para a compreensão do texto.

4. Ler, escrever e dizer.

Segundo Bajard, explica que ler é uma atividade individual e que, quando uma pessoa lê, ela elabora ou produz um sentido para o texto lido, e através da leitura possibilita ao leitor a matéria para a construção de sua própria competência lingüística. Escrever é uma atividade individual, cujo resultado é a produção do texto. Já o dizer consiste em transmitir oralmente um texto lido para outras pessoas. Dizer envolve tanto a produção de sentido quanto a produção da oralidade.

Ler, escrever é, em essência, atividades solitárias, enquanto o dizer é uma atividade social. Cabendo a escola possibilitar a todas as crianças o domínio da escrita exigido pela sociedade. Em outras palavras, é preciso ensinar a ler, escrever e dizer.

É através do dizer que a prática da escrita ganha dimensão social. A prender a ler não é ter contato com bons livros, mas ter contato com todos e encontrar entre eles os melhores. Não se pode formar o espírito critico tendo contato apenas com bons livros escolhidos por outras pessoas. Aprender a ler é entrar na cultura escrita, no universo da leitura. Freire diz que: [...] Ler não se esgota na pura linguagem da realidade se prendem dinamicamente. A leitura do mundo precede a leitura da palavra. Na medida em que a criança se torna intima de seu mundo, é capaz de perceber e entender melhor a “leitura” dele [...]. (1997, p.11)

     A leitura só é praticada por cerca de um terço da população e o nível de analfabetismo funcional revela-se preocupante.

     Foucambert, do Instituto Nacional de Pesquisas Pedagógicas da França (INRP), defende a idéia de que o problema da leitura só será resolvido quando as pessoas passarem a ser “Leiturizadas”, em vez de alfabetizadas e colocá-lo em contato direto com a escrita que permite o pensamento sobre o pensamento e não uma simples transcrição da linguagem oral. (1994, p.156).

Foucambert defende a tese de que só se lê e se escreve quando o assunto esta relacionado com a vida de cada um. O bom leitor, não se mede só pela quantidade de livros que se lê, mas também por sua produção escrita. O bom leitor lê por necessidade e escreve para superar dificuldades, para transformar a realidade.

5. O que a escola precisa saber (e fazer) para formar leitores

Jean Foucambert acredita que a escola e as bibliotecas devem ser abertas a comunidade.

A biblioteca de uma escola deve ser comparável a de uma empresa, deve conter um conjunto de livros e de documentos que necessitamos para desenvolver um trabalho dentro do projeto da empresa, que no caso é a escola. O projeto é o de aprender a ler por meio de uma política de leitura voltada para o bairro. Como Paulo Freire diz:

[...] A biblioteca popular como centro cultural e não como um depósito silencioso de livros, é vista como um fator fundamental para o aperfeiçoamento e a intensificação de uma forma correta de ler o texto em relação como contexto [...]. (Freire, 1990 p.38).

 Ou seja, o projeto de as crianças aprenderem a ler ao mesmo tempo em que produzem atividades pela leitura no meio social. A biblioteca, necessariamente, um local aberto ao bairro, onde crianças e adultos da escola e de fora dela trabalham no contexto de uma política de leitura. Uma das funções principais das bibliotecas é permitir a observação de todos os textos produzidos atualmente, de modo que cada leitor utilize seu saber no contato do que é a escrita.

6. Conclusão

Sabe-se que formar leitores é um compromisso de toda a sociedade e não apenas dos professores. Para isso, vários setores da sociedade, como a família, as bibliotecas, os meios de comunicação e a indústria eleitoral devem trabalhar para democratizar o livro e a leitura. Poucos compreendem que a literatura é uma leitura do mundo e não apenas uma coisa para ser decodificada. A crise da leitura começa no sistema econômico e social discriminatório, que não oferece as mesmas oportunidades de desenvolvimento cultural a todas as chamadas da população. Quando se fala da formação do leitor e da leitura critica, tem-se como objetivo atingir uma espécie de leitura não do que o texto diz, mas daquilo que ele realmente quer dizer e dos meios que utiliza para dizer e mascarar seu ponto de vista. Essa leitura critica é uma leitura de intenções, dos entremeios, uma leitura de entrelinhas, é necessariamente uma leitura sob suspensão. Olhar um texto é forçosamente se perguntar o que pretende a pessoa que o escreveu. Isso não quer dizer que estejamos diante de um advérbio e também não significa que todos os textos tenham más intenções.

Os educadores devem estar sempre preocupados com uma melhor formação dos alunos, respeitando-os e reconhecendo, que eles têm uma história para ser contada; não rompendo jamais com a “leitura do mundo”, sabendo que esta precede a leitura da palavra. Agindo assim, atuarão não mais como meros mediadores do conhecimento, e sim mediadores da cultura auxiliando os leitores na descoberta maravilhosa das letras e transformando a leitura num ato interativo e de compreensão do mundo.

Referências

BAMBERGER, Richard. Como Incentivar o Hábito da Leitura. 7ª ed.2000

 FAULSTICH, Enilde L. de J. Como Ler, Entender e Redigir um Texto. 9ª ed; 1998.

 FOUCAMBERT, Jean. A Leitura em Questão, 1994.

 FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 35. ed. São Paulo: Cortez, 1997. (Coleção Questões da nossa Época. v. 13).

 FREIRE, Paulo. Alfabetização, 1990.

 REVISTA.  Educação 78 ed. Fevereiro e março 2010.

 SILVA, Maria Alice S. Souza e. Construindo a Leitura e a Escrita. 7ª ed.2000.