LEI Nº 12.551/11: REGULAMENTAÇÃO DO TELETRABALHO NO DIREITO TRABALHISTA BRASILEIRO [1]

 

 

                                                                        Alexandre Freire Amorim[2]

                                                               Bárbara Denise Silva[3]

 

 

SUMÁRIO: Introdução; 1 A Lei do Teletrabalho (Lei nº 12.551/11); 1.1 Os Direitos trabalhistas no Teletrabalho; 2 Subordinação Jurídica do Teletrabalhador; 2.1 O Teletrabalho e a “Desconexão do Ambiente de Trabalho”; 3 Jurisprudências; Conclusão; Referências.

RESUMO

A Lei do Teletrabalho (Lei 12.551/11)  promoveu o reconhecimento dessa modadlidade de trabalho à distância na Consolidação das Leis do Trabalho. O legislador na referida Lei, não realizou uma regulamentação específica para os teletrabalhadores, apenas equiparando-os aos trabalhadores presenciais, que realizam suas funcões do domícilio do empregador. Isso provocou alterações quanto à subordinação dos teletrabalhadores e colocou em pauta à desconexão do ambiente de trabalho, cabendo à Jurisprudência aplicar ao caso concreto os direitos trabalhistas equiparados aos teletrabalhadores.

 

PALAVRA-CHAVE

Lei 11.551/11; Teletrabalho; Subordinação; Desconexão do Ambiente de Trabalho.

INTRODUÇÃO

 A Lei 12.551, de 15 de dezembro de 2011, alterou o artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho, inclusive acrescentando o parágrafo único, reconhecendo expressamente o trabalho à distância e os meios telemáticos e informatizados aplicáveis nessa modalidade de trabalho. O teletrabalho constitui modalidade de trabalho à distância, típico dos tempos pós-modernos, haja vista que a velocidade no qual a tecnologia avança nos dias atuais, permite-se o labor fora do estabelecimento do empregador. Os canais de comunicação decorrentes da computação e da internet permitem o contato contínuo com o empregador e a realização de atividades mais complexas como o secretariado, consultoria, jornalismo, contabilidade e etc.

O Teletrabalho é fruto da moderna tecnologia, e a respeito disso Alice Monteiro de Barros (2009, p. 326) coloca, “A inovação tecnológica subverte  a relação de trabalho clássica, sendo responsável por novos tipos de atividade descentralizada, que reúnem informação e comunicação.” Portanto, o teletrabalho surgiu das comunicações advindas do desenvolvimento tecnológico, como a computação e a já referida Internet.

Essa quebra da relação de trabalho clássica, com o surgimento do labor à distância decorrente do uso das modernas comunicações, fez surgir a necessidade de uma regulamentação dessa nova modalidade de trabalho, como ,por exemplo, a flexibilização do horário de trabalho no Teletrabalho, que pode implicar numa duração de tempo maior no exercício das atividades profissionais do que a jornada de trabalho acordada, haja vista que o local de trabalho será o domicilio do empregado, logo o tempo de disposição do empregado em relação ao empregador será maior, assim surge uma questão muito importante que corresponde a como garantir ao teletrabalhador uma desconexão do ambiente de trabalho, que constitui direito comum a todos os trabalhadores, além de outras implicações surgidas com o teletrabalho.

 

1 A Lei do Teletrabalho (Lei nº 12.551/11)

A Lei nº 12.551/11 inovou com uma nova redação do artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho, anteriormente a redação deste artigo não incluía com precisão o conceito de teletrabalho, assim colocado: “Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador e o executado no domicílio do empregado, desde que esteja caracterizada a relação de emprego”. Essa redação anterior a Lei 12.551/11, traz uma discussão sobre as diferenças entre Teletrabalho e Trabalho à domicílio, que não são equivalentes, assim o trabalho à domicílio se diferencia, pois tem como elemento caracterizador a frequente realização de atividades manuais, diferente do Teletrabalho, que como já referido é fruto da moderna tecnologia, tratando-se de uma modalidade de trabalho à domicílio que permite a realização de tarefas mais complexas, como jornalismo, contabilidade e outras.

Enfim, o Teletrabalho está intimamente ligado ao emprego de modernas tecnologias, como pode ser observado na nova redação do artigo 6º, alterado pela Lei nº 12.551/11, incluindo um parágrafo único que reconhece o Teletrabalho com precisão no regime trabalhista brasileiro, disposto da seguinte forma:

Art. 6o  Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. 

Parágrafo único.  Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. 

Como pode ser observado, a nova redação do artigo 6º da CLT reconhece os “meios telemáticos” e informatizados para a realização de atividades, funções e supervisão, equiparando-se aos meios pessoais, exercido na modalidade tradicional de trabalho, a presencial no domicílio do empregador. Logo, são aplicáveis ao Teletrabalho, preenchendo os requisitos da relação de emprego, as mesmas disposições do trabalho tradicional, no que tange a subordinação jurídica e os direitos trabalhistas já reconhecidos.

A recente Lei 12.551/11, finalmente reconheceu o Teletrabalho e o emprego de seus meios informatizados na relação de trabalho, mas não houve regulamentação quanto as peculiaridades dessa modalidade de labor, assim como os seus direitos e deveres específicos, logo aplica-se as conhecidas normas gerais da Consolidação das Leis do Trabalho que regem a relação de emprego, que apesar das  peculiaridades do Teletrabalho, devem ser moldadas a essa nova modalidade de trabalho à distância.

1.1  Os Direitos Trabalhistas no Teletrabalho

No Direito Trabalhista Brasileiro, não há legislação especial para o teletrabalhor, posto que a Lei 12.551/11 apenas alterou o artigo 6º da CLT, assim como também não há legislação especial para o trabalho à domicilio. Logo, configurado o vínculo empregatício, aplica-se as mesmas normas gerais da CLT ao Teletrabalho, adaptando-se às peculiaridades desse tipo de trabalho quando for necessário. Uma das peculiaridades do Teletrabalho, corresponde a flexibilização do horário de trabalho, que apesar de ser difícil controlar as horas trabalhadas nessa modalidade de trabalho à distância, é possível aplicar as normas gerais sobre a jornada de trabalho, utilizando-se de programa informático que permita uma conexão permanente do empregado com a empresa, controlando a atividade e o tempo de trabalho do teletrabalhador, sendo capaz de armazenar na sua memória a duração real da atividade  ou dos intervalos, assim o Teletrabalho pode permitir que o empregador tenha controle total das atividades e produtividade do teletrabalhador, garantindo também o cumprimento da jornada de trabalho estipulada.

São garantidos aos teletrabalhadores, todos os direitos que cabem ao trabalhador urbano, que exerce o trabalho na empresa, conforme o artigo 7º da Constituição Federal. Assim, o teletrabalhador é assalariado e possui direito à férias, hora extra, o direito de greve, tudo decorrente da equiparação do artigo 6º da CLT. A tutela sindical é reconhecida ao teletrabalhador, sobretudo o já referido direito de greve, apesar da dificuldade de se exercer esse direito nessa modalidade de trabalho, visto que o teletrabalhador exerce o seu trabalho à distância, no seu próprio domicílio, que deve ser definido no contrato de trabalho, dificultando um maior contato social com os demais empregados.

No teletrabalho, é garantido de forma peculiar o direito à intimidade e à vida privada do empregado, posto que a fiscalização do empregador no domicílio do teletrabalhor, só pode ser realizado com a sua anuência, sob pena de violar a vida privada do teletrabalhador. Alice Monteiro de Barros (2009, p. 330), exemplifica uma solução norte-americana para esse problema, assim disposto:

Nos EUA (Los Angeles), para contornar esse problema, exige-se que os teletrabalhadores designem um local ou um cômodo para esse tipo de atividade, com passagem direta à parte externa  do domicílio, para que a administração do trabalho tenha acesso sem que viole o domicílio do trabalhador.

Essa solução poderia ser aplicada no regime do teletrabalho brasileiro, mas como a Lei do Teletrabalho não tratou das peculiaridades, não há regulamentação dessa fiscalização no próprio domicilio do teletrabalhador. Enfim, a Lei 12.551/11 não regulamentou o Teletrabalho no que tange aos direitos trabalhistas, apenas equiparando-os ao trabalho exercido no domicílio do empregador, logo aplica-se as  normas gerais da CLT ao teletrabalhador, apenas moldando essas normas gerais naquilo que for peculiar ao Teletrabalho.

2 Subordinação Jurídica do Teletrabalhador

Ao alterar o Art.6º da Consolidação das Leis do Teletrabalho (CLT), a Lei do Teletrabalho, no que se trata da equiparação da subordinação e seus efeitos tanto no trabalho à distância, quanto no trabalho realizado no estabelecimento do empregador, estabeleceu que os direitos e garantias são iguais para os empregados em regime de CLT e os teletrabalhadores.

No trabalho à distância, do qual o teletrabalho à modalidade, o controle abusivo ao poder de direção poderá se apresentar com maior ou menor intensidade, tomando a subordinação jurídica a denominação de telessubordinação, que poderá manifestar-se durante a execução do trabalho ou, mais comumente, em função do seu resultado. Afirma-se, até mesmo, que o controle da atividade é substituído pelo controle do resultado (BARROS, 2009, p. 331).

Vimos que o Art 3º da CLT, estabelece que  “considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual”, e a doutrina trata o conceito de dependência como sendo a subordinação jurídica, e “o trabalho em domicílio pode ser prestado de forma autônoma ou com subordinação, sendo certo que para a configuração desta última a presença da pessoalidade é mitigada” (MIRAGLIA, ZAPATA, 2012). Assim sendo:

O trabalhador em domicílio pode ser considerado empregado, desde que a subordinação esteja presente. Todavia, o conceito tradicional de subordinação não auxilia no cumprimento da missão de avaliar a presença ou ausência da relação de emprego. Isso se deve à forma de prestação de serviço do trabalhador em domicílio, que realiza seu trabalho fora do estabelecimento do empregador, longe da vigilância de um superior hierárquico e imune do sistema organizativo empresarial no que diz com as conexões de tarefas a serem desempenhadas. Fica evidente que o conceito de subordinação não pode ficar restrito à verificação de ordens e vigilância por parte do empregador. Ao contrário, deve ser ampliado para adaptá-lo à posição de empregado perante a empresa (MIRAGLIA;ZAPATA,2012).

Então, no que se tratar dos direitos dos trabalhadores em regime de CLT e desempenhando funções no estabelecimento do empregador e os trabalhadores em regime do teletrabalho, estes são guarnecidos dos mesmos direitos, como adicional noturno, horas extras etc. E, em relação à natureza jurídica do vínculo estabelecido entre o trabalhador e o tomador de serviços no teletrabalho, “pode-se afirmar que haverá relação empregatícia quando estiverem presentes os elementos descritos na CLT (pessoalidade, continuidade, onerosidade, subordinação)” (MIRAGLIA; ZAPATA, 2012). Percebe-se que, no caso do teletrabalho, a subordinação jurídica é estrutural, visto na percepção de Lívia Mendes Moreira MiragliaDaniela Lage Mejia Zapata (2012):

Isso porque a flexibilidade de horários, a ausência de ordens diretas e a inexistência de fiscalização e controle, características do teletrabalho, descaracterizam a subordinação se adotada em sua matriz clássica, o que levaria a exclusão do campo de incidência do ordenamento jurídico trabalhista o teletrabalhador. 

Em suma, a “subordinação no contrato de trabalho entre o teletrabalhador e o empregador é mitigada e manifesta-se de forma diferente da sua concepção clássica porque a atividade do prestador é descentralizada do processo produtivo do tomador e se desenvolve longe dos seus olhos” (SILVA, 2012), e isso não implica na renúncia do poder de controle da atividade do teletrabalhador, sendo esta exercida pelo empregador, pessoa que o teletrabalhador  dirige a prestação pessoal de serviço.

2.1 O Teletrabalho e a “Desconexão do Ambiente de Trabalho”

O Teletrabalho fez surgir novidades na realidade trabalhista, como a flexibilização do tempo e do local para o exercício da atividade laboral, e o tempo reservado para o descanso físico e mental do teletrabalhador, ou seja, a desconexão do ambiente de trabalho.

Estar em “seu próprio ninho”, desfrutando do ambiente familiar faz com que o teletrabalhador não contabilize o tempo gasto diante dos afazeres profissionais. A linha entre o lapso temporal destinado ao lazer e ao trabalho passa a ser tênue demais implicando na confusão entre estes dois ambientes, o que certamente ocasionará uma real possibilidade de prolongamento da jornada de trabalho. Não se pode esquecer, também, que o teletrabalhador não precisará deslocar-se para a sede do seu empregador, o que se traduz em economia de tempo. Isto é, com um tempo maior, poderá o seu superior hierárquico determinar mais tarefas a serem realizadas, representando trabalho excedente (RESEDÁ, 2012, p. 08).

Com o excesso de trabalho e a falta de momentos de lazer, o teletrabalhador pode desenvolver problemas visuais, devido ao uso intenso do computador ou outras máquinas, pode ter problemas dores lombares e nas articulações, mas “não só a fadiga e os problemas osteomusculares poderão surgir nesse tipo de trabalho como também o estresse, responsável por transtornos físicos e psicológicos” (BARROS, 2009, p. 335).

É, portanto, neste sentido, que se direciona o direito à desconexão, ou seja, é o direito do assalariado de não permanecer “lincado” com o empregador fora dos horários de trabalho, nos finais de semana, férias ou quaisquer outros períodos que sejam destinados ao seu descanso. Isto é, à preservação do ambiente domiciliar contra as novas técnicas invasivas que perturbam a vida íntima, o convívio familiar, o repouso e o lazer do trabalhador. (RESEDÁ, 2012, p. 12).

O Direito do Trabalho estabelece intervalos intrajornada e interjornada, com o objetivo de garantir o descanso físico e mental do trabalhador, para que este possa exercer suas atividades de maneira satisfatória. Então, além do intervalo intrajornada, o direito à desconexão busca garantir também o intervalo interjornada. “Este último, quando não respeitada a observância ao seu intervalo de onze horas previsto no art. 66 da CLT, acarreta duplo prejuízo ao empregado: uma, porque trabalhou em jornada superior à devida e, duas, porque não pôde gozar do descanso mínimo necessário para recompor suas energias.” (RESEDÁ, 2012, p. 12-13).

Então, o direito à desconexão deve ser uma garantia assegurada a todos os trabalhadores submetidos ao regime do teletrabalho, porque estará assegurando o cumprimento das normas existentes na CLT.

 

3 Jurisprudências

Antes da Lei 12.551/11, os Tribunais tinham uma visão mais conservadora sobre o Teletrabalho, enquadrando-o na hipótese do artigo 62, I da CLT, que dispõe da seguinte forma:

Art. 62 - Não são abrangidos pelo regime previsto neste capítulo:

I - os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados

Logo, o Teletrabalho se enquadraria na atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho, portanto alguns direitos básico dos trabalhadores como a hora extra não seriam garantidos aos teletrabalhadores, decorrente dessa flexibilidade do horário de trabalho, tornando difícil o controle desse horário, apesar de existir programa informático capaz de fazer esse controle. O Teletrabalho, nessa visão retrógada, evidentemente mostra uma supersubordinação, afinal o teletrabalhador está sempre à disposição do empregador e exercendo suas atividades, podendo inclusive ter suas férias interrompidas, tendo seu direito básico à desconexão do trabalho violado, sem contrapartida pecuniária pois não recebe hora extra, decorrente de uma nova modalidade de exercer o labor à distância. O Tribunal Superior do Trabalho decidiu da exata forma referida sobre o Teletrabalho, na modalidade home office, cujo Relator foi o Ministro Maurício Godinho Delgado, assim:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. HOME OFFICE: ENQUADRAMENTO E EFEITOS JURÍDICOS. OUTROS TEMAS: SUBSTITUIÇÃO. ACÚMULO DE FUNÇÕES. HORAS EXTRAS.ADICIONAL NOTURNO. HORAS DE SOBREAVISO. FÉRIAS INTERROMPIDAS. DECISÃO DENEGATÓRIA. MANUTENÇÃO.

O teletrabalho e o trabalho em domicílio (home office) tornaram-se frequentes nas últimas décadas em face da invenção, aperfeiçoamento e generalização de novos meios comunicacionais, ao lado do advento de novas fórmulas organizacionais e gerenciais de empresas e instituições. Isso não elimina, porém, necessariamente, a presença de subordinação na correspondente relação socioeconômica e jurídica entre o trabalhador e seu tomador de serviços, desde que ultrapassado o conceito tradicional desse elemento integrante da relação empregatícia em favor de sua dimensão objetiva ou, até mesmo, em favor do conceito de subordinação estrutural. Dentro deste novo, moderno e atualizado enfoque da subordinação, os trabalhadores em domicílio, mesmo enquadrando-se no parâmetro do home office, podem, sim, ser tidos como subordinados e, desse modo, efetivos empregados. Não obstante, não se pode negar que, de maneira geral, em princípio, tais trabalhadores enquadram-se no tipo jurídico excetivo do art. 62 da CLT, realizando o parâmetro das jornadas não controladas de que fala a ordem jurídica trabalhista (art. 62, I, CLT). Por outro lado, a possibilidade de indenização empresarial pelos gastos pessoais e residenciais efetivados pelo empregado no exercício de suas funções empregatícias no interior de seu home office supõe a precisa comprovação da existência de despesas adicionais realizadas em estrito benefício do cumprimento do contrato, não sendo bastante, em princípio, regra geral, a evidência de certa mistura, concorrência, concomitância e paralelismo entre atos, circunstâncias e despesas, uma vez que tais peculiaridades são inerentes e inevitáveis ao labor em domicílio e ao teletrabalho. Finalmente, havendo pagamento pelo empregador ao obreiro de valores realmente dirigidos a subsidiar despesas com telefonemas, gastos com informática e similares, no contexto efetivo do home office, não têm tais pagamentos natureza salarial, mas meramente instrumental e indenizatória. Na mesma linha, o fornecimento pelo empregador, plenamente ou de modo parcial, de equipamentos para a consecução do home office obreiro (telefones, microcomputadores e seus implementos, etc.) não caracteriza, regra geral, em princípio, salário in natura, em face de seus preponderantes objetivos e sentido instrumentais. Agravo de instrumento desprovido. (TST − 6ª T − AIRR 62141-19.2003.5.10.0011 − Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado - DJ 16/4/2010).

Outra Jurisprudência interessante do Tribunal Regional do Trabalho da 3º Região de 2004, trata das mudanças decorrentes do surgimento do Teletrabalho e na disposição dos funcionários das empresas, estabelecendo a possibilidade da subordinação e do vínculo empregatício perfeito para os teletrabalhadores, colocado da seguinte forma:

RELAÇÃO DE EMPREGO. TRABALHO AUTÔNOMO. O trabalho do homem livre acompanhou o movimento pendular da economia, segundo a tendência de cada época – liberal ou intervencionista. O trabalho subordinado e o trabalho autônomo foram, durante séculos, os pontos extremos de uma mesma linha, na qual se inseriram obrigatoriamente os diversos fatores da produção, inclusive o custo da mão-de-obra. Durante cerca de cinqüenta anos viu-se, no Brasil, por força da CLT, a progressiva aglutinação jurídica em torno do trabalho subordinado, fruto até de uma exigência do sistema fordista da produção. Nos últimos anos, contudo, tem-se presenciado um forte movimento em sentido inverso, em decorrência das substanciais mudanças na forma de prestação de serviços – teletrabalho, microinformática, robotização, trabalho a domicílio – sem que se atente para o determinismo do art. 3º da CLT. Neste contexto, se o trabalho não eventual é prestado com pessoalidade, por pessoa física, com onerosidade, resta ao intérprete examinar a subordinação. Esta, cada vez mais, vem se diluindo diante da quebra da estrutura hierárquica da empresa fordista e suas características deslocaram-se da esfera subjetiva para a esfera objetiva, sem se falar que a desprestigiada dependência econômica volta a ganhar importância. Preenchidos estes pressupostos, o contrato de emprego se assume por inteiro. (TRT − 3ª R – 4ª T – RO 00750.2003.047.03.00.0 – Rel. Luiz Otávio Linhares Renault – DJMG 7/8/2004 – p. 9).

Recentemente, em sentido contrário o Tribunal Regional do Trabalho da 2º Região decidiu à favor da hora extra para os teletrabalhadores, implicando numa perspectiva mais atual, que culminou na Lei 12.551/11, que alterou o artigo 6º da CLT, respeitando o direito à desconexão equiparando-o ao trabalho realizado no domicílio do empregador, assim o Tribunal admitiu o pagamento da hora extra ao teletrabalhador, desde comprovada à fiscalização das horas trabalhadas, afastando à incidência do artigo 62, I da CLT, disposto da seguinte forma:

EMENTA: Trabalho externo. Fiscalização sobre as horas trabalhadas. Exceção do artigo 62, I da CLT afastada. Mesmo na hipótese de trabalho externo é perfeitamente viável a existência de controle de jornada, concretizado de várias maneiras. Relevante avaliar apenas, se os métodos empregados eram suficientes para conferir ao empregador certeza sobre a rotina diária do trabalhador, hábeis a atestar a existência de criteriosa fiscalização das horas. Caso assim se constate, não há falar na exceção trazida no artigo 62 da CLT, tendo em vista apenas o isolado argumento de trabalho externo e desprovido do tradicional controle de ponto. Havendo fiscalização acerca do cumprimento dos horários, ainda que de forma mais tênue em comparação às formas tradicionalmente utilizadas, haverá direito ao recebimento das horas laboradas além dos limites legais estabelecidos para a jornada normal. A exemplo disso, os casos em que o empregado é obrigado a comparecer diariamente na empresa para receber as ordens de serviço e, ao final do expediente, para prestar contas, devolver veículo ou ferramentas utilizadas na prestação dos serviços. (Recurso Ordinário. Julgamento: 29/6/2011. Relator(a): Rita Maria Silvestre. Revisor(a): Sidnei Alves Teixeira. Acórdão nº 20110832153. Processo nº: 02289004720095020055 Ano: 2011. Turma: 8ª. Publicação: 4/7/2011).

Como referido, na atualidade existem diversas formas de exercer esse controle das horas trabalhadas, mediante uso de programa informático, assim estabelecendo de forma exata a quantidade de horas trabalhadas e os intervalos, que podem garantir hora extra para o teletrabalhador quando devido, culminando também numa adequação do horário de descanso desses profissionais, garantindo o cumprimento  da jornada de trabalho estipulada, não ficando a disposição do empregador por mais tempo que deveria. Logo, isso garante qualidade de vida e saúde ao teletrabalhador, que tem maior controle das horas que dispende nas suas atividades relacionadas ao trabalho, garantido-se à necessidade de desconexão do ambiente de trabalho, e quando trabalhador além da jornada de trabalho diária, ganha uma contrapartida pecuniária, como a hora extra. Equilibrando-se melhor a relação teletrabalhistas, que não tinha muitos direitos comuns ao trabalhador, que exerce a atividade no domicílio do empregador, reconhecidos devidamente.

CONCLUSÃO

Com análise da Lei do Teletrabalho (Lei 12.551/11), observa-se que o legislador não regulamentou especificadamente essa modalidade de trabalho à distância, apenas equiparando-o ao trababalho realizado no domícilio do empregador, assim algumas peculiaridades como a flexibilização do horário de trabalho, que acarreta no problema da desconexão do ambiente de trabalho, ficaram sem a regulamentação de uma norma clara sobre o assunto. Logo, cabe a Jurisprudência aplicar as norma gerais da Consolidação das Leis do Trabalho, moldando as referidas peculiaridades do Teletrabalho.

A aplicação das normas trabalhistas pela Jurisprudência se faz essencial, posto que a falta de regulamentação do Teletrabalho no Brasil, acarreta na supersubordinação desses profissionais, que antes da Lei do Teletrabalho, era legitimado pela própria jurisprudência, não garantindo hora extra, adicional noturno e podendo ter suas férias interrompidas, prejudicando a saúde e o bem-estar dos teletrabalhadores. Com advento da Lei do Teletrabalho e a referida equiparação, a Jurisprudência está consciente dos problemas e reconhece de forma mais clara essa modalidade de labor à distância, buscando os mesmos direitos trabalhistas do trabalho realizado presencialmente no domícilio do empregador.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 5 ed. São Paulo, LTr, 2009.

CALVACANTE, Jouberto de Quadros Pessoa; JORGE, Francisco Ferreira Neto. O Fenômeno do Teletrabalho: Uma Abordagem Jurídica Trabalhista. Revista Justiça do Trabalho Ano 29 Nº 337. Porto Alegre, HS Editora, 2012.

ESTRADA, Manuel Martin Pino. A Escravização Digital no Teletrabalho e nos Mundos Virtuais e Comentários à Lei 12.551 de 2011. Revista Justiça do Trabalho Ano 29 Nº 339. Porto Alegre, HS Editora, 2012.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Teletrabalho e Trabalho à Distância: Considerações sobre a Lei 12.551/11. Revista Justiça do Trabalho Ano 29 Nº 337. Porto Alegre: HS Editora, 2012.

 

 

MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira; ZAPATA, Daniela Lage Mejia. As relações de trabalho e a subordinação jurídica na contemporaneidade: uma análise da nova redação do artigo 6º da Consolidação das Leis Trabalhistas. Revista Eletrônica de Direito do Centro Universitário Newton Paiva. Edição nº18, 2012. Disponível em < http://npa.newtonpaiva.br/direito/?p=519 >. Acesso em: 19 de maio de 2013.

RESEDÁ, Salomão. O direito à desconexão: uma realidade no teletrabalho. Disponível em: < http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/23040-23042-1-PB.pdf >. Acesso em: 19 de maio de 2013.

SILVA, Paulo Antonio Maia e. Breves anotações sobre o Teletrabalho no Direito do Trabalho Brasileiro. Periódico Suplemento Trabalhista.  Editora LTR, v.065, p.317-320, 2012. Disponível em: < www.paulomaia.adv.br/arquivos/documents/academico> Acesso em: 19 de maio de 2013.

 

TRT 2º Região. Acórdão nº 20110832153, rel. Rita Maria Silvestre, 29.06.11. Disponível em:< http://revistavisaojuridica.uol.com.br/advogados-leis-jurisprudencia/68/artigo243466-3.asp>. Acesso em: 19 maio 2013.

 

TRT 3º Região. RO 00750.2003.047.03.00.0, rel. Luiz Otávio Linhares Renault, 07.08.04. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitu ra&artigo_id=11504 >. Acesso em: 19 maio de 2013.

TST. AIRR 62141-19.2003.5.10.0011, rel. Min. Maurício Godinho Delgado, 16.04.10. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura& artigo_id=11504> . Acesso em: 19 maio de 2013.



[1] Paper apresentado à disciplina de Direito do Trabalho ministrada pela Profª Ana Carolina Cardoso.

[2] Acadêmico do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB

[3] Acadêmica do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB