Marcos Vinícius Barbosa Lima
3º Período de Direito

Lei da Ficha Limpa

Inconformada com a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Rondônia que indeferiu o seu registro de candidatura, Sueli Alves Aragão, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar reaver seu registro e poder participar das eleições gerais deste ano. Ela foi condenada por improbidade administrativa e com isso perdeu seus direitos políticos por cinco anos, diante da condição de inelegível, o TRE/RO rejeitou seu registro de candidatura com base na chamada lei da ??Ficha Limpa?? (lei complementar 135/2010).
Contra essa rejeição, a política ajuizou no STF uma reclamação, alegando ofensa ao princípio constitucional da presunção de inocência, uma vez que não houve trânsito em julgado de sua sentença condenatória.
Diante do caso proposto, é necessário verificar alguns princípios constitucionais; (art. 5°, X/CF. "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação").
Direito à honra:
O direito à honra alcança tanto o valor moral íntimo do homem como a estima dos outros, a consideração social, o bom nome, a boa fama, enfim, o sentimento ou a consciência da própria dignidade pessoal refletida na consideração dos outros e no sentimento da própria pessoa. Envolve, portanto, a honra subjetiva e a honra objetiva, a primeira tendo por núcleo o sentimento de auto ? estima do individuo, o sentimento que possui acerca de si mesmo, e a honra objetiva significando o conceito social que o individuo possui. (CARVALHO, 2009, p. 753).
A preservação dos valores da pessoa, deve ? se manter sempre, a honra é um direito inerente ao homem, sendo de fundamental importância em sua vida social, caracterizando assim a honra subjetiva, que é exterior a própria pessoa, assegurando também a honra objetiva que é sua auto ? estima e consideração por si próprio.
Direito a imagem:
O direito à imagem envolve duas vertentes: a imagem ? retrato e a imagem ? atributo. No primeiro sentido significa o direito relativo à reprodução gráfica (retrato, desenho, filmagem, dentre outros) da figura humana, podendo envolver até mesmo partes do corpo da pessoa, como a voz, a boca, o nariz, as pernas, etc. No segundo sentido é entendida como a imagem dentro de um determinado contexto, é dizer, o conjunto de atributos cultivados pelo individuo e reconhecidos pelo meio social. (CARVALHO, 2009, p. 753).
A imagem da pessoa não se limita apenas a imagem gráfica, ou seja, a exibição da pessoa na mídia, mas também é preenchida por um contexto social. O individuo deve zelar pela sua imagem e respeitar a imagem de outrem e não julgar o mesmo pela sua aparência.
Quando se trata de pessoas representativas ou que a mídia expõe em certo grau mais elevado, far ? se ? a necessário um tratamento mais cauteloso do direito a imagem.
Em relação à hipótese que envolve autoridades publicas políticos, artistas ou assemelhados, o presente direito constitucional deve ser interpretado de maneira mais elástica, em virtude da existência de maior exposição à mídia, decorrente inclusive da própria natureza das funções exercidas. (MORAES, 2006, p.180).
Direito a intimidade:
[...] considere ? se que a vida social do individuo divide ? se em pública e privada. Por privacidade deve ? se entender os níveis de relacionamento ocultados ao público em geral, como a vida familiar, o lazer, os negócios, as aventuras amorosas. Dentro, contudo dessa privacidade há outras formas de relações, como as que se estabelecem entre cônjuges, pai e filho, irmãos, namorados, em que poderá haver abusos ou violações. Assim, na esfera da vida privada há outro espaço que é o da intimidade. Há, portanto, uma noção de privacidade em que as relações individuais devem permanecer ocultas ao público e existe o espaço da intimidade, onde pode ocorrer a denominada "tirania da vida privada", na qual o individuo deseja manter ? se titular de direitos impenetráveis mesmo aos mais próximos. (CARVALHO, 2009, p.753 ? 754).
A intimidade do individuo requer certo grau de restrição, em certas ocasiões existe a necessidade da quebra da intimidade, como por exemplo, investigação usando como recurso a escuta telefônico de uma pessoa suspeita, mas isso só poderá acontecer se houver autorização judicial.
Direito a vida privada: "[...] o conceito de vida privada envolve todos os relacionamentos da pessoa, inclusive os objetivos, tais como relações comerciais, de trabalho, de estudo etc". (MORAES, apud FERREIRA FILHO, 1997, p.35).
A vida privada do individuo é uma constante relação de várias espécies no convívio social, porém este direito está intimamente ligado ao direito a intimidade, uma vez que o mesmo se enquadra nas relações subjetivas do individuo, ou seja, a intimidade deve ? se manter oculta ao público e por isso pode ocorrer à chamada "tirania da vida privada", desse modo o individuo deve se tornar titular do direito ao sigilo absoluto, até mesmo entre as pessoas mais próximas, para que não ocorra nenhuma violação de seu direito a intimidade.
Após analisar os princípios contidos no art. 5°, X/CF, a envolvida, ao recorrer ao STF deu inicio a discussão, na qual a lei da "Ficha Limpa" fere principio constitucional. Não havendo trânsito em julgado, o princípio da presunção de inocência, (ART 5°, LVII/CF. ??ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória??) estará sendo violado. O recurso da apenada supramencionada tem fundamentação legal, uma vez que esse direito já havia sido consagrado desde os tempos passados em outros continentes. "Essa garantia já era prevista no art. 9° da Declaração francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada em 26-8-1789 "Todo acusado se presume inocente até ser declarado culpado". (MORAES, 2006, p.272).
O principio da presunção de inocência vincula ao principio do devido processo legal (due process of low) exposto no art. 5°, LIV/CF (ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem devido processo legal). Uma vez que o processo encerrará somente quando o juiz deferir à pena ou se houver prescrição do processo.
Quando o delito é constatado e as provas são certas, é justo que se conceda ao acusado o tempo e os meios para se justificar, se isso lhe for possível; é necessário, contudo, que tal tempo seja bem curto para não atrasar o castigo que deve acompanhar de perto o delito, se se quer que o mesmo seja um útil freio para os criminosos. (BECCARIA, 1764, p.43)
No Brasil pretende ? se, que todos os cidadãos que optem por cargos públicos, sejam insuspeitos e não tenha nenhuma dúvida sobre as sua honestidade e honradez.
Como o processo analisado não transitou em julgado da sua sentença condenatória, seria muito cedo considera ? lá culpada, mas isso não quer dizer que ela tenha direito de participar do processo eleitoral, no entanto a suspensão dos direitos políticos ocorrerá quando houver:
a) Incapacidade absoluta:
Assim, nesse diapasão, distingue ? se a capacidade de gozo, que todo ser humano possui na capacidade de exercício ou capacidade de fato, que é a aptidão de exercer pessoalmente os atos da vida civil, a qual pode sofrer restrições, por várias razões. (VENOSA, 2010, p. 139).

Aquele que por incapacidade absoluta, poderá será privado de participar do processo eleitoral, pois não possui discernimento ou maturidade para exercer cargos públicos.
b) Condenação criminal transitada em julgado:
Reza o artigo 15°, inciso III, da Constituição Federal que a condenação criminal transitada em julgado determina a suspensão de direitos políticos enquanto perdurarem seus efeitos. [...] a suspensão de direitos políticos constitui efeitos secundário da sentença criminal condenatória, exsurgindo direta e automaticamente com seu trânsito em julgado. Por isso, não é necessário que venha registrada expressamente no decisum. [...] em tais casos, o trânsito em julgado da condenação criminal implica privação de direitos políticos e automática perda do mandato. (GOMES, 2008, p.10-11).
Conforme o autor citado acima é justo que a apenada venha perder seus direitos políticos, ainda que o processo não transitasse em julgado.
c) Improbidade administrativa:
[...] registramos que a improbidade consiste na ação desvestida de honestidade, de boa ? fé e lealdade para com que o ente estatal, compreendendo os atos que, praticados por agente público, ferem a moralidade administrativa. Prevê o artigo 37, § 4°, da Lei Maior: "os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação prevista em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. (GOMES, 2008, p.14).
Os atos ímprobos cometidos pelos representantes do povo (políticos e autoridades administrativas) explicitam a má ? fé dos mesmos e fere a moralidade administrativa, com isso a população que tem como referência a pessoa pública, se vê no direito de cometer os mesmo atos, uma vez que os representantes alem de dar mau exemplo se mostram impunes e ferem a máquina estatal.
Os princípios que foram questionados mostram o quanto à pessoa pública é vulnerável a ofensas, no entanto o ser humano é defeituoso que movido por sua ambição, se vê no direito de alcançar status impossíveis cometendo delitos que afetam uma sociedade como um todo.
Diante do caso proposto e conseqüentemente estudado, conclui ? se que a chamada lei da "Ficha Limpa" implicará em constitucional para alguns juristas e considerada inconstitucional para outros, uma vez que a mesma abre uma discussão extensa e polêmica; a lei realmente traz consigo alguns trechos que ferem a constituição, porem, mesmo assim, a lei foi publicada e vigorada.
O caso concreto que foi exposto nesse trabalho, direciona a um pensamento que todos devem ter total direito a sua imagem, a honra, a vida privada, presunção de inocência e que nenhuma lei estará acima da lei maior, a nossa carta magna. O processo de Sueli Alves Aragão, em sua primeira instância foi transitado em julgado da sentença condenatória, perdendo assim seus direitos políticos por cinco anos, inclusive esse ano; como disposto no art. 16°, caput / CF. (a lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor, não se aplicando à eleição que ocorre até 1 (um) ano da data de sua vigência).
Percebe ? se que a condenada tem o respaldo da lei maior, e que de forma alguma ela poderá ser impedida de participar das eleições desse ano, por que, como é assegurado a todos os cidadãos no art. 1°caput/CP. (não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal) o ato cometido foi anterior a lei, se essa lei tivesse de ser retroagida deveria ser automaticamente em favor do réu, nesse caso mostra o contrario, pois a lei está indo contra o réu.
BIBLIOGRAFIA:
BECCARIA, Cesare Borseana. Dos delitos e das penas. 2°. ed. tradução: Torrieri Guimarães São Paulo: Martin Claret, 2010.
BRASIL, Constituição Federativa do. Editora. Saraiva. 6°. ed, São Paulo, 2010.
BRASILEIRO, Código Penal, editora. Saraiva. 6°. ed, São Paulo, 2010.
CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito constitucional: teoria do estado e da constituição: direito constitucional positivo. 15°. ed Belo Horizonte: Del Rey, 2009.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à constituição brasileira de 1988. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997.
GOMES, José Jairo. Direito eleitoral. 2°. ed Belo Horizonte: Del Rey, 2008.
MORAES, Alexandre de. Direitos humanos fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil Dou... 7°. ed São Paulo: Atlas, 2006.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 10°. ed São Paulo, SP: Atlas, 2010.