Primeiramente, há que se definir a legítima defesa. Pois bem, ao Estado é incumbida a função de proteção aos cidadãos, e como não pode estar em todos os lugares a todo tempo, garante ao indivíduo que se defenda legitimamente, de prontidão e com os meios necessários, caso tenha um direito seu ou de outrem cerceado injustamente. A legítima defesa, como podemos depreender da própria expressão, é a defesa amparada pela lei. Ao longo do tempo sua acepção foi evoluindo, e em seu histórico podemos destacar o papel do Direito Canônico, que em busca da paz, colocou de lado os direitos do agredido, valorizando-se cada vez mais a importância dos limites da legítima defesa. Neste diapasão, contribuiu de maneira ímpar para o reconhecimento de um dos substratos da legítima defesa, a saber, o emprego moderado de meios necessários. Com este, fez surgir o que hoje conhecemos como excesso na legítima defesa.
A lei não resguarda a vingança. Por isto, para identificar esta linha tênue entre a retaliação vingativa e a defesa legítima são estabelecidos requisitos objetivos que devem ser obedecidos, ou quem ilegitimamente se defendeu responderá pelo crime. O Art. 25 do atual Código Penal brasileiro elucida: "Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem".
Quem mata em legítima defesa, por exemplo, executa a conduta descrita e tipificada no art. 121 do CP, porém, não comete crime, pois seu ato não é ilícito, ao passo que conta a seu favor a causa que exclui a antijuridicidade do fato.
É requisito da legítima defesa que a agressão que a tenha motivado seja injusta. Esta agressão que autoriza a reação defensiva não precisa necessariamente constituir um crime. Em regra, injusta é a agressão que provém da ausência de provocação.
Para que se enquadre como legítima defesa, é preciso que a agressão seja atual ou iminente. A legítima defesa não pode se fundar na premissa de que porventura possa ser agredido e nem tampouco no contra-ataque vingativo de quem já foi acometido. Há de ser presente ou pelo menos estar prestes a ocorrer. Desta forma, não é cabível a legítima defesa preventiva ou antecipada, nem mesmo em face de agressão futura, ou contra a quem já a cessou.
A legítima defesa poderá se dar em virtude da proteção de direito próprio ou alheio.
A lei prestigia através da legítima defesa de outrem o elevado sentimento da solidariedade humana.
São necessários os meios eficazes e suficientes à repulsa da agressão praticada.
Há que se pese que o meio pode ser desnecessário, desde que aplicado com moderação, como por exemplo, quem defende a sua propriedade com um tiro para o alto.

A legislação penal admite a legítima defesa em relação a qualquer direito ou bem. Contudo, é presente o entendimento na doutrina de que os bens públicos não são passíveis de legítima defesa.
A legítima defesa é permitida quanto à honra, elemento intrínseco à personalidade. Inicialmente, faz-se necessário analisar o instituto da honra. Esta sempre foi objeto de acirradas discussões doutrinárias, principalmente por ser um dos reflexos da evolução do direito. A honra acompanha o ser humano desde a antiguidade, e como não poderia deixar de ser, os preceitos deste atributo vem evoluindo paulatinamente. Não há como negar que a boa fama é requisito indispensável para uma adequada vida social. A honra é entendida como um atributo de ordem personalíssima que merece ser estudado.
Partindo da premissa de que a o direito à honra é um bem tutelado pela ordem jurídica, o que se pretende discutir não é a possibilidade da legítima defesa neste âmbito, e sim a proporcionalidade entre a ofensa e a repulsa.
A honra, por mais nobre e venerada que seja não poderá reclamar favores sanguinários, até por lhe faltar a proporcionalidade essencial para caracterizar a legítima defesa.
No que diz respeito à legítima defesa da honra no caso de crime passional motivado por adultério, o atual entendimento doutrinário e jurisprudencial é pacífico ao considerar que a ilicitude penal não deve ser excluída neste caso. Entretanto, é de grande relevância acompanhar o desenvolvimento desta percepção que se atrela aos costumes e ditames sociais no tempo e espaço.
Por uma questão de princípios morais e de proteção a entidade familiar, o Código Penal brasileiro, até 2005, considerava crime o adultério, punindo seu infrator a uma pena de detenção de 15 dias a 6 meses, segundo a redação do antigo Art. 240 do Código Penal. Preceituava-se que a prática de tal delito atingia especialmente a honra do cônjuge traído, podendo este, valer-se do instituto da legítima defesa para amparar atos de lesão empreendidos contra o parceiro infiel e seu amante.
Antes mesmo da descriminalização do adultério, passou-se a questionar a legitimidade da defesa da honra conjugal.
Por certo, a honra tem amparo jurídico na legítima defesa ao preencher os requisitos em suas generalidades e, por conseguinte, a honra conjugal, como espécie também poderá ser objeto de defesa, desde que não implique em excessos.
Em 2005, o adultério deixou de ser crime. Isto se deu em virtude da pretensão de intervencionismo mínimo do Estado, e, além disto, pelo fato de que o cônjuge infiel não desonra o companheiro, e sim a si mesmo, portanto, por não causar dano a outrem não poderia ser culpado.
É observada uma constante tendência dos tribunais brasileiros, no sentido de não conceder a absolvição sumária ante a alegação de legítima defesa, principalmente quando trata-se de homicídio. Os julgados recentes demonstram que qualquer incerteza no que tange aos elementos caracterizadores da legítima defesa enseja a negativa de absolvição sumária e envio da análise do mérito ao Conselho de Sentença para que seja promovida apreciação meticulosa, a fim de se fazer justiça.
Contudo, em alguns julgados este comedimento não fora observado. Em alguns, os tribunais admitiram que fossem absolvidos aqueles que ilegitimamente vitimaram.
É abjeto que as instituições judiciárias, as quais apreendem precípuo papel constitucional de salvaguardar os direitos humanos fundamentais, acabem por reproduzir esta irracionalidade injusta e aviltante.
O argumento da legítima defesa da honra é altivo, contudo, não deve ser aplicado como justificativa de uma conduta agressiva e criminosa. A honra não deve ser paga com a morte.
Aqui insta recordar o lema invocado por um movimento feminista nas décadas de 70 e 80 que levantaram esta bandeira em manifestação contrária à invocação da legítima defesa da honra nos crimes passionais: "Quem ama não mata!".
Apesar da evolução do Direito advinda da Constituição Federal de 1988, do progresso dos princípios e garantias fundamentais, visualiza-se ainda a presença do argumento da legítima defesa da honra conjugal ante a prática de adultério como justificativa de homicídio.
Os requisitos de aplicabilidade desta cláusula de excludente de antijuridicidade, como incansavelmente demonstrado, são de ordem objetiva, como se depreende da lei penal. Contudo, verifica-se que em muitos dos casos, especialmente no que tange o exame da honra conjugal, há consideração de elementos subjetivos, tais como o comportamento da vítima e a instabilidade emocional do agente, geralmente motivado pelo ciúme.
Se a fé move montanhas, o que diremos então das paixões. É indubitável que este sentimento humano assuma um aspecto complexo, motivador de atos de loucura. Ademais, a paixão atrela-se ao amor, e como dito anteriormente "quem ama não mata". Assim, a paixão não deve ser evocada para que sejam acobertados atos de violência, devendo ser considerada a exigibilidade de discernimento do ser humano, capaz de prever e arcar com as conseqüências de atitudes impensadas.
A análise da legítima defesa da honra é considerada como aspecto de constatação peculiar. A honra, bem personalíssimo da esfera subjetiva deve ser submetida à valoração contraposta ao outro bem de sobreposição
permitida na legítima defesa, especialmente quando se tratar da vida.
O ordenamento jurídico brasileiro prevê a vida como direito fundamental de máxima estima.
Nos Tribunais do Júri, que cuidam dos crimes dolosos contra a vida, não se consolidou a lógica deste raciocínio. É comum que advogados façam o uso de artimanhas ardilosas para persuadirem os juízes naturais a absolverem homicidas. Falam teatralmente da moral abalada, do brio ferido do homem que se vê rechaçado pelo adultério. E quando isto acontece, muitas vezes, o direito à vida da vítima se vê esquecido e então e réu é absolvido. Nestes casos podemos imaginar metaforicamente o direito à vida sentado em algum canto do tribunal, observando tristemente o destino a que foi dado o seu injusto julgamento.
Demonstrada a base legal, é razoável a defesa, em todos os pormenores da possibilidade do indivíduo proteger a sua honra legitimamente. O objeto de questionamento se dá somente no que diz respeito da proporção em que deve ser concedida. Nesta ocasião, levanta-se a bandeira da consagração da vida, a qual deve ser debatida incansavelmente para que seja devidamente percebida nos critérios da justiça.