Nos dias atuais, a ordem é assegurada por meio de uma série de regras e preceitos que orientam e determinam o comportamento de seus membros. O direito, assim, é um meio de controle social que tem por escopo harmonizar as relações intersubjetivas, contribuindo para a superação das dificuldades da vida humana que em sua essência é conflituosa.

As pessoas litigam umas contra as outras e tal ocorre pela escassez de recursos para a satisfação das necessidades e dos desejos de todos. Contudo, ao mesmo tempo em que estas circunstâncias levam os homens a entrar em conflito uns com os outros, também os fazem buscar a cooperação entre si.

Houve época em que os conflitos de interesses eram resolvidos pelos próprios litigantes ou pelo grupo social a que pertenciam, sem qualquer interferência estatal, seja porque inexistia o Estado como poder político, seja porque, apesar de existente, era incipiente e incapaz de impor a sua decisão aos contendores. Posteriormente, assumiu o Estado o exercício da jurisdição, com a resolução das lides através do processo.

Carnelutti atribuiu à jurisdição a função de justa composição da lide, entendida como o conflito de interesses qualificados pela pretensão de um e pela resistência do outro interessado[1].

Chiovenda definiu a jurisdição como a função do Estado que tem por escopo a atuação da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela atividade de órgãos públicos, da atividade de particulares ou de outros órgãos públicos, afirmando a existência da vontade concreta da lei, com vistas a torná-la efetiva[2].

Nas palavras de Cintra, Grinover e Dinamarco:

A jurisdição é uma das funções do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para, imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. Essa pacificação é feita mediante a atuação da vontade do direito objetivo que rege o caso apresentado em concreto para ser solucionado; e o Estado desempenha essa função sempre mediante o processo, seja expressando imperativamente o preceito (através de uma sentença de mérito), seja realizando no mundo das coisas o que o preceito estabelece (através da execução forçada)[3] .

Em resposta a pergunta o que é jurisdição, assim discorre Fernando Negreiros:

Como dito, a jurisdição é, simultaneamente, poder, função e atividade estatais, conforme o ângulo a partir de que se examine. É poder – explica Celso Neves – enquanto relacionada ao plano da soberania estatal; como função, refere-se às que a Constituição e as leis cometem aos órgãos judiciários; no sentido, enfim, de atividade, reporta-se aos atos que os juízes praticam no processo, no desempenho de seu ofício[4].

O exercício da jurisdição, por sua vez, é monopólio do Estado. O Estado monopolizou a jurisdição para que o indivíduo não possa agir com as próprias mãos.

CRÍTICAS AOS CONCEITOS CLÁSSICOS DE JURISDIÇÃO

O surgimento do Estado Liberal de Direito precisou frear os abusos e desmandos do absolutismo e do ancien regimen. A forma encontrada foi erigir o princípio da legalidade como fundamento da nova ordem.

A liberdade passou a ser vista como garantia máxima, para haver qualquer intromissão seria necessária uma lei aprovada com a cooperação da representação popular. O absolutismo do rei foi substituído pelo absolutismo do parlamento[5].

O direito passou a ser identificado pelo critério do princípio da legalidade, o direito estaria na norma jurídica, desde que produzida por uma autoridade dotada de competência normativa.

Chiovenda, mergulhado nas concepções acima, afirmou que o juiz atuava a vontade concreta da lei, o direito nada mais era do que a lei.

Carnelutti, bebendo da mesma fonte, afirmou que ao juiz cabia a justa composição da lide.

Como se pode ver, as teorias sobre jurisdição refletem valores e ideias da época em que são desenvolvidas, não são equivocas, mas não refletem os valores do Estado Constitucional de Direito. A assunção do Estado Constitucional deu novo conteúdo ao princípio da legalidade, hoje não se fala em superioridade da lei mais sim em superioridade da Constituição.

Nesse sentido afirma Marinoni:

É verdade que a norma individual, ou a sentença, outorga características ao caso, mas é impossível ignorar que na atualidade- diante do pluralismo da sociedade e da constante transformação dos fatos sociais-, é necessário muito mais do que isto, uma vez que a interpretação da lei, ou a norma formulada pelo juiz, depende do sentido do caso concreto.

Portanto, nenhuma dessas teorias responde aos valores do Estado constitucional. Não só porque ambas são escravas do princípio da supremacia da lei, mas também porque as duas negam lugar à compreensão do caso concreto no raciocínio decisório, isto é, no raciocínio que leva à prestação jurisdiciona[6]l.

  Diante do Estado Constitucional de Direito, onde a constituição e os direitos fundamentais tem supremacia no ordenamento jurídico desenvolve Marinoni uma nova concepção a respeito do que seja jurisdição:

O Estado constitucional inverteu os papéis da lei e da Constituição, deixando claro que a legislação deve ser compreendida a partir dos princípios constitucionais de justiça e dos direitos fundamentais. Expressão concreta disso são os deveres de o juiz interpretar a lei de acordo com a Constituição, de controlar a constitucionalidade da lei, especialmente atribuindo-lhe adequado sentido para evitar a declaração de inconstitucionalidade, e de suprir a omissão legal que impede a proteção de um direito fundamental. Isso para não falar do dever, também atribuído à jurisdição pelo constitucionalismo contemporâneo, de tutelar os direitos fundamentais que se chocam no caso concreto.

Não a dúvida de que a jurisdição, atualmente, tem a função de tutelar(ou proteger) os direitos, especialmente os fundamentais[7].

A prestação jurisdicional

 

Como administrador, o Estado toma para si a responsabilidade de “fazer” justiça, controlando, regrando e determinando como será a prestação jurisdicional. Assim, retirando a atividade administrativa das mãos do administrado, tutela a prestação jurisdicional sobre direitos ameaçados ou efetivamente violados.

A prestação jurisdicional não se dá somente com o fornecimento da sentença, sendo esta parte de todo um conjunto, que não apenas dita o direito, ou corrige sua violação, mas é também responsável por fornecer meios de garantia.

Assim, a prestação jurisdicional é também composta por movimentos acautelatórios e antecipatórios, diante de um regramento específico e premissas fornecidas.

De acordo com Carmen Lucia Rocha:

O direito à jurisdição é o direito público subjetivo constitucionalmente assegurado ao cidadão de exigir do Estado a prestação daquela atividade. A jurisdição é, então, de uma parte, direito fundamental do cidadão, e, outra, dever do Estado[8].

E continua:

Não basta, contudo, que se assegure o acesso aos órgãos prestadores da jurisdição para que se tenha por certo que haverá estabelecimento da situação de justiça na hipótese concretamente posta a exame. Para tanto, é necessário que a jurisdição seja prestada – como os demais serviços públicos – com a presteza que a situação impõe. A presteza da resposta jurisdicional pleiteada contém-se no próprio conceito do direito-garantia que a jurisdição representa[9].

 

Ao direito à jurisdição do administrado corresponde a função (obrigação) do administrador, ou seja, por intermédio da função legislativa, o Estado estabelece o ordenamento jurídico, composto por juízos prescritivos que regem condutas intersubjetivas. Outra faceta do monopólio estatal na produção de normas jurídicas é a jurisdição[10].

Busca, neste segundo momento, a concretização daquelas normas jurídicas em caso de conflitos de interesses entre pessoas, denominado lide ou litígio. Dado o exposto, em virtude da pretensão de monopólio na produção decorre a necessidade de monopólio na aplicação das normas jurídicas.

 

A Prestação judiciária e A efetividade do processo

 

Com o crescimento da sociedade, cresceu o Estado e, consequentemente, multiplicaram-se os conflitos, tornando morosa a prestação jurisdicional, porquanto o poder estatal, encarregado de resolvê-los, já não consegue, por inúmeras razões, desincumbir-se dela.

 Tal situação tem direcionado a sociedade moderna na busca de formas alternativas de resolução dos conflitos, consciente da impossibilidade de serem resolvidos exclusivamente pelo Estado. Estas experiências têm, sobretudo, a vantagem de proporcionar a resolução do litígio a baixo custo e sem a complexidade da justiça estatal.

Nos dias atuais com o ritmo das atividades humano cada vez mais rápido, assume particular gravidade o problema do tempo necessário à realização do processo, não sendo raras as hipóteses em que a sua inevitável demora é capaz de inviabilizar a proteção do direito postulado, por mais certo que se afigure[11].

A Constituição de 1988 assegura a todos o acesso ao Judiciário, sendo parte dos Direitos Fundamentais. No entanto, não basta a distribuição do feito para que se conclua que a prestação jurisdicional, ou o acesso ao judiciário, esteja concretizada.

A prestação jurisdicional somente se realiza com a tutela e proteção efetiva ao direito, ou seja, da função estatal de responder eficazmente e regular a lide. Na atualidade, a efetividade do processo confunde-se em muitas circunstancias com a possibilidade de se ter a tutela jurisdicional em tempo razoável, diante disso, a morosidade processual constitui uma das principais causas de descrédito no judiciário. 

A prestação da tutela jurisdicional, desse modo, não se resume em apreciar o dano a um direito material violado, porém, da mesma maneira está comprometido em apreciar ameaça a direito tendo como finalidade a prestação da tutela jurisdicional de modo útil e eficaz.

A pronta atuação do juiz, fazendo uso dos meios legais e instrumentar do processo, evita o risco de dano ao direito do autor, tornando-o efetivo. E a antecipação da tutela se presta eficientemente para isso. O processo, no tocante ao princípio da efetividade, deve dispor de instrumentos adequados à tutela de todos os direitos; deve assegurar o gozo pleno da utilidade prevista no ordenamento jurídico; deve garantir um resultado com o mínimo de dispêndio de tempo, energias e sacrifício.

O processo foi concebido para solucionar conflitos e fazer atuar, em favor de quem tem razão, a vontade concreta da lei, será tanto mais eficaz quanto mais rapidamente conseguir fazer com que prevaleça, de maneira mais completa, o direito subjetivo da parte que dele se vê injustamente privado ou que sofre ameaça de agressão em sua esfera jurídica.

O direito material deve ostentar abstração apenas na configuração normativa, como parâmetro de conduta social. Ocorrendo evento que materialize refração à norma jurídica, o direito deve se fazer presente de forma concreta, como valor cuja efetividade, impostergável, realmente satisfaça as necessidades daqueles que exibem titularidade.

Nesse sentido, afirma Luiz Fux que:

A necessidade de garantir a utilidade prática das tutelas de cognição e de execução levou o legislador a conceber um tertium genus de prestação jurisdicional, consistente num provimento servil às demais manifestações judiciais, capaz de resguardar as condições de fato e de direito necessárias à prestação da justiça com efetividade[12].

Desta forma, de nada adianta um processo que se caracterize por uma justiça tardia ou que apresente procedimentos ou institutos que na prática não sejam capazes de garantir de forma eficaz a proteção dos direitos.

Para a efetividade do processo, isto é, para que se obtenha a completa consecução de sua finalidade oficial de excluir conflitos e realizar a justiça, é necessário então superar os óbices que ameaçam a boa qualidade de seu produto final, ou seja, a sentença[13].

Segundo Barbosa Moreira, o processo deve dispor de instrumentos de tutela adequados, a fim de assegurar à parte vitoriosa o pleno gozo do direito ao qual faz jus [14].

Deste modo, o monopólio jurisdicional do Estado e a consequente impossibilidade de fazer justiça com as próprias mãos estão relacionados não apenas com o dever do Estado-juiz de não declinar da prestação jurisdicional diante de eventual lacuna da lei, mas também com o dever de eficiência do Estado na prestação da tutela jurisdicional.

O processo, na história da jurisdição, evoluiu de simples meio de declarar o direito, para eficiente instrumento de sua real concretização. Ressalta Fux que, na ótica atual do direito processual civil:

O desígnio maior do processo, além de dar razão a quem efetivamente a tem, é fazer com que o lesado tenha recomposto o seu patrimônio, lesado pelo descumprimento da ordem jurídica, sem que sinta os efeitos do inadimplemento, por isso que compete ao Estado repor as coisas no status quo ante utilizando-se de meios de sub-rogação capazes de conferir à parte a mesma utilidade que obteria pelo cumprimento espontâneo[15].

O rito ordinário impõe ao autor, que se afirma titular do direito, o inconveniente de não poder dispor dele desde logo, já que deve aguardar o lapso temporal do processo para a sua certificação. Nas palavras de Zavaski:

 

Esta espera nem sempre é compatível com a natureza do direito afirmado, que pode exigir fruição imediata, como a prestação alimentícia a quem dela necessita. Ou pode ocorrer que neste lapso ocorram fatos que ponham em risco a execução da futura sentença, como a alienação furtiva de bens pelo devedor. Em tais casos são insuficientes os mecanismos ordinários de prestação da tutela, fazendo-se necessária a adoção de medidas acautelatórias, seja antecipadoras do gozo do direito vindicado, seja de garantia da futura execução[16].

Percebida a importância do tempo na prestação jurisdicional que se pretende competente, solucionando de forma rápida e eficaz os conflitos, há necessidade de se redistribuir ou de se corrigir o seu ônus no processo. Deve-se tentar evitar, sempre, que o tempo do processo prejudique o autor que tem razão[17].

Conforme Destefessi, o direito de acesso à jurisdição estatal também significa direito à obtenção de uma tutela jurisdicional efetiva, prestada em prazo razoável, quer dizer, sem dilações indevidas. Há, nestes termos, a garantia constitucional à tutela efetiva[18].

Assim sendo, a tutela provisória vem de encontro com esse objetivo no sentido de proporcionar à parte a tutela jurisdicional adequada para o satisfatório atendimento da pretensão deduzida em juízo.

De acordo com o artigo 294 do Novo Código de Processo Civil, a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

A urgência envolve mais do que situações meramente aptas a gerar dano irreparável, englobando também qualquer situação fática de risco ou embaraço à efetividade da jurisdição como, por exemplo, o abuso do direito de defesa, que constitui embaraço ao direito, também decorrente do sistema constitucional, de prestação da tutela em prazo razoável. E também abrange situações de disciplina imediata de um direito que só pode ser gozado imediatamente, como alimentos, guarda dos filhos e direito de visita, que não pode aguardar o desfecho do processo[19].

Enquanto na tutela definitiva se busca juízo de certeza, a tutela provisória é conferida à base de juízos de verossimilhança, com base em cognição sumária, guardando, pois um elo de vinculação àquela, em regra. Na tutela definitiva o valor privilegiado é a segurança, ao passo que na provisória é a efetividade[20].

As tutelas de urgência, nas quais se insere a tutela antecipada, compreendem assim as providências necessárias a conjurar uma situação de risco de dano ao direito, risco de ineficácia da execução e embaraços ao andamento normal do processo.

O art. 5º, XXXV, da CF, garante o acesso à justiça, estabelecendo que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Isso não significa apenas que ao jurisdicionado seja possibilitado o acesso aos órgãos jurisdicionais. Significa isso, sim, que a pessoa tem o direito de que o Estado, por seus órgãos de jurisdição, aprecie a sua demanda e, configurado o seu direito, o declare e o efetive, realizando-o na sua plenitude. Só assim se terá por concretizado o princípio da efetividade do direito. E para isso o processo deve se valer de instrumentos que possibilitem uma ação rápida e eficiente do juiz, de maneira a não permitir que o tempo interfira em uma pronta solução, mesmo que provisória, do conflito.

Carnelutti, ao descrever sobre a finalidade do processo, diz que este (processo) tem que se desenvolver para a composição justa do litígio. Para o autor a composição justa do litígio significa:

Paz com justiça. Nem paz sem justiça, nem justiça sem paz. Nada de paz sem justiça, porque o processo, como se viu, não tende a compor o litígio de qualquer modo, e sim, segundo o Direito. Nada de justiça sem paz porque o Direito não se aplica ou se realiza por quem está em conflito, e sim por quem está sob o conflito; supra partes, não inter partes; a fim de compor um litígio e não de tutelar um interesse[21].

Fux observa que a cautelaridade e a satisfatividade acabaram por se misturar no âmago do processo cautelar, atendendo a situações de emergência e aos reclamos da efetividade, acabando por fazer aflorar a questão dos direitos evidentes, a respeito dos quais a prática judiciária revelou não ser justa a demora da prestação jurisdicional, malgrado a inexistência de situação de perigo[22].

Portanto, não basta a certeza que a prestação jurisdicional será realizada, mas igualmente importante é que ela ocorra em tempo hábil, dentro de um prazo adequado, apto para solucionar a demanda proposta. Em um país em que processos se arrastam por décadas, a prestação jurisdicional necessita ser célere, sob pena de sua ineficácia.

A INTRODUÇÃO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA NO SISTEMA PROCESSUAL BRASILEIRO E O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

A antecipação da tutela também é, no dizer de Marinoni, uma técnica de distribuição do ônus do tempo do processo, visando a eliminar uma das vantagens adicionais do réu contra o autor, que não pode arcar, sem grandes perdas, com a morosidade do Poder Judiciário. Com ela pode ­se recuperar a igualdade no procedimento, a partir da premissa de que não só a ação, mas também a omissão podem causar prejuízo. Busca ­ ­se atingir uma tutela que alcance, mais rapidamente possível, àquele que tem um direito a tudo aquilo a que tem direito, princípio que deve nortear as novas definições dos estudiosos do processo[23].

A antecipação de tutela surge a partir da necessidade de superar duas barreiras à adequada entrega da prestação jurisdicional, a saber, a duração e o custo do processo[24].

O legislador introduziu no ordenamento jurídico pátrio a antecipação de tutela, primeiramente pela Lei 8.952/94, depois mais alargadamente, pela Lei 10.444/02.

Como ensina Didier:

Com a reforma dos arts.273 e 461, §3°, do CPC, pela lei n. 8952/1994, inseriu-se, no bojo do procedimento comum, o poder geral de antecipação, generalizando a autorização legislativa para concessão da tutela antecipada satisfativa, agora permitida para “qualquer direito”, e não apenas para aquelas que se tutelavam por alguns procedimentos especiais. Promoveu-se a ordinarização da tutela antecipada satisfativa- ou seja, o que antes era privilégio de alguns procedimentos especiais tornou-se regra no nosso sistema...[25]

Em substituição ao longo processo de cognição plena surgiu a ideia de uma tutela mais rápida, com cognição limitada, que possibilite à parte obter antecipadamente o resultado da atuação jurisdicional.

O processo cautelar, ao longo dos anos, produziu excelentes resultados, mostrando-se o instrumento adequado para dar resposta às prestações jurisdicionais de urgência, fora dos estreitos limites do mandado de segurança.

Além disso, mostrou-se fecundo de experiências, mormente depois do advento da nova Constituição, com o abuso de leis temporárias, veiculadas por medidas provisórias, o que permitiu aos tribunais traçar-lhe perfil mais ou menos definido, inclusive no campo da tutela satisfativa. Foram essas experiências, colhidas na prática diuturna dos tribunais, que permitiram o florescimento da ideia de antecipação da tutela[26].

Através das cautelares, procura-se preservar o status quo, como forma de assegurar a utilidade da sentença que será proferida na ação principal; já a antecipação de tutela conduz à imediata produção de efeitos que só se fariam normalmente sentir quando da prolação da sentença de mérito. Na verdade, a decisão antecipatória de tutela nasce preordenada a ser confirmada pela sentença final, ao passo que as cautelares nascem preordenadas a morrer, pois seu papel limita-se a resguardar a utilidade da sentença que provavelmente será proferida a final[27].

Dessa maneira, o que diferencia a tutela cautelar da tutela antecipada é, principalmente, o fato de na primeira se buscarem medidas para se assegurar que o processo principal (que busca o bem da vida) não tenha um resultado frustrado, inútil ou inócuo; enquanto que, na segunda, o que se quer é, justamente, o bem da vida pleiteado no processo satisfativo, só que, antecipadamente, baseado em determinada situação fática que assim autoriza. O pedido da tutela antecipada será sempre o mesmo pedido do processo principal, só que com pretensão antecipada (antes da sentença, ou nela); já o pedido da lide cautelar será sempre diverso, visto que meramente acautelatório daquele. A tutela cautelar, ao contrário da antecipada, nada acrescenta ao patrimônio do requerente.

Conforme Fernando Negreiros:

O processo cautelar, em sede penal ou cível, fundamenta-se na necessidade de oferecer resposta jurisdicional à pretensão à segurança. Nesse contexto, coloca-se em relação de acessoriedade, no que diz respeito aos processos de conhecimentos e de execução. Essa condição acessória consubstancia-se no fato de o processo cautelar servir de instrumento do processo principal, garantindo-lhe o resultado útil[28].

Se duas pessoas brigam por um pedaço de carne, e uma delas pede ao magistrado que ponha na geladeira, para que o vencedor possa usufruir do alimento ao final do processo, é requerer uma providência cautelar(assegura para efetivar no futuro); se o pedido for para a extração de um bife, para propiciar alimentação imediata, estar-se-á diante de uma tutela antecipada atributiva[29].

A antecipação de tutela veio então ampliar a tutela de prevenção ou de emergência.  Quer dizer, a tutela de emergência, ou de urgência, que antes se exercia através das medidas cautelares e das liminares satisfativas previstas em diplomas legais específicos, foi enriquecida com a introdução no seu âmbito das medidas antecipatórias da tutela.

Não pode o juiz antecipar mais do que será atribuído à parte pela sentença que lhe for favorável, mas apenas aquilo que fizer parte do pedido; do mesmo modo, não poderá antecipar coisa diversa da que poderá ser alcançada pela sentença. É o que se chama de congruência entre a sentença e a antecipação da tutela[30].

O Novo Código de Processo Civil não apresenta um título ou capítulo próprio para a tutela antecipada, porém possui um livro próprio destinado a tutela provisória que abarca a tutela provisória de urgência, antecipada e cautelar, e de evidência.

A tutela provisória pode ser cautelar com caráter instrumental e acessório a tutela definitiva, ou pode ser antecipatória do próprio mérito da tutela definitiva.

O novo Código deu relevância à classificação das tutelas antecipatórias quanto ao momento em que é requerida, distinguindo entre as medidas preparatórias e as incidentes, proporíeis antes e depois do processo principal:

 

Art. 294.  A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência.

Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.

De acordo com o artigo 300 do Novo Código de Processo Civil, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

O procedimento antecipatório da tutela tem perfil de procedimento de cognição, só que limitada em extensão e profundidade e com eficácia executória própria, o que dispensa novo processo (de execução) para tornar efetivas as suas decisões[31].

No sistema de 1973, na hipótese de ter a tutela antecipatória natureza satisfativa, seria desnecessária a posterior propositura da ação principal, porque a medida se exaure em si mesma.



[1] Franceso Carnelutti, Sistema di diritto processuale civile. Padova: Cedam, 1936. V.1 p.40

[2] CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Tradução: Paolo Capitânio. Campinas: Bookseller, 2008, p.8.

[3] CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel, Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2014, p.113.

[4] Lima, Fernando Antônio Negreiros; Teoria geral do processo judicial. São Paulo: Atlas, 2013, p.235.

[5] MARINONI, Luiz Guilherme; Teoria Geral do Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.24

[6] MARINONI, Luiz Guilherme; Teoria Geral do Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.93

[7] [7] MARINONI, Luiz Guilherme; Teoria Geral do Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p.143

[8] ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. O direito constitucional à jurisdição. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. As garantias do cidadão na justiça. São Paulo: Saraiva, 1993, p.35.

[9] Ibid. p.37.

[10] MORAES, Diego Fernando Vila Nova de. Responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes da atividade judiciária. Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 47, 1 nov.2000. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/493>. Acesso em:

[11] BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Tutela de urgência e efetividade do Direito. Revista de Direito da Procuradoria Geral, Rio de Janeiro, n. 57, p. 244-260, 2003, p.245.

[12] FUX, Luiz. Curso de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 449.

[13] CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2014, p.35.

[14] BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Temas de Direito Processual. Vol III. São Paulo: Saraiva, 1989, p.27.

[15] FUX, Luiz. Tutela de segurança e tutela da evidência. São Paulo: Saraiva, 1996, p. 138.

[16] ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. São Paulo: Saraiva, 2009, p.25.

[17] MARINONI, Luiz Guilherme. Tutela Antecipatória e julgamento antecipado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p.233.

[18] DESTEFENNI, Marcos. Natureza constitucional da tutela de urgência. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2002, p. 290.

[19] ZAVASCKI, op.cit., p.31.

[20] ZAVASCKY, 2009, p.31.

[21] CARNELUTTI, Francesco. Sistema de Direito Processual Civil. Tradução: Hiltomar Martins Oliveira. São Paulo: Classic Book, 2004, p.273.

[22] FUX, 1996, p.20.

[23] MARINONI, Luiz Guilherme. Antecipação da Tutela. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p.23-24.

[24] CARNEIRO, Athos Gusmão. Da antecipação de tutela. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 3-4.

[25] DIDIER JR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: Editora JusPodivm; 2012. P.477

[26] ALVIM, J. E. Carreira. Tutela antecipada - De acordo com as recentes reformas processuais. Revista e atualizada por Luciana Gontijo Carreira Alvim Cabral. Curitiba: Juruá, 2006, p.26.

[27] BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência (tentativa de sistematização). São Paulo: Malheiros, 2009, p. 323.

[28] Lima, Fernando Antônio Negreiros; Teoria geral do processo judicial. São Paulo: Atlas, 2013, p.527.

[29] DIDIER JR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual Civil. Bahia: Editora JusPodivm; 2012,p.471

[30] POZZA, Pedro Luiz. Sentença parcial de mérito - Cumulação de pedidos e o formalismo -Valorativo para a celeridade da prestação jurisdicional. Curitiba: Juruá, 2015, p.109.

[31] ALVIM, J. E. Carreira. Manual do Novo Código de Processo Civil - Parte Geral - Volume I. 2. ed., rev.e atual. Curitiba: Juruá, 2012, p.386.