1. OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS.


1.1. A ORIGEM DOS JUIZADOS ESPECIAIS.


A concepção dos juizados de pequenas causas, no Brasil, demonstrou a recuperação histórica das experiências concretizadas no período colonial e republicano, implantadas num conjunto mais amplo da constituição de um Estado Brasileiro e de nossa cultura jurídica, social, econômica e política, num universo do movimento mundial por uma justiça mais democrática e acessível a todos os grupos da população.

Em 1984 foi publicada a Lei 7.244, que regulamentou a instituição dos Juizados Especiais de Pequenas Causas, órgão criado através de uma auto-reforma realizada pelo Judiciário com o objetivo de possibilitar a população o acesso à justiça, ampliando a efetividade das soluções dos litígios. A criação desse órgão teve sua gênese nos Conselhos de Conciliação e Arbitragem, sendo o Estado do Rio Grande do Sul o primeiro a implementá-lo, tendo posteriormente os outros Estados federativos seguido o seu exemplo.

O Juizado Especial de Pequenas Causas foi criado e amparado pela previsão contida na Constituição Federal de 1988:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
[...]
X ? criação, funcionamento e processo do juizado de pequenas causas. (grifo nosso)

Promulgada em 1988, a Lei Magna, ao tratar do Poder Judiciário disciplinou a criação dos juizados especiais, conferindo-lhes competência para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade, assim como as infrações penais de menor potencial ofensivo.

Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão:
I ? juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau;(grifo nosso).

A Lex Mater de 1988 teve o objetivo, ao inserir em seu texto o referido artigo, de possibilitar a expansão da capacidade da jurisdição institucional no que pertine a sociabilidade, bem como buscar a democratização do acesso à justiça, o que estava de fato limitado nos Juizados de Pequenas Causas. Observa-se que as disposições das outras Constituições do país, anteriores a esta, não tinham a intenção de propiciar a ampliação do acesso à justiça a toda população, ao contrário, aquelas visavam sempre preterir a elite brasileira, o que difere consubstancialmente do espírito da Carta Magna de 1988.

Em 26.09.1995 foi editada a Lei n° 9.099 que instituiu o regulamento do Juizado Especial Cível e Criminal, com a finalidade de desafogar a justiça comum em todo o país, propiciando, ainda, um acesso mais fácil ao Judiciário pela população carente, bem como acelerar a prestação jurisdicional já que seria o responsável pelo processamento de causas de menor complexidade e de menor valor econômico.

Ricardo Cunha Chimenti (2003, p. 05) entende que é tal órgão jurisdicional:
[...] um sistema ágil e simplificado de distribuição da Justiça pelo Estado. Cuidando das causas do cotidiano de todas as pessoas (relações de consumo, cobranças em geral, direito de vizinhança etc.), independentemente da condição econômica de cada uma delas, os Juizados Especiais Cíveis aproximam a Justiça e o cidadão comum, combatendo o clima de impunidade de descontrole que hoje a todos preocupa.

Corrobora também o professor Luiz Guilherme Marinoni (2005, p. 670), aduzindo que os Juizados Especiais tem a finalidade de "apresentar ao jurisdicionado um caminho de solução das controvérsias mais rápido, informal e desburocratizado, capaz de atender às necessidades do cidadão e do direito postulado".

A Lei 9.099/95 em seu artigo 1º, em conformidade com o artigo 98, I, da Lei Magna, propiciou à criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, sendo este órgão um microssistema jurisdicional, com o intuito de julgar e executar as ações de menor complexidade e de menor valor econômico. A idéia-central deste órgão é facilitar acesso à Justiça pela população, resolvendo os litígios que eles são partes com rapidez e eficácia.

Art. 1º Os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, órgãos da Justiça Ordinária, serão criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para a conciliação, processo, julgamento e execução, nas causas de sua competência.(grifo nosso)

Afirma o civilista Ricardo Cunha Chimenti (2003, p. 03) que depois de editada a lei dos juizados especiais:

[...] acabaram por ser unificadas, claramente, as sistemáticas dos Juizados de pequenas causas e dos Juizados especiais de causas de menor complexidade, ao menos naquelas relacionadas à matéria cível, isto porque foi revogada expressamente a Lei n.7.244/84 (Lei n. 9.099/95, art. 97), que regulava o processamento perante os Juizados de Pequenas Causas Cíveis.

No que tange a parte cível, objeto de estudo do presente trabalho, a Lei 9.099/95 acolheu com algumas ressalvas e acréscimos, os princípios e idéias contidas na Lei 7.244/84, tendo sido mantido o seu objetivo principal, qual seja a facilitação do acesso à justiça pela sociedade. Os Juizados Especiais Cíveis são subordinados ao Poder Judiciário, e por isso, a sua aplicação procedimental deve estar submetida à lei que o regulamenta (Lei 9.099/1995), estando ainda integrada com o Código de Processo Civil, o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil.





1.2. A MOTIVAÇÃO DA CRIAÇÃO DOS JUIZADOS ESPECIAIS.


Com a evolução da sociedade surgiram conflitos urbanos, peculiares à civilização moderna, que versam sobre direitos transindividuais, relações de consumo, relações pulverizadas no conjunto social e direitos individuais não patrimoniais, sendo todos estes classificados como os novos direitos. Para tais conflitos fez-se necessário criar uma justiça apta e efetiva, com uma estrutura e processamento diverso daquele contido na justiça tradicional, pois este seria impróprio para a eficácia na solução dos litígios referentes aos novos direito.

Assim, visando possibilitar uma maior celeridade processual, com menor custo, nas ações que abordem os novos direitos, o Estado buscou uma solução para dirimir tais conflitos e proporcionar o acesso à Justiça pelo cidadão, através da criação do Juizado Especial Cível de Pequenas Causas (Lei 7.244/84) e posteriormente os Juizados Especiais Cíveis e Criminais (Lei 9.099/95).

O sistema de juizados especiais segundo Pedro Manoel de Abreu (2004, p. 34):
[...] insere o Brasil na chamada terceira onda (terza ondata) do universo cappelletiano, pois representa acesso à justiça, adequação dos anseios da população a uma justiça rápida, sem custos e sem formalismo, como freio ao fenômeno da litigiosidade contida e à violência, capazes de induzir à justiça de mão própria e à barbárie social, nesse quadro sombrio de pobreza e de exclusão social dos países em via de desenvolvimento.

Os juizados especiais foram criados como um recurso do Estado para dar solução às causas de pequeno valor e de menor complexidade, democratizando o processo e permitindo seu acesso pelo cidadão, tendo por conseqüência a promoção da cidadania.

Concorda com tal assertiva o doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto e Joel Dias Figueira Júnior (2005, p. 40) tecendo comentário sobre o procedimento aplicado ao Juizado Especial:

[...] nova forma de prestar jurisdição significativa, antes de tudo, um avanço legislativo de origem eminentemente constitucional, que vem dar guarida aos antigos anseios de todos os cidadãos, especialmente aos da população menos abastada, de uma justiça apta a proporcionar uma prestação de tutela simples, rápida, econômica e segura, capaz de levar à liberação da indesejável litigiosidade contida. Em outros termos, trata-se, em última análise, de mecanismo hábil na ampliação do acesso á ordem jurídica justa.

Nesse sentido, tais órgãos judiciais apresentam uma tutela diferenciada, reunindo critérios de segurança e celeridade processual para assegurar a toda população o acesso á justiça, acolhendo os princípios da inafastabilidade do controle jurisdicional e do devido processo legal, formadores do Estado de Direito, buscando atender ao quanto disposto no artigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal, que refere-se ao princípio da acesso à justiça.


1.3. OS PRINCÍPIOS NORTEADORES DOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS.


A Lei n° 9.099/95 estabeleceu princípios orientadores do sistema dos Juizados Especiais Cíveis, que concorrem para a viabilização do acesso a justiça e na procura da conciliação entre as partes sem infringir as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Art. 2º. O processo orientar-se-à pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação. (grifo nosso)

O ilustre doutrinador Ruy Samuel Espíndola (1999, p. 45-49):

[...] a idéia de princípio ou a sua conceituação, [...] designa a estruturação de um sistema de idéias, pensamentos ou normas por uma idéia mestra, por um pensamento chave, por uma baliza normativa, donde todas as demais idéias, pensamentos ou normas derivam, se reconduzem e/ou se subordinam.
[...]
[...] tem-se usado o termo princípio ora para designar a formulação dogmática de conceitos estruturados por sobre o direito positivo, ora para designar determinado tipo de normas jurídicas e ora para estabelecer os postulados teóricos, as proposições jurídicas construídas independentemente de uma ordem jurídica concreta ou de institutos de direito ou normas legais vigentes.

Os princípios tem suma importância no direito, uma vez que, são utilizados pelo legislador, pelo jurisdicionado e pela jurisprudência para fundamentar normas jurídicas e decisões judiciais, sendo estes considerados como inspiração doutrinária, podendo estarem ou não descobertos pelo ordenamento jurídico.

No que tange a hierarquia no ordenamento jurídico os princípios conforme entendimento da doutrina moderna assumiram o caráter normativo, ou seja, são utilizados como normas jurídicas.

Corrobora com tal entendimento o professor Ruy Samuel Espíndola (1999, p. 55):
Hoje, no pensamento jurídico contemporâneo, existe unanimidade em se reconhecer aos princípios jurídicos o status conceitual e positivo de norma de direito, de norma jurídica, Para este núcleo de pensamento, os princípios têm positividade, vinculatividade, são normas, obrigam, têm eficácia positiva e negativa sobre comportamentos públicos ou privados bem como sobre a interpretação e a aplicação de outras normas, como as regras e outros princípios derivados de princípios de generalizações mais abstratas. [...] Reconhece-se, destarte, normatividade não só aos princípios que são, expressa e implicitamente, contemplados no âmago da ordem jurídica, mas também aos que, defluentes de seu sistema, são anunciados pela doutrina e descobertos no ato de aplicar o Direito.

É de ver-se que os princípios são considerados basilares para o legislador ao criar uma norma jurídica, e este ao criar a Lei 9.099/95 também utilizou tais preceitos devendo estes serem utilizados para toda e qualquer aplicação das regras contidas em tal lei.

Assevera Ricardo Cunha Chimenti (2003, p. 08) que os princípios que fundamentam o processamento dos Juizados Especiais Cíveis "convergem na viabilização do amplo acesso ao Judiciário e na busca da conciliação entre as partes sem violação das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa".

Os princípios gerais previstos na Lei 9.099/95 baseam-se e orientam o seu procedimento, entretanto, devem ser aplicados também nesse microssistema os princípios norteadores do universo processual civil e aqueles princípios constitucionais que estejam em harmonia com os critérios dos Juizados Especiais, tais como a ampla defesa, a igualdade entre as partes, o contraditório, segurança jurídica, etc.

O princípio da oralidade, também conhecido como viga mestra da técnica processual, pode ser demonstrado através do processo utilizado nos juizados especiais cíveis, onde consta que muitos atos processuais podem ser realizados oralmente. A oralidade tem importância essencial, pois contribui para acelerar o ritmo do processo por meio da obtenção de uma resposta mais próxima da veracidade do fato que ensejou a interposição da ação, buscando estar mais perto da realidade dos mesmos.

Afirma Luiz Guilherme Marinoni (2005, p. 671) que o processamento dos juizados especiais "[...] é todo desenhado para se desenvolver oralmente, reduzindo-se ao máximo as peças escritas e, mesmo, a escrituração das declarações orais".

A utilização de tal princípio pode ser comprovada através da previsão contida na Lei 9.099/1995, nos seguintes casos: a petição inicial pode ser formulada de modo verbal ou escrita (art. 14), tendo essa mesma disponibilidade para a formulação da resposta do réu (art. 30), bem como em alguns outros dispositivos previstos nos artigos 13, §§ 2º e 3º, 17, 19, 21, 24, § 1º, 28, 29, etc.

Afirma Fernando da Costa Tourinho Neto e Joel Dias Figueira Júnior (2006, p. 74) que a adoção do princípio da oralidade:

[...] apresenta uma outra vantagem que poderíamos chamar de "ordem psicológica"; as partes têm a impressão de exercer, elas mesmas, uma influência decisiva no deslinde da demanda, resultando, em contrapartida, no melhoramento da imagem do Judiciário perante os jurisdicionados.

Ressalta-se ainda que a lei dos juizados especiais cíveis em seu artigo 44 trouxe uma novidade em relação à apresentação de provas, pois a sua colheita pode ser realizada pelo sistema oral, sendo a sua transcrição gravada em fita magnética.

A disposição do princípio da oralidade no procedimento dos juizados especiais tem o intuito de regular o processo para que ele se desenvolva com rapidez e eficácia, diminuindo-se a burocratização e maximizando a solução dos litígios.

Os princípios da simplicidade e da informalidade seguiram a ideologia contida na Lei 7.244/84, sendo introduzidos na lei dos juizados especiais para que o cidadão comum pudesse compreender o procedimento usado nestes órgãos e possa, por conseguinte, propiciar o exercício de seu direito de cidadania com menos formalidade.

Ricardo Cunha Chimenti (2003, p. 12) afirma "[...] que a maior preocupação do operador do sistema dos Juizados Especiais deve ser a matéria de fundo, a realização da justiça de forma simples e objetiva".

No dispositivo legal constam as seguintes previsões de simplificação e informalidade do processo: a citação postal das pessoas jurídicas de direito privado por meio da entrega de correspondências ao encarregado de recepção (art. 18, II), o pedido deve ser formulado de maneira simples e em linguagem acessível (art. 14, § 1º), dispensa de publicação de editais na alienação de coisa de pequeno valor (art. 52, VIII), bem como outros dispositivos presentes nos artigos 19, 34, 38, 46, 52, IV, etc.

O legislador inseriu o princípio da economia processual na Lei 9.099/95 com o objetivo de proporcionar às partes a solução dos litígios com uma maior agilidade através da utilização de menor quantidade de atos processuais.

Concorda o professor Pedro Manoel Abreu (2004, p. 214) aduzindo que, através da aplicabilidade de tal princípio o julgador "[...] deve dirigir o processo conferindo às partes um máximo de resultado em confronto com um mínimo de esforço processual".

O microssistema dos Juizados Especiais Cíveis demonstra a aplicação do princípio da economia processual ao dispor sobre: a validade dos atos processuais sempre que preencherem o fim para os quais foram realizados (art. 13), a cumulação de pedidos conexos (art. 15), e os demais dispositivos contidos nos artigos 17, parágrafo único, 31, 38, 52, III, 53, § 4º.

A celeridade processual, princípio previsto na lei dos juizados especiais cíveis, tem como finalidade alcançar a solução dos litígios com agilidade e eficácia, sem violar o princípio constitucional da segurança das relações jurídicas.

Merecem destaque alguns dispositivos expressos na Lei 9.099/95 onde há a aplicação do princípio em questão: a apresentação de defesa; a produção de provas; a manifestação sobre os documentos oferecidos; a resolução dos incidentes e a prolação de sentença; a busca pela realização de apenas uma única audiência (arts. 28 e 29); a instauração imediata da sessão de conciliação, caso os litigantes compareçam em juízo, sendo displicente o registro prévio do pedido e a citação (art. 17); dentre outros.

Os princípios contidos na Lei dos Juizados Especiais Cíveis têm como escopo orientar o processamento de ações neste órgão, através de inovações que envolvem um conjunto de técnicas demonstradas por meio da simplicidade dos atos processuais, estratégias no tratamento de interesses e agilidade procedimental.

1.4. A COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS.


À luz do artigo 98 da Lei Maior competem aos Juizados Especiais Cíveis dos Estados e do Distrito Federal julgar ações de menor complexidade, devendo preencher os requisitos expresso na Lei 9.099/95.

Art. 3° O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas:
I ? as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;
II- as enumeradas no artigo 275, inciso II, do Código de Processo Civil;
III- a ação de despejo para uso próprio;
IV ? as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente ao fixado no inciso I deste artigo; (grifo nosso)

No que pertine ao inciso I do artigo supra, tal dispositivo foi inserido para delimitar as causas que podem estar aptas a utilizar o procedimento dos Juizados Especiais Cíveis, sendo as mesmas também conhecidas como causas de menor complexidade.

Nesse sentido o Enunciado 15 do I Encontro de Juizes de Juizados Especiais Cíveis da Capital e da Grande São Paulo, do seguinte preceito: "Causas de menor complexidade são aquelas previstas no artigo 3° da Lei 9.099/95, e que não exijam prova técnica de intensa investigação. A alta complexidade jurídica da questão, por si só, não afasta a competência dos Juizados Especiais" (SANTOS, CHIMENTI, 2005, p. 01).

O valor da causa e da matéria foram critérios utilizados pelo legislador para a identificação das causas cíveis de menor complexidade sendo a alçada, das ações de competência dos juizados especiais cíveis, limitada em 40 (quarenta) salários mínimos, quando o autor estiver acompanhado de advogado e de 20 (vinte) salários mínimos quando este profissional não estiver presente.

Em relação às causas mencionadas no inciso II do artigo 3º da Lei dos Juizados Especiais Cíveis, há uma discussão doutrinária acerca da limitação destas no montante de 40 (quarenta) salários mínimos.

Afirma Ricardo Cunha Chimenti (2003, p. 33):

[...] a interpretação sistemática da Lei 9.099/95, em especial a análise conjunta dos seus arts. 3º, § 3º, 15 e 39, autoriza a conclusão de que a sentença condenatória, mesmo nas hipóteses do inciso II do art. 275 do CPC, será ineficaz na parte que superar a alçada do sistema especial.

Divergindo de tal entendimento o Enunciado 58 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais aduz que: "As causas cíveis enumeradas no art. 275, II, do CPC admitem condenação superior a 40 salários mínimos e sua respectiva execução, no próprio juizado"( SANTOS, CHIMENTI, 2006, p. 17).

O legislador ao estabelecer a competência dos Juizados Especiais Cíveis para julgar ações de despejo para uso próprio, constante no inciso III, do artigo 3º, teve a finalidade de viabilizar a solução de tais litígios.

Orienta o Enunciado 4 do Fórum Permanente de Coordenadores dos Juizados Especiais do Brasil que "[...] nos Juizados Especiais só se admite a ação de despejo prevista no art. 47, III, da Lei 8.245-91" (SANTOS, CHIMENTI, 2006, p. 18).

Vale dizer que se ação de despejo for cumulada com o pedido de indenização, essa soma não poderá ultrapassar a alçada determinada na Lei 9.099/95, sob pena de renúncia ao crédito excedente (art. 15).

Em relação ao inciso IV do artigo 3º, a Lei 9.099/95 estabeleceu a competência dos Juizados Especiais Cíveis para julgar as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente a limitação da alçada estando tal demanda prevista no artigo 920 e seguintes do Código de Processo Civil.

A alçada de 40 (quarenta) salários mínimos refere-se ao valor da causa das ações que estão previstas no inciso IV, artigo 3º, mas se os litigantes têm o intuito da posse a título de domínio, o valor da demanda será o valor do imóvel, e caso o processo tenha como objeto o direito pessoal, o valor da causa corresponderá ao proveito econômico.

É importante informar ainda que além das competências determinadas neste dispositivo legal, conciliação, processo e julgamento, há a arbitragem, conforme expresso nos artigos 24 a 26 da Lei 9.099/95, e a execução de título judicial, consoante artigo 3º, § 1º, I, e art. 52, e extrajudicial, previsto no artigo 3º, § 1º, I, e artigo 53.

Desse forme o artigo 3º, caput e incisos da lei em comento discrimina com muita clareza as causas de competência dos Juizados Especiais Cíveis, por meio da utilização da conjugação dos critérios de valor, matéria, condição da pessoa e complexidade da ação, sendo a limitação desta competência apoiada em 40 (quarenta) salários mínimos, para ações ajuizadas com advogado e 20 (vinte) salários mínimos para aquelas sem o acompanhamento destes profissionais. Vale dizer ainda que no parágrafo 2º do referido artigo constam as ações em que tal órgão não possui competência para processar e julgar.

REFERÊNCIAS:


ABREU. Pedro Manoel. Acesso à justiça e juizado especiais: o desafio histórico da consolidação de uma justiça cidadã no Brasil. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2004.

CHIMENTI, Ricardo Cunha. Teoria e prática dos juizados especiais cíveis: Lei n. 9.095/95 ? parte geral e parte cível ? comentada artigo por artigo ? 6 ed. atual. e ampl. Com a Lei n. 10.259/2001 (Lei dos Juizados Federais) ? São Paulo: Saraiva, 2003.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sergio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 4ª ed. rev., atual. e ampl. SãoPaulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.

______. Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995. Dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. D.O.U. de 27 set.1995.

______. Lei 7.244, de 07 de novembro de 1984. Dispõe sobre a criação e o funcionamento do Juizado Especial de Pequenas Causas. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF. 163º da Independência e 96º da República.

______. Constituiçao Federal de 1988, de 05 de outubro de 1988. Constituição da república Federativa do Brasil ? 1988. D.O.U. de 05/10/1988., p. 01.