JUDICIALIZAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE: a efetividade do direito fundamental à saúde e o acesso à justiça
Publicado em 03 de março de 2014 por Eliza de Mesquita Lisbôa
RESUMO
Apresenta o direito à saúde no âmbito constitucional e esclarece sobre outras positivações em que o direito em questão está inserido. Discute sobre a principal função do magistrado ao analisar casos em que o direito à saúde como direito social está em ponderação. Explicita o papel do Poder Judiciário para a efetivação do direito à saúde por meio do princípio da ponderação e tece explicações sobre os meios processuais para o acesso do cidadão à justiça. Relata as medidas judiciais atribuídas em prol de garantir o efetivo exercício do direito constitucional a saúde.
Palavras-chave: Direito à Saúde; Efetivação; Judicialização. INTRODUÇÃO
O direito à saúde é um direito fundamental estabelecido tanto na esfera do direito constitucional brasileiro, quanto nos organismos internacionais de direitos humanos. É um direito tão essencial que, de acordo com Sarlet (2002, p.3), mesmo em países em que não há previsão constitucional expressa, acontece o reconhecimento como um direito fundamental não escrito. A Constituição brasileira garante a saúde como “direito de todos e dever do Estado”. Sob este aspecto, no momento em que declara a saúde é um direito social, a Constituição reconhece que este é um direito fundamental do indivíduo. Todo cidadão tem direito ao serviço público apropriado, concretizando um direito social, podendo demandar do Estado a realização de prestações positivas para a satisfação das necessidades classificadas como essenciais. Entretanto, tal direito não vem sendo assegurado na prática.
Dessa maneira, percebe-se uma crescente importância do Poder Judiciário no controle da política pública de saúde no Brasil. Este fato advém da definição do acesso universal aos serviços de saúde pela legislação brasileira. Por outro lado, há obstáculos na garantia dos recursos necessários para esse acesso da população aos serviço de saúde pelo
1 Paper apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Processo de Conhecimento II do curso de Direito da UNDB ministrada pelo prof. Hugo Passos.
2 Graduandas do 5o período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB
3 Professor orientador.
Estado. Diante dos empecilhos em atender às necessidades dos usuários do sistema de saúde pública, estes buscam o poder judiciário solicitando o acesso aos serviços e produtos de saúde.
Assim, percebe-se que o Judiciário pode ser um local de participação nas políticas públicas de saúde, especialmente para os mais desprovidos, que têm na tutela jurisdicional um ambiente institucional onde reclamar bens e serviços de saúde não oferecidos ou oferecidos de maneira não satisfatória pelo poder público.
1 CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE
A Constituição Brasileira de 1988 significa, no ordenamento jurídico brasileiro, notável transformação do tratamento concedido pelo Estado à sociedade, uma vez que consolidou, de maneira geral, os denominados direitos de segunda geração (econômicos, sociais e culturais), bem como enunciou como um de seus embasamentos a dignidade da pessoa humana (artigo 1°, III).
O acesso à saúde pública é direito social previsto no artigo sexto da Constituição Federal e o artigo 196 e seguintes apontam de que forma o Estado agirá em relação à saúde pública, que é estabelecida como um “direito de todos e um dever do Estado garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Ainda, o artigo 198 define que:
As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;
III – participação da comunidade.
Parágrafo primeiro – O sistema único de saúde será financiado, nos termos do artigo 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.
A Constituição, em seu artigo 196 citado acima, abarca uma norma de natureza programática, requerendo complemento em lei ordinária. Regulamentando o assunto de tais disposições constitucionais, a Lei 8.080/90, declara, em seu art. 2o, que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”. Para asseverar esse direito fundamental, o art. 4o da Lei, guiado pelo art. 198
da Constituição, prevê o Sistema Único de Saúde (SUS), definido como o “conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público”.
O direito à saúde, em virtude do seu atributo de direito fundamental, recebeu a qualificação de norma constitucional de eficácia plena, ou seja, possui força normativa suficiente para sua incidência imediata e independente de providência normativa ulterior para sua aplicação. O caráter pleno de eficácia de uma norma diz
respeito à ideia de que, desde a entrada em vigor da Constituição, tais normas produzem, ou têm a possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais relativos aos interesses, comportamentos e situações, que o constituinte direta e
normativamente quis regular, sendo garantida a existência de um aparato jurídico-
institucional para a sua efetivação. (ASENSI, 2010, p.350)
De acordo com a Constituição, o Estado deve assumir políticas sociais e econômicas e ações e serviços de saúde de acesso universal e igualitário. Dessa forma, os serviços de saúde pública devem ser abertos a todos os cidadãos em condições de igualdade. Nessa conjuntura, abrangente e complexa, que se entende o direito à saúde, não se abordando apenas se o Estado precisaria ou não fornecer determinado medicamento ou cirurgia, mas se as políticas estatais são ajustadas para encarar as necessidades da saúde da população em geral.
2 A FUNÇÃO SOCIAL DO MAGISTRADO
A atividade legislatória do Estado é a responsável por delinear os meios de que o mesmo dispõe para concretizar o sistema de saúde. Mas, os direitos sociais, por demandarem uma maior ingerência, bem como a produção de políticas públicas para sua efetivação, fazem com que o foco do setor legislativo do Estado seja desviado para as atividades executiva e judiciária, pois não é bastante apenas que exista a lei, mas é necessário assegurar o gozo dos direitos.
Os direitos fundamentais, formulados pela constituição através de normas necessariamente vagas e genéricas, quando violados ou postos em dúvida só podem ser afirmados, positivados e efetivados pelos tribunais. [...] É perante o Poder Judiciário, portanto, que se pode efetivar a correção da imperfeita realização automática do direito: vãs seriam as liberdades do indivíduo se não pudessem ser reivindicadas e defendidas em juízo. (CINTRA, GRINOVER, DINAMARCO, 2010, p.176)
Considera-se, assim, que a fraqueza dos institutos de representação popular e o desgaste dos ambientes de mediação política e social transmitem ao Poder Judiciário um papel mais ativo em matéria de direitos sociais. O magistrado que age na esfera de um
processo de viés coletivo, compõe-se em verdadeiro ator social, participante efetivo para a materialização da paz e da justiça, pois privilegia ao processo decisões compartilhadas e impulsionadas por um diálogo aberto às diversas interpretações para além daquelas ligadas aos intérpretes jurídico-formais da norma. Para Barroso (2009, p.390):
O papel do Judiciário e, especialmente, das cortes constitucionais e supremos tribunais deve ser resguardar o processo democrático e promover os valores constitucionais, superando o déficit de legitimidade dos demais Poderes, quando seja o caso; sem, contudo, desqualificar sua própria atuação, exercendo preferências políticas de modo voluntarista em lugar de realizar os princípios constitucionais. Além disso, em países de tradição democrática menos enraizada, cabe ao tribunal constitucional funcionar como garantidor da estabilidade institucional, arbitrando conflitos entre Poderes ou entre estes e a sociedade civil. Estes os seus grandes papéis: resguardar os valores fundamentais e os procedimentos democráticos, assim como assegurar a estabilidade institucional.
Desse modo, cabe ao magistrado uma atitude ativa enquanto cidadão do Estado Democrático de Direito, pois, além da função política que exerce, em razão dessa postura cidadã, lhe compete a procura pelo real patrocínio dos direitos que baseiam a sua própria existência e a dos demais, assim como a busca pela concretização de uma estabilidade nas relações da comunidade como um todo por meio do privilégio aos Direitos Humanos.
O juiz do Estado Democrático de Direito, privilegia a democracia e iguala a ordem jurídica nacional, internacional e estrangeira sob a ótica da prioridade da dignidade humana, reparando dificuldades à concretização dos direitos. Portanto, não é apenas um intérprete da norma, mas um participador veemente da sociedade e um agente incentivador dos direitos e garantias do cidadão, concretizando os objetivos de um Estado plural.
3 O PAPEL DO JUDICIÁRIO NA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE E OS TRAMITES PROCESSUAIS DE GARANTIAS
O direito à saúde, como já afirmado, é considerado principio fundamental e está garantido na Constituição Federal brasileira, devidamente elencado no artigo 6o da Carta Magna. Dessa forma, é dever do Estado garantir tal direito seja através de suas próprias a ações ou politicas publicas que promovam o acesso a saúde, seja através de intervenção garantidora através do sistema judiciário, principalmente no que tange a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, a citar a saúde.
Esta eficácia horizontal pode ser exemplificada nesse caso pelas relações entre particulares que pode ser ilustrada até mesmo por um individuo que contrata um plano de saúde como forma de se precaver ou melhor ser atendido em meio as faltas do Estado. Dessa
forma, é cada vez mais comum, porem polemico, o fato de se recorrer ao judiciário para garantir fornecimento de medicamentos ou mesmo atendimentos médico-hospitalar.
Segundo Alexy (2008), princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Portanto, são mandamentos de otimização que podem ser satisfeitos em graus variados pois sua satisfação depende não só de situações fáticas em si, mas jurídicas também. Diferem-se das regras, pois, estas ou são satisfeitas ou não.
Quando se tratar de colisão entre princípios, ou seja, no caso da efetivação de garantia do direito a saúde e qualquer outro principio em contrapartida, como autonomia da administração publica ou privada em seus regimentos, um deles terá que ceder. O jurista, portanto, deverá fazer um sopesamento de interesses conflitantes definindo qual destes interesses - que no plano abstrato encontram-se no mesmo nível, tem maior peso no caso concreto. É perceptível o fato de o direito a saúde se relacionar ao principio da dignidade da pessoa humana e o direito à vida, considerados, para alguns com caráter prima facie, isto é, a máxima de proteção do direito.
Destarte, esse sopesamento é feito na analise do caso pelo jurista através das três máximas da proporcionalidade, segundo o mesmo autor: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Assim, o jurista deve seguir esse protocolo de etapas na analise da colisão entre princípios para definir qual deverá ceder e qual tem caráter precedente.
Para tanto, geralmente são concedidas as medidas liminares, de antecipação de tutela e os mandados de segurança na tentativa de impor aos órgãos vinculados mesmo que administrados pelo Poder Executivo, pois conforme a Constituição quando se trata desses direitos, todos os Poderes devem mover-se para a otimização do fornecimento desses, ainda que se saiba de suas dimensões objetivas e subjetivas de afetação.
A antecipação de tutela é vista na nova redação do art. 273 no Código de Processo Civil com a intenção de afastar os danos materiais decorrentes da demora de uma decisão acerca de um direito material pretendido por autor, concedida liminarmente mediante simples cognição sumaria baseada em prova documental. Alguns requisitos são necessários para a concessão de tutela antecipada como: prova inequívoca de verossimilhança e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. O primeiro item diz respeito a veracidade dos fatos apresentados, ou seja, acolhe-se os fatos apresentados sob a presunção de veracidade. O segundo item relaciona-se ao dano propriamente dito, caso se siga com o processo e em face a sua celeridade possa ocasionar dano irreversível ou de difícil reparação. Esse aspecto é
amplamente visto nos casos relacionados a direito à saúde, já que, o fornecimento de medicamentos, por exemplo é de caráter imediato, não podendo o doente esperar o curso normal de um processo e a apreciação do mérito por parte do magistrado com todos os seus requisitos.
O mandado de segurança se trata de um meio constitucional à disposição de pessoa física ou jurídica que protege direito individual ou coletivo, liquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade de qualquer categoria ou função. Assim sendo, o papel do juiz ao analisar o caso é identificar esse direito liquido e certo através de documentos o abuso de autoridade numa ação ou omissão ao serviço de saúde quando assim se tratar. O mandado também pode ter como parte e legitimidade ativa para impetrá-lo um individuo apenas, ou a coletividade que geralmente é representada por entidades legitimadas pela lei ou ainda através do Ministério Publico. Em se tratando de direito liquido e certo, conforme texto do inciso LXIX do artigo 5o da Constituição Federal tem-se que este é o direito titularizado pelo impetrante embasada em situação fática perfeitamente delineada e comprovada de plano por meio de prova pré- constituída. (SODRÉ, 2011, p.121)
A título de exemplo nos casos de tutela de direito à saúde o Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de afirmar que:
O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (artigo 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve zelar, de maneira responsável, o poder público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir aos cidadãos, inclusive aqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico hospitalar.")
"O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa consequência indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atenção no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional.
A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. O caráter programático da regra inscrita no artigo 196 da carta política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o poder público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. (AgRg no Recurso Extraordinário no 271.286-8, DJU 24.11.2000, relator Ministro Celso de Mello)
4 POSSIBILIDADES COATORAS PELO DESRESPEITO A LIMINARES CONCEDIDAS
Pelo descumprimento de medidas judiciais atribuídas em prol de garantir o efetivo exercício do direito constitucional a saúde através de fornecimento de medicamentos ou serviços especiais, os magistrados tem amparo nos Códigos de Processo Civil, bem como no Código Penal ou ainda com base na doutrina e jurisprudência.
O artigo 14, caput e inciso V do CPC que regula sobre as astreintes (multas diárias) fixadas com base no entendimento de que o não cumprimento de uma ordem judicial diz respeito a atentado contra a própria ordem e dignidade da justiça, exemplifica tal afirmação:
Art. 14 - São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:
V - cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.
Parágrafo Único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado.
Outra forma de proceder contra esse tipo de atentado é a estipulação de multas decorrentes do não cumprimento do mandado com base nos artigos 461 e 461-A do CPC conforme descritos:
Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.
§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.
Em decisões anteriores de tribunais superiores, a exemplo do STJ que tratou exatamente da matéria no que tange ao fornecimento de medicamentos ou tratamentos médicos especiais , percebe-se ainda a possibilidade de o juiz bloquear valores de cofres públicos tais como da Fazenda Publica Nacional como multa com base no artigo anteriormente citado do CPC:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA. – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – ART. 461, § 5o, DO CPC – BLOQUEIO DE VALORES PARA ASSEGURAR O CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL – POSSIBILIDADE. Tem prevalecido no STJ o entendimento de que é possível, com amparo no art. 461, |
§ 5o, do CPC, o bloqueio de verbas públicas para garantir o fornecimento de medicamentos pelo Estado. |
hipóteses, em matéria de preservação dos direitos à vida e à saúde, aquela Corte não aplica tal entendimento, por considerar que ambos são bens máximos e impossíveis de ter sua proteção postergada. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido. |
(STJ - REsp 784.241/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 8.4.2008, DJ 23.4.2008 p. 1)
Em termos penais é possível enquadrar pessoas responsáveis por órgãos direcionados em decisões não cumpridas acerca do artigo 319, que prediz a Prevaricação elencada no CP sobre o título de Crimes Contra a Administração Pública e 330 a respeito da Desobediência a funcionário público, a citar o próprio juiz no seu exercício:
O tema é de suma relevância, haja vista que, ainda que ocorrendo sentença favorável ao autor em relação ao fornecimento de medicamentos ou acesso a serviços de saúde, que como já tratado são garantias constitucionais de caráter primordial, atualmente existem inúmeras pessoas que morrem esperando o cumprimento dessa garantia por inúmeros fatores, pois de fato a sentença por si só não é garantia de cumprimento e consequente eficácia da lei em sentido amplo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Compreende-se dessa discussão, que a saúde é responsabilidade primordial do Estado, não sendo uma alternativa, mas sim, um imperativo. Não é contentador apenas afirma-la constitucionalmente, mas sim, torna-la efetiva. É preciso, portanto, que o Estado crie políticas públicas salutares que assegurem esse direito fundamental.
A efetivação desse direito garantida por meio judicial, no caso de não ser oferecido pelo Estado, é um meio de expansão do acesso à saúde e da cidadania. A alta intensidade da procura judicial na área da saúde espelha uma busca de aproximação, de
Artigo 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá- lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Artigo 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público.
efetividade desse direito no aspecto primordial do acesso aos meios materiais para sua obtenção.
A efetivação do direito à saúde se depara com múltiplos percalços, tais como ausência de recursos e de políticas públicas ou, ainda, de descumprimento das existentes. Diante disso, aqueles que precisam de remédio indispensável à sua vida se sujeitam a procurar a via jurisdicional para alcançá-lo.
De fato, a judicialização da saúde apresenta modificações expressivas nas relações sociais e institucionais, com desafios para a gestão e para os diversos campos, simbolizando o exercício da cidadania plena e a adequação da manifestação da justiça às novas e crescentes requisições sociais.
Portanto, não há que se pôr condições à saúde em discursos vagos, pois o que se analisa é a vida do ser humano, não podendo esta ser posta em segundo plano. Então, sendo direito constitucionalmente afiançado, a sociedade pode exigir as prestações necessárias à sua consolidação, sendo o direito à saúde de eficácia imediata.
REFERÊNCIAS
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SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia e efetividade do direito à saúde na constituição de 1988. Revista Diálogo Jurídico. Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, n. 10, jan. 2002. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 21 de outubro de 2011.
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