RESUMO

Apresenta o direito à saúde no âmbito constitucional e esclarece sobre outras positivações em que o direito em questão está inserido. Discute sobre a principal função do magistrado ao analisar casos em que o direito à saúde como direito social está em ponderação. Explicita o papel do Poder Judiciário para a efetivação do direito à saúde por meio do princípio da ponderação e tece explicações sobre os meios processuais para o acesso do cidadão à justiça. Relata as medidas judiciais atribuídas em prol de garantir o efetivo exercício do direito constitucional a saúde.

Palavras-chave: Direito à Saúde; Efetivação; Judicialização. INTRODUÇÃO

O direito à saúde é um direito fundamental estabelecido tanto na esfera do direito constitucional brasileiro, quanto nos organismos internacionais de direitos humanos. É um direito tão essencial que, de acordo com Sarlet (2002, p.3), mesmo em países em que não há previsão constitucional expressa, acontece o reconhecimento como um direito fundamental não escrito. A Constituição brasileira garante a saúde como “direito de todos e dever do Estado”. Sob este aspecto, no momento em que declara a saúde é um direito social, a Constituição reconhece que este é um direito fundamental do indivíduo. Todo cidadão tem direito ao serviço público apropriado, concretizando um direito social, podendo demandar do Estado a realização de prestações positivas para a satisfação das necessidades classificadas como essenciais. Entretanto, tal direito não vem sendo assegurado na prática.

Dessa maneira, percebe-se uma crescente importância do Poder Judiciário no controle da política pública de saúde no Brasil. Este fato advém da definição do acesso universal aos serviços de saúde pela legislação brasileira. Por outro lado, há obstáculos na garantia dos recursos necessários para esse acesso da população aos serviço de saúde pelo

1 Paper apresentado como requisito parcial para aprovação na disciplina Processo de Conhecimento II do curso de Direito da UNDB ministrada pelo prof. Hugo Passos.
2 Graduandas do 5o período do curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco – UNDB
3 Professor orientador.

page1image26400
page2image672 page2image1096 page2image1520 page2image1944 page2image2368 page2image2528 page2image2688 page2image2848 page2image3008 page2image3168 page2image3328 page2image3488 page2image3648 page2image3808 page2image3968 page2image4128 page2image4288 page2image4448 page2image4608 page2image4768 page2image4928 page2image5088 page2image5248 page2image5408 page2image5568 page2image5728 page2image5888 page2image6048 page2image6208 page2image6368 page2image6528 page2image6688 page2image6848 page2image7008 page2image7168 page2image7328

Estado. Diante dos empecilhos em atender às necessidades dos usuários do sistema de saúde pública, estes buscam o poder judiciário solicitando o acesso aos serviços e produtos de saúde.

Assim, percebe-se que o Judiciário pode ser um local de participação nas políticas públicas de saúde, especialmente para os mais desprovidos, que têm na tutela jurisdicional um ambiente institucional onde reclamar bens e serviços de saúde não oferecidos ou oferecidos de maneira não satisfatória pelo poder público.

1 CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE

A Constituição Brasileira de 1988 significa, no ordenamento jurídico brasileiro, notável transformação do tratamento concedido pelo Estado à sociedade, uma vez que consolidou, de maneira geral, os denominados direitos de segunda geração (econômicos, sociais e culturais), bem como enunciou como um de seus embasamentos a dignidade da pessoa humana (artigo 1°, III).

O acesso à saúde pública é direito social previsto no artigo sexto da Constituição Federal e o artigo 196 e seguintes apontam de que forma o Estado agirá em relação à saúde pública, que é estabelecida como um “direito de todos e um dever do Estado garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Ainda, o artigo 198 define que:

As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
II – atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais;

III – participação da comunidade.
Parágrafo primeiro – O sistema único de saúde será financiado, nos termos do artigo 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.

A Constituição, em seu artigo 196 citado acima, abarca uma norma de natureza programática, requerendo complemento em lei ordinária. Regulamentando o assunto de tais disposições constitucionais, a Lei 8.080/90, declara, em seu art. 2o, que “a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício”. Para asseverar esse direito fundamental, o art. 4o da Lei, guiado pelo art. 198

page3image744 page3image1168 page3image1592 page3image2016 page3image2440 page3image2600 page3image2760 page3image2920 page3image3080 page3image3240 page3image3400 page3image3560 page3image3720 page3image3880 page3image4040 page3image4200 page3image4360 page3image4520 page3image4680 page3image4840 page3image5000 page3image5160 page3image5320 page3image5480 page3image5640 page3image5800 page3image5960 page3image6120 page3image6280 page3image6440 page3image6600 page3image6760 page3image6920 page3image7080 page3image7240 page3image7400

da Constituição, prevê o Sistema Único de Saúde (SUS), definido como o “conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público”.

O direito à saúde, em virtude do seu atributo de direito fundamental, recebeu a qualificação de norma constitucional de eficácia plena, ou seja, possui força normativa suficiente para sua incidência imediata e independente de providência normativa ulterior para sua aplicação. O caráter pleno de eficácia de uma norma diz

respeito à ideia de que, desde a entrada em vigor da Constituição, tais normas produzem, ou têm a possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais relativos aos interesses, comportamentos e situações, que o constituinte direta e

normativamente quis regular, sendo garantida a existência de um aparato jurídico-

institucional para a sua efetivação. (ASENSI, 2010, p.350)

page3image16936

De acordo com a Constituição, o Estado deve assumir políticas sociais e econômicas e ações e serviços de saúde de acesso universal e igualitário. Dessa forma, os serviços de saúde pública devem ser abertos a todos os cidadãos em condições de igualdade. Nessa conjuntura, abrangente e complexa, que se entende o direito à saúde, não se abordando apenas se o Estado precisaria ou não fornecer determinado medicamento ou cirurgia, mas se as políticas estatais são ajustadas para encarar as necessidades da saúde da população em geral.

2 A FUNÇÃO SOCIAL DO MAGISTRADO

A atividade legislatória do Estado é a responsável por delinear os meios de que o mesmo dispõe para concretizar o sistema de saúde. Mas, os direitos sociais, por demandarem uma maior ingerência, bem como a produção de políticas públicas para sua efetivação, fazem com que o foco do setor legislativo do Estado seja desviado para as atividades executiva e judiciária, pois não é bastante apenas que exista a lei, mas é necessário assegurar o gozo dos direitos.

Os direitos fundamentais, formulados pela constituição através de normas necessariamente vagas e genéricas, quando violados ou postos em dúvida só podem ser afirmados, positivados e efetivados pelos tribunais. [...] É perante o Poder Judiciário, portanto, que se pode efetivar a correção da imperfeita realização automática do direito: vãs seriam as liberdades do indivíduo se não pudessem ser reivindicadas e defendidas em juízo. (CINTRA, GRINOVER, DINAMARCO, 2010, p.176)

Considera-se, assim, que a fraqueza dos institutos de representação popular e o desgaste dos ambientes de mediação política e social transmitem ao Poder Judiciário um papel mais ativo em matéria de direitos sociais. O magistrado que age na esfera de um

page4image656 page4image1080 page4image1504 page4image1928 page4image2352 page4image2512 page4image2672 page4image2832 page4image2992 page4image3152 page4image3312 page4image3472 page4image3632 page4image3792 page4image3952 page4image4112 page4image4272 page4image4432 page4image4592 page4image4752 page4image4912 page4image5072 page4image5232 page4image5392 page4image5552 page4image5712 page4image5872 page4image6032 page4image6192 page4image6352 page4image6512 page4image6672 page4image6832 page4image6992 page4image7152 page4image7312

processo de viés coletivo, compõe-se em verdadeiro ator social, participante efetivo para a materialização da paz e da justiça, pois privilegia ao processo decisões compartilhadas e impulsionadas por um diálogo aberto às diversas interpretações para além daquelas ligadas aos intérpretes jurídico-formais da norma. Para Barroso (2009, p.390):

O papel do Judiciário e, especialmente, das cortes constitucionais e supremos tribunais deve ser resguardar o processo democrático e promover os valores constitucionais, superando o déficit de legitimidade dos demais Poderes, quando seja o caso; sem, contudo, desqualificar sua própria atuação, exercendo preferências políticas de modo voluntarista em lugar de realizar os princípios constitucionais. Além disso, em países de tradição democrática menos enraizada, cabe ao tribunal constitucional funcionar como garantidor da estabilidade institucional, arbitrando conflitos entre Poderes ou entre estes e a sociedade civil. Estes os seus grandes papéis: resguardar os valores fundamentais e os procedimentos democráticos, assim como assegurar a estabilidade institucional.

Desse modo, cabe ao magistrado uma atitude ativa enquanto cidadão do Estado Democrático de Direito, pois, além da função política que exerce, em razão dessa postura cidadã, lhe compete a procura pelo real patrocínio dos direitos que baseiam a sua própria existência e a dos demais, assim como a busca pela concretização de uma estabilidade nas relações da comunidade como um todo por meio do privilégio aos Direitos Humanos.

O juiz do Estado Democrático de Direito, privilegia a democracia e iguala a ordem jurídica nacional, internacional e estrangeira sob a ótica da prioridade da dignidade humana, reparando dificuldades à concretização dos direitos. Portanto, não é apenas um intérprete da norma, mas um participador veemente da sociedade e um agente incentivador dos direitos e garantias do cidadão, concretizando os objetivos de um Estado plural.

3 O PAPEL DO JUDICIÁRIO NA EFETIVAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE E OS TRAMITES PROCESSUAIS DE GARANTIAS

O direito à saúde, como já afirmado, é considerado principio fundamental e está garantido na Constituição Federal brasileira, devidamente elencado no artigo 6o da Carta Magna. Dessa forma, é dever do Estado garantir tal direito seja através de suas próprias a ações ou politicas publicas que promovam o acesso a saúde, seja através de intervenção garantidora através do sistema judiciário, principalmente no que tange a eficácia horizontal dos direitos fundamentais, a citar a saúde.

Esta eficácia horizontal pode ser exemplificada nesse caso pelas relações entre particulares que pode ser ilustrada até mesmo por um individuo que contrata um plano de saúde como forma de se precaver ou melhor ser atendido em meio as faltas do Estado. Dessa

page5image656 page5image1080 page5image1504 page5image1928 page5image2352 page5image2512 page5image2672 page5image2832 page5image2992 page5image3152 page5image3312 page5image3472 page5image3632 page5image3792 page5image3952 page5image4112 page5image4272 page5image4432 page5image4592 page5image4752 page5image4912 page5image5072 page5image5232 page5image5392 page5image5552 page5image5712 page5image5872 page5image6032 page5image6192 page5image6352 page5image6512 page5image6672 page5image6832 page5image6992 page5image7152 page5image7312

forma, é cada vez mais comum, porem polemico, o fato de se recorrer ao judiciário para garantir fornecimento de medicamentos ou mesmo atendimentos médico-hospitalar.

Segundo Alexy (2008), princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Portanto, são mandamentos de otimização que podem ser satisfeitos em graus variados pois sua satisfação depende não só de situações fáticas em si, mas jurídicas também. Diferem-se das regras, pois, estas ou são satisfeitas ou não.

Quando se tratar de colisão entre princípios, ou seja, no caso da efetivação de garantia do direito a saúde e qualquer outro principio em contrapartida, como autonomia da administração publica ou privada em seus regimentos, um deles terá que ceder. O jurista, portanto, deverá fazer um sopesamento de interesses conflitantes definindo qual destes interesses - que no plano abstrato encontram-se no mesmo nível, tem maior peso no caso concreto. É perceptível o fato de o direito a saúde se relacionar ao principio da dignidade da pessoa humana e o direito à vida, considerados, para alguns com caráter prima facie, isto é, a máxima de proteção do direito.

Destarte, esse sopesamento é feito na analise do caso pelo jurista através das três máximas da proporcionalidade, segundo o mesmo autor: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Assim, o jurista deve seguir esse protocolo de etapas na analise da colisão entre princípios para definir qual deverá ceder e qual tem caráter precedente.

Para tanto, geralmente são concedidas as medidas liminares, de antecipação de tutela e os mandados de segurança na tentativa de impor aos órgãos vinculados mesmo que administrados pelo Poder Executivo, pois conforme a Constituição quando se trata desses direitos, todos os Poderes devem mover-se para a otimização do fornecimento desses, ainda que se saiba de suas dimensões objetivas e subjetivas de afetação.

A antecipação de tutela é vista na nova redação do art. 273 no Código de Processo Civil com a intenção de afastar os danos materiais decorrentes da demora de uma decisão acerca de um direito material pretendido por autor, concedida liminarmente mediante simples cognição sumaria baseada em prova documental. Alguns requisitos são necessários para a concessão de tutela antecipada como: prova inequívoca de verossimilhança e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. O primeiro item diz respeito a veracidade dos fatos apresentados, ou seja, acolhe-se os fatos apresentados sob a presunção de veracidade. O segundo item relaciona-se ao dano propriamente dito, caso se siga com o processo e em face a sua celeridade possa ocasionar dano irreversível ou de difícil reparação. Esse aspecto é

page6image656 page6image1080 page6image1504 page6image1928 page6image2352 page6image2512 page6image2672 page6image2832 page6image2992 page6image3152 page6image3312 page6image3472 page6image3632 page6image3792 page6image3952 page6image4112 page6image4272 page6image4432 page6image4592 page6image4752 page6image4912 page6image5072 page6image5232 page6image5392 page6image5552 page6image5712 page6image5872 page6image6032 page6image6192 page6image6352 page6image6512 page6image6672 page6image6832 page6image6992 page6image7152 page6image7312

amplamente visto nos casos relacionados a direito à saúde, já que, o fornecimento de medicamentos, por exemplo é de caráter imediato, não podendo o doente esperar o curso normal de um processo e a apreciação do mérito por parte do magistrado com todos os seus requisitos.

O mandado de segurança se trata de um meio constitucional à disposição de pessoa física ou jurídica que protege direito individual ou coletivo, liquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, lesado ou ameaçado de lesão, por ato de autoridade de qualquer categoria ou função. Assim sendo, o papel do juiz ao analisar o caso é identificar esse direito liquido e certo através de documentos o abuso de autoridade numa ação ou omissão ao serviço de saúde quando assim se tratar. O mandado também pode ter como parte e legitimidade ativa para impetrá-lo um individuo apenas, ou a coletividade que geralmente é representada por entidades legitimadas pela lei ou ainda através do Ministério Publico. Em se tratando de direito liquido e certo, conforme texto do inciso LXIX do artigo 5o da Constituição Federal tem-se que este é o direito titularizado pelo impetrante embasada em situação fática perfeitamente delineada e comprovada de plano por meio de prova pré- constituída. (SODRÉ, 2011, p.121)

A título de exemplo nos casos de tutela de direito à saúde o Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de afirmar que:

O direito público subjetivo à saúde representa prerrogativa jurídica indisponível assegurada à generalidade das pessoas pela própria Constituição da República (artigo 196). Traduz bem jurídico constitucionalmente tutelado, por cuja integridade deve zelar, de maneira responsável, o poder público, a quem incumbe formular - e implementar - políticas sociais e econômicas idôneas que visem a garantir aos cidadãos, inclusive aqueles portadores do vírus HIV, o acesso universal e igualitário à assistência farmacêutica e médico hospitalar.")

"O direito à saúde - além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas - representa consequência indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atenção no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional.

A INTERPRETAÇÃO DA NORMA PROGRAMÁTICA NÃO PODE TRANSFORMÁ-LA EM PROMESSA CONSTITUCIONAL INCONSEQÜENTE. O caráter programático da regra inscrita no artigo 196 da carta política - que tem por destinatários todos os entes políticos que compõem, no plano institucional, a organização federativa do Estado brasileiro - não pode converter-se em promessa constitucional inconsequente, sob pena de o poder público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado. (AgRg no Recurso Extraordinário no 271.286-8, DJU 24.11.2000, relator Ministro Celso de Mello)

page7image672 page7image1096 page7image1520 page7image1944 page7image2368 page7image2528 page7image2688 page7image2848 page7image3008 page7image3168 page7image3328 page7image3488 page7image3648 page7image3808 page7image3968 page7image4128 page7image4288 page7image4448 page7image4608 page7image4768 page7image4928 page7image5088 page7image5248 page7image5408 page7image5568 page7image5728 page7image5888 page7image6048 page7image6208 page7image6368 page7image6528 page7image6688 page7image6848 page7image7008 page7image7168 page7image7328

4 POSSIBILIDADES COATORAS PELO DESRESPEITO A LIMINARES CONCEDIDAS

Pelo descumprimento de medidas judiciais atribuídas em prol de garantir o efetivo exercício do direito constitucional a saúde através de fornecimento de medicamentos ou serviços especiais, os magistrados tem amparo nos Códigos de Processo Civil, bem como no Código Penal ou ainda com base na doutrina e jurisprudência.

O artigo 14, caput e inciso V do CPC que regula sobre as astreintes (multas diárias) fixadas com base no entendimento de que o não cumprimento de uma ordem judicial diz respeito a atentado contra a própria ordem e dignidade da justiça, exemplifica tal afirmação:

Art. 14 - São deveres das partes e de todos aqueles que de qualquer forma participam do processo:
V - cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação de provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final.

Parágrafo Único. Ressalvados os advogados que se sujeitam exclusivamente aos estatutos da OAB, a violação do disposto no inciso V deste artigo constitui ato atentatório ao exercício da jurisdição, podendo o juiz, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis, aplicar ao responsável multa em montante a ser fixado de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa; não sendo paga no prazo estabelecido, contado do trânsito em julgado da decisão final da causa, a multa será inscrita sempre como dívida ativa da União ou do Estado.

Outra forma de proceder contra esse tipo de atentado é a estipulação de multas decorrentes do não cumprimento do mandado com base nos artigos 461 e 461-A do CPC conforme descritos:

Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.

Em decisões anteriores de tribunais superiores, a exemplo do STJ que tratou exatamente da matéria no que tange ao fornecimento de medicamentos ou tratamentos médicos especiais , percebe-se ainda a possibilidade de o juiz bloquear valores de cofres públicos tais como da Fazenda Publica Nacional como multa com base no artigo anteriormente citado do CPC:

page8image680 page8image1104 page8image1528 page8image1952 page8image2376 page8image2536 page8image2696 page8image2856 page8image3016 page8image3176 page8image3336 page8image3496 page8image3656 page8image3816 page8image3976 page8image4136 page8image4296 page8image4456 page8image4616 page8image4776 page8image4936 page8image5096 page8image5256 page8image5416 page8image5576 page8image5736 page8image5896 page8image6056 page8image6216 page8image6376 page8image6536 page8image6696 page8image6856 page8image7016 page8image7176 page8image7336

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC – INEXISTÊNCIA. – FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS – ART. 461, § 5o, DO CPC – BLOQUEIO DE VALORES PARA ASSEGURAR O CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL – POSSIBILIDADE.

Tem prevalecido no STJ o entendimento de que é possível, com amparo no art. 461,

§ 5o, do CPC, o bloqueio de verbas públicas para garantir o fornecimento de medicamentos pelo Estado.
Embora venha o STF adotando a "Teoria da Reserva do Possível" em algumas

hipóteses, em matéria de preservação dos direitos à vida e à saúde, aquela Corte não aplica tal entendimento, por considerar que ambos são bens máximos e impossíveis de ter sua proteção postergada.

Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, não provido.

(STJ - REsp 784.241/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 8.4.2008, DJ 23.4.2008 p. 1)

Em termos penais é possível enquadrar pessoas responsáveis por órgãos direcionados em decisões não cumpridas acerca do artigo 319, que prediz a Prevaricação elencada no CP sobre o título de Crimes Contra a Administração Pública e 330 a respeito da Desobediência a funcionário público, a citar o próprio juiz no seu exercício:

O tema é de suma relevância, haja vista que, ainda que ocorrendo sentença favorável ao autor em relação ao fornecimento de medicamentos ou acesso a serviços de saúde, que como já tratado são garantias constitucionais de caráter primordial, atualmente existem inúmeras pessoas que morrem esperando o cumprimento dessa garantia por inúmeros fatores, pois de fato a sentença por si só não é garantia de cumprimento e consequente eficácia da lei em sentido amplo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Compreende-se dessa discussão, que a saúde é responsabilidade primordial do Estado, não sendo uma alternativa, mas sim, um imperativo. Não é contentador apenas afirma-la constitucionalmente, mas sim, torna-la efetiva. É preciso, portanto, que o Estado crie políticas públicas salutares que assegurem esse direito fundamental.

A efetivação desse direito garantida por meio judicial, no caso de não ser oferecido pelo Estado, é um meio de expansão do acesso à saúde e da cidadania. A alta intensidade da procura judicial na área da saúde espelha uma busca de aproximação, de

page8image27992

Artigo 319 - Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá- lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. Artigo 330 - Desobedecer a ordem legal de funcionário público.

page9image656 page9image1080 page9image1504 page9image1928 page9image2352 page9image2512 page9image2672 page9image2832 page9image2992 page9image3152 page9image3312 page9image3472 page9image3632 page9image3792 page9image3952 page9image4112 page9image4272 page9image4432 page9image4592 page9image4752 page9image4912 page9image5072 page9image5232 page9image5392 page9image5552 page9image5712 page9image5872 page9image6032 page9image6192 page9image6352 page9image6512 page9image6672 page9image6832 page9image6992 page9image7152 page9image7312

efetividade desse direito no aspecto primordial do acesso aos meios materiais para sua obtenção.

A efetivação do direito à saúde se depara com múltiplos percalços, tais como ausência de recursos e de políticas públicas ou, ainda, de descumprimento das existentes. Diante disso, aqueles que precisam de remédio indispensável à sua vida se sujeitam a procurar a via jurisdicional para alcançá-lo.

De fato, a judicialização da saúde apresenta modificações expressivas nas relações sociais e institucionais, com desafios para a gestão e para os diversos campos, simbolizando o exercício da cidadania plena e a adequação da manifestação da justiça às novas e crescentes requisições sociais.

Portanto, não há que se pôr condições à saúde em discursos vagos, pois o que se analisa é a vida do ser humano, não podendo esta ser posta em segundo plano. Então, sendo direito constitucionalmente afiançado, a sociedade pode exigir as prestações necessárias à sua consolidação, sendo o direito à saúde de eficácia imediata.

page10image688 page10image1112 page10image1536 page10image1960 page10image2384 page10image2544 page10image2704 page10image2864 page10image3024 page10image3184 page10image3344 page10image3504 page10image3664 page10image3824 page10image3984 page10image4144 page10image4304 page10image4464 page10image4624 page10image4784 page10image4944 page10image5104 page10image5264 page10image5424 page10image5584 page10image5744 page10image5904 page10image6064 page10image6224 page10image6384 page10image6544 page10image6704 page10image6864 page10image7024 page10image7184 page10image7344

REFERÊNCIAS

ASENSI, Felipe Dutra. Judicialização ou juridicização? As instituições jurídicas e suas estratégias na saúde.Physis. Rio de Janeiro, v. 20, n. 1, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010373312010000100004&lng=e n&nrm=iso>. Acesso em: 23 de outubro de 2011.

BARROSO, Carlos Eduardo Ferraz de Mattos. Teoria geral do processo e processo de conhecimento. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

BARROSO, Luís Roberto. Curso de direito constitucional contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. São Paulo: Saraiva, 2009.

CINTRA, Antonio Carlos de Araújo. GRINOVER, Ada Pellegrini. DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. São Paulo: Malheiros, 2010.

GONÇALVES, Vitor Eduardo Rios. Dos Crimes contra a Dignidade Sexual aos Crimes contra a Administração / Vitor Eduardo Rios Gonçalves. – 15. ed – São Paulo: Saraiva, 2011 – (Coleção sinopses jurídicas; v. 10)

RIOS, Roger Raupp. Direito à saúde, universalidade, integralidade e políticas públicas: princípios e requisitos em demandas judiciais por medicamentos. Revista de Doutrina da 4a Região, Porto Alegre, n.13. agosto. 2009. Disponível em: http://www.revistadoutrina.trf4.jus.br/artigos/edicao031/roger_rios.html. Acesso em 22 de outubro de 2011.

SARLET, Ingo Wolfgang. Algumas considerações em torno do conteúdo, eficácia e efetividade do direito à saúde na constituição de 1988. Revista Diálogo Jurídico. Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, n. 10, jan. 2002. Disponível em: <http://www.direitopublico.com.br>. Acesso em: 21 de outubro de 2011.

SODRÉ, Eduardo. Mandado de segurança individual. In DIDIER JR., Fredie. (Org.). Ações Constitucionais. 5. Ed. Bahia : Editora JusPodivm, 2011.