Joana e o papel feminino na religiosidade ocidental

Gustavo Uchôas Guimarães

RESUMO

A mulher, por muito tempo, teve papel secundário na história do catolicismo. Com as conquistas femininas em todos os campos da sociedade, houve naturalmente uma maior abertura à participação das mulheres na Igreja, sendo hoje essencial a presença delas nos serviços religiosos, especialmente no trabalho junto aos pobres e na evangelização. No entanto, já há muitos séculos vêm se destacando no catolicismo personagens que, históricas ou lendárias, demonstram a grande capacidade feminina de superar os preconceitos e se inserir nos postos de liderança da sociedade, casos de Joana D’Arc e da papisa Joana (esta sem a historicidade comprovada), além das santas e doutoras que o catolicismo venera em seus altares. Atualmente, a doutrina católica também tem se mostrado mais aberta e defende a igual dignidade de homens e mulheres, reconhecendo seu importante papel no processo de crescimento do catolicismo no mundo em que vivemos.

Palavras-chave: Catolicismo. Joana D’Arc. Joana de Ingelheim. Doutrina.

ABSTRACT

The woman has long had a secondary role in the history of Catholicism. With women's achievements in all fields of society, there was naturally a greater openness to the participation of women in the church and is now essential to their presence in religious services, especially at work with the poor and evangelization. However, there are already many centuries have stood out in Catholicism characters, historical or legendary, show the great capacity of women to overcome the prejudices and insert themselves into leadership positions in society, cases of Joan of Arc and Pope Joan (this without the historically proven), and the holy doctors and that Catholicism worship at their altars. Currently, the Catholic doctrine has also been shown to be more open and defend the equal dignity of men and women, recognizing its important role in the growth of Catholicism in the world in which we live.

Keywords: Catholicism. Joan of Arc. Joan of Ingelheim. Doctrine.

Introdução

A mulher já teve papel divino na História, emprestando sua feminilidade a representações de deusas em todo o mundo. Em várias civilizações, desde milhares de anos atrás, a mulher foi envolvida em uma aura de mistério, como se fosse conhecedora do curso da vida e tivesse poderes para rompê-la ou prorrogá-la. Foi assim com as Vênus pré-históricas, que davam vida às frágeis tribos constantemente ameaçadas pelos fenômenos de um imenso mundo desconhecido; foi assim com Ísis e Inanna, capazes de ressuscitar divindades; foi assim com Ariadne, cujo engenhoso fio matou um monstro e salvou um jovem do terrível labirinto; e ao longo da História continua sendo com heroínas, deusas e simples mortais que mudam destinos, resgatam vidas ou as fazem perder-se.

Apesar de toda a aura sobrenatural, o mistério da vida foi dominado pela prática da força. Como que desejosos por possuir um inestimável tesouro, o sexo masculino prevaleceu e submeteu a mulher a milhares de anos de servidão. Acusada de seduzir o homem ao pecado, subtraindo-lhe a ligação íntima com o divino, a mulher recebeu uma dura sentença: servir ao homem e sofrer dores para gerar vida. Sob o manto de uma explicação mitológica, o homem deu à mulher tratamento de ser inferior e imperfeito.

A submissão feminina veio acompanhada de resistências. Não são raros os casos de mulheres que, desafiando a suposta ordem universal, ousaram equiparar-se ao homem e superá-lo em habilidade, conhecimento e sabedoria. Em momentos de grande relevância histórica, vemos mulheres por trás dos grandes personagens ou até mesmo mulheres que assumem o protagonismo, a despeito das represálias masculinas. Exemplos não faltam deste destaque feminino em momentos históricos: Ester salvando o povo judeu do extermínio, Joana D’Arc defendendo o povo francês, Marózia entronizando papas. Mais recentemente, a mulher tem assumido governos de países importantes no cenário político e econômico mundial, casos de Angela Merkel na Alemanha e Dilma Rousseff no Brasil.

Dentre tantos aspectos da vida social, a mulher perdeu sua liderança também no campo religioso. Se pesquisarmos a trajetória do ser humano enquanto um ser organizado em tradições religiosas, constataremos como a mulher teve de “descer do pedestal” para ceder seu posto a deuses poderosos e fortes ou a heróis matadores de monstros. Se antes as Vênus pré-históricas eram adoradas como princípios da vida, depois veremos as deusas-mãe sendo suplantadas e submetidas ao poderio de seres masculinos a quem eram atribuídas força e soberania. E aos poucos, deusas são reduzidas para que se evidenciassem os poderes da masculinidade divina. Foi assim, por exemplo, que Astarte, divindade cananeia, foi reduzida pelos hebreus a uma prostituta que os afastava de Iahweh. Mesmo quando a mulher foi exaltada no monoteísmo, esta exaltação se deu em função de sua submissão ao masculino, caso de Maria, mãe de Jesus Cristo, respeitada como modelo de obediência a Deus.

A tradição cristã, modeladora da cultura no Ocidente tal como a conhecemos, herdou do judaísmo um posicionamento que tinha a mulher como ser inferior. Chegou-se até mesmo a pensar na mulher como um ser perigoso, altamente sedutor e que deveria ser constantemente submetido a pesadas disciplinas para alcançar a salvação, já que teria sido a mulher a responsável por corromper o gênero humano em meio ao pecado. Atualmente, as diversas igrejas e comunidades cristãs ocidentais refletem sobre o papel da mulher na sociedade e são mais flexíveis ao permitir que elas atuem em serviços antes considerados “de homem”, embora ainda seja dominante a figura masculina como líder na maioria das igrejas. Citando especificamente o caso da Igreja Católica Apostólica Romana, a presença feminina acabou tornando-se indispensável nos serviços pastorais e caritativos, como podemos atestar, por exemplo, no trabalho feito por Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança, e na participação das mulheres como líderes comunitárias, animadoras de serviços caritativos ou auxiliares do clero em trabalhos junto ao povo onde fica difícil os padres estarem sempre presentes. Apesar de liderada por homens, a Igreja seria menos ativa sem o trabalho das mulheres que tomam a frente dos serviços básicos.

O presente estudo vem discutir a forma como as mulheres têm conquistado seu espaço no meio religioso católico. A discussão não entrará em questões doutrinárias nem se envolverá em dogmas ou normas disciplinares próprias do catolicismo, mas buscará compreender como a mulher tem encontrado seu lugar na sociedade através da tradição religiosa mais antiga e influente do mundo ocidental. A discussão tomará como ponto de partida a história de duas Joanas, uma histórica e outra que divide opiniões a respeito de sua historicidade. A primeira, Joana D’Arc, foi tida como bruxa (o que desencadeou sua morte), mas depois foi reabilitada, chegando aos altares católicos quase 500 anos após sua execução; a segunda, que teria sido papa, é uma figura polêmica que, independente de ter sido uma personagem histórica ou uma lenda, vem ao longo dos séculos sendo tema de estudos, livros, filmes e teses sobre a presença feminina no catolicismo.

Joana D’Arc viveu no século XV, em meio a uma disputa entre franceses e ingleses, a chamada Guerra dos Cem Anos (1337-1453). Serviu ao rei francês por dois anos, até ser presa e queimada como bruxa, em 1431, aos 19 anos de idade. Tendo seu processo anulado em 1456, foi beatificada e canonizada no início do século XX. Já a papisa Joana, segundo estudiosos que se dedicam a sua figura, teria vivido no século IX e ocupado o trono papal com o nome de João VIII, obviamente disfarçada de homem; sua farsa teria sido descoberta quando ela deu à luz um bebê em meio a uma procissão, com o consequente e proposital apagamento de seu nome do Liber Pontificalis, uma lista de papas escrita na Idade Média e que oferece várias informações a respeito do catolicismo em sua milenar trajetória. Não serão discutidos aqui os aspectos teológicos e místicos que envolvem Joana D’Arc e nem a existência e os atos da papisa Joana, mas suas figuras neste estudo apenas darão bases para compreendermos o entendimento católico sobre as mulheres e o crescente envolvimento que hoje elas têm nos assuntos e nas práticas religiosas católicas.

O desenvolvimento deste estudo partirá de pesquisas realizadas em fontes escritas e virtuais, sendo as principais delas: livros didáticos, artigos publicados em páginas virtuais de revistas de História, romances históricos e documentos da Igreja Católica. Além das fontes escritas, também serão pesquisados filmes que falem sobre importantes mulheres na História, destacando “Papisa Joana”, “Joana D’Arc” e “Alexandria”. Em um primeiro momento, serão apresentadas as personagens Joana D’Arc e papisa Joana (no caso desta última, com informações favoráveis e contrárias à sua historicidade), associando suas figuras à luta da mulher por espaço na sociedade através da religião; depois, será exposto o que o catolicismo pensa hoje a respeito dos direitos da mulher e de sua participação na sociedade, principalmente através da cooperação nas ações da Igreja Católica; por fim, todo o trabalho será concluído em considerações que permitam estender os horizontes do tema. No entanto, a discussão sobre o papel da mulher no meio religioso ocidental deve ir muito além deste e de todos os estudos que já foram feitos, a fim de que também a religião possa cooperar na garantia dos direitos da mulher em nosso meio social.

 

1 – Joanas que lutam em meio aos homens

Antes de falar das duas personagens que embasam este estudo, é importante mencionar que a presença feminina nos meios católicos cada vez mais é reconhecida pela Igreja, principalmente nos últimos dois séculos. Deste período, poderíamos mencionar Teresa do Menino Jesus, Madre Teresa de Calcutá, Edith Stein e muitas outras mulheres que contribuíram não só com a Igreja, mas também com a sociedade (basta lembrarmos do trabalho de Madre Teresa entre os pobres da Índia, sendo este trabalho hoje estendido a vários cantos do mundo).

Uma característica que marca as duas Joanas de nosso estudo é a masculinização: em Joana D’Arc, esta característica foi mais discreta, apenas com o uso de trajes masculinos (a fim de evitar assédios), mas sem a ocultação do caráter feminino; já a papisa Joana teria se disfarçado de homem, assumindo o nome de João Ânglico e por muito tempo vivido como se fosse do sexo masculino. Tais atitudes revelam um machismo exacerbado, capaz de ver na mulher nada mais do que um objeto para sanar desejos. Ambas as personagens, ao se vestirem ou viverem como homem, buscaram se resguardar dos apetites masculinos e ter acesso a “mundos” até então tipicamente dos homens.

No caso de Joana D’Arc, o “mundo” a que teve acesso foi o da guerra, considerada perigosa demais para ter a presença de mulheres; e no da papisa, o “mundo” acessado foi o do conhecimento, dominado exclusivamente por homens, considerados superiores em inteligência. Nos dois casos, podemos abrir paralelos históricos que permitem visualizar melhor o anseio das mulheres por alcançar o que era privilégio dos homens, citando os exemplos de Maria Quitéria de Jesus, que no século XIX se disfarça de “soldado Medeiros” para lutar pela independência do Brasil, e Hipácia, filósofa alexandrina dos séculos IV e V, morta por fanáticos cristãos que não aceitavam uma mulher ensinando e influenciando homens.

Joana D’Arc era uma garota pobre e analfabeta do interior da França, nascida em 1412. O contexto de seu país era aterrador, com uma guerra entre franceses e ingleses, por motivos políticos, econômicos e familiares (envolvendo a sucessão no trono francês). Os ingleses mostravam grande força e qualidade bélica, mas os franceses resistiam bravamente aos ataques que lhes tomavam territórios e vidas.

FLORES (2009) destaca que Joana D’Arc “apresenta-se como portadora de uma mensagem de Deus. Joana D’Arc foi um mito vivo, sua trajetória foi surpreendente e intrigante”. Apresentando-se ao rei francês Carlos VII, Joana consegue o comando de uma tropa de 4 mil homens, obtendo a seguir uma heroica vitória, ao retomar para os franceses o domínio sobre a cidade de Orleans. A partir de então, Joana tornou-se famosa por suas vitórias, até ser presa e julgada pelos ingleses. Queimada como feiticeira aos 19 anos de idade, Joana teve seu processo revisto e anulado em 1456, sendo reabilitada pelo papa Calisto III.

No decorrer dos séculos, Joana D’Arc teve sua imagem de heroína construída por diversos autores franceses, até chegarmos à Revolução Francesa (iniciada em 1789), que foi, segundo Amaral (2011), um divisor de águas na maneira de se estudar e interpretar Joana D’Arc. Antes da Revolução, haveria uma Joana defensora da monarquia; depois, Joana passa a ser a representante do povo que combate a tirania do absolutismo governamental.

Nossa outra Joana, a suposta papisa, é objeto de discussões sobre sua historicidade. Donna Woolfolk Cross, escritora norte-americana, publicou o romance “Papisa Joana”, depois transformado em filme. Embora Cross afirme que não pretendera escrever um estudo histórico, ela mesma mostra várias evidências que comprovariam a historicidade de Joana de Ingelheim, disfarçada de João Ânglico para prosseguir em sua sede de estudos e conhecimento. Segundo Cross, a favor da personagem histórica Joana estão, entre outros argumentos, o uso de uma cadeira perfurada para se conhecer o sexo do papa eleito, costume adotado supostamente após a morte de Joana, além do processo envolvendo o “herege” Jan Hus, que acusou o clero de inúmeros crimes, inclusive o de colocar uma mulher no poder papal, sendo esta acusação a única que não foi contestada pelos 28 cardeais, 4 patriarcas, 30 metropolitas, 206 bispos e 440 teólogos presentes em seu julgamento, no século XV. No entanto, contra a historicidade de Joana, portanto considerando-a apenas uma lenda medieval, estão, segundo Lev (2010), a ausência de seu nome na lista de papas e em relatos históricos do século IX, as incertezas sobre seu nome (Giovanna, Agnese ou Giberta) e sua data de eleição papal (847 ou 1087) e a atribuição da criação da lenda aos cátaros, considerados hereges pela Igreja medieval. Seja como for, a personagem Joana, histórica ou lendária, simbolizou no imaginário medieval a possibilidade de uma mulher inserir-se em posições sociais altas, apesar do massacrante domínio masculino.

Recentemente, o cinema colocou em evidência as duas Joanas que estudamos aqui, nos filmes “Joana D’Arc” (Luc Besson, 1999) e “Papisa Joana” (Sönke Wortmann, 2009), mostrando a importância de tais personagens como imagens da luta feminina por espaços no meio social, seja através da religião ou da guerra ou de quaisquer outros meios.

2 – O catolicismo e as mulheres

Durante a instrução a mulher conserve o silêncio, com toda submissão. Eu não permito que a mulher ensine ou domine o homem. Que ela conserve, pois, o silêncio. Porque primeiro foi formado Adão, depois Eva”. (1Timóteo 2,11-13).

O trecho bíblico acima mencionado, escrito pelo apóstolo Paulo, talvez cause espanto aos que vivem no mundo de hoje. As colocações do apóstolo escandalizariam quem hoje acha natural ter uma mulher como chefe ou vê-la assumir as rédeas da família. No entanto, seria um erro analisar o documento de uma época com o juízo de valores de outra época (isto constitui o anacronismo), assim como foi um erro o clero assumir isoladamente este e outros trechos bíblicos para justificar suas pregações que inferiorizavam a mulher ao longo dos séculos. As frases de Paulo sobre o silêncio e a submissão da mulher são mencionadas no romance “Papisa Joana” e no filme “Alexandria” (Alejandro Almenábar, 2009), nas falas de quem procurava menosprezar as personagens principais de ambas as histórias.

Para CARVALHO (s/d), a imagem da mulher submissa foi construída ao longo da Idade Média, através das pregações que expunham a mulher como pecadora, perigosamente ameaçadora à salvação do homem. O modelo deste caráter feminino era Eva, que no relato bíblico levou Adão ao pecado. Por esta razão, à mulher era negado o acesso ao conhecimento, aos cargos públicos e a outros privilégios dados apenas aos homens. No entanto, tal situação da mulher no cristianismo medieval não era absoluta ou fechada a momentos de exceção.

Ao mesmo tempo em que se condenava a mulher por ter levado o homem ao pecado, exaltava-se a figura de santas que dariam exemplo de virtudes e boa conduta a todos os católicos, além de terem se destacado na sociedade cristã medieval mulheres dotadas de grande capacidade intelectual e de liderança. BARRETO (2009) ilustra esta afirmação com os exemplos de Hilda de Whitby (fundadora de conventos no século VII), Hroswhita de Gandersheim (autora alemã de várias peças de teatro, principalmente comédias, no século X), Anna Comnena (fundadora, em 1083, de uma escola de medicina em Constantinopla), Herrade de Landsberg (autora, no século XII, da enciclopédia Hortus Deliciarum, ou “Jardim das Delícias”), a abadessa Heloisa (administradora do mosteiro do Paráclito, no século XII, e professora de grego e hebraico), entre outras mulheres que se inseriram numa sociedade de comando majoritariamente masculino.

Voltando ao trecho bíblico citado no início deste capítulo, seria parcial e tendencioso acusar Paulo de “machista” ou “preconceituoso” nas suas ideias em relação ao sexo feminino. GILLMAN (1998) aponta várias mulheres que fizeram parte da vida do apóstolo Paulo, entre elas Febe e Júnia. Ambas são mencionadas no capítulo 16 da carta aos cristãos de Roma:

“Recomendo-vos Febe, nossa irmã, diaconisa da Igreja de Cencreia. Saudai Andrônico e Júnia, meus parentes e companheiros de prisão, apóstolos exímios que me precederam na fé em Cristo” (Romanos 16, 1.7)

Chamando Febe de diaconisa (um serviço da Igreja de auxílio ao clero) e Júnia de apóstola, Paulo mostra a posição que algumas mulheres tinham na Igreja em seus primórdios. No decorrer dos séculos seguintes, não faltaram mulheres nos altares católicos, embora, segundo Martins, “a figura da mulher raramente era apresentada pelos historiadores, só aparecia marginalmente na história”. Atualmente, com os movimentos de defesa dos direitos da mulher, o sexo feminino tem marcado cada vez maior presença também no catolicismo.

Enquanto uma onda feminista se levantava na década de 1960, a Igreja Católica, reunida no Concílio Vaticano II (1962-1965) pronunciava-se sobre várias questões referentes ao mundo moderno, inclusive os direitos da mulher, como podemos ver em diversos artigos dos documentos do Concílio, no Brasil reunidos em um Compêndio organizado por Vier (2000). Em documentos do Concílio Vaticano II, vemos, por exemplo, a luta das mulheres por paridade de direitos com o homem sendo legitimada como evidência de que os benefícios da cultura devem ser estendidos a todos; ou ainda, vemos a Igreja declarar que homem e mulher têm igual dignidade enquanto pessoas, além de lamentar o fato de que ainda existem mulheres sem acesso à cultura e à educação a que os homens têm acesso (Constituição Pastoral Gaudium et Spes). No campo do trabalho religioso, o Concílio Vaticano II declara ser de grande importância que a mulher participe mais amplamente no apostolado da Igreja (Decreto Apostolicam Actuositatem).

Mais recentemente, a importância da mulher no catolicismo tem sido reafirmada no Catecismo, uma organização de toda a doutrina católica, e em documentos de conferências como a que ocorreu em Aparecida (Brasil), em 2007. No Catecismo, por exemplo, a Igreja volta a condenar a poligamia (como sempre fez em sua história), ampliando a argumentação com a defesa da igualdade entre homem e mulher. No Documento de Aparecida, ao falar sobre a promoção humana, os bispos latino-americanos defendem a acolhida e o acompanhamento das mulheres que sofrem violência física e sexual, além da criação, da parte de toda a sociedade, de oportunidades econômicas para as mulheres marginalizadas.

Não somente no catolicismo, como também em outras igrejas cristãs, a mulher tem ocupado hoje posições importantes, assumindo a responsabilidade em vários serviços, como a caridade e a catequese. Em artigo sobre a atuação do homem e da mulher no cristianismo e na sociedade, Pereira atribui o aumento da participação feminina nos meios religiosos à omissão e ao desinteresse dos homens. Seja como for, não mais passa despercebida a grande presença das mulheres que auxiliam o clero nos trabalhos de evangelização, ajuda aos pobres e expansão da mensagem de Jesus Cristo.

3 – Considerações finais

Atualmente, há uma grande consciência no Ocidente a respeito do papel da mulher na sociedade e de sua capacidade de contribuir para a melhoria das condições em que vive esta mesma sociedade. De dependente do homem e das instituições, a mulher passa a ser protagonista de sua própria história, tomando decisões e agindo conforme suas convicções e crenças.

As formas religiosas do Ocidente, especialmente o catolicismo (um dos objetos deste estudo), têm aberto espaço para que as mulheres atuem e contribuam em seu crescimento junto aos fiéis. Houve, ao longo da História, várias mulheres que, semeando a abertura que hoje se dá ao sexo feminino, lutaram por seu espaço e mostraram que a mulher muito pode fazer pela sociedade. Estas mulheres acabaram ganhando status na História, como heroínas e modelos de luta e perseverança, como é o caso de Joana D’Arc, cujo heroísmo cresceu junto com o nacionalismo francês.

Há muito a se discutir sobre a posição da mulher no catolicismo e nas diversas instituições religiosas ao redor do mundo, principalmente devido ao ainda existente preconceito e discriminação que ocorrem em algumas regiões do planeta, fruto de dinâmicas culturais e tradições que resistem ao tempo. Com os rumos que tomam as sociedades atuais, teremos muitos progressos na participação da mulher em todos os meios sociais, e a religião terá de acompanhar os progressos para ainda oferecer ao mundo de hoje os questionamentos e as respostas que sempre ofereceu para o crescimento do ser humano.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

A Bíblia de Jerusalém. São Paulo: Sociedade Bíblica Católica Internacional e Paulus, 1994.

Catecismo da Igreja Católica. São Paulo: Loyola, 2000. Parágrafos 1645 e 2387.

AMARAL, Flávia Aparecida. História, Revolução e ressignificação: Joana D’Arc na historiografia francesa da primeira metade do século XIX. In: Revista Aedos, número 7, volume 3, Fevereiro/2011, páginas 111 a 127. Disponível em: http://seer.ufrgs.br/aedos/article/viewFile/16019/11363 Acesso em: 30 de agosto de 2011.

BARRETO, Pedro Henrique Quitete. O papel da mulher na Idade Média – Régine Perroud. Disponível em: http://stoa.usp.br/pedrohqb/weblog/65010.html Acesso em: 05 de setembro de 2011. Publicado em: 17 de outubro de 2009.

CARVALHO, Fabrícia A. T. de. A mulher na Idade Média: a construção de um modelo de submissão. Disponível em: http://www.ifcs.ufrj.br/~frazao/mulher.html Acesso em: 28 de agosto de 2011.

CONSELHO EPISCOPAL LATINO-AMERICANO (CELAM). Documento de Aparecida. Brasília e São Paulo: CNBB, Paulus e Paulinas, 2007. 3ª edição. Páginas 181 e 183.

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FLORES, Paula dos Santos. Discussão sobre a questão do nacionalismo na Idade Média. In: Revista Aedos, número 2, volume 2, Junho/2009, páginas 429 a 436. Disponível em: http://seer.ufrgs.br/aedos/article/view/9868/5730 Acesso em: 30 de agosto de 2011.

GILLMAN, Florence Morgan. Mulheres que conheceram Paulo. São Paulo: Paulinas, 1998. Tradução de Suely Mendes Brazão.

LEV, Elizabeth. “A papisa”, história de um papa que jamais existiu. Disponível em: http://www.cleofas.com.br/imprimir.aspx?m=art&cat=108&scat=80&id=497 Acesso em: 28 de agosto de 2011. Publicado em: 26 de outubro de 2010.

MARTINS, Pastor Flat James de Souza. A mulher na História. Disponível em: http://www.iprb.org.br/artigos/textos/art151_199/art159.htm Acesso em: 28 de agosto de 2011.

PEREIRA, Pastor José Maurício. O homem, a mulher, a Igreja e a sociedade. Disponível em: http://www.iprb.org.br/artigos/textos/art51_100/art60.htm Acesso em: 27 de agosto de 2011.

VIER, Frei Frederico (org.). Compêndio do Vaticano II. Petrópolis: Vozes, 2000. 29ª edição.

__________________. Op. cit. Páginas 151, 172 e 199. Constituição Pastoral Gaudium et Spes.

__________________. Op. cit. Página 541. Decreto Apostolicam Actuositatem.

REFERÊNCIAS CINEMATOGRÁFICAS:

ALEXANDRIA (filme). Alejandro Almenábar. Espanha, 2009. 127 min. Son. Color. Aventura/drama/histórico/romance.

JOANA D’ARC (filme). Luc Besson. França, 1999. 124 min. Son. Color. Drama/histórico.

PAPISA JOANA (filme). Sönke Wortmann. Reino Unido/Alemanha, 2009. 149 min. Son. Color. Drama/histórico/romance.