Adriana Azevedo de Araujo Lima
Wilson Moura de Araujo1

INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) assegura ao particular o direito de propriedade (artigo 5º, XXII). Também no Título VII da CF/88, "da ordem econômica e financeira", existem artigos relativos à propriedade enquanto atividade econômica, mais direcionados ao estudo de temas como os "princípios gerais da atividade econômica", explicitados no Capítulo I do mesmo Título.
Especificamente no artigo 170 existem incisos que asseguram o reconhecimento do direito inerente à propriedade privada (inciso II) e à função social da propriedade. (inciso III).
Se analisarmos a idéia de propriedade privada com conotação de liberdade absoluta de uso e domínio particular, enquanto a imposição de que esta mesma propriedade cumpra função social sob pena de possibilidade de intervenção estatal, caso haja interesse público em primazia sobre o particular, por exemplo, a primeira leitura dos incisos supracitados pode fazer surgir certo contra-senso de interpretação, como se houvesse conflito entre os dois incisos. Porém a doutrina aponta e explica o equilíbrio que existe entre os dispositivos.
De acordo com CARVALHO FILHO (2010:840), "a propriedade é instituto de caráter político: a ordem jurídica pode reconhecer, ou não, as características que dão forma ao instituto". Embora o mesmo autor faça menção à propriedade historicamente reconhecida como do direito natural, ressalta a importância da intervenção do Estado no direito de propriedade para assegurar que o "interesse privado não se sobreponha aos interesses maiores da coletividade". Isto significa que, enquanto o art. 5º da CF/88 assegura a tutela jurídica ao direito de propriedade, o art. 170, III, do mesmo documento, impõe limitações ao exercício desse direito, através do direito positivo se sobrepondo ao direito natural.
MEIRELLES (1995:503) esclarece que, através de atos de império, o Poder Público poderá suprimir a conduta privada se esta for considerada anti-social. Em suas palavras:
"Para o uso e gozo dos bens e riquezas particulares o Poder Público impõe normas e limites e, quando o interesse público o exige, intervém na propriedade privada e na ordem econômica, através de atos de império tendentes a satisfazer as exigências coletivas e a reprimir a conduta anti- social da iniciativa particular."

CARVALHO FILHO (2010:843) justifica o direito do Estado em agir, quando faz alusão à competência para o procedimento de intervenção na propriedade. Afirma o autor que é de competência privativa da União legislar sobre direito de propriedade, requisição e desapropriação, de acordo com disposto no artigo 22, I, II, III, da CF/88. Contudo, quando se trata de matéria relativa às restrições e condicionamentos de uso da propriedade, a competência é concorrente, repartida entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Para esta última consideração, MEIRELLES (1995:506) classifica como sendo "medidas de polícia administrativa".
Aliás, este autor apresenta uma forma sucinta de diferenciação das formas de intervenção na propriedade, de acordo com o objetivo a ser alcançado pelo Estado. Para ele, se o Poder Público retira a propriedade para alcançar fim de interesse social ou quer lhe dar destinação pública, o faz através da desapropriação. Se é necessário proteger de situação de iminente perigo público, a forma será a requisição. Quando o objetivo é restrito à ordenar socialmente o uso da propriedade, recorre às limitações ou servidões administrativas.
Quanto ao tombamento, MEIRELLES (1995:486-7) diz ser parte da matéria de domínio público, mais especificamente como patrimônio histórico, abordado em capítulo à parte da intervenção. CARVALHO FILHO (2010:867-83), porém, estuda tombamento dentro da intervenção do Estado na propriedade, mas abre capítulo específico para desapropriação.
O presente trabalho será disposto em subtítulos específicos a cada tipo de intervenção na propriedade. Quando pertinente, far-se-á distinção quanto à forma com que os dois principais doutrinadores em matéria de Direito Administrativo as classificam, como intervenção pelo domínio público, econômico ou garantia de função social. Insta mencionar que abordaremos, neste artigo, apenas as formas de intervenção referentes apenas à desapropriação, servidão administrativa, tombamento e requisição.

2 DESAPROPRIAÇÃO


CARVALHO FILHO (2010:886) conceitua desapropriação como sendo "procedimento de direito público pelo qual o Poder Público transfere para si a propriedade de terceiro, por razões de utilidade pública ou de interesse social, normalmente mediante o pagamento de indenização".
MEIRELLES (1995:508), por sua vez, relata ser o termo "expropriação" sinônimo de desapropriação e assim o conceitua:
"Desapropriação ou expropriação é a transferência compulsória de propriedade particular (ou pública de entidade de grau inferior para superior) para o Poder Público ou seus delegados, por utilidade ou necessidade pública ou, ainda, por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro".

O art. 182 § 3º da CF/88 é claro quando cita "prévia e justa indenização em dinheiro" salvo os casos em que o pagamento é feito com títulos da dívida pública (art. 182, § 4º, III, CF/88) ou da dívida agrária (art. 184 e parágrafos, CF).
Para que ocorra a expropriação de forma legítima, são necessários pressupostos. CARVALHO FILHO (2010:887) cita a utilidade pública (que, de acordo com o mesmo, engloba a necessidade pública) e o interesse social.
2.1 Espécies de desapropriação
CARVALHO FILHO (2010:888-891) classifica as espécies de desapropriação em: ordinária (art. 5º, XXIV, CF/88), urbanística sancionatória (art. 184, § 4º, III, CF/88), desapropriação rural (art. 184, CF/88) e desapropriação confiscatória (art. 243, CF/88).
2.1.1 Desapropriação ordinária
CARVALHO FILHO (2010:888) também a denomina de desapropriação comum, por ser regra geral para as desapropriações. Disposta no art. 5º, XXIV, CF/88, essa desapropriação pode ser tanto amigável quanto judicial. A indenização é prévia, justa e em dinheiro. Pode recair sobre qualquer bem, salvo as vedações legais. Este tipo de desapropriação pode ser efetivado pela União, Estado, Município, Distrito Federal e outras pessoas a quem a lei reconheça tal competência.
O mesmo autor cita dois diplomas que regulamentam esse tipo de expropriação, que são o Decreto-lei 3.365, de 21/06/1941, que trata dos casos de desapropriação por utilidade pública, também conhecido como "lei das desapropriações"; e a Lei 4.132, de 10/09/1962, que define os casos de expropriação por interesse social.
2.1.2 Desapropriação extraordinária
Esta classificação é utilizada por SILVA (2010) e refere-se ao art. 182, parágrafo 4º, III e 184 e parágrafos, CF/88, que diz ser essa desapropriação também tanto amigável como judicial. A autora sub-classifica dois tipos de desapropriação extraordinária:
a) Para fins de Reforma Agrária
CARVALHO FILHO (2010:890) denomina-a de desapropriação rural. A indenização, embora prévia e justa, é paga em títulos da dívida agrária com cláusula de preservação do valor real, resgatáveis no prazo de até 20 (vinte) anos, a partir do segundo ano de sua emissão para terra nua, e em dinheiro para as benfeitorias úteis e necessárias, inclusive culturas e pastagens (art. 184, parágrafo 1ª da CF e Lei Complementar 76/93, art. 14).
O imóvel a ser desapropriado só poderá ser imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social e só poderá ser efetivada a desapropriação pela União e seus delegados que, no caso, é o INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). O ato expropriatório é de competência do Presidente da República ou da autoridade a quem ele delegar poderes específicos.
b) Desapropriação urbanística sancionatória
Para CARVALHO FILHO (2010:889), esta forma de expropriação é adotada com fins de penalização ao proprietário que não promoveu o seu adequado aproveitamento ou após o decurso de cinco anos de cobrança de IPTU progressivo, sem que o proprietário tenha cumprido a obrigação de parcelamento, edificação ou utilização compulsórios.
SILVA (2010) acrescenta que a indenização é paga com títulos da dívida pública municipal de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de resgate de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurado o valor da indenização e os juros.
A mesma autora ressalta que somente poderá incidir sobre propriedade urbana não edificada, subutilizada ou não utilizada, incluída no Plano Diretor e só poderá ser efetivada pelo Município e pelo Distrito Federal. CARVALHO FILHO (2010:889) ainda complementa o entendimento quando fala do Estatuto da Cidade, lei 10.257 de 10/07/2001, que determina os termos em que a desapropriação poderá ser efetivada.
Após a incorporação ao patrimônio público, o Município e o Distrito Federal terão o prazo de cinco anos para dar ao bem desapropriado o adequado aproveitamento, ou poderá alienar ou outorgar o imóvel desapropriado, via licitação, para o adequado aproveitamento (art. 182, parágrafo 4º, II da CF).
2.2 Desapropriação por zona ou extensiva
Para SILVA (2010), refere-se à ampliação da expropriação às áreas que se valorizem extraordinariamente em conseqüência da obra ou do serviço público. O Decreto lei 3.365/41, art. 4º, especifica que:
"a desapropriação poderá abranger a área contínua necessária ao desenvolvimento da obra a que se destina, e as zonas que se valorizam extraordinariamente, em conseqüência da realização do serviço. Em qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis à continuação da obra e as que se destinam à revenda".
2.3 Desapropriação confiscatória
CARVALHO FILHO (2010:889) lembra esse tipo de expropriação e a define como sendo proveniente de culturas ilegais de psicotrópicos, não cabendo indenização ao proprietário, cujo processo encontra regulamentação na lei 8.257 de 26/11/1991.
2.4 Desapropriação de bem público
SILVA (2010) afirma que as entidades de hierarquia maior podem desapropriar bens das entidades de hierarquia menor, ou seja, a União desapropria bens de Estados e Municípios e também bens de autarquias, empresas públicas e sociedade de economia mista criadas pelo Município, Estado, Distrito Federal ou de concessionárias dessas pessoas jurídicas.
CARVALHO FILHO (2010:892) justifica essa possibilidade através do que denomina preponderância do interesse, vez que, em regra, não se admite hierarquia entre entes administrativos. Os Estados desapropriam bens dos Municípios situados em seu território, mas jamais pode desapropriar bens de outro Estado e os Municípios não podem desapropriar bens de outro Município. Qualquer das pessoas políticas pode desapropriar bens de suas respectivas entidades Administração Indireta.
2.4 Retrocessão
SILVA (2010) define retrocessão como o direito que tem o ex-proprietário de exigir de volta o seu imóvel e pleitear o direito a uma indenização (perdas e danos), caso o expropriante não dê ao bem desapropriado a destinação motivadora da desapropriação.
O direito de retrocessão deve ser utilizado pelo expropriado dentro de cinco anos contados do momento em que o expropriante deixa de utilizá-lo numa finalidade pública ou demonstra essa intenção.
A alteração específica da finalidade da desapropriação não enseja retrocessão, se a sua destinação tiver as finalidades de necessidade pública, utilidade pública e interesse social, conforme consta no Decreto lei 3.365 de 1941, art. 35.
MEIRELLES (1995:531) trata de observação interessante no tocante a retrocessão quando afirma ser direito personalíssimo, não cabendo aos herdeiros, sucessores e cessionários, mas somente ao antigo proprietário. É direito inerente ao expropriado e não ao bem, elencado no âmbito da obrigação pessoal.

3 REQUISIÇÃO

O art. 5º, XXV, CF/88, diz: "No caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano".
A requisição pode ser civil ou militar e podem recair sobre bens móveis, imóveis e serviços, ou seja, é a utilização coativa de bens ou serviços particulares pelo Poder Público, por ato de execução imediata e direta da autoridade requisitante.
A depender do tipo de bem requisitado, poderá implicar perda irrecuperável. Se houver dano, caberá indenização ulterior, inexistindo dano comprovado, não caberá indenização.
As formas de requisição civil e militar têm o mesmo conceito e fundamento e são cabíveis no tempo de paz, desde que presente uma real situação de perigo público iminente, divergindo apenas no objetivo.
SILVA (2010) diferencia a civil da militar afirmando que a requisição civil objetiva evitar danos à vida, à saúde e aos bens da coletividade, enquanto a requisição militar objetiva resguardar a segurança interna e a manutenção da Soberania Nacional.
Em tempo de guerra a requisição civil e militar devem atender os preceitos da lei específica, como reza o art. 22, III da CF/88. Por ser ato de urgência, não precisa de prévia intervenção do Poder Judiciário. SILVA (2010) ainda ressalta que a requisição civil de serviços é de competência exclusiva da União.

4 SERVIDÃO ADMINISTRATIVA OU PÚBLICA

MEIRELLES (1995:532) define servidão administrativa ou pública como sendo "ônus real de uso imposto pela Administração à propriedade particular para assegurar a realização e conservação de obras e serviços públicos ou de utilidade pública mediante indenização dos prejuízos efetivamente suportados pelo proprietário".
O Decreto lei n. 3.365 de 1941, art. 40, regula este ato. Na servidão administrativa alguns atributos do direito de propriedade são partilhados com terceiros. Apenas uma parcela do bem tem seu uso compartilhado ou limitado, para atender ao interesse público. A servidão administrativa poderá impor uma obrigação de fazer.
Para SILVA (2010), os entes políticos, empresas governamentais, concessionários e permissionários podem instituir servidão. Seu fundamento é declarado de necessidade pública, utilidade pública ou interesse social. Depois de editado o ato declaratório da servidão, esta poderá concretizar-se por acordo ou mediante sentença do Judiciário em ação movida pelo Poder Público ou seu delegado.
Caso a servidão seja instituída de fato, o proprietário poderá pleitear ressarcimento na via administrativa, não obtendo sucesso ou não pretendendo usar esta via, moverá ação de reparação de dano.
De um modo geral, é um direito real que recai sobre coisa alheia, fazendo com que seja estabelecida uma relação de sujeição entre a coisa serviente e a coisa ou pessoa dominante. CARVALHO FILHO (2010:848) ilustra através de exemplos como a instalação de redes elétricas e a implantação de gasodutos.
No caso da servidão administrativa, o proprietário do bem serviente somente terá direito à indenização se provar a efetiva existência do prejuízo, caso contrário a indenização não será devida.
Em termos práticos, existem servidões que não causam prejuízos ao particular, como no caso, em que é colocada uma placa com o nome da rua em determinado imóvel, e, por isso, não serão indenizadas. Pode-se concluir que constituem elementos essenciais da servidão: o direito real sobre coisa alheia; a sujeição existente entre a coisa serviente e a coisa ou pessoa dominante (servidão real e servidão pessoal, respectivamente); e a utilidade pública, que confere ao Poder Público o direito de usar ou gozar do bem do particular.
As servidões administrativas, via de regra, se constituem em virtude de lei, de acordo entre o particular e o poder público, ou por sentença judicial. Quando constituir-se em decorrência de lei não haverá necessidade de qualquer ato jurídico, seja ele unilateral ou bilateral, basta a publicação da lei para que esteja caracterizada a servidão e para que ela comece a produzir seus efeitos.
Já com a declaração de utilidade pública do imóvel, seu proprietário poderá firmar acordo com o Poder Público acerca da constituição da servidão, dispensando, assim, eventual intervenção judicial.
E, por fim, poderá ser a servidão constituída mediante sentença judicial, que se dará nos casos em que não houver acordo entre o Poder Público e o particular ou se não ocorrer o fenômeno da prescrição aquisitiva em favor do Estado.
CARVALHO FILHO (2010:851) ainda cita a hipótese de que a servidão se dê manu militari, quando a Administração não celebrou acordo com o proprietário nem observou as formalidades necessárias à implementação da servidão administrativa.
O mesmo autor faz menção ao princípio da perpetuidade, que em regra, é característica de qualquer servidão, porém com ressalvas, posto que deverá perdurar enquanto existir a necessidade do Poder Público no uso daquele imóvel, com a sua consequente utilidade.
A incorporação do imóvel serviente aos bens do patrimônio público fará com que a servidão seja extinta, o que também ocorrerá caso ocorra algum fato que torne o imóvel incompatível para o fim a que se destina.

5 TOMBAMENTO

SILVA (2010) define tombamento como forma de intervenção do Estado na propriedade privada, que tem por objetivo a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, assim contemplado pela legislação ordinária como sendo o "conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no país cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos memoráveis da história do Brasil, quer por seu excepcional valor arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico".
A mesma autora afirma que são passíveis de tombamento quaisquer bens móveis ou imóveis, materiais ou imateriais, públicos ou privados, de interesse cultural ou ambiental. Importante ressaltar, entretanto, que somente são passíveis de tombamento as obras do patrimônio histórico e artístico nacional, excluindo-se quaisquer outras obras de origem estrangeira, consoante art. 3º Decreto Lei nº 25 de 1937.
A competência para fazer o tombamento é da União através do IPHAN - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, e pelo Governo Estadual, através do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado, que acompanham todo o procedimento/sucessão de atos até a inscrição do bem no "Livro do Tombo".
CARVALHO FILHO (2010:868) remete ao significado do vocábulo "tombamento", relatando que é sinônimo de inventariar, registrar ou inscrever bens. Que existe no Direito português o Livro do Tombo, assim denominado por situar-se na Torre do Tombo, local em que se depositam os arquivos de Portugal. Em nosso ordenamento, o artigo 216 § 1º da CF/88 e o Decreto lei 25 de 1937 tratam do tema.
SILVA (2010) afirma a existência de uma "restrição parcial", o que não implica em um impedimento ao particular sobre o exercício de seus direitos, uma vez que a propriedade do bem continua sendo sua, passando-se tão somente a ser considerado um "bem de interesse público", ou seja, continua podendo ser livremente utilizado pelo proprietário, e por tal motivo não gera via de regra dever de indenizar, salvo nos casos em que reste comprovada a ocorrência de efetivo prejuízo em decorrência do tombamento.
Poderá ocorrer, entretanto, a necessidade de o poder público impor uma "restrição total" sobre o bem, de modo a impedir o proprietário do exercício de todos os poderes inerentes ao domínio, quando então ao revés de efetuar o tombamento, deverá o poder público desapropriar o bem.
Quanto à preservação do bem, é importante ressaltar que isso continua sendo um dever do proprietário, sendo-lhe inclusive permitida a realização de eventuais reformas, obviamente desde que com a aprovação do órgão que efetuou o tombamento. Tal aprovação depende do nível de preservação do bem e está sempre vinculada à necessidade de serem mantidas as características que justificaram o tombamento. Dessa forma, o órgão responsável pela preservação fornece gratuitamente aos interessados toda a orientação indispensável, a fim de que a reforma por menor que seja, possa ser executada com êxito.
SILVA (2010) classifica o tombamento quanto às modalidades. Assim, o tombamento pode ser constituído de 03 (três) diferentes formas, de Ofício: incide apenas sobre os bens públicos, e se processa com a simples notificação da entidade a quem pertencer ou cuja guarda estiver o bem, seja a União, Estado ou Município; Voluntário: versa exclusivamente sobre os bens particulares, e ocorre através de uma solicitação feita pelo proprietário do bem; Compulsório: realizado por iniciativa do poder público, ainda que contrariando a vontade do proprietário.
Quanto à eficácia, o tombamento pode ser definitivo ou provisório, ambos produzem os mesmos efeitos, com a diferença de que a transcrição no Registro de Imóveis é somente exigível para o tombamento. Por fim, uma última classificação do tombamento diz respeito aos destinatários, sendo Individual: que atinge um bem único e determinado ou Geral: que versa sobre todos os bens situados em determinado bairro ou cidade.
Feitas então essas considerações acerca do tombamento, resta apenas esclarecer em linhas gerais quais as conseqüências/efeitos práticos desse instituto.
É preciso ressaltar sobre as inúmeras obrigações suportadas pelo proprietário do bem tombado. O Proprietário fica sujeito à fiscalização do bem pelo órgão técnico competente, sob pena de multa em caso de opor obstáculos indevidos à vigilância; não pode destruir, demolir ou mutilar o bem tombado sem prévia autorização; também não pode retirar a coisa do país (em se tratando de bens móveis) senão com a finalidade exclusiva de intercâmbio cultural e por curto espaço de tempo; deve realizar obras de conservação necessária à preservação do bem ou, comunicar ao órgão competente tal necessidade; deve também assegurar o direito de preferência da União, Estados e Municípios quando da intenção de alienar onerosamente o bem, sob pena de nulidade do ato e conseqüente punição a ser determinada pelo Poder Judiciário.
Há de se concordar que todas essas "obrigações" devem ser vistas sob a ótica de uma ação estatal que, limitando o direito à propriedade dos indivíduos, busca apenas e tão somente preservar valores supra-patrimoniais, não caracterizando de qualquer forma uma penalização ao indivíduo proprietário do bem tombado, pelo contrário, apenas o constitui como um colaborador ciente de que jamais será lesado, pois deverá se submeter ao ato de tombamento, tão somente para permitir que um bem seu venha garantir a perpetuidade dos valores memoráveis da história do nosso país.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não foi objetivo deste trabalho esgotar o tema proposto, dado à extensão de possibilidades de estudo, mais fácil seria objetivo de conhecer os institutos através de noções básicas de reconhecimento das diferenças entre eles.
O Estado deixa de ser interventor na propriedade privada à medida em que reconhece e assegura o direito à propriedade privada. Todavia, a partir do instante em que o interesse público clama por tutela, proteção, deverá o Estado prover meios que assegurem ao proprietário, quando cabível, a justa indenização pelo bem que possui e que irá necessariamente dispor em favor da coletividade.
A forma pela qual o Estado se utiliza deve estar prevista em lei ou norma constitucional, pelo princípio da legalidade e do respeito à segurança jurídica. Não é o Estado um "Leviatã", um Administrador sem limites, detentor de formas e meios de sobrepor sua vontade, sua discricionariedade aos seus súditos. Mas uma organização política e social que visa atender aos interesses de uma sociedade regida por seus critérios, leis e normas, contanto que atenda ao princípio inerente à supremacia do bem público ao interesse particular.
A CF/88, conhecida como "constituição cidadã", ou "constituição verde", quando se refere aos temas de tutela ambiental, por exemplo, não tem estes codinomes a esmo. Quando se trata de inserção da função social da propriedade como inciso constitucional, significa dizer que o tema patrimonial deverá estar abaixo da dignidade e proteção da pessoa humana.
É esta a função da intervenção estatal na propriedade privada.

REFERÊNCIAS

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 23. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2010. ISBN: 978-85-375-0733-9.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 1995.

SILVA, Flávia Martins André da. Intervenção do estado na propriedade privada. Direitonet. Disponível em <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2633/Intervencao-do-Estado-na-propriedade-privada>. Acesso em 09 mai. 2010.