INTERVENÇÃO DO DESIGN NO ARTESANATO, QUANTO PRESERVAÇÃO DA IDENTIDADE CULTURAL.


Tatiana de Sousa Oliveira1, Maria do Socorro da Silva2, Juliana Loss Justo3


1Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, Brasil
2Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, Brasil
3Universidade Federal do Ceará, Juazeiro do Norte, Ceará, Brasil


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Resumo. Este estudo trata da intervenção do profissional de design em produtos artesanais. A intervenção de designers em culturas locais vem ocorrendo constantemente em territórios nunca antes previsto, promovendo assim, a renovação e em muitos casos a inovação de produtos feitos manualmente. Esta relação gera renda para grupos artesanais, através da inovação nos produtos como estratégias de conquista de mercados.


1. Introdução


Tornar um produto mais competitivo no mercado é uma tarefa árdua, que passa por uma óptica de inovação, comunicação e gestão. Esta dificuldade torna-se ainda mais presente quando se envolve artesanato e seus produtos.
Os produtos artesanais fazem parte da herança cultural de uma determinada região. E nasceram a partir da necessidade do homem de criar e desenvolver ferramentas para garantir a sua sobrevivência, produzindo objetos manualmente. O artesanato vem ganhando novas características e formas de acordo com sua origem e práticas culturais introduzidas ao longo do tempo.
Apesar de o produto artesanal não exigir um nível de instrução e especialização elevado para sua confecção, ele detém características próprias, que confere ao produto artesanal a originalidade e a delicadeza que são perdidas em processos industriais. Entretanto, a crescente industrialização faz dos produtos manuais algo comum e de poucas qualidades para o mercado consumista. Então, para ocorrer a inovação nesses produtos não industrializados acontece a intervenção do designer, que tem como principal premissa inovar produtos que tenham uma certa carga cultural sem fazer com que estes percam a sua identidade inicial. Um exemplo disso vem sendo praticado no projeto Mulheres da Palha, onde acontece uma intervenção no artesanato de palha de carnaúba das artesãs residentes na colina do Horto, em Juazeiro do Norte, Ceará.
Este trabalho tem como objetivo entender como o designer pode desenvolver uma prática de intervenção no artesanato que considere o desenvolvimento autônomo dos sujeitos artesãos, na busca do aperfeiçoamento dos produtos sem que estes percam sua identidade cultural.


2. Metodologia


O desenvolvimento deste trabalho, foi realizado com base em revisões bibliográficas de autores como Ricardo Lima, Ana Vasconcelos, Mário Costa, entre outros, sobre como se dá as intervenções de designs em artesanatos, pretendendo indicar caminhos para o desenvolvimento de produtos juntamente com artesãos, sem que estes percam sua identidade cultural.


3. Resultados e discussão


Um dos aspectos que se destaca na cultura brasileira é sua diversidade, caracterizada pela variedade de produção artesanal tanto nas tipologias quanto nas matérias prima utilizadas em todo o território nacional.
Após o desenvolvimento da indústria, a demanda no mercado por produtos artesanais foi sendo reprimida, tornando-se uma atividade de menor rentabilidade, muitas vezes devido ao fato da grande presença de produtos industrializados, que possuem o preço mais baixo se comparados à produtos artesanais. Para Ana Vasconcelos (2009), Outro problema encontrado, especificamente nos produtos artesanais, é a falta de regionalidade e caracterização dos produtos existentes, é possível perceber que os produtos artesanais estão perdendo sua identidade, devido a novas tecnologias empregadas nas indústrias.


Com o advento da industrialização e a massificação da produção o artesão perdeu seu caráter de produtor tanto de bens de consumo quanto de cultura. Por não ser considerado “útil”, foi relegado a um “segundo plano” pelas sociedades industriais. (VASCONSELOS, 2009, p. 2).


Diante deste fato, as intervenções de design no artesanato, através de processos projetuais e do conhecimento das exigências do mercado, se apresentam como agentes que buscam desenvolver e orientar a produção artesanal, com a responsabilidade e a preocupação de valorizá-las, tornando-as mais atraentes ao mercado, inserindo nestas uma característica mais mercadológica para que possam competir com certos produtos industrializados, sem que isso interfira na sua identidade. Para LIMA(2002) identidade não é uma palavra vazia, desprovida de significado. Usada num sentido mais imediato é aquilo que identifica, é o que nos dá a origem.


Diante dessa proposição, é de suma importância que se tenha sensibilidade para saber identificar as falhas de um produto, e criar soluções para as mesmas, sem que isso implique na perda do valor cultural deste objeto, para que este não se transforme numa mera mercadoria igual a qualquer outra industrial, perdendo assim, sua identidade.
Essa identidade possui a intensão de tornar o produto mais atrativo e rentável, introduzindo neste algumas características que possam lhe conferir um aspecto mais comercial, sem que este perca suas referências culturais. Para isso entende-se necessário o desenvolvimento da parceria entre artesão e designer, onde ambos possam trabalhar com a finalidade de melhorar a produção, como uma das formas de inovação no artesanato.
Em Juazeiro do Norte, a partir de um projeto de extensão premiado pelo Banco Santander, vem sendo praticada uma intervenção no artesanato em palha de carnaúba das mulheres do Horto, tradicionalmente passado de mãe para filha.
Alunos e Professores de design buscam, através de seus conhecimentos e experiências das mulheres, proporcionar melhoras e inovações para os produtos como também a criação de uma identidade visual que as identifique, sem que isto acarrete na perda da identidade cultural do artesanato produzido por elas.
Os designers podem ajudar os artesões na busca de soluções inovadoras para seus produtos, que atendam requisitos de funcionalidade, qualidade, custo, produção, ergonomia, estética, como também a importância da conscientização na utilização de materiais e métodos sustentáveis que vão desde a elaboração do artesanato até seu descarte, diminuindo, portanto danos ambientais, já que o produto final, por interagir no mundo natural do homem, pode causar impacto seja nos hábitos, na cultura, valores ou no ambiente social. O designer pode contribuir também, na elaboração de etiquetas que contenham informações sobre o artesanato e seu criador, na concepção de uma identidade visual simples e direta, que possa representar e divulgar o produto artesanal perante diversos públicos e na elaboração de embalagens que protejam e facilitem o transporte dos mesmos. Em contra partida, os artesões podem contribuir com seus conhecimentos a respeito dos métodos produtivos e matérias primas utilizadas. O diálogo com o artesão é um alicerce, que auxilia os designers no estudo da cultura tradicional da região, por isso artesões devem procurar expor suas opiniões e desejos, assim como seu saber fazer, suas limitações e dificuldades. Para que dessa forma, o designer interprete a mensagem do artesão e através do saber adquirido, encontre uma maneira inovadora para solucionar o problema.
Comumente os produtos artesanais apresentam problemas quanto a sua função ou funcionalidades, que necessariamente não estão ligadas à questões de acabamento, como marcas deixadas pelo fogo, sobras de palha, a não padronização de determinadas peças, entre outras, mais sim a questões de usabilidade.
É importante que quando eu me deite numa cama e me cubra com uma colcha de algodão, que ela não me faça espirrar demais por soltar pelos exageradamente. Agora, jamais quero pensar em interferir nos padrões dessa colcha, nas combinações de cores, na escolha dos tons, de como se processa os desenhos, toda a sua decoração. (LIMA, 2002, p. 30).


Cabe ao designer, saber identificar e solucionar esses tipos de problemas, e não lutar contra as marcas culturais, que possuem um grande valor agregado, mais sim tornar os artesões, conscientes do valor que elas possuem e informar ao mercado sobre a importância desses objetos.


4. Conclusão


Com o passar do tempo o artesanato vem sofrendo uma serie de mudanças, evoluindo para acompanhar as necessidades do consumidor. O design se apresenta como uma ferramenta para ajudar a solucionar produtos. Certamente, o designer pode melhorar aspectos ergonômicos, estéticos e visuais dos produtos artesanais, podendo assim
satisfazer o consumidor, melhorando o conforto e a satisfação. Desse modo o designer vem mais para um fator inovador.
De acordo com a pesquisa aqui descrita, a intervenção do design no meio artesanal é um meio de configurar produtos manuais, para assim, inovar no que é tradicional sem perder a identidade da cultura local. Essa cultura está agregada a diversos valores, como tradição e rusticidade, as quais o designer irá trabalhar em cima, tratando de evidenciar suas qualidades, acalorando a funcionalidade e a originalidade dos produtos que passaram pela intervenção.


Agradecimento


À Universidade Federal do Ceará, campus Cariri por ter me concedido a bolsa de monitoria e a oportunidade de apresentar esse trabalho, como também a minha mãe, a meus professores e aos meus amigos e mulheres do projeto Mulheres da Palha, pela força e companheirismo, que tem para comigo.


Referencias


Lima, R., Artesanato, produção e mercado: uma via de mão dupla, cadernos ArtSol, Programa Artesanato Solidário, São Paulo, 2002.
Pereira, Quesia da C. Design e Artesanato: uma alternativa para o designer pernambucano, Recife, 2004.
Vasconcelos, Ana K. H.; Leal, Rennaly de L. de M.; Silva, Maria V., Intervenção do design num grupo de produção artesanal, Qualit@s Revista Eletrônica ISSN 1677 4280 Vol.9. No 1, 2009.
Costa, Mario B. Contribuições do Design Social - Como o Design deve atuar para o desenvolvimento econômico de comunidades produtivas de baixo valor agregado, 2008.
Fachone, Savana L.; Merlo, Márcia, Designer artesão ou artesão designer? Uma questão
Contemporânea - As aproximações por meio das intervenções de design no artesanato, São Paulo, 2010.
Abbonizio, Marco A. O., Aproximação teórica das intervenções de design no artesanato com os princípios pedagógicos de Paulo Freire: caminhos para uma prática emancipatória, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009.