Introdução

O reprocessamento de artigos médico-hospitalares tem sido discutido e estudado sob os aspectos legais, éticos e de segurança, envolvendo profissionais de controle de infecção, empresas reprocessadoras.
Quando se fala de processamento de materiais médico-hospitalares faz-se referência aos diferentes métodos de desinfecção ou esterilização disponíveis no mercado, no entanto, antes de iniciar qualquer processo todo material deverá passar por um uma fase considerada cada vez mais importante, sem a qual o resultado final ficará seriamente comprometido: é a limpeza, assepsia, cujo objetivo mais relevante é a eliminação da matéria orgânica, pois é nela que os microorganismos se proliferam com maior intensidade.
As micobactérias de crescimento rápido (MRC), como M.fortuitum, M.abscessus, M.chelonae, M.massiliense são comumente encontradas no meio ambiente em solo e fontes de água.
Já foram reconhecidas como contaminantes de medicamentos injetáveis e outros produtos, incluindo artigos e dispositivos para a saúde.
As cirurgias por vídeo incrementam inúmeras vantagens aos procedimentos cirúrgicos convencionais, por serem uma técnica geralmente mais segura e com rápida recuperação dos pacientes, possibilitando breve alta hospitalar e minimizando a dor no pós-operatório. Os riscos de infecção estão relacionados à dose de contaminação versus virulência; à resistência do paciente e ao próprio procedimento cirúrgico.
Recentemente foram descritos surtos por micobactérias de crescimento rápido (MRC) envolvendo procedimentos cirúrgicos e estéticos, como videocirurgias, implante de próteses mamarias, lipoaspiração, mesoterapia e injeções subcutâneas de substâncias sem registro para tratamentos alternativos. Os números são alarmantes e assustadores, já somando 2.025 casos de contaminação registrados em todo o território nacional pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)². Ironicamente, a causadora de todo esse caos na saúde brasileira possui algarismos bem menos expressivos para medir seu tamanho: 0,2-0,6 a 1-10 mm, ou seja, o equivalente a 20 mil vezes menor que uma formiga ou 80 mil vezes mais miúda que um pernilongo.
Ainda que o microorganismo só tenha ganhado destaque nas páginas dos jornais e revistas esse ano, o grande surto da chamada micobacteriose de pele ocorreu entre 2006 e 2007, quando cerca 1.051 pacientes apresentaram sintomas da doença logo após passarem por videolaparoscopias ou por cirurgias estéticas como lipoaspiração e implante de próteses de silicone. O Rio de Janeiro foi o estado mais atingido. Esse ano é o Espírito Santo que lidera a lista de locais com a maior incidência de pessoas infectadas, levando inclusive à decisão extrema da Secretaria de Estado da Saúde de suspender intervenções estéticas, segundo Margareth Dalcolmo23.

Mesmo que não se possua o registro exato do aparecimento do microorganismo, nem se consiga entender como ele penetrou no ambiente hospitalar, muito já se sabe a respeito de seu comportamento no organismo humano. Segundo o chefe do laboratório de micobactérias do Instituto de Microbiologia Prof.Paulo Góes UFRJ5, ele vive no ambiente, é oportunista e, havendo qualquer quebra da barreira epitelial, como uma incisão por um instrumento cirúrgico ou por administração de alguma solução contaminada, ele pode acabar infectando seres humanos e causando granulomas na superfície (lesão histopatológica significativa), que muitas vezes progride para o espaço subcutâneo e órgãos adjacentes, podendo também se disseminar pelo corpo. Há ainda alguns casos raros associados à infecção no trato respiratório inferior.

Em busca de uma resposta para o que estava desencadeando tantos casos de micobacteriose, uma equipe do Ministério da Saúde, realizou um estudo, para o qual foram visitados hospitais e centros de esterilização de material³. Constatou-se, a partir da visita, que o processo de limpeza e desinfecção não era validado, o que em parte pode ser explicado pela inexistência de protocolos de esterilização, fazendo com que cada lugar estabelecesse seu próprio método. É claro, isso tornou visível a deficiência de alguns estabelecimentos e conseqüentemente foi admitida assim, a hipótese de que um dos fatores associado ao surto seja a inadequação dos métodos de higienização dos mesmos.

Entretanto, o Instituto de Microbiologia levanta outra suposição, baseada em resultados divulgados recentemente. Alguns exemplares de M. massiliense isolados durante o surto no RJ foram colocados em contato com a substância comumente usada para fazer esterilização, o glutaraldeído a 2%, pelos seguintes períodos: 30 minutos, 1, 6 e 10 horas. Foram usadas algumas marcas comerciais diferentes o teste foi repetido três vezes.
Os resultados sugerem que a micobactéria pode ser tolerante ao glutaraldeído a 2%, então mesmo que fossem seguidos os procedimentos de limpeza corretos, a infecção não seria evitada.

Ainda são necessários mais testes, que já estão sendo desenvolvidos em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz e com um grupo de São Paulo. É importante ressaltar também que esses resultados não indicam que o desinfetante não esteja funcionando, mas que o protocolo oficial do Teste da Eficácia Micobactericida de Desinfetantes não permite inferir os resultados para todas as micobactérias, provavelmente as propriedades biológicas estão variando de
espécie para espécie.