1 INTRODUÇÃO.

Após um período em que ocorreram diversas reformas legislativas efetuadas no ordenamento jurídico brasileiro, novos questionamentos foram suscitados no âmbito jurídico. Temos em especial, a Emenda Constitucional 45 de 2004, bem como as mudanças que alteraram o diploma processual civil .
Ainda, tivemos a oportunidade de fazer novos questionamentos acerca da efetividade processual como um todo, e principalmente, no que tange ao módulo processual de execução.
Estávamos, portanto, numa fase que tinha como sustentáculo a Emenda Constitucional 45, que instituiu mediante o art5º, LXXVIII os princípios da razoável duração dos processos e da celeridade.
Mister ressaltar, os ventos dessas mudanças ainda surtem efeito, como se verá em breve, com a criação do novo código de ritos civil, que, calcado nestes ensinamentos, pretende encurtar o trâmite processual.
Como se verá no decorrer deste trabalho, a problemática maior do processo trabalhista e que aqui se propugna, se dá no âmbito da execução. No direito processual do trabalho o número menor de recursos e a irrecorribilidade das decisões interlocutórias tornam o módulo processual de conhecimento mais célere, sem atropelar as garantias constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.
Sabendo que a pedra de toque nas demandas trabalhistas, a nosso ver, se dá na execução, nos casos em que o Exequente por anos a fio tenta receber o seu crédito, surge uma oportunidade. Oportunidade esta que seria a ultima ratio da execução, o ato de constrição mais gravoso ao Executado.
Falamos, por certo, da possibilidade da penhora das contas salário, ou seja, nos termos em que orienta o festejado professor Araken de Assis , remuneração da pessoa natural, porquanto apenas um dos créditos elencados no art. 649, IV, do CPC comporta a acepção jurídica salário, conforme o Direito do Trabalho.
Desta forma, inúmeros casos decorrentes da penhora de salário chegaram aos tribunais regionais da federação, bem como ao Tribunal Superior do Trabalho. A divergência acerca do tema ? possibilidade ou impossibilidade da penhora ? acirrou-se, restando ao TST a decisão sobre o tema em comento.
Assim, a mais alta corte brasileira em sede do direito laboral, isto é, o Tribunal Superior do Trabalho, editou uma orientação jurisprudencial, de número 153, proveniente da SDI-2, com o seguinte teor:
ofende direito líquido e certo decisão que determina o bloqueio de numerário existente em conta-salário, para satisfação de crédito trabalhista, ainda que seja limitado a determinado percentual dos valores recebidos ou a valor revertido para fundo de aplicação ou poupança, visto que o art. 649, IV, do CPC contém norma imperativa que não admite interpretação ampliativa, sendo a exceção prevista no art. 649, § 2º, do CPC espécie e não gênero de crédito de natureza alimentícia, não englobando o crédito trabalhista.
Adiante-se, nesta oportunidade, que pedimos vênia, para discordar deste entendimento. Não obstante a existência da orientação jurisprudencial tal posicionamento não merece ser sedimentado sem maiores discussões.
Ocorre que, muito embora a Orientação Jurisprudencial sirva como norte para os casos semelhantes, alguns tribunais regionais vem tomando posicionamento diverso, permitindo a penhora das contas salário de forma limitada, observando o princípio da dignidade da pessoa humana, a efetividade processual, a acepção da palavra prestação alimentícia, dentre outras justificativas.
Comungando desse entendimento, e tendo em vista uma a interpretação conforme a constituição (art. 100, §1º), pergunta-se: é possível penhorar uma conta salário que tem natureza alimentar, em face de crédito trabalhista que possui a mesma natureza? Propugna-se, pois, pela revisão e debate mais aprofundado do tema.
A discussão sobre a possibilidade da penhora de salário não está apenas vinculada ao Direito do Trabalho ? Processo do Trabalho, mas caminha também pela seara civil. Trata-se de uma questão processual de suma importância, adstrita à efetividade processual, uma luta atual do judiciário.
Não é preciso dizer que não se pretende traçar um padrão para o devedor brasileiro, atribuindo a ele a pecha de mal pagador, no entanto sabemos como isso é comum.
É assim, a tão sonhada busca pela efetividade perdida como lembra Mauro Schiavi .
A Lei Maior, com clareza solar, tenta trazer de volta essa efetividade mediante o art. 5º LXXVIII, dizendo que "a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação."
Tal disposição não deve ser jogada ao relento, tratada simplesmente como "norma programática" da constituição. Deve ser em verdade, uma luta constante.
Mutatis mutandis, traçando uma relação com o direito penal, a penhora de salário para a satisfação de um crédito (inicialmente, qualquer que seja este), seria a ultima ratio da execução. A alternativa final para que o direito material se concretize.
No âmbito trabalhista, tendo em vista que a execução movida contra os sócios somente ocorre após a desconsideração da pessoa jurídica, precisamos exaurir todas as tentativas de conseguir o crédito mediante os bens da empresa, para que, uma vez inexistindo esses bens, possamos adentrar o patrimônio dos sócios.
Assim, tratando da efetividade processual, temos o ponto ápice, em que se inicia a execução. O módulo processual de execução, ou fase de execução, consiste na concretização do direito material pretendido na demanda que transitou em julgado. Na fase de cognição, averiguou-se o Direito pretendido, decidindo-se pela procedência ou improcedência dos pedidos da Reclamação Trabalhista.
Adentrando brevemente ao mérito do presente trabalho, é preciso traçar alguns elementos básicos que servirão de base à fundamentação, tendo como base a pesquisa bibliográfica como método utilizado.
Primeiro, trataremos da execução trabalhista de forma geral. Após, precisaremos lembrar que penhora faz parte dos atos de execução, e assim, estamos na fase de execução e ela será analisada no segundo capítulo deste trabalho. Nele ainda nos alongaremos tratando da penhorabilidade dos bens, em especial e como não poderia deixar de ser, o salário.
Em um segundo momento, no capítulo 3 e após a análise do art. 649, IV e parágrafo 2º do mesmo artigo, iremos propor a discussão deste citado artigo sobre uma interpretação teleológica.
Adiante, retomaremos o conceito do que vem a ser salário, suas características, o berço constitucional da proteção ao salário e a sua característica de crédito alimentar.
No quinto capítulo deste trabalho avançamos sobre o prisma dos princípios da execução e dos princípios constitucionais que lhe dão amparo, isto é, o princípio da não prejudicialidade do devedor e o princípio da dignidade da pessoa humana, o princípio da igualdade de tratamento das partes na execução e o princípio da isonomia, efetividade processual e o direito fundamental à tutela jurisdicional e por fim, já quase adentrando ao capítulo seguinte, trataremos do princípio da proporcionalidade
Após a fundamentação principiológica, analisaremos o choque de princípios que envolvem e solucionam toda a problemática. A ponderação de princípios é, sem dúvidas, o ponto fulcral deste trabalho.
Estamos, portanto, diante de um choque entre uma norma e um princípio. Ainda, um choque entre princípios, posto que estes não contemplam apenas um pólo da relação jurídica. Em verdade, resguardam todo e qualquer indivíduo.
Assim, não podemos deixar de solucionar a presente questão. Precisamos dar ao caso concreto a resposta adequada, observando o sistema como um todo, dos direitos e princípios trabalhistas às normas concernentes à execução. Ainda, é preciso ver em que sentido se inclina a carta magna.
O grande desafio deste trabalho será dar ao tema, ao menos, uma solução para o caso concreto. Deverá o julgador analisar atentamente cada nuance que possa interferir na sua decisão.
Por fim, faremos um breve estudo de caso, observando algumas decisões paradigmas sobre o tema, analisando a sua fundamentação em contraponto ao que foi elaborado ao longo deste trabalho.
Acrescente-se, a final, que a pesquisa sobre o tema revelou-se fascinante, uma vez que se tornou possível a cumulação do estudo de institutos de Direitos Constitucional com aqueles próprios do Direito do Trabalho, ainda, com o próprio direito Processual do Trabalho e a legislação subsidiária, isto é, o Direito Processual Civil. Áreas de notável importância e de grande interesse pessoal e profissional.
Observe-se que a discussão cinge-se ainda, numa questão social, a sobrevivência do executado com uma parcela do seu salário sendo retida forçadamente.
Ultrapassada esta breve introdução deste trabalho monográfico, inicia-se o estudo dos temas apresentados.