1.0 Noções Gerais:
Trata-se de imposto cuja competência para criá-lo pertence à União . Nos dizeres de Eliana Calmon, o imposto de importação tem característica essencialmente política econômica, "destinado a proteção de produtos nacionais, tendo secundário significado como fonte de receita".
O imposto de importação - dizem - é o mais antigo já instituído nas relações de comércio. Hodiernamente, destina-se a proteger a indústria nacional frente a produtos estrangeiros que, no mais das vezes, chegam ao Brasil com preços reduzidos. Isto acontece, pois em alguns países a mão-de-obra possui baixos custos ou baixa incidência de tributos.
Portanto, resta claro a natureza extrafiscal do Imposto de Importação. À guisa de revisão, convém transcrever a seguinte lição de Hugo de Brito Machado:
Extrafiscal, quando seu objetivo principal é a interferência no domínio econômico, buscando um efeito diverso da simples arrecadação de recursos financeiros
Atualmente, o imposto de importação é regulado pelo CTN (arts. 19 até o 22) e pelo Decreto-lei 37/66.
2.0 Hipótese de incidência
2.1 Critério material:
O aspecto material da hipótese de incidência do Imposto de Importação está previsto no art. 19 CTN, verbis:
Art. 19. O imposto, de competência da União, sobre a importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada destes no território nacional.
Fazendo coro ao CTN, o art. 1º do decreto-lei 37/66 estatui:
Art.1º - O Imposto sobre a Importação incide sobre mercadoria estrangeira e tem como fato gerador sua entrada no Território Nacional.
Para fins de incidência do imposto, o parágrafo primeiro do artigo supra-escrito também considera estrangeira a mercadoria nacional ou nacionalizada exportada, que retornar ao País, salvo se: (i) for enviada em consignação e não for vendida no prazo autorizado; (ii) devolvida por motivo de defeito técnico, para reparo ou substituição; (iii) por motivo de modificações na sistemática de importação por parte do país importador; (iv) por motivo de guerra ou calamidade pública; (v) por outros fatores alheios à vontade do exportador.
Observo que a "entrada no território nacional" deve ter ânimo definitivo. Ou seja, para que haja a incidência, em seu aspecto material, o produto ou mercadoria deve ingressar no território nacional a titulo definitivo. Não há falar em imposto de importação sobre produto em trânsito pelo Brasil, mas com destino à outro país.
No escólio de Sacha Calmon Navarro:
Por suposto, nos casos dos navios, trens, caminhões e aeronaves que adentram o país de passagem, ou que aqui pousam e estacionam, atracam e depois partem para outros destinos com as mercadorias que transportam, não há cogitar de fato gerador.
No que tange o aspecto material, ainda convém apontar para a existência da isenção quanto aos bens adquiridos no estrangeiro, respeitado o limite de valor estabelecido pelo poder executivo. A chamada isenção quanto à bagagem está previsto no art. 13 do DL 37/66. Ademais, a súmula 64 do STF prevê que "é permitido trazer do estrangeiro, como bagagem, objetos de uso pessoal e doméstico, desde que, por sua quantidade e natureza, não induzam finalidade comercial"
De igual maneira, o art. 14 do mesmo DL ainda prevê a isenção do imposto nos casos de bens de interesse para o desenvolvimento econômico nacional, vejamos
Art. 14 - Poderá ser concedida isenção do impôsto de importação, nos têrmos e condições estabelecidas no regulamento:
I - Aos bens de capital destinados à implantação, ampliação e reaparelhamento de empreendimentos de fundamental interêsse para o desenvolvimento econômico do país;
II - aos bens importados para construção, execução, exploração, conservação e ampliação dos serviços públicos explorados diretamente pelo Poder Público, emprêsas públicas, sociedades de economia mista e emprêsas concessionárias ou permissionárias;
III - aos bens destinados a complementar equipamentos, veículos, embarcações, semelhantes fabricados no país, quando a importação fôr processada por fabricantes com plano de industrialização e programa de nacionalização, aproveitados pelos órgãos competentes;
IV - as máquinas, aparelhos, partes, peças complementares e semelhantes, destinados à fabricação de equipamentos no país por emprêsas que hajam vencido concorrência internacional referente a projeto de desenvolvimento de atividades básicas.
O art. 15 do mesmo diploma ainda prevê uma série de isenções.
Já o art. 17 do DL, prevê que "a isenção do imposto de importação somente beneficia produto sem similar nacional, em condições de substituir o importado", ressalvando alguns casos descritos nos incisos do parágrafo único deste mesmo artigo.
Por fim, o diploma legal de 66 prevê a possibilidade de bens e mercadorias entrarem no território nacional sem que ocorra a incidência de impostos. São elas: (i) o trânsito aduaneiro (art. 73 e 74); (ii) a admissão temporária (arts. 75 a 77); (iv) e o drawback (art. 78).
2.3 Critério espacial
Como se pode presumir, o tributo somente incidirá no território nacional, e o local aonde ocorre a materialização da hipótese de incidência (o fato gerador) são as fronteiras.
É comum, embora equivocada, a confusão entre o critério espacial e o critério temporal. Isto porque, no mais das vezes, o tributo só é cobrado em momento posterior à ocorrência do fato gerador, até porque seria praticamente impossível a cobrança do tributo quando do cruzamento da fronteira. De forma brilhante, Marcelo Guerra Martins resume que não se deve confundir a fronteira (que é o local aonde ocorre o fato gerador) com o local e o momento (aspecto temporal) em que o tributo é exigido.
2.4 Critério temporal
Já o aspecto temporal traz as suas peculiaridades. Conforme ventilado adrede, é praticamente impossível que o tributo seja exigido e pago na fronteira. Aqui, convém ressaltar que, via de regra, o fato gerador ocorrerá no exato momento em que a mercadoria ingressar no território nacional, contudo, até mesmo por questões óbvias, a quitação, o pagamento do tributo é prorrogado para momento posterior, que é o desembaraço.
Parte da doutrina, assim como o STF, entende que o art. 23 do DL 37/66, na verdade, explicita o que o CTN e o art. 1º do mesmo diploma chamam de "entrada no território nacional."
Em que pese as mercadorias despachadas para o consumo, não vemos maiores problemas já que o art. 23 é explicito ao afirmar que "considera-se ocorrido o fato gerador na data do registro, na repartição aduaneira". O antigo TFR chegou a formular uma súmula nesse sentido:
"Súmula 4 ? É compatível com o art. 19 do Código Tributário Nacional a disposição do art. 23 do Decreto-lei nº 37, de 18 de novembro de 1996"
O que, entretanto, deve ser questionado é o critério temporal a ser adotado para as mercadorias despachadas para fins comerciais, já que não há nenhum dispositivo especial como existem para os bens despachados para consumo. A questão é de alta relevância prática, já que o Imposto de Importação não se sujeita, em parte, à anterioridade e a noventena , podendo o Poder Executivo mudar as suas alíquotas através de decreto . Nesse ponto a lição de Hugo de Brito Machado se torna indispensável:
estaria inviabilizada a importação, como atividade empresarial. O Governo poderia levar à ruína qualquer importador com um simples ato de elevação de alíquotas do imposto de importação, o que efetivamente não é compatível com o Estado de direito que assegura a livre iniciativa econômica.
Em outra passagem, ele ainda assevera que:
Não se deve confundir a ocorrência do fato gerador do imposto com a forma pela qual tal ocorrência se exterioriza ou é documentada. Não há de confundir, assim, a entrado do produto estrangeiro no território nacional com o respectivo desembaraço aduaneiro
Trata-se, na verdade, de confusão comum no âmbito do direito tributário, severamente refutada por Paulo de Barros Carvalho, para o qual:
O critério temporal da hipótese tributária como o grupo de indicações, contidas no suposto da regra, e que nos oferecem elementos para saber, com exatidão, em que preciso instante acontece o fato descrito, passando a existir o liame jurídico que amarra devedor e credor, em função de um objeto ? o pagamento de certa prestação pecuniária.
Não obstante a definição precisa e exata do que seja o critério temporal, a confusão entre esta e o "fato gerador" é constante, e segundo Paulo de Barros:
Os estudiosos, os legisladores, e os jurisprudentes passaram a dar nome de fato gerador dos impostos justamente ao critério temporal estabelecido na lei para cada um o que contribuiu para o desalinho teórico
No mesmo, sentido Raquel Novais leciona que:
Sobre o critério temporal da hipótese de incidência, no momento oportuno deste estudo, teremos ocasião de demonstrar ser ele identificável com a entrada da mercadoria entrangeira em território nacional e não com o registro da Declaração de importação "DI"; o registro da DI é o momento correspondente ao lançamento do II, que não se confunde com o evento tributável no lançamento reportado.
Sem mais delongas, já que o propósito deste estudo não nos permite tanto aprofundamento da matéria, concluímos que de fato a Constituição, no seu art. 146, III, conferiu à lei complementar o ônus de estabelecer normas gerais que definam o fato gerador de cada tributo, e por assim ser não vemos inconstitucionalidade no art. 23 desde que incidam tão-somente sobre produtos destinados para consumo. Este, contudo, não tem sido o entendimento da Suprema Corte, para a qual o fato gerador do Imposto de importação é o desembaraço aduaneiro.
3.0 Conseqüência:
3.1 Critério quantitativo
3.1.1 Base de Cálculo
Segundo reza o CTN:
Art. 20. A base de cálculo do imposto é:
I - quando a alíquota seja específica, a unidade de medida adotada pela lei tributária;
II - quando a alíquota seja ad valorem, o preço normal que o produto, ou seu similar, alcançaria, ao tempo da importação, em uma venda em condições de livre concorrência, para entrega no porto ou lugar de entrada do produto no País;
III - quando se trate de produto apreendido ou abandonado, levado a leilão, o preço da arrematação.
Pelo cotejo do texto em análise, temos que a base de cálculo do imposto de importação pode ser uma unidade de medida, o preço normal que o produto alcançaria ao tempo da importação ou o preço de arrematação do produto. Sempre a depender da alíquota utilizada.
Teremos a base de cálculo como unidade de medida quando a alíquota for específica. É o caso, e. g., em que a lei estabelece que deve ser pago uma quantia "x" para cada cm³ de gasolina: nesse caso, a quantia "x" é a alíquota, enquanto que a unidade de medida (cm³) será a base de cálculo.
Noutra alheta, quando a alíquota for ad valorem, ou seja, um percentual (e. g., 30%) a base de cálculo será o preço normal que o produto, ou seu similar, alcançaria, ao tempo da importação, em uma venda em condições de livre concorrência. Nesta senda, calha, por oportuno, a lição de Marcelo Guerra Martins:
Relativamente ao inciso II é de se observar que a base de cálculo não é o preço resultante da compra e venda objeto da importação. Este preço é irrelevante do ponto de vista tributário. Com efeito, a base imponível é o preço normal que o produto alcançaria ao tempo da importação em venda em condições de livre concorrência. Pode até ser que o preços sejam coincidentes ou muito próximos ( o preço do produto na compra e venda para a importação e o referido preço normal), mas não necessariamente isto deva ocorrer.
Sucede que parte da doutrina costuma criticar o modo como o qual é determinado o preço que um bem poderia alcançar ao tempo da importação em condições de livre concorrência. Já nos parece pacífico na jurisprudência que a legitimidade para determinar o valor destes bens pertença aos órgãos do poder executivo . De fato, isso tem sido feito através de tabelas, elaboradas pelo executivo, contendo o valor mínimo de vários produtos.
Ainda sobre o inciso II do art. 20 do CTN, é importante tecer mais duas observações: (i) não obstante a jurisprudência ter pacificado o entendimento de que cabe aos órgãos administrativos do poder executivo estabelecer "o preço normal" do produto, nada impede que aquele que se sentir lesado, ao entender como exorbitante ou elevado o valor arbitrado pelo poder executivo, recorra as vias judiciais. Isso porque ? e aqui já caminhamos para a observação seguinte ? (ii) segundo o entendimento também jurisprudencial a fixação do valor do produto, como ato administrativo que é, deve conter uma motivação expressa.
Esse entendimento já foi, inclusive, alvo de súmula do extinto TFR, in verbis:
"Súmula 97 ? As resoluções do Conselho de Política Aduaneira, destinadas à fixação de pauta de valor mínimo, devem conter motivação expressa"
A base de cálculo do também poderá ser, nos moldes do inciso III, o preço da arrematação, do produto que tenha sido abandonado ou apreendido e levado a leilão.

3.1.2 Alíquota
A alíquota, conforme adiantamos alhures, poderá ser específica, quando for estipulado um valor em função de uma unidade de medida, ou seja, o imposto será de tantos reais por centímetro cúbico ou metro quadrado ou qualquer outra unidade de medida. Poderá, também, ser ad valorem, quando representar uma porcentagem que incidirá sobre o valor do bem.
Consoante afirmamos adrede, quando falávamos sobre o aspecto temporal do imposto de importação, dissemos que ele não se sujeita, em parte, aos princípios da anterioridade e noventena . Resta, entretanto, fazer mais algumas ponderações acerca de tal questão.
Primeiramente, é de salutar importância esclarecer aos desavisados que a Constituição Federal, art. 150. § 1º, previu, no que tange ao imposto de importação (art. 153, I), a possibilidade de se alterar, apenas, as alíquotas através de decreto. Portanto, tem-se que parte do art. 21 do CTN não fora recepcionado pela Constituição Federal, de forma que deve ser excluída de sua redação, quando da interpretação do art., o que diz respeito à possibilidade de alteração da base de cálculo por meio de decreto.
Depois, assim como ocorre com a fixação da tabela de preços para aferir o valor do produto, para fins de determinação da base de cálculo, a alteração da alíquota do imposto de importação deve ser devidamente motivada. Hugo de Brito sintetiza bem a idéia ao afirmar que:
A alteração da alíquota não é ato discricionário. Por isto, para ser válido, há de ser fundamentado, com indicação expressa e específica do objetivo a ser alcançado. Não basta a indicação genérica, como tem acontecido, dizendo-se que a alteração se faz para ajustar o imposto aos objetivos da política cambial e do comércio exterior. O objetivo a ser alcançado tem de ser indicado especificamente, pena de invalidade do ato, que sem essa indicação específica se revela discricionário.
Perfilhamos este entendimento que, por feliz coincidência, tem sido o entendimento dos nossos tribunais. Isto porque, em matéria tributária não se admite discricionarismo, sobretudo no que diz respeito à imposição de valores a serem cobrados. Por tratar-se de caso excepcional, a alteração da alíquota com base em decreto não poderia escapar da necessidade de motivação expressa, já que foge à regra de que o valor do tributo deve ser determinado de acordo com os elementos que devem estar previstos em lei.
Por fim, vale relembrar que o art. 21 do CTN se refere ao "poder executivo" e não "chefe do poder executivo", razão pela qual não há necessidade de decreto presidencial para alteração das alíquotas do imposto de importação, podendo o órgão, devidamente competente (atualmente a CAMEX), do poder executivo alterar as alíquotas através de ato próprio.
3.2 Critério Pessoal
O sujeito ativo do aludido imposto é a União Federal, conforme prevê o art. 153, I da CF, o art. 1º do DL 37/66 e o art. 19 CTN.
Já o sujeito passivo está indicado em 2 dispositivos legais:
CTN - Art. 22. Contribuinte do imposto é:
I - o importador ou quem a lei a ele equiparar;
II - o arrematante de produtos apreendidos ou abandonados.

DL 37/66 ? Art. 31 - É contribuinte do imposto:
I - o importador, assim considerada qualquer pessoa que promova a entrada de mercadoria estrangeira no Território Nacional;
II - o destinatário de remessa postal internacional indicado pelo respectivo remetente;
III - o adquirente de mercadoria entrepostada.
Noutro giro, em conformidade com o art. 121, II, do CTN o art. 32 do DL 37/66 cria hipóteses de responsabilidade pelo pagamento do imposto.
Art . 32. É responsável pelo imposto:
I - o transportador, quando transportar mercadoria procedente do exterior ou sob controle aduaneiro, inclusive em percurso interno;
II - o depositário, assim considerada qualquer pessoa incumbida da custódia de mercadoria sob controle aduaneiro.
Parágrafo único. É responsável solidário:
a) o adquirente ou cessionário de mercadoria beneficiada com isenção ou redução do imposto;
b) o representante, no País, do transportador estrangeiro.
Parágrafo único. É responsável solidário:
I - o adquirente ou cessionário de mercadoria beneficiada com isenção ou redução do imposto;
II - o representante, no País, do transportador estrangeiro;
III - o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora.
Conforme assevera Marcelo Guerra Martins, pouco importa se o importador é pessoa física ou jurídica, estabelecida regularmente ou não. E ainda aponta que "a finalidade da importação (para futura revenda ou para consumo próprio) não é relevante para a sujeição passiva."
Na mesma esteira, Hugo de Brito anota que "a capacidade tributária passiva independe de formalismo, como se pode ver da regra do art. 126 do Código Tributário Nacional".


BIBLIOGRAFIA
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 29ª Edição, São Paulo: Malheiros, 2008.
CALMON, Eliana. Código tributário nacional comentado. (coord. Vladimir Passos). 1ª Edição. São Paulo: RT, 2001.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 1999.
NOVAIS, Raquel. Importo de Importação. Inn Curso de Especialização em direito Tributário: Estudos Analíticos em Homenagem a Paulo de Barros Carvalho (coord. Eurico marcos Diniz de Santi). Rio de Janeiro: Forense, 2007.
MARTINS, Marcelo Guerra. Impostos e Contribuições Federais. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.