IDEOLOGIAS, ILUSÕES E FALSIDADES: a necessidade de se filosofar sobre a comunicação

Afirmava Karl Marx, um grande filósofo alemão, que “a religião é o ópio do povo”. Hoje, ao que parece, a televisão é quem tornou-se o ópio do povo. As imagens, mensagens e filmagens exibidas na televisão tornaram-se as mais sedutoras “substâncias” capazes de entorpecer, acomodar - ou quem sabe alienar – as massas populares, levando-as aos mais diversos desejos, ações e sensações.


No passado, pelo menos por um período de mil anos – tempo de duração da idade média -, a religião era quem dizia a forma do homem pensar, desejar, agir, e “gozar”, de modo que a conduta de toda sociedade era a conduta que o sacerdote determinava dia após dia. A igreja romana impunha como se vestir, comer, beber, pensar, gozar a vida, orar etc. etc. Todos eram doutrinados, ou dogmatizados, conforme as ideologias dos sacerdotes. O decorrer do tempo trouxe a criação de várias tecnologias, das quais destacamos o aparelho de TV, que induz e conduz, aos diversos grupos sociais, a incontáveis ações, reações e, inclusive, ilusões e frustrações, segundo a capacidade de fantasia intelectual de cada indivíduo.


As filmagens, e mensagens, do cotidiano estão dizendo que os seres humanos necessitam de álcool para serem felizes. Outras imagens dizem que os homens são mais importantes e felizes se possuírem um automóvel caro e importado. Mais algumas filmagens “atestam” que necessitamos desta ou daquela tecnologia para sermos mais desejados e felizes. Isto é verdade ou não passa de ideologia criada pelo modo de produção capitalista e disseminada pelas empresas de comunicação, que também é uma empresa capitalista, a qual depende, da mesma forma, das muitas ilusões e dependências de consumo? Os seres humanos tem necessidades e a mídia criou os desejos; mesmo os que são desnecessários à vitalidade humana.


Certamente não é uma maior ou menor quantidade de posses materiais que permite aos homens mais felicidades. Por que as pessoas (com as devidas ressalvas), com grandes somas bancárias, estão se deslocando em carros importados, com ar condicionado, muito confortável, no entanto estão insatisfeitas - ou melhor infelizes - , violentas, agressivas, irritadas, angustiadas etc. etc. Quem poderá dizer onde a FELICIDADE está? Só existe uma forma de ser feliz? Quem é que esta dizendo que para ser feliz é preciso consumir sem freios?


Uns se passaram para afirmar que a felicidade só seria possível na religião; outros disseram, com veemência, que a felicidade está apenas na riqueza e no consumo; mais alguns tiveram a crença que a felicidade estava somente no poder ou com quem detém o poder. Entretanto, como tantas pessoas que vivem nestas condições estão infelizes? Será mesmo que ter dado poder ou riqueza torna alguns homens melhores e mais deleitosos do que outros?


Talvez as pessoas não estejam pensando, ou filosofando, o suficiente para desenvolveram uma razoável consciência e maior liberdade mental. 
Se é verdade que o poder e uma riqueza considerável tornam homens e mulheres melhores e felizes com a vida por que tantos políticos perderam, ou nunca tiveram, a honra, a honestidade, a dignidade, a consciência do justo, uma boa ética/moral? Se é verdade que grandes quantias deixam os mortais melhores, por que muitos capitalistas continuam explorando o trabalho do operário e aumentando sua propriedade de forma injusta, com o esforço laboral e o dinheiro alheios, como é o caso de famintos que vivem de um salário mínimo (miserável para melhor dizer), enquanto seus senhores, ou "donos", lucram milhões? Por quê? Se o consumo de produtos empacotados, engarrafados, enlatados, bens mecânicos e eletrônicos etc. fazem humanos com mais prazer na vida por que uma grande parte da sociedade moderna não está mais satisfeita mesmo consumindo demasiadamente, à medida que também se consome, muitas vezes sem nem saber o porquê consome? Se é verdade que é preciso muitos bens para ser feliz por que um pequeno agricultor é feliz com a chuva que cai? Como pode um pescador encontrar felicidades com sua pesca diária, por mais humilde que seja? Por que uma criança fica muito feliz com o cão amigo que possui, numa convivência de amizade – ou amor – e carinho sólida como uma rocha e resistente como a água que as lâminas não consegue separa? Por que mesmo sem poder econômico nem político um cachorro se sente feliz ao reencontrar um amigo, que pode ser outro cão ou um ser humano. Por quê? Por que um criador se senti feliz com a sua criação, que pode ser um pequeno rebanho de ovelhas; um viveiro com alguns passarinhos; um casal de coelhos ou uma ninhada de pintos igênuos e inocentes? Por que um grupo de crianças - e até adolescentes - brincam, divertem-se e sentem-se felizes com os castelos de areias que fazem numa praia, independente de riquezas, poder, títulos nem vínculos com esta ou aquela religião? O que leva um grupo de gatos amigos, ou filhos da mesma mamãe-gato, a correrem, pularem, rodopiarem de alegria em suas brincadeiras? Como pode um pequeno artesão ser e estar feliz com o seu artesanato, mesmo vivendo em humilde condições econômicas? O que leva um carpinteiro, um ferreiro, um marceneiro etc. a trabalharem satisfeitos com seu ofício? Sem dúvidas é a felicidade. Se é somente apenas por causa das grandes quantias, do poder, ou mesmo de uma religião, que podemos ter felicidades, por que um homem encontra grande felicidade nos filhos amados, obedientes e generosos que possui, ainda que não tenha riquezas, poder político nem seja aderente de nenhuma religião? Por que um casal onde o homem e a mulher sem amam, de verdade, são eles felizes, com o amor que possuem, um com o outro, independente de riquezas, posses e poder? É preciso, e imprescindível, que todos – ou a maioria da nossa sociedade – pense e repense o que a mídia diz, sempre, afinal de contas foi filosofando que os gregos, e outras civilizações exemplares, encontraram respostas certas para perguntas certas e soluções apropriadas para suas problemáticas, sociais e individuais, inclusive de temais universais inerentes a qualquer povo ou sociedade, ou grupos sociais menores; ou específicos.

As antigas imagens, mensagens, de cigarros (malboro, hollywood, arizona) sempre mostravam homens fortes, corajosos, aventureiros, determinados e felizes, como paraquedistas, desportistas, vaqueiros, os quais estavam sempre atrelados ao cigarro, “degustando-o” satisfatoriamente. Certamente, as filmagens dos cigarros queriam dizer, ou induzir, uma das seguintes ideias: ou os homens mais fortes, felizes, aventureiros, destemidos etc. fumam espontaneamente, ou é preciso fumar para ser feliz, ousado, desbravador, livre e satisfeitos com a vida (como os cawboys americanos). Hoje, o mesmo continua acontecendo com as bebidas alcoólicas que estão dizendo que os seres humanos precisam de álcool para gozar ou encontrar a felicidade. A ideia disseminada é que é preciso ingerir álcool para se conquistar um mulherão, ter um grande verão, com bastante satisfação. Mas isto é verdade? As mensagens e imagens transmitidas pela televisão são sinceras?

Todos os anos, o ano todo, dia e noite, a insdústria de comésticos está dizendo, inventando e vendendo cosméticos e mais comésticos, alegando na mídia que milhões e milhões de mulheres, necessitam deles e irão viver e ficar mais felizes se consumirem (em toneladas) este ou aquele produto de "beleza" - muito embora a mãe natureza saiba produzir o belo (uma linda mulher; a chuva que cai; o sol que se põe; uma sinfonia de cantos de aves num bosque; a beleza das flores da primavera etc.), assim como o feio (um corpo em putrefação; um homem esquelético e faminto; um ser humano desfigurado etc.) sem precisar de adornos humanos. Que verdade(s) a televisão está declarando para as mulheres? Para quem serve vender toneladas de bugingangas que muitas vezes pode prejudicar mais do que ajudar a ficar bela? Se consumir incontáveis produtos de maquiagem e/ou beleza causa felicidades, de verdade, por que os salões de beleza estão cheios de pessoas "narrando" suas infelicidades ou insatisfações físicas, emocionais, espirituais, profissionais, intelectuais... Até que ponto é verdade que o consumo de coméstico promove a FELICIDADE? 

Bom seria que as massas sociais observassem bem o que a mídia vai propagando dia após dia, o dia todo, e analisassem, discutissem, desta forma interferindo na realidade, com protestos, manifestos, usando da democracia1, conscientes, com o propósito de conscientizar, reformar e melhorar a qualidade do conteúdo dos meios comunicação social. Mas opinar ou se expressar talvez não seja do feitio do povo sem instrução, sem orientação, propositadamente, possivelmente. Gabriel , o pensador, já dizia em uma de suas músicas, qual seja, “É pra rir ou pra chora”: “(…) o povo sem estudos não dá palpites enquanto nossa República é para as elites”.


A maior qualidade, ou propriedade, das aves é voar, com maestria e simplicidade. A grande característica dos peixes é nadar, independente da água, as grandes ou pequenas profundidades. O maior atributo dos répteis é rastejar. A mais preciosa qualidade dos felinos (mamíferos) é correr, com grande velocidade e habilidades. E do homem, qual é - ou são - sua(s) maior(es) propriedade(s)? O que tem naturalmente de relevante o ser humano? São os aparelhos de DVD, LCD, TV, celulares, iPhone, iPade, tabletes etc. característica nata dos humanos? O que está sendo dito é verdade? O que têm de próprio os seres humanos, assim como todos os animais “irracionais” e seres vivos têm?

No oráculo de Delfos, na Grécia Antiga, ficou registrado uma máxima de Sócrates, um dos mais notáveis filósofos da antiguidade, que dizia: “conhece-te a ti mesmo”. Infelizmente, nas sociedades modernas, os seres humanos estão quase sempre “plugados”, isto é conectados, nesse ou naquele aparelho eletrônico, nessa ou naquela mídia a tal ponto de não pensar sobre si mesmo, na sua condição humana, de forma individual, ou coletiva, seja como um ser natural, ou como objeto ou massa de manobra de quem tem alguma forma de poder, quer econômico, quer político, quer da comunicação de massa etc. O que percebe-se, lamentavelmente, cremos, é que a maior parte da sociedade, em multidões, continua – e possivelmente continuará por tempo incerto – ganhando merrecas, comendo bagatelas, ligada em algumas telas, ouvindo e assimilando balelas, “vivendo” em ruelas e entorpecidos (anestesiados), dependentes e apaixonados por novelas, sempre fixada nelas – ainda que não sirvam para o desenvolvimento intelectual, emocional, moral, mental e espiritual dos humanos.

Mal orientados, ou desorientados, dados grupos sociais vão caminhando e “cantando”, pensando, comendo, vestindo, bebendo, gozando... como dizem uns e outros, ora ali, ora aqui, com este ou aquele meio de comunicação, o qual vai criando muitos servos ou escravos das ilusões construídas pelas mídias; com as devidas ressalvas – como é o caso da produção e programação da TV Brasil, antiga TV Cultura, que contribui para a instrução, informação, desenvolvimento, orientação e liberdades dos indivíduos, individualmente ou coletivamente.

 

 

Referências bibliográficas

 

CHAUÍ, Marilena de Souza. O que é ideologia. 37ª edição. São Paulo: Editora Brasiliense, 1994. (Coleção primeiros passos, nº 13).

______________. Convite à filosofia. São Paulo: Editora Ática, 1995.

COELHO, Teixeira. O que é indústria cultural. São Paulo: Nova Cultural/Editora Brasiliense, 1986. (Coleção primeiros passos, nº 81).

Guaraschi, Pedrinho A. Sociologia crítica: alternativas de mudança. 55ª edição. Porto Alegre: Edipucrs, 2004.

STRENGER, Irineu. História da filosofia. São Paulo: Ltr, 1998.

CLÉMENT, Élisabeth; DEMONQUE, Chantal et. All. Dicionário prático de filosofia. Título original: Pratique de la Philosofhie, de A a Z. Edição original: Hatier, Paris, 1994. 5ª edição portuguesa: Terramar, 2007. Tradução: Manuela Torres, Madalena Bacelar et. all.

 

1É oportuno salientarmos que, infelizmente, apesar de se falar muito em Democracia as massas – ou povo – ainda não tem uma noção plausível do significado ou conceito do que é Democracia. Conceitos como povo, República, Democracia, Estado de Direito, entre tantos outros, não são claramente discutidos e compreendidos no cotidiano das maiorias, uma vez que não existe, de fato, preocupação por parte de quem governa, com a instrução social das massas caminhantes, ainda que sem saber para onde vão, por que vão, como vão etc. Uma grande parte da população não tem consciência que o termo Democracia tem um significado político e jurídico de grande importância, pois é conforme as relações jurídicas entre o povo e o governo que se originar ou um Estado totalitário, autoritário (ditador) ou um Estado democrático, onde neste o povo tem vez e voz. Nas democracias, verdadeiras, o povo protesta, discuti, fomenta e até interfere nas decisões políticas e nas elaboração das leis (justas) que vão reger toda a sociedade. As verdadeiras Democracias exigem participação popular, desde as mais simples coisas até as mais complexas, de modo que ela não admite que o governo vá impondo suas vontades e anseios conforme seu arbítrio, e povo assistindo e aceitando tudo, de forma pacífica, ou, pior ainda, passivamente, sem oposição alguma; sem nem se quer haver discussão entre o povo e o governo.