Logicamente quando se fala em Brasil, sobretudo no exterior, a primeira idéia que surge na mente dos “gringos” é: futebol, carnaval e mulata. Obviamente existem muitas outras características que podemos enumerar nesse rol, no entanto vamos nos ater a essas três, uma vez que simbolizam a hegemonia de pensamentos sobre o Brasil.

Diante dessa realidade, surge um questionamento bastante pertinente. Qual a verdadeira identidade cultura do Brasil? Poderíamos dizer que o Brasil é o país do futebol, do carnaval e da mulata, em tese estaríamos certos, mas, analisando a fundo essas questões podemos nos deparar com uma realidade bastante interessante e que a imensa maioria da população brasileira desconhece. Em primeiro lugar o carnaval não é uma manifestação tipicamente nacional, não nasceu no Brasil, embora a configuração atual de como se comemora a festa sim, é tipicamente brasileira. E é essa configuração que atrai cada vez mais turistas estrangeiros para cá.

Historicamente o carnaval originário tem início nos cultos agrários da Grécia, de 605 a 527 a.C. Com o surgimento da agricultura, os homens passaram a comemorar a fertilidade e produtividade do solo. O primeiro foco de concentração carnavalesca se localizava no Egito. A festa era nada mais que dança e cantoria em volta de fogueiras. Os foliões usavam máscaras e disfarces simbolizando a inexistência de classes sociais. Depois, a tradição se espalhou por Grécia e Roma, entre o século VII a.C. e VI d.C. A separação da sociedade em classes fazia com que houvesse a necessidade de válvulas de escape. É nessa época que sexo e bebidas se fazem presentes na festa.

Em seguida, o Carnaval chega em Veneza para, então, se espalhar pelo mundo. Diz-se que foi lá que a festa tomou as características atuais: máscaras, fantasias, carros alegóricos, desfiles. O Carnaval brasileiro surge em 1723, com a chegada de portugueses das Ilhas da Madeira, Açores e Cabo Verde. A principal diversão dos foliões era jogar água nos outros. O primeiro registro de baile é de 1840. Em 1855 surgiram os primeiros grandes clubes carnavalescos, precursores das atuais escolas de samba. No início século XX, já havia diversos cordões e blocos, que desfilavam pela cidade durante o Carnaval. A primeira escola de samba foi fundada em 1928 no bairro do Estácio e se chamava Deixa Falar. A partir de então, outras foram surgindo até chegarmos à grande festa que vemos hoje.

Analisando todas essas informações, podemos concluir que o carnaval não é brasileiro, suas origens remontam há séculos atrás, bem antes de o Brasil ter sido “descoberto” pelos portugueses. Não podemos afirmar que o carnaval pertence a uma identidade cultural genuinamente brasileira. Embora, como afirmei anteriormente, a configuração do carnaval brasileiro é um atrativo para milhares de “gringos” invadirem o país em busca de diversão e sobretudo da “mulata brasileira”.

O futebol, como outro aspecto da cultura brasileira, não tem suas origens no Brasil, embora, hoje Brasil é sinônimo de futebol. Atentemos então para a origem do futebol.

O futebol, como esporte moderno, foi criado na Inglaterra do século XIX. Entretanto, muitas pesquisas mostram que o jogo de bola, tanto praticado com os pés como com as mãos é praticado bem anteriormente ao século XIX. Alguns estudiosos dizem que a origem deste esporte está na China, há muitos séculos atrás. Dizem que um "esporte" muito parecido com o futebol era praticado por soldados do Imperador Xeng Ti 25 séculos A.C.. A bola era de pele de animal recheada com ferragens . Colocamos o termo esporte entre aspas pois, como sabemos tal palavra só pode ser empregada após o século XIX, e as atividades físicas do período anterior ao contemporâneo podiam ser consideradas mais como rituais religiosos ou como preparação militar do que esporte.
Muitos pesquisadores dizem também que o futebol tem origem em um "esporte" praticado na Itália medieval. "Esporte" aliás, que existe até hoje e é praticado anualmente na cidade de Florença. Estamos falando do Calcio. Tal esporte consiste de um jogo entre duas equipes que, em um campo de terra têm que atravessar uma bola até uma área ao final do campo adversário. O jogo pode ser caracterizado como muito violento, pois os ataques físicos entre os jogadores dos dois times são constantes e permitidos. Os italianos acreditam que a origem do futebol está no Calcio, tanto que, na Itália, o futebol como conhecemos é chamado de Gioco Calcio. Assim como o Calcio, na Inglaterra, um jogo era praticado desde mais ou menos o ano de 1300: o Hurling. Tal jogo tinha características muito parecidas com o Calcio, e era também muito violento.
O Calcio tem características muito parecidas com um esporte que surge na Inglaterra ao mesmo tempo que o futebol: o Rugby. Aliás, podemos dizer que o futebol e o rugby tem uma raiz comum, pois são muito parecidos, e que se dividiram na metade do século XIX na Inglaterra, devido a dissidências na questões das regras entre os participantes. Enquanto o Rugby pode ser jogado com as mão e com os pés, o Football — como o próprio nome diz— só pode ser jogado com os pés, sendo apenas o Keeper que pode pegar a bola com as mãos.

A tese "oficial" que aponta o surgimento do futebol no Brasil é aquela que coloca o filho de ingleses Charles Willian Miller como o patriarca do futebol brasileiro. Em 1894, Miller teria trazido da Inglaterra, onde passara 10 anos estudando, uma bola de futebol, e algumas camisas, e ensinou os sócios do São Paulo Atletic Club (SPAC) a praticarem tal jogo tão difundido na Bretanha. Outras fontes dizem que o Football chegou ao Brasil com marinheiros ingleses em 1872, no Rio de Janeiro. Outros dizem que foram os trabalhadores ingleses das fábricas de São Paulo que trouxeram o futebol. Recentes estudos nos mostraram que o futebol já era praticado no Brasil em diversos colégios pelo Brasil. Em 1880 já se praticava o esporte no colégio São Luiz, em Itu; em 1886 se praticava no colégio Anchieta, no Rio de Janeiro; também no Rio, em 1892, se praticava o "esporte bretão" no colégio Pedro II. A data real do aparecimento do futebol no Brasil realmente não interessa, o que interessa é o caminho que o esporte seguiu no Brasil em seus primeiros anos. Segundo Nicolau Sevcenko o futebol se difundiu por dois caminhos: "um foi dos trabalhadores das estradas de ferro, que deram origem às várzeas, o outro foi através dos clubes ingleses que introduziram o esporte dentre os grupos de elite." . Podemos dizer que Sevcenko tem certa razão. Realmente, podemos perceber, que o futebol no Brasil seguiu estes dois caminhos, mas tais caminhos também se cruzavam. Miller apresentou o futebol à elite paulista, e a sua aceitação foi rápida pelos clubes das diferentes comunidades. Ao mesmo tempo que a elite começava a praticar esse esporte, o futebol se desenvolvia entre a classe operária, tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo. O futebol se expandiu rapidamente pelo Brasil. Os diversos times dos operários das fábricas iam surgindo na várzea paulista, e os clubes iam adotando o esporte em seus quadros.

Concluímos então que não podemos caracterizar o Brasil como o país do carnaval e do futebol do ponto de vista das origens, podemos afirmar que no Brasil o carnaval e o futebol encontram as condições ideais para sua pratica. É como se pudéssemos afirmar que é o no Brasil que essas manifestações culturais encontram seu habitat natural. A identidade cultural do Brasil não pode logicamente estar resumida a essas questões, pois diante de uma vasta diversidade de cultura que aportaram aqui a partir da chegada dos portugueses em 1500, o que surgiria aqui no Brasil, seria a mais singela expressão da mistura de raças, um verdadeiro coquetel de culturas e tradições que a posteriori vão formar a identidade cultural do Brasil.

O que classificar como genuinamente brasileira? A culinária? A música? Sem usar um reducionismo ou mesmo determinismo, poderia dizer que a MULATA é genuinamente brasileira, “produto” tipicamente nacional e um fator a mais de atração para os “gringos” no carnaval. Não seria exagero afirmar que é o que realmente interessa para a maioria dos que aqui desembarcam em busca de diversão, mulatas semi-nuas e a famosa caipirinha, mistura perfeita, para quem enxerga no Brasil um parque de diversões erótico.