Lazer

 

Todos os assuntos ligados aos estudos do lazer são bastante polêmicos. Para não fugir a regra, a questão da ocorrência histórica do lazer também é bastante discutida. Alguns autores consideram que, se os homens sempre trabalharam, também paravam de trabalhar, existindo assim um tempo de não trabalho, e que esse tempo seria ocupado pelas atividades de lazer, mesmo nas sociedades chamadas “tradicionais”. Para outros, o lazer é fruto da sociedade moderna – urbano – industrial. (MARCELLINO, 2006. p. 54).

No cenário internacional, é importante destacar que o interesse pelo lazer e o desenvolvimento das primeiras investigações sistematizadas sobre o assunto têm origem na segunda metade do século XIX. Àquela época, o lazer foi entendido apenas como um tempo disponível depois das ocupações, como pode ser constatado no Dictionnaire de la langue Française, elaborado por Maximilien Littré no decorrer dos anos de 1860. Segundo o sociólogo francês Joffre Dumazedier (1973), esta definição foi reproduzida por vários autores, e somente em 1930 o Dictionnaire,de  Claude Augé, acrescentou um novo significado a este verbete: o lazer passou a ser concebido como distrações, ocupações às quais o indivíduo poderia se entregar  de espontânea vontade, durante o tempo não ocupado pelo trabalho. (GOMES & MELO, 2003)

De acordo com o texto citado anteriormente, pode-se perceber um importante marco histórico no que diz respeito ao lazer. Para alguns autores que estudam lazer, esse fenômeno teria surgido com a Revolução Industrial, o que reforça Gomes (2003), quando fala que para alguns teóricos o surgimento do lazer é associado a essa época em virtude, principalmente, das transformações decorrentes do processo da Revolução Industrial, destacadamente àquelas que levaram à rígida e nítida delimitação da jornada de trabalho. Segundo a autora, essa delimitação da jornada de trabalho acabou distinguindo nitidamente o tempo de trabalho do tempo de não trabalho, ou seja, distinguindo o tempo de trabalho do tempo livre (dentro do qual o tempo de lazer estaria inserido).

Durante muitas décadas, as discussões relativas à temática “lazer” não foram frequentes no Brasil, tanto no âmbito das instituições acadêmicas quanto no das organizações governamentais, já que o assunto era considerado de menor importância, muitas vezes até mesmo não reconhecido como direito social como outro qualquer. (MELO, 2003)

Passa a se perceber uma mudança no que diz respeito ao lazer, na década de 60, com uma visibilidade maior em torno da temática. Apenas a partir da década de 80, muito timidamente ainda, começa-se a tomar uma forma mais estruturada, inclusive em programas governamentais.

Ainda sobre o lazer (MELO, 2003): “Os anos 90 trazem ainda novas preocupações, na medida em que um novo mercado passa a desenvolver-se rapidamente, a exemplo do que já ocorrera na Europa e nos Estados Unidos. A indústria de “Lazer e Entretenimento” organiza-se rapidamente no país, destacando-se o crescimento do turismo e a consolidação do esporte como forte produto de negócios. Tal indústria tem sido apontada como uma das maiores possibilidades de negócios no milênio que está para iniciar-se”.

É notável algumas mudanças no que diz respeito às andanças do lazer entre as décadas de 60 e 90 no Brasil. Enquanto nos anos 60 ela começa a ser vista e um pouco pesquisada nas áreas acadêmicas, nos anos 80, o lazer passa a ser  inserido de forma meio tímida em programas governamentais, já na década de 90, assim como nos Estados Unidos e na Europa, o lazer passa a ser um fator industrial, destacando o aumento do turismo e a consolidação do esporte como produtos de negócios.

O lazer, numa suposta escala hierárquica de necessidades humanas, seria menos importante que a educação, a saúde o saneamento (com certeza todas essas dimensões humanas são fundamentais, mas porque seria o lazer menos importante? Além disso, existe ligação direta entre lazer e saúde, lazer e educação, lazer e qualidade de vida, as quais não podem ser negligenciadas). (Melo, 2003. p. 29).

Muitas vezes o lazer é confundido apenas pelo tempo sobrante do trabalho, mas o lazer não se resume a isso. No entanto, pelo fato de o tempo destinado ao lazer se tornar tão escasso, devido a vários fatores como (sistema capitalista, jornada de trabalho, ocupações domésticas, tempo no trânsito, etc.) se torna adequado afirmar que as atividades de lazer são observáveis no tempo livre das obrigações, sejam elas profissionais, religiosas, domésticas ou decorrentes das necessidades fisiológicas.

O prazer também é adotado equivocadamente de forma isolada, para definir lazer, como citado por Melo, 2003.

O autor que mais influenciou a concepção brasileira de lazer foi o sociólogo francês Dumazedier. O conceito de lazer de Dumazedier (1973, p.34) diz o seguinte: “o lazer é um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se, ou ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares ou sociais”.

O lazer, portanto, opõe-se a obrigações quaisquer que seja. Segundo Dumazedier (2001, p.52), “não subsiste qualquer dúvida de serem classificadas como opostas ao lazer”, as atividades seguintes: O trabalho profissional; O trabalho suplementar ou trabalho de complementação; Os trabalhos domésticos (arrumação da casa, a parte diretamente utilitária da criação de animais destinados à alimentação, da bricolagem e da jardinagem).Atividades de manutenção (as refeições, os cuidados higiênicos como corpo, o sono).As atividades rituais ou ligadas ao cerimonial, resultantes de uma obrigação familiar, social ou espiritual (visitas oficiais, aniversários, reuniões políticas, ofícios religiosos).As atividades ligadas aos estudos interessados (círculos e cursos preparatórios de um exame escolar ou profissional).

Um dos conceitos mais interessantes é o de Oleias (2003): Lazer, em sua forma ideal, seria um instrumento de promoção social, servindo para auxiliar no rompimento da alienação do trabalho, apresentando-se politicamente como um mecanismo inovador aos trabalhadores na medida em que estabelece novas perspectivas de relacionamento social; promover a integração do ser humano livremente no seu contexto social, onde este meio serviria para o desenvolvimento de sua capacidade crítica, criativa e transformadora e proporcionar condições de bem-estar físico e mental do ser humano.

Em concordância com Dumazedier, Melo, 2003 define as atividades de lazer baseado em duas vertentes, uma de caráter social (o tempo), e outro de caráter individual (o prazer).

Para Melo, 2003 podemos definir lazer da seguinte forma:

As atividades de lazer são atividades culturais, em seu sentido mais amplo, englobando os diversos interesses humanos, suas diversas linguagens e manifestações;

As atividades de lazer podem ser efetuadas no tempo livre das obrigações, profissionais, domésticas, religiosas, e das necessidades físicas;

As atividades de lazer são buscadas tendo em vista o prazer que possibilitam, embora nem sempre isso ocorra e embora o prazer não deva ser compreendido como exclusividade de tais atividades.

O conteúdo do lazer, segundo Marcellino (2006, p. 13). “O conteúdo do lazer podem ser os mais variados e para que uma atividade possa ser entendida como lazer é necessário que atenda a alguns valores ligados aos aspectos tempo e atitude [...]”.

Atitude e tempo são caracterizados segundo Marcellino (2006, p. 8). “O lazer considerado como atitude será caracterizado pelo tipo de relação verificada entre o sujeito e a experiência vivida, basicamente a satisfação provocada pela atividade”.        

Ainda segundo o autor

 O lazer ligado ao aspecto tempo considera as atividades desenvolvidas no tempo liberado do trabalho, ou no ‘tempo livre’, não só das obrigações profissionais, mas também das familiares, sociais e religiosas, MARCELLINO (2006, P. 8).

 “A educação é hoje entendida como o grande veículo para o desenvolvimento, e o lazer um excelente e suave instrumento para impulsionar o indivíduo a desenvolver-se, a aperfeiçoar-se, a ampliar os seus interesses e sua esfera de responsabilidade” (REQUIXA, 1979 citado por MARQUES, 1998).

[...] “o lazer, como veículo de educação, potencializa o desenvolvimento social e pessoal dos indivíduos, eis que além de favorecer a compreensão da realidade a partir do aumento da sensibilidade pessoal, auxilia no reconhecimento das responsabilidades sociais.”. (CHEMIN, 2009)

A educação para o lazer, ou a educação para o tempo livre, para sermos mais abrangentes, tem como objetivo formar o indivíduo para que viva seu tempo disponível de forma mais positiva, sendo um processo de desenvolvimento total através do qual in indivíduo amplia o conhecimento de si próprio, do lazer e das relações do lazer com a vida e com o tecido social. Por tal, deve ser considerada um processo integral na vida diária da escola, no sentido de que é necessário ensinar o lazer ativo. (MARQUES, 1998)

Referencias

CHEMIN, B. F. A educação para e pelo lazer no âmbito municipal. Porto Alegre, 2009. Disponível em:

http://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/faced/article/viewFile/5515/4012. Acesso em: 31 de Outubro de 2013, às 20:26h.

MARQUES, A. I. A educação e o lazer. Millenium, 1998. Disponível em: http://hdl.handle.net/10400.19/785. Acesso em 31 de Outubro de 2013, às 21:05h.

GOMES, Christianne Luce; MELO, Victor A. Lazer no Brasil: Trajetória

de estudos, possibilidades de pesquisa. Revista Movimento. Porto Alegre, n.19, 2003.

GOMES, C. L. Significados de recreação e lazer no Brasil: reflexões a partir da análise de experiências institucionais (1926-1964). Tese (Doutorado em Educação) – Universidade Federal de Minas Gerais, 2003.

OLEIAS, V. J. Disponível em: <http://www.cds.ufsc.br/~valmir/cl.html>.

Acesso em: 01 de Novembro de 2013, as 16:32h.

AQUINO, Cássio Adriano Braz; MARTINS, José Clerton de Oliveira. Ócio, lazer e tempo livre na sociedade do  consumo e do trabalho.

Revista Mal-estaR e subjetividade – FoRtaleza – vol. vii – Nº 2 – p.479-500 – set/2007