Baseado no livro de José Carlos Reis, "História da história: Civilização Ocidental e sentido Histórico" faremos uma analise sobre as filosofias da história e sobre o seu desenvolvimento histórico a partir dos Gregos chegando até o século XVIII, onde historiadores tentaram resgatar a idéia de "História Universal".
A preocupação em se estabelecer a História Universal no século XVIII tem a ver com uma busca de identidade. Segundo José Carlos Reis, o mundo Europeu pós-guerra, com sua fragmentação religiosa e seus conflitos existenciais, precisava encontrar uma justificativa para seu expansionismo. Ao estabelecerem a "História Universal", eles legitimaram os motivos para o domínio do mundo, pois eram agentes da modernidade, os que portavam as ferramentas para conduzir os povos à salvação.
José Carlos Reis faz um retorno ao passado para que se possa entender esse pensamento expansionista de "Historia Universal" que se tenta estabelecer na época atual, o século XVIII.
A História foi criação dos Gregos, que vivam a anti-história, por terem mitologias e lendas impregnadas na sua História local. Houve uma tentativa de se eliminar os mitos entre os Gregos, mas isso não foi possível devido ao fato de que esses mitos estavam enraizados na sua cultura. Portanto, embora em Tucídides haja uma conscientização sobre a necessidade de se buscar a verdade dos fatos, a História dos Gregos ainda está repleta da anti-história, com seus mitos e lendas.
A idéia de "História Universal" não estava presente no mundo Grego, eles viviam o agora, não pensavam o futuro, mas sim o eterno. Para os Gregos o mundo era de natureza cíclica, portanto, o futuro não seria diferente do passado e nem do presente.
Nietzsche que fora estudioso do Grego Arcaico fala que para os Gregos qualquer tentativa de se aprender do passado era fútil, pois nada seria diferente e qualquer mudança que porventura ocorresse seria totalmente irracional. Portanto, o homem de amanhã não será melhor do que o de ontem, nem o de hoje.
Na sucessão dos Gregos temos o mundo Romano, que herdou a filosofia Grega e a História. Na concepção Romana já é possível visualizar a "História Universal", contudo o seu sentido final se resume na Romanização do mundo. O final da História para os Romanos é a completa dominação mundial. Portanto a Universalização Romana tinha sentido de dominação, um povo dominando outros povos, no caso Roma dominaria os povos do mundo.
Com o aparecimento do Cristianismo, surge um novo ideal que logo será anexado ao pensamento Romano de "História Universal". Os Cristãos seguem os ideais Judeus de povo eleito, escolhido para a condução da humanidade a uma vida melhor. Eles esperam em Cristo a salvação e vêem nos demais povos a idéia de pagão-mas-também-filho-de-Deus, portanto merecem ouvir as verdades que conduzem a redenção.
Quando ocorre a junção entre esses dois mundos, o Romano e o Cristão, têm-se uma nova concepção de "História Universal": dominação para a salvação. A Roma cristianizada acreditava ser o instrumento de Deus para a salvação da humanidade, portanto, havia uma legitimação divina para sua expansão: levar a salvação para todos os povos.
Diferentemente dos Gregos, na filosofia Judeo-Cristã, a salvação está no futuro. Portanto, é preciso abandonar todas as perspectivas seculares, levando uma vida moderada e abnegada para que se alcance no futuro a salvação. A religião passa a ter uma importância muito grande na vida da humanidade, pois era ela a responsável pelas diretrizes de condução para a salvação.
Nos séculos XVI e XVII ocorre uma fragmentação da História e o campo abrangido são as questões metafísicas. Os historiadores passam a questionar o papel salvador da religião ou da História com sua filosofia Judeo-Cristã. No Renascimento há um rompimento com o futuro e com o passado, voltam-se as ideologias Gregas e o que importa agora é o presente, é preciso viver o hoje. Vigora, portanto, uma filosofia Epicurista de "Comamos e bebamos, pois amanhã morreremos". O passado já não existe, o futuro é incerto, portanto o hoje é a única certeza que nos resta.
A ruptura renascentista com a religião gerou a princípio uma sensação de liberdade, pois não havia mais a quem fazer uma prestação de contas, vigorava a idéia de que era permitida a procura de satisfação imediata.
Mas longe de ser só felicidade, o rompimento com a religião trouxe conseqüências morais desastrosas, dentre elas o irrompimento de guerras e a depravação sexual pela falta de normas, ou melhor, por uma falta de perspectiva para o futuro.
As guerras constantes, os questionamentos e conflitos que vigoram no mundo, provocaram uma perda de identidade no mundo europeu, fazendo com esse mundo fique cheio de fissuras.
O mundo passou a sofre um desencantamento. Matou-se Deus, e agora não há a quem recorrer como salvador da humanidade. A História promoveu o renascentismo que apontou para a vida do presente sem conseqüências no futuro, uma mentira, pois o que vê agora é justamente o mundo entrando em derrocada, onde o sofrimento da humanidade foi fortemente agravado.
Em meio a esta situação caótica, em meio as turbulências, começa-se a pensar o "deve ser" da humanidade. Perguntas de sentido metafísico vão ser feitas como: de onde viemos? Para onde vamos? Qual o objetivo de nossa existência? Existe uma esperança de salvação, se existir, que meios conduzem a este?
O mundo europeu precisava criar uma identidade que fosse condizente com seus objetivos imperialistas e que se encaixasse dentro dos anseios da humanidade atual. Já que houve uma ruptura com a religião outra justificativa precisava existir para que os ideais de expansão europeus, não maculassem a sua identidade, que já se encontrava cheia de fissuras.
Surge então a forma filosófica de se pensar o mundo. As filosofias da História têm como objetivo analisar o mundo através da razão. Trata-se de entender a modernidade com que o mundo se confronta. O moderno pregado pelas filosofias da História rompe definitivamente com a religião. A religião não serve mais como meio de salvação. Não há uma base verdadeira na religião que possa justificar o seu pretendido papel de meio de salvação humana.
Por outro lado, o europeu é detentor do modernismo e tem como obrigação levá-lo ao resto do mundo, mesmo que para isso seja preciso o uso da violência na dominação dos povos. Isso ao mesmo tempo é uma tentativa de europeização do mundo.
Nas filosofias da História procura-se olhar o mundo sob os olhos da razão, mas apontando para a salvação no futuro. Portanto, o modernismo é de natureza ambígua. Por um lado segue a filosofia Grega, com seu pensamento de aproveitar o mundo d agora, os prazeres mundanos devem se vividos. Por outro lado, segue-se a filosofia Judeo-Cristã da salvação no futuro.
Para as filosofias da História o futuro trará uma melhora na situação da humanidade, mas as melhorias vêm através das mãos humanas e não através de um salvador metafísico. A História tem a solução, tem os meios de conseguir a salvação no futuro. Contudo, enquanto não se chega a este futuro promissor, não há nada de errado em se aproveitar dos meios terrenos para a satisfação imediata dos prazeres.
Nesta consideração, José Carlos Reis, nos mostra que a idéia de "História Universal" foi resgatada no século XVIII, com o objetivo de sanar as feridas do mundo europeu e justificar os seus planos de expansão pelo mundo. O mundo foi assim europeizado, a colonização moderna ocorreu com tamanho sucesso que todas as partes do mundo têm sua influencia. Mas uma nova fragmentação da História esta em vistas. Essa nova fragmentação coloca em xeque o valor da História como história. De que modo será lidada essa crise? Sobreviverá a História para o futuro? Na parte final do seu livro José Carlos Reis responderá brilhantemente a esses questionamentos.

Referências:

REIS, José Carlos. História & teoria: historicismo, modernidade, temporalidade e verdade. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007.