A suposta superioridade de uma raça, região ou classe social sobre outra, faz acentuar mais uma falsa superioridade: a da Língua. Crêem os que falam o português das gramáticas que quem não o faz, fala errado, estigmatizando muitos, principalmente, analfabetos e a maioria pobre da nossa população.

O livro A Língua de Eulália, de Marcos Bagno, evidencia o preconceito contra aqueles que falam um português diferente do ensinado nas escolas. Com uma linguagem acessível a qualquer interessado no assunto variedades lingüísticas, a obra traz propostas interessantes em defesa dos brasileiros, que a todo momento são discriminados por falarem uma variedade da língua eleita como padrão. Aprender o português padrão a partir do não-padrao é, por exemplo, uma das propostas inovadoras. As pessoas que falam "ingrês", "craro" e "chicreti" não têm nenhum atraso mental, como supõem alguns, elas seguem apenas uma tendência natural da língua portuguesa de transformar em R o L nos encontros consonantais. Trata-se então, nesse caso, de um fenômeno fonético: o rotacismo.

A assimilação é outro fenômeno fonético que deve ser levado em consideração ao debochar de quem troca LH por I como em "trabaia", ou de quem troca OU por O como em "poco"ou ainda de quem faz a desnazalização das vogais postônicas como em "home", "onte" e "garage". Analisando-se cientificamente a língua não-padrão, ver-se-á que tudo parece erro, tem uma explicação lógica. Contrariando assim, os "policiais da língua": os gramáticos.

O preconceito contra os falantesdo português não-padrão é decorrente de um preconceito social. A ojeriza não está essencialmente na fala, mas na pessoa. Milhões de "Eulálias" continuarão sendo vitimas do deboche quando falam, enquanto a sociedade não compreender que ser diferente não significa ser inferior.