Em minha infância não tão passada, olhava o mundo pelo olhar de uma criança que queria ser um homem de farda, sonhava em ser um policial ou um oficial da Aeronáutica. Era bonito observar aquelas pessoas imponentes.

Fui crescendo e troquei meu sonho por ser um político que pudesse fazer coisas pelos jovens. Achava possível me tornar o primeiro presidente militar da Aeronáutica. Assim estaria unindo os dois sonhos em um. Minha plataforma presidencial tinha o combate ao alcoolismo, devido aos problemas que tinha dentro de minha casa, e com as drogas que estavam apenas começando a se tornar moda, a laçar traiçoeiramente os jovens.

Mas o tempo passou. Veio a Abertura Política com o Presidente General João Batista Figueiredo. Foi o princípio do fim de meus sonhos. A imprensa teve liberdade de expressão, a repressão acabava e as verdades foram aparecendo, principalmente na área militar. Comecei a ver, já adulto, o que se escondia por trás das fardas.

Com o fim da Ditadura militar, os investimentos nas Forças Armadas caíram drasticamente, passamos a ter uma armada defasada e obsoleta. Nossos navios, aviões e armas são ultrapassados, compradas de ferro velho de países avançados. Ou seja, ficamos com o resto dos restos. Ser piloto da Aeronáutica me parecia perigoso. Não por voar em aviões considerados arcaicos, mas por não serem competitivos em caso de guerra, seria alvo fácil. Então desisti de vez de entrar para as Forças Armadas. Caia um sonho.

Quanto a ser policial demorou um pouco mais para eu desistir. Tentei e fui reprovado no psicotécnico, pasmem, por ser inteligente e ter personalidade forte. Eles queriam alguém para ser comandado e não para comandar, o que seria perigoso, segundo o psicólogo tentando me explicar e consolar.

Mas é assim mesmo. Meus heróis morreram por culpa de uma democracia que não quer seres pensantes, com autonomia. Criar uma Armada com capacidade de fogo seria colocar em risco o que tinham derrubado: os militares. Criar uma Segurança Pública que usa inteligência ao invés de armas também é arriscado, afinal, qual político poderia ser inocentado ou corromper um policial pensante? Não querendo dizer que nossos policiais não pensam ou são incapazes, longe disso. O problema é que o investimento em segurança tira verbas de gabinetes e são perigosos para os filhos desses mesmos políticos. Então os policiais continuam com armas que não chegam aos pés das usadas por bandidos.

No mesmo caminho de heróis mortos está a educação. Esta já respira com ajuda de aparelhos, está moribunda. Nossos políticos tentam com todas as forças o direito de praticarem a eutanásia para aliviar a educação dos sofrimentos em um leito do qual será difícil sair. Mas nós professores buscamos ar onde não seria mais possível. Somos heróis em um país em que o presidente Lula afirma: "desde Cabral a educação foi programada para não haver. Portugal e a burguesia secular jamais quiseram que o povo aprendesse. Educação é liberdade, entendimento, perigoso!"

Está entranhada na alma da política brasileira a ideia de que pobre não precisa estudar. E muitos acham que é até melhor que sejam analfabetos. São mais fáceis de enganar, basta que saibam servir.

De nada adianta professores fazerem grave por reivindicações salariais, pois se a educação pública brasileira parar não fará falta na concepção dos políticos. Pelo contrário, estaria indo a favor deles. Menos educação e estrangulamento da dignidade da classe que já anda ainda mais moribunda são tudo o que a educação alcançaria com seu movimento grevista.

A solução está nas mãos da sociedade. A mesma que vê o professor como acessório educacional familiar. Aquele que ganha para educar o filho que não tem a presença efetiva dos pais no lar. A mesma sociedade que enxerga a escola como "creche" e não como estabelecimento fornecedor de conhecimento. Esta sociedade então deveria ter um respeito maior pela classe educacional, já que é um acessório de luxo, e escolher em quem depositar confiança nas eleições e escolher um "senhor" que valorize e apóie a educação.

Ser professor no Brasil é ser herói sem capa e espada que luta contra a injustiça mesmo sendo um dos oprimidos. Sem salário digno e sem a própria dignidade.