Sobre o conceito de herança jacente podemos apreciar a lição de Alexandre Freitas Câmara, segundo o autor falecendo alguém sem deixar herdeiros, ou que não tenha herdeiros conhecidos, dá-se o fenômeno a que se denomina herança jacente.

            Assim sendo, tendo alguém falecido sem deixar herdeiro. (ou se não houver herdeiros conhecidos), ou se herdeiros renunciarem à herança (art. 1.823 do C.C. 2002), estar-se-á diante de uma herança jacente. Neste caso, e depois de preenchidos certos requisitos, os bens do espólio se transmitirão ao Município onde os mesmos estiverem localizados (ou ao Distrito Federal), nos termos do art. 1.822 do C.C. 2002. Estando os bens em algum Território Federal, passarão ao patrimônio da União.

            Como se verá adiante, a entrada dos bens no patrimônio do Município ou do Distrito Federal só estará definitivamente acertada depois da declaração de vacância da herança jacente, e passados cinco anos da abertura da sucessão. Discute-se, porem, se é aplicável à hipótese o principio da saisina, estabelecido pelo art. 1.784 do C.C. 2002, segundo o qual a transferência da propriedade para o patrimônio do sucessor se dá no momento da abertura da sucessão. – na opinião de A. Câmara esse princípio é perfeitamente aplicável à hipótese, isto é o Município, o Distrito Federal ou a União passa a ser proprietário desde logo do patrimônio deixado pelo de cujus sem herdeiro, ao menos não conhecido, pelo fato que cabe aqueles suceder na herança vacante.

            Câmara, ainda reitera sua posição dizendo que, o Código Civil de 2002 não repete o Código de 1916 art. 1.603, inc. V, mas é claro em afirmar que o bem, não havendo outro sucessor, passa para o patrimônio da fazenda Pública. Não se pode, pois, negar-lhe a condição de herdeiro. Alem disso, a posição contraria levaria a afirmar que entre a abertura da sucessão e o decurso do prazo de cinco anos após o qual os bens da herança vacante entrariam no patrimônio do Município, os bens deixados pelo finado seriam bens sem dono, res nullius. Ora, se a herança é vacante, ela o é, em verdade, desde a abertura da sucessão, e os bens do finado desde sua morte pertencem a alguém. Este alguém, à evidencia, é o Município (ou Distrito Federal ou União). Finaliza dizendo o autor.

            Data vênia a posição doutrinária, mas sobre esse particular convém em discordar, pois, o princípio da saisine é aplicável aos herdeiros, sejam legítimos ou testamentários art. 1.784 do C.C. 2002. O referido diploma legal afastou por completo o estatus de herdeiro legítimo do Município, Distrito Federal e União em seu art. 1.829. Restando apenas a condição de herdeiro testamentário se for o caso do testador nomear um desses entes público no testamento, hipótese cabível da aplicabilidade do princípio da saisine. O que nesse caso não estaríamos diante de herança vacante.

            A necessariedade de aguardar o decurso do prazo de cinco anos após a abertura da sucessão, para o bem incorporar ao patrimônio público, não implica dizer que estamos diante de res nullius (coisa sem dono), pois esse decurso de tempo é um período que a Lei aguarda a manifestação de um possível herdeiro. Manifestando este, o bem não irá integrar ao patrimônio publico. Assim entendemos que o prazo de cinco anos não é um estágio dos bens do de cujus, e sim uma condição para integralizar-se ao patrimônio público, ou seja, só depois de observado estes período é que os bens passarão para o patrimônio da Fazenda Pública.

            O que a lei procurou evitar é a situação de existir um bem e não existir um dono, res nullius, no art. 1.844 do Código Civil de 2002, e não conferir condição de herdeiro ao Município, Distrito Federal ou União. Na hipótese de falecer uma pessoa, sem deixar cônjuge, ou companheiro e nenhum parente sucessível, ou tendo estes renunciados à herança, daí então que os bens ficarão para a Fazenda Pública.

            Em consonância ao raciocínio de Carlos Roberto Gonçalves, podemos concluir com o que foi dito até o presente momento, é que o estado de jacência é transitório e limitado por natureza, possuindo no seu bojo a predominância da incerteza, sendo herança jacente aquela que em determinado momento não possui herdeiro ou não conheça este.
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1 - Alexandre Freitas Câmara, Lições de Direito Processual Civil, 13ª ed., R. Janeiro, Lúmen Júris 2008, Vol. III, p. 511.

2 - Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, Direito das Sucessões, 2ª ed., S. Paulo, Sariva 2008, Vol. VII.