PALAVRAS-CHAVE: Liberdade ? Direito ? Habeas Corpus

INTRODUÇÃO

No presente paper será abordada a importância da ação constitucional ou recurso Habeas Corpus, observando-se o caráter histórico desse instituto, assim como o surgimento no Brasil,verificando a sua inserção no texto constitucional, bem como na lei processual penal.
A pesquisa levou em consideração aspectos históricos da tutela a liberdade de locomoção e a forma como foi positivado esse direito (quer seja na esfera constitucional - ação constitucional ou processual ? recurso), assim como quando há necessidade de se impetrar o writ constitucional. A doutrina especializada também foi comentada ao longo do trabalho. Deu-se importância a alguns julgamentos do STF históricos, e, estes, foram inseridos com comentários ao longo do trabalho com intuito de demonstrar como o Habeas Corpus anteriormente era utilizado para tutelar qualquer direito liquido e certo e não somente o direito de locomoção. Assim como demonstrar que, embora a liberdade, em tese, sempre foi um direito resguardado pelo então chamado Estado de Direito Democrático, houve pedidos negados de Habeas Corpus por questões políticas e o direito a liberdade foi negado e isso trouxe conseqüências como a morte, a exemplo do caso de "Olga Benário". Houve o período também que o instituto citado era tutelador de qualquer direito liquido e certo e não somente o da liberdade de locomoção, isso, observa-se nestes julgamentos que o instrumento tutelava não somente a liberdade de locomoção como a outros direitos que, hoje, são tutelados por meio do Mandado de Segurança. E também, mostra-se como esse instituto está mais bem resguardado no Estado Democrático de Direito do que em regimes totalitaristas. Aborda-se-á o período de 1215, onde o Habeas Corpus foi inserido no texto constitucional outorgado pelo rei João Sem Terra, na Inglaterra. E como naquela época, não se tutelava o direito de todas as pessoas, e sim de uma classe. Com essa abordagem, observa-se que o Direito de Liberdade no passado era um privilegio de uma classe, um grupo, no caso Inglaterra, dos nobres e barões.
No Brasil o Habeas Corpus é utilizado desde a época do Brasil Império, porém, como ação constitucional propriamente dita, só veio estar explicitamente na constituição de 1891. Já em aspecto infralegal, foi inserido no Código de Processo Criminal de 1832. Um dos mais importantes defensores desse instituto da época republicana no Brasil foi Rui Barbosa .
O referido "writ" (ordem, mandado) tem como objetivo resguardar a liberdade das pessoas no momento que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou ameaça a sua liberdade de ir e vir, de natureza ilegal, salvo nos casos de punição disciplinar . Nos dias de hoje, o Habeas Corpus está inserido no texto constitucional no art.5º, recebendo o titulo de condição de direito fundamental e como tal, cláusula pétrea, ou seja, não passível de alteração. Assim, está disposto no artº60 e § 4º dispõe da seguinte forma: "Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: IV ? os direitos e garantias individuais".

1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

A origem do Habeas Corpus traz como referencia de três linhas de pensamento ou três correntes do Direito a respeito do tema, a primeira originam o Habeas Corpus no direito romano. Já a segunda corrente, reconhece tal origem ao direito Inglês em sua constituição de 1215, a chamada "Magna Charla Liertatum" e a terceira (que têm menos adeptos) diz que o Habeas Corpus se origina na Petition of Rights editada no reinado de Carlos II.
A primeira corrente reconhece no instituto o "interdicto de homine libero", do período romano, como o possível precursor da ação constitucional do Habeas Corpus. Este instituto, para os romanos, garantia ao cidadão o direito de locomover-se, ou seja, a liberdade de ir, vir e ficar. O "interdictum de homine libero exhibendo" era o nome dado a ação que permitia a qualquer cidadão romano o direito de solicitar que um homem fosse exibido quando, este fora detido ilegalmente .
Pinto Ferreira é um dos que defendem essa primeira linha de raciocínio sobre a origem do Habeas Corpus, onde este teria se originado do direito romano. Pela sua doutrina, anos após, os writs constitucionais retornaram com o intuito de resguardar a liberdade, no reinado de Henrique II (1133 -1189), na Inglaterra. Contudo, o Habeas Corpus, resguardaria somente a liberdade dos barões e nobres, sem estender, tal direito, a homens comuns .
Os anos passaram-se, e em 1215 a Carta Magna da Inglaterra (Magna Charla Libertatum), outorgada pelo Rei João Sem Terra, foi inserido que nenhum homem poderia ser preso, ou sequer detido, sem a permissão das leis de sua terra ou o prévio julgamento de seus pares. E, foi com este período que a segunda corrente acredita ter surgido o Habeas Corpus, esta corrente, por sua vez, é a que mais possui seguidores .
Observa-se que,assim como nos dias de hoje, o Habeas corpus era utilizado contra os abusos do Estado por meio das suas autoridades. No século XVII, no mandato de Carlos II, em 1679, surgiu o Habeas Corpus act. Durante este período se exigia que o preso fosse apresentado ao juiz num prazo de 20 dias. E, nisso o juiz ordenava a liberdade do paciente (sujeito passivo do Habeas Corpus, a vitima). E a autoridade que novamente emitisse a detenção, pelo mesmo motivo, era punida, com multa.
O Habeas Corpus act era utilizado somente quando se tratasse de alguém que era acusado da prática de algum crime, não sendo utilizado em outras situações, como nos dias de hoje utiliza-se contra autoridade particular (mesmo sem pratica de crime algum). Saindo deste período a terceira corrente diz que, assim, se origina o Habeas Corpus. Porém esta tem cada vez menos seguidores, tendo grandes chances de acabar se extinguir.
2. CONCEITO DE HABEAS CORPUS

Há inúmeros conceitos do que seria Habeas Corpus, porém, destacam-se neste trabalho, os que melhor se adéqua a idéia de proteção a liberdade de locomoção de todos os cidadãos. Para Alexandre de Moraes:
"Habeas Corpus é uma garantia individual ao direito de locomoção, consubstanciada em uma ordem dada pelo Juiz ou Tribunal ao coator, fazendo cessar a ameaça ou coação à liberdade de locomoção em sentido amplo - o direito do indivíduo de ir, vir e ficar".
Para José Cretella Júnior:
"O Habeas Corpus é uma ação constitucional de caráter penal e de procedimento especial, isenta de custas e que visa evitar ou cessar violência ou ameaça na liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".
Segundo José Cretella Junior:
"Não se trata, portanto, de uma espécie de recurso, apesar de regulamentado no capítulo a eles destinado no Código de processo Penal."
Para o ilustre advogado e escritor Rui Barbosa:
"O Habeas Corpus é uma ordem dada pelo juiz ao coator a fim de fazer cessar a coação."
Para Vicente Greco Filho:
"Originário da Magna Carta, mas definitivamente consagrado nas declarações universais de direitos, constitui-se o Habeas Corpus no mais eficiente remédio para a correção do abuso de poder que compromete a liberdade de locomoção."
Observa-se que, independente do conceito de Habeas Corpus, todos eles, remontam a mesma idéia de tutela a liberdade de locomoção, mesmo que ampla. É importante ressaltar o conceito do instituto por que, anteriormente, mesmo no Brasil em outras constituições que não a de 1988, o citado remédio constitucional era o instrumento utilizado para tutelar qualquer direito liquido e certo que sofresse ou se achasse ameaçado a sofrer violência ou grave ameaça, não importando ser direito de locomoção ou não. Bastava-se que fosse direito lesado para que o Habeas Corpus fosse reclamado. Hoje, sabe-se que existe outro instrumento que tutela direito liquido e certo não amparado por Habeas Corpus, é o caso do Mandado de Segurança.
3. HABEAS CORPUS E OS DIREITOS HUMANOS
A nomenclatura "Direitos humanos" fora criada no século XX para o que ficou conhecido como Direitos Naturais ou Direitos dos Homens. Ferreira Filho (1999) se posiciona dizendo que não há diferença entre Direito humano e direito fundamental, este defende que ambos são sinônimos, deste entendimento se possibilitou que o nome mais adequado para Direito Humano seria "Direitos Humanos Fundamentais". O que foi o resultado de inúmeras lutas travadas ao longo da historia da humanidade, os direitos humanos chegaram ao século XX como uma imposição de toda a humanidade, traduzida em tratados e Convenções internacionais, ingressando por fim na constituição de todos os Estados.
Todos os confrontos entre os homens e o Estado tiverem a mesma conotação, a exemplo da reação de colonos ingleses na América do Norte e a insurreição do Terceiro Estado Na França, que era o descontentamento da população com um poder Estatal que não tinha limite e nem controles, o que o caracterizava como um governo despótico. Por isso Montesquieu propunha em sua obra: "um governo de leis e não de homens." A idéia de um Estado de direito é de um poder político que está preso e subordinado a um Poder objetivo, e, este poder é emanado do povo e exprime o que é justo por meio de seus representantes. Sendo que esse direito e justiça não seria fruto da vontade de um homem, mas sim da natureza das coisas.
A positivação de direitos num documento escrito foi uma prática que se difundiu, somente na Segunda metade da Idade Média: por toda a Europa, encontram-se exemplos, não necessariamente de direitos registrados (documentados), mas de direitos de comunidades locais, ou de corporações por meio de Forais ou de cartas de franquia onde os senhores feudais, normalmente os reis, outorgavam e Inscreviam direitos próprios e peculiares aos membros pertencentes daquele grupo . Observa-se que o direito não é da pessoa individualmente e sim do grupo ao qual fazia parte. Portanto, se o individuo deixasse de pertencer aquele grupo, perdia-se o direito outrora que lhe era conferido.
Na Magna Carta Inglesa foi confirmada e reforçada pelos monarcas da época, para validar ainda mais a sua relevância. Como ocorreu, por exemplo, no Petition of Rights, de 7 de junho de 1628 e no Bill of Rights de 13 de fevereiro de 1689. Na Inglaterra surgiram o common law, rule of law, due process, equal protection of the laws, que, posteriormente foram levados pelos ingleses à América do Norte. Os americanos usaram em seus tribunais americanos, sobretudo a Suprema Corte, fizeram uso e souberem aproveitar de modo a dar mais flexibilidade em suas decisões, contribuindo de forma significativa ao desenvolvimento sobre os direitos fundamentais dos séculos XIX e XX.
O século XVIII foi um período de grandes lutas pelos direitos fundamentais e por isso, houve certa incorporação dos direitos fundamentais com a chegada do liberalismo, que defendia as liberdades individuais e o direito dos cidadãos contra o autoritarismo e o abuso do poder do Estado (período absolutista). Houve a consolidação da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do cidadão, no ano de 1789 na França e a expressão foi repetida em 1793, assim como as constituições de 1946 e 1958 já citavam os direitos do homem.
Hoje em dia a maioria das constituições dos Estados, contém declarações de direitos e garantias humanas fundamentais. Contudo, foi na Declaração Universal dos Direitos do Homem foi promulgada em 1948 pela Organização das Nações Unidas que primeiro se reconheceu e positivou esses direitos. Essa doutrina dos direitos humanos se espalhou somente pelo mundo ocidental cristão. No entanto nas culturas chinesa, hindu e a árabe não se valorizam os direitos por meio de um documento formalmente legitimado para proteger os direitos das pessoas, mas obrigações, virtudes e comportamentos socialmente aceitos .
4. O INSTITUTO DO HABEAS CORPUS NO BRASIL E O SURGIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA.

O instituto no Brasil foi inserido no período constitucional imperial com a vinda de D. João VI, em um decreto de 23 de maio de 1821:
"Decreto Ordeno, que desde a sua data em diante nenhuma pessoa livre no Brazil possa jamais ser presa sem ordem por escripto do Juiz, ou Magistrado Criminal do territorio, excepto sómente o caso de flagrante delicto, em que qualquer do povo deve prender o delinquente."
A constituição de 1824 proibia as prisões arbitrarias; contudo, não usava o termo Habeas Corpus propriamente dito. Posteriormente surgiu expressamente no Código de Processo Criminal, mas só era concedido a brasileiros. Passado esse período, em 29 de setembro de 1871 o decreto n°2033 deu ao Habeas Corpus caráter preventivo e ampliou o direito para estrangeiros .
No Período Constitucional Republicano, precisamente em 1890, no decreto 848, foi autorizado o recurso à Suprema Corte (hoje STF) em todos os casos que a ordem de Habeas Corpus fosse negada.
Com a constituição de 1891, surgiu a chamada interpretação brasileira do Habeas Corpus. Nesse período, deu-se uma interpretação mais ampla ao instituto, inclusive para a proteção de direitos pessoais, e não só a liberdade física. Um dos seus maiores defensores foi Rui Barbosa, veja-se:
Na época, ficou famosa a posição extremada de Rui Barbosa para quem o Habeas Corpus teria cabimento em qualquer caso em que se desse abuso de poder ou ilegalidade em oposição aos que se mantinham fiéis às linhas clássicas do Direito inglês, onde o Habeas Corpus se destinava, apenas, a garantir a liberdade de locomoção, tal como ocorria ao tempo das leis do Império
Na constituição de 1934 encontra-se a definição no art.113, n.14 e na constituição de 1937 no art.122. E, na de 1946 dizia em seu art.141, §23: E, foi naquele texto constitucional (1934) que surgirá a ação do Mandado de Segurança, pois, até então, todos os direitos que fossem lesados por abuso de poder de autoridades publicas eram resguardados via Habeas Corpus, conforme esclarece Sergio Demoro Hamilton:
A Lei Magna de 34 repete as linhas básicas contidas nas normas anteriores, acrescentando, apenas, que "nas transgressões disciplinares" não caberia o Habeas Corpus (art. 113, 23)9. Porém, a grande novidade da Constituição de 1934, no âmbito da tutela dos direitos e garantias individuais, resultou na criação do mandado de segurança (art. 113, 33)10, destinado à defesa de direito "certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional ou ilegal de qualquer autoridade". Estabelecia, ainda, que o processo (rectius procedimento) seria o mesmo do Habeas Corpus, bem como a obrigatoriedade da ouvida da pessoa de direito público interessada.

A carta política de 1967 dizia em seu art.150,§20:
"Dar-se-á Habeas Corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. Nas transgressões disciplinares não caberá Habeas Corpus."
E finalmente, como não poderia ser diferente, a atual constituição de 1988 diz em seu art.5°, LXVIII:
"Conceder-se-á Habeas Corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder."
Ao longo da historia jurídico constitucional brasileira o instituto foi inserido em vários textos, conforme citado acima, contudo, sabe-se que durante este período, mesmo existindo o referido remédio constitucional, o direito de liberdade era um sonho muito pequeno ainda. Tal direito foi mais bem resguardado e defendido hoje no texto constitucional. E, mesmo assim, sabe-se que muito tem que ser feito para que o direito de liberdade, ir, vir ou permanecer seja, de fato, assegurado a todos os cidadãos.
5. O SENTIDO LITERAL DA EXPRESSÃO "HABEAS CORPUS"

O Habeas Corpus é a uma ação que tutela constitucionalmente o direito de ir e vir ou permanecer, é um ou, se não, o mais importante direito que alguém pode ter é denominado de Direito a Liberdade. Porém, não é qualquer liberdade (como a de imprensa, ou expressão) que o Habeas Corpus resguarda, mas somente o direito de circular, locomover-se pelo território nacional. Para garantir este direito, foi que surgiu o este instituto. Segundo o Dicionário Aurélio, Habeas Corpus é a garantia constitucional outorgada em favor de quem sofre ou está na iminência de sofrer coação ou violência na sua liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. A expressão Habeas Corpus procede de dois vocábulos do latim: "habeas" e "corpus".
No sentido literal das palavras, quer dizer: "tome o corpo", porque habeas, subjuntivo de "habeo" (es, habitum, habere) significa ter, possuir, manter, tomar posse e corpus (corporis), corpo. O Habeas Corpus nasceu como um direito necessário para limitar-se o poder arbitrário do Estado. Foi adotado como norma de ordem constitucional nos países civilizados (necessariamente nos ocidentais), pois sua ordem significa uma forma de conter ao autoritarismo Estatal.

6. ESPECIEIS DE HABEAS CORPUS E NATUREZA JURIDICA

A natureza jurídica do Habeas Corpus é de uma ação constitucional mandamental, destinada à proteção do direito à liberdade de locomoção, que é eficaz para atacar qualquer espécie de ilegalidade ou constrangimento ao cidadão.
É uma ação de suprema importância, devido a sua natureza constitucional de direito fundamental, tem caráter especial e isenção de custas processuais, conforme preleciona o especialista em Direito Publico Washington Luis Batista Barbosa:
É uma ação constitucional de caráter penal e de procedimento especial, isenta de custas e que visa evitar ou cessar violência ou ameaça à liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder. Em caso de guerra haverá a possibilidade de restrição à locomoção que, visando a segurança nacional, poderá prever requisitos menos flexíveis da garantia de liberdade de locomoção consagrada na constituição.
Há duas espécies de Habeas Corpus, são eles: preventivo e repressivo ou liberatório. Porém, ele poderá ser concedido como liminar.
Quando for utilizado para afastar constrangimento ilegal à liberdade de locomoção já existente, o Habeas Corpus é chamado de liberatório ou repressivo; Isso quer dizer que o paciente já sofreu a lesão a sua liberdade de locomoção (está impossibilitado de se locomover por autoridade publica ou privada), porém, quando só existe uma ameaça a essa liberdade, recebe o nome de Habeas Corpus preventivo, neste caso o juiz expede um salvo conduto para garantir que liberdade do paciente não será burlada.
É importante ressaltar que, os juízes e tribunais, também poderão conceder a ordem de Habeas Corpus de ofício nos autos dos processos que estiverem presidindo, desde que sejam competentes. Em suma, o Habeas Corpus é uma ordem judicial para que se cesse ou para que não se ameace a liberdade de ir e vir de determinado indivíduo. Ordem que pode ser dirigida a quem quer que restrinja ilegalmente o direito de ir, vir ou permanecer de determinado individuo. Via de regra, é destinada contra o poder público, mas pode, segundo a jurisprudência, dirigir-se contra particular. Por exemplo: um hospital que não permita que uma pessoa se retire dele sem pagar a conta.
7. A DEFESA DA LIBERDADE AMPLIADA DEFENDIDA POR RUI BARBOSA
Rui Barbosa, no Brasil, foi o primeiro jurista a provocar o Poder Judiciário e obter, dele, decisões que controlassem atos do Poder Executivo. E fez isso por meio do Habeas Corpus. Impetrou os primeiros junto ao Supremo Tribunal Federal contra detenções praticadas durante Estado de Sítio decretado por Floriano Peixoto. O Habeas Corpus nº 300 do Supremo Tribunal Federal foi impetrado por Rui para libertação do Almirante Eduardo Wandenkolk e outros.
Encontra-se na página do STF:
"O advogado Rui Barbosa impetra Habeas Corpus em favor do Senador Almirante Eduardo Wandenkolk e outros cidadãos, indiciados por crimes de sedição e conspiração, presos ou desterrados em virtude de decretos expedidos pelo Vice-Presidente da República, Marechal Floriano Peixoto, na função de Presidente. Tais atos determinam a suspensão das garantias constitucionais, decretando-se o estado de sítio no Distrito Federal. Fundamenta-se o pedido na inconstitucionalidade do estado de sítio e na ilegalidade das prisões ocorridas, umas antes de decretado o estado de sítio, outras, depois de terminada a sua vigência, quando devem imediatamente ser restabelecidas as garantias constitucionais"
Em outros momentos foram impetrados HC por Rui Barbosa para proteger liberdades públicas e vale lembrar que o mesmo impetrou referido remédio constitucional em causa própria de nº 3536, para defender o seu direito de publicar um discurso escrito quando era senador em que se posicionava contra prorrogação de estado de sítio. O Habeas Corpus tornou-se, com a Constituição de 1980, e a partir de inegável impulso de Rui Barbosa, importante garantia individual, utilizado para corrigir atos de abuso de autoridades que feriam o direito de liberdade de alguém. Na atualidade, depois da Lei nº 1533/51, que instituiu o mandado de segurança, o Habeas Corpus destina-se, exclusivamente à proteção da liberdade de ir e vir de alguém. Não serve, mais, à reparação de constrições não relacionadas ao direito de locomoção.
8. JULGAMENTOS HISTORICOS DE HABEAS CORPUS

O primeiro pedido de Habeas Corpus julgado pelo Supremo Tribunal de Justiça (como se chamava o STF entre 1829 e 1891) de que se tem notícia no arquivo da Suprema Corte foi impetrado em 1870. O HC 73 foi ajuizado em favor do italiano Nicolla Hamillo Mattocello, que segundo seu defensor, teria sido preso ilegalmente por ser depositário infiel. O relator do caso na Corte foi o ministro Albino José Barboza de Oliveira.
Hoje, sabe-se que tal constrição a liberdade por causa da não entrega de um bem em poder de depositário (depositário infiel) não seria possível, tendo em vista que o Brasil em 1992, no mês de novembro, ter aderido ao Pacto de São José da Costa Rica, que, em seu art. 7, § 7º. Determina que:
Art 7º, §7º: "Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandatos de autoridade judiciária competente, expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar".
O que implica dizer que, se o HC estivesse em julgamento hoje em dia, seria sem dúvida, concedido. Isso devido ao STF em dezembro de 2008, ter consolidado o entendimento de que é inconstitucional a prisão do depositário infiel. Por maioria, o STF restringiu a prisão civil por dívida ao inadimplente voluntário e inescusável de pensão alimentícia, em consonância com o "Pacto de San José da Costa Rica". Para os ministros que compõe a Corte hoje, as dívidas não podem ser pagas com a liberdade.
Após a renúncia do presidente brasileiro Deodoro da Fonseca, em 1891, uma revolta militar começou a se movimentar pedindo que o presidente em exercício, Marechal Floriano Peixoto, determinasse a realização de novas eleições no país ? como previa a Constituição da época. Para conter o movimento, Floriano Peixoto decretou, em abril de 1892, estado sítio, destituindo do cargo os generais que comandavam o movimento, mandando ainda prender seus lideres.
Nesta época, Rui Barbosa, atuou como defensor - mesmo sem procuração - e ajuizou no Supremo o HC 300, em favor de oficiais generais, de senadores da República, de deputados federais, de jornalistas, como José do Patrocínio, e de poetas, como Olavo Bilac ? que haviam sido indiciados por crimes de sedição e conspiração. Segundo Barbosa, foram todos atingidos em seus direitos e em suas liberdades por atos arbitrários do Marechal Floriano Peixoto, presidente da República em exercício .
Navio "Júpiter"
Em 1893, Rui Barbosa ajuizou na Corte os HCs 406 e 410, desta vez em favor de 49 civis presos a bordo do navio mercante "Júpiter". A prisão foi determinada por ordem do presidente da República, Marechal Floriano Peixoto.
Presos por crime militar inafiançável, juntamente com todos os ocupantes do navio, eles ficaram retidos ilegalmente, conforme alegação do advogado, nas Fortalezas de Santa Cruz e Lage, no Rio de Janeiro, sem nota de culpa e à disposição da Justiça Militar, que segundo Rui Barbosa, seria incompetente para julgá-los.
Por maioria de votos, o Supremo concedeu a ordem e determinou a soltura dos detidos.
Olga Benário
"Outro caso histórico foi o HC 26155, ajuizado na Corte em favor de Olga Benário, alemã de nascimento. Companheira do líder comunista Luiz Carlos Prestes, Olga participou, com o marido, da chamada Intentona Comunista. Grávida, Olga foi presa pelo governo de Getúlio Vargas e extraditada para a Alemanha nazista em 1936, onde acabou morrendo em um campo de concentração.
Segundo seu advogado, a ordem de prisão, emitida pelo Ministro da Justiça, considerava Olga uma "estrangeira perniciosa à ordem pública". Sua cliente corria o risco de ser expulsa do território nacional e entregue ao regime de Hitler. No pedido, o defensor pedia que ela fosse julgada no Brasil por seus crimes, cometido no país.
A Corte não conheceu do pedido, por considerar, entre outros fatores, que a permanência de Olga Benário no Brasil comprometia a segurança nacional ".
Revolta da Vacina
Em 1905, durante o surto de Febre Amarela que afligiu o Brasil no final do século 19 e início do século 20 e causou milhares de mortes no país, chegou ao Supremo o RHC 2244, em favor de Manoel Fortunato de Araújo Costa. Ele alegava ameaça de constrangimento ilegal o fato de ter recebido, pela segunda vez, a intimação de um inspetor sanitário para adentrar em sua casa ? seu asilo inviolável segundo a Constituição da época -, e proceder à desinfecção do mosquito causador da febre amarela .
O Tribunal considerou inconstitucional a disposição regulamentar que facultava à autoridade sanitária penetrar, até com auxílio da força pública, em casa particular para realizar operações de expurgo.
Observa-se que, neste período o Habeas Corpus tinha a função de tutelar um direito que hoje se reclama por meio do Mandado de Segurança. Contudo, naquele período, tendo em vista a sua historia, o Habeas Corpus era um remédio constitucional que viabilizava a proteção ao cidadão contra os desmandos do Estado. Por isso, encontramos pedidos de Habeas Corpus para toda a sorte de direito lesado.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O direito de liberdade sempre foi alvo de todos os homens. Houve, e ainda nos dias de hoje, busca-se por esse direito. A liberdade é uma ilusão. Todos sabem que necessitamos de algo ou alguém, e isso torna a todos os homens, de certa forma, não livres. Contudo, a liberdade de locomoção é algo real, possível de se observar, praticar, viver. Quando se é tomado esse direito, logo, sente-se menos humano, menos gente. Ao longo da historia da humanidade, existiu muitas lutas para se garantir tal direito. Houve o período da escravatura, dos feudos, do absolutismo, dos Estados Totalitaristas, enfim, inúmeros momentos históricos, governos déspotas, absolutismo que tentaram retirar um dos mais nobres direitos do ser humano, a sua liberdade. Observa-se que as lutas travadas no século passado e na idade média serviram para garantir esse direito. E mesmo com um inicio "nebuloso" com o período do João Sem terra, e mesmo no Brasil onde o instituto não era assegurado a toda pessoa humana independente de nacionalidade ou classe social. Mas foi graças a essas mudanças que se migrou para o que hoje conhecemos como Habeas Corpus. Mais do que uma ação constitucional é um direito fundamental.
Contudo, embora o instituto seja possível de ser impetrado por qualquer um do povo, sem a dita capacidade postulatória. Sabe-se que a maioria das pessoas ainda não conhece seus direitos, e mesmo conhecendo não sabe exercê-los.