Gummo e a desconstrução do American Way of Life

Felipe Stolnik Borges

Resumo

Neste artigo será apresentado como ocorre a desconstrução de um conceito tão reconhecido no cinema norte-americano, que é uma idealização de uma vida perfeita entre famílias da classe média alta nos Estados Unidos. A análise será feita a partir de um longa-metragem diferente, em que a violência e o fastio de uma cidade pequena são a principal característica do lugar.


Palavras-chave: Harmony Korine, American Way of Life, White Trash, cinema.


1. Introdução


Um filme intrigante: este é o caso de Vidas Sem Destino (Gummo). Trata­-se de um longa-­metragem norte­americano feito em 1997. Seu diretor, Harmony Korine, é também roteirista e produtor, conhecido pelo roteiro de outro filme perturbador: Kids (1995), que aborda um grupo de adolescentes na cidade de Nova Iorque descobrindo as drogas, o sexo e as doenças sexualmente transmissíveis.

Gummo se passa na pequena e pobre cidade de Xenia, Ohio, Estados Unidos. Trata da vida da população de uma maneira diferente do comum esperado do cinema de Hollywood. O tradicional American Way of Life (AWL) não é aplicado de maneira alguma, e o que se vê é a tristeza de um lugar pós-apocalíptico que foi anteriormente atingido por um devastador tornado. O filme começa sem início e termina sem fim, o que gera um interessante receio no espectador. Não é sobre uma personagem ou uma narrativa, mas trata de uma sociedade cheia de histórias a respeito do seu cotidiano, que transmite, na maioria das vezes, um demasiado cansaço para o telespectador, pois, afinal, a cidade está em crise e não há muito a se fazer. Entretanto, quando as opções de entretenimento acabam, novas surgem, e é exatamente o que este filme aborda: como as pessoas vivem sem recursos usuais de diversão.

A partir da escolha e estudo de duas cenas, este artigo procurará responder, principalmente, a questão de como o conceito estadunidense de American Way of Life não é mostrado, e em seguida, uma análise da desconstrução da mesma definição aplicada nas cenas e o porquê deste filme ser polêmico de uma maneira discreta, já que não há uma história fixa ou uma grande aventura envolvendo uma família feliz e seus problemas de classe média. Além disso, há mais um conceito que será pesquisado e que define uma das características essenciais dos protagonistas do filme. Pode-­se dizer que as pessoas são consideradas como White Trash, termo depreciativo para pessoas brancas de classes sociais consideradas baixas, poucas perspectivas de vida e formação. Ou seja, são a porcentagem da população que o cinema e a mídia não costumam mostrar. Malgrado a intenção do diretor seja transmitir uma ideia estereotipada de cidade pequena que envolve fastio e desemprego, as pessoas consideram­-se extremamente felizes. De fato, elas não são depressivas, o que é uma quebra em um pensamento característico da maioria das pessoas, que apenas dinheiro traz felicidade e lazer.

O artigo se iniciará com informações sobre o filme e sobre o diretor. Ele se baseará numa segmentação de filmes Hollywoodianos, em que será comparado à filmes familiares que tratam da vida de uma família normal, podendo ser exemplificados por Beethoven, O Magnífico (1992),  Ferias no Trailer (2006), Uma Babá Quase Perfeita (1993) e Bud - O Cão Amigo (1997). Em seguida, haverá a descrição das duas cenas em questão, que serão analisadas na quarta parte do trabalho, de acordo com a aplicação dos dois conceitos citados anteriormente. Mas, antes disso, o esclarecimento dos conceitos­-chave de AWL, e de White Trash. Para, ao fim, chegar à conclusão e à resposta do problema de pesquisa.

Para a realização deste artigo, será necessária a leitura de conceitos da teoria do cinema, principalmente de livros como A Linguagem Cinematográfica (MARTIN, 1955) e A Estética do Filme (AUMONT, 2008). A leitura de livros e monografias acadêmicas sobre o conceito de AWL, como o trabalho de pós-­graduação Indústria Cultural de Guerra em Hollywood (PAIVA, 2012), também serão vistas. Por fim, existem diversas análises e críticas ao filme, e com certeza a leitura abrirá as fronteiras de pensamento para um melhor estudo geral.


2. Vidas Sem Destino (Gummo)


O diretor, produtor e roteirista Harmony Korine, responsável pela criação de Vidas Sem Destino, nasceu em 1973, em Bolinas, Estados Unidos, e já ganhou sete vitórias de oito indicações em premiações de filmes por seus trabalhos. Uma de suas características mais marcantes é a de criar imagens ou personagens para destruí-los depois. Se analisarmos outros trabalhos, como Kids (1995), que aborda adolescentes abusando das drogas e do sexo, ou Spring Breakers (2012), que conta a história de quatro colegiais que são acolhidas por um traficante e começam uma vida de crime, podemos observar que essa desconstrução ocorre de maneira simples e rápida, ou seja, são impulsos que as personagens têm e que fazem a vida delas mudar radicalmente, sendo isso o foco principal de seus longas.

O dramático Gummo foi o primeiro filme dirigido pelo diretor em 1997. Segundo o IMDb,  ele custou cerca de um milhão de dólares, possui cerca de 89 minutos e é o vencedor de quatro prêmios cinematográficos, como o Gotham Awards e o Venice Film Festival. É passado na Xenia, Estados Unidos, mas foi filmado em Nashville. Possui uma estética “suja”, não é um filme visualmente agradável para assistir, devido a inúmera quantidade de lixo encontrada na rua e nas casas das pessoas. Conta diversas histórias diferentes, mas com a mesma temática, que é a de uma população norte-americana residente em uma pequena cidade com poucos recursos de entretenimento. As pessoas são financeiramente pobres e não possuem emoções aparentes, como se tivessem perdido a esperança. Considerando o contexto de que um tornado atingiu o lugar na década de 1970, este cenário se encaixa perfeitamente na representação do comportamento das pessoas no local.

No lançamento, em agosto de 1997, no 24º Telluride Film Festival em Telluride, Colorado, Estados Unidos, o filme provocou reações e críticas muito negativas do público. Uma influente crítica do The New York Times, Janet Maslin, escreveu que aquele era o pior filme do ano. Contudo, o cineasta alemão Werner Herzog ligou para Korine para o gratificar pela produção e disse ao jornal nova-iorquino: “Quando eu vi aquele pedaço de bacon frito fixado na parede do banheiro de uma cena de Gummo, aquilo me fez cair da cadeira. Korine é uma clara voz de uma geração de produtores de filmes que estão criando uma nova posição. Não dominará o mundo cinematográfico, mas e daí?”

Cada protagonista da trama é único e diferente. Há dois grupos principais de personagens que aparecem em mais cenas quando comparadas às outras pessoas, que são a dupla Solomon e Tummler, que passam o tempo livre matando gatos, e o trio Darby, Dot e Helen, que se preocupa muito com a aparência do corpo. Além disso, são apresentadas outras histórias menores, como a de um grupo de jovens que se reúne para falar sobre os crimes que cometeram, um bêbado paquerando um anão, um homem que prostitui a irmã que possui um retardo mental e um garoto que se veste de mulher escondido e que possui uma vó doente. Mas uma das personagens que mais chama a atenção é o mesmo menino que aparece na primeira cena do filme, Bunny Boy. Ele não possui uma história fixa, é apenas um menino com cerca de 14 anos que usa um chapéu simulando orelhas de coelho e que costuma aparecer em transições entre duas cenas. Ele não dialoga, é uma personagem muda e misteriosa que prende os olhares do espectador por aparecer tocando gaita em um momento que não possui relação alguma com as outras cenas, ou por aparecer beijando Helen e Dot, sem mesmo ser introduzido ao espectador o fato de que ele conhecia as duas.

Outros aspectos interessantes são a trilha sonora e a direção de arte do filme. Percebe-se um contraste muito grande nas músicas que tocam durante as cenas. Desde um estilo popular, como Madonna, ao Thrash metal. Além disso, há gospel e rock, com Roy Orbinson no repertório. A maioria das músicas é do estilo mais pesado, com guitarras distorcidas e vocais guturais, deixando-o mais maçante.

O filme é esteticamente sujo. Por ter como cenário uma cidade precária e pós-apocalíptica, ainda existem resquícios do desastre espalhados pelo lugar. Quando Herzog disse a frase sobre o pedaço de bacon na parede, era literal.  Pode-se observar lixo, pedaços de móveis e sucata de automóveis em quase todos os ambientes, principalmente os externos. Além disso, Gummo apresenta cores frias e pouco contraste. Estes dois conceitos são o oposto aos Hollywoodianos, em que tons quentes em romances e em longas de ação ou comédias são característicos.

De acordo com Modesto Farina, Clotilde Perez e Dorinho Basto, autores do livro Psicodinâmica das Cores em Comunicação, as cores exercem diferentes efeitos fisiológicos sobre as pessoas, e por isso elas produzem sentimentos. (FARINA, PEREZ, BASTO, 2011, p.96). Por isso, a frieza e a falta de luz ajudam na produção de uma compreensão perturbadora para quem assiste ao projeto de Korine.

Ao ser comparado com os conceitos de um filme que respeita as característias do AWL, a história é totalmente contra a definição. Os filmes deste significado são feitos para agradarem a um público muito grande, que são os indivíduos que aderem ao mesmo estilo de vida. Visto que não possui cores visualmente agradáveis, nem músicas alegres ou uma relato sobre, por exemplo, uma família que viajou nas férias, Vidas Sem Destino é sem dúvida o oposto ao American Way.


3. American Way of Life e White Trash


O cinema de Hollywood é uma das indústrias de entretenimento mais reconhecidas no mundo e responsável pela produção de diversos Blockbusters. Visto isso, uma parte da cultura dos Estados Unidos se espalhou para inúmeros lugares do globo terrestre. Esse modo de viver é caracterizada por um estereótipo muito forte, que consiste no usual dos filmes de Hollywood, que pode ser exemplificado por uma família religiosa composta de mãe, pai, filhos e um animal de estimação, todos vivendo numa casa no subúrbio e passando por problemas da classe média alta.

O termo American Way of Life ou simplesmente American Way foi primeiramen-te utilizado pela mídia para diferenciar os padrões de vida dos soviéticos aos dos estadunidenses durante a Guerra Fria (1945-1991) e refere-se a uma modalidade de comportamento. É considerada uma forma de conduta que foi desenvolvida na década de 1920 e é aderida até os dias de hoje. Amparado pelo bem-estar econômico da época, o consumismo e o materialismo são a base da conduta (KLICK EDUCAÇÃO, 2012) . É uma expressão referente ao estilo de vida que os norte-americanos possuem, dada por características o patriotismo e a procura pela felicidade. Segundo a enciclopédia online britânica Merriam-Webster, “É um método ou maneira de comportamento ou de vivência que é característico dos Estados Unidos”.

Um programa de intercâmbio da escola ianque Wellstone Internacional High School, localizada em Wellstone, Minesota,publicou em seu site uma coluna chamada “12 Conceitos que Moldam o American Way”, baseada em 40 anos de pesquisas de antropológos e sociólogos. Dentre os conceitos, encontram-se a assertividade, o esforço/otimismo, a simpatia, o trabalho duro, o individualismo, o materialismo, o pragmatismo, o progresso, o puritanismo, o uso do método científico que envolve ceticismo, empirismo e racionalismo, o sucesso e a consciência do tempo, pois não gostam de atrasos e são pontuais.

Os filmes de Hollywood com o tema família feliz mostram a cultura dos ianques como uma idealização, algo para se seguir. Um aspecto bastante comum encontrado nestas formas de entretenimento é a cultura do herói, tratando-se de alguém um ou grupo de pessoas com um objetivo a ser seguido ou algo a conquistar. Há um conceito que define a segmentação dos filmes que estão sendo comparados a Vidas Sem Destino: o monomito. É um dos conceitos mais clássicos de filmes que possuem o histórico de serem idolatrados pela população e que possuíram um lucro muito alto como: Jornada nas Estrelas, E.T. - O Extraterrestre, Senhor dos Anéis e Matrix. Esse conceito não é abordado em Gummo devido à diversas razões. Uma delas é o fato de que as personagens não possuem um perfil heroico e são White Trash.

A expressão White Trash não é comum no Brasil, e na visão de muitos estadunidenses é considerado como um estilo de vida e uma ofensa. Pela sua tradução “lixo branco”, remete a pessoas brancas de renda baixa, pouca ou nenhuma formação escolar e conduta questionável. Nada mais é do que um estereótipo.  Matt Wray, do departamento de sociologia da Temple University, explica o pensamento da população sobre o termo em uma coluna no The Society Pages:

“Para muitos, o termo evoca imagens de trailers em parques, laboratórios de metanfetamina, Camaros velhos em cima de blocos de cimento, povos rurais e pobres com muitos filhos e o government cheese não é suficiente. É um nome dado a estes brancos que não alcançam nada, ou porque são muito preguiçosos ou simplesmente estúpidos. Ou talvez seja porque há algo de errado com seus genes. Qualquer seja a razão, é a culpa deles mesmos do porquê vivem daquele jeito.” (WRAY, 2013, tradução nossa)

Resumindo, White Trash diferencia pessoas brancas de pessoas brancas financeiramente pobres. Refere-se ao rótulo de caipiras que moram em casas de madeira, que consomem bebidas alcoólicas todos os dias, que possuem muitos filhos, que se vestem com roupas baratas como camisas xadrez e macacões, que fumam cigarro excessivamente e que adoram corridas de stock car. Este grupo é facilmente encontrado na zona rural do sul dos Estados Unidos, em estados como Texas e Tennessee. Todas as personagens do filme passam a ideia de pertencerem a esse grupo citado anteriormente. Nenhum dos diálogos das pessoas são complexos ou difíceis de serem compreendidos, sempre permanecem frases curtas sobre o cotidiano, nenhum aspecto teórico mais aprofundado são exibidos. São conversas muitas vezes etnocêntricas a respeito de outros grupos ou simplesmente sobre assuntos do dia-a-dia como o clima.

4. Análise

As quebras com a tradicional cultura norte-americana que Hollywood abordasão as principais características do filme. É o que o torna diferente e polêmico. Não é apresentada uma história de aventura ou um drama para fazer o espectador escorrer lágrimas dos olhos, o que foge completamente do padrão desse segmento que foi abordado sobre os filmes. Ao mesmo tempo em que é possível sentir pena das pessoas devido à sua condição de vida, percebemos a felicidade delas naquelas condições. Talvez por não possuírem uma referência de outros estilos de vida que não o deles, não ficam deprimidos e enciúmados.

É claro entender o porquê de Gummo não ter se tornado tão conhecido. Ele é controvérso ao Blockbuster e ao costume de uma produção que contém uma história com início, meio e fim. O autor do trabalho de pós-graduação Indústria Cultural de Guerra em Hollywood,  Rogério Marques de Paiva, explica isso:

"O ingresso é pago visando à diversão e o escapismo. Oriundo de uma arte especializada, o entretenimento experimentado através de um filme Blockbuster não tem como objetivo primordial oferecer e estimular certos tipos de questionamento."  (PAIVA, 2012, p.22)


O público considera o cinema como entretenimento para o tempo livre. Isso significa que busca escapar do questionamento e do aflito que Vidas Sem Destino oferece. Sendo esse um dos motivos pelo qual o filme não lucrou. O fato de que o filme recebeu críticas negativas e que na estréia em 1997 muitas pessoas foram embora da sessão comprova isso.

Foi escrito no início deste artigo que serão analisadas duas cenas do filme:

A primeira cena a ser comentada se inicia com dois meninos de aproximadamente 10 anos vestidos de cowboys brincando em um depósito de lixo que contém sucatas de carro e outras máquinas. Logo, Bunny Boy chega com seu skate na mão. Ambos os meninos começam a falar mal do novo companheiro que chega em silêncio, o xingando e criticando. A seguir, sem pensar muito, eles sacam armas de brinquedo e atiram no garoto que lentamente cai no chão. Permanecem falando palavras de baixo calão enquanto conversam entre si sobre o fedor do menino coelho. Mesmo supostamente morto, continuam apertando o falso gatilho até a certeza de que ele está morto. Eles tratam o menino como se fosse um verdadeiro animal, tanto que pegam seu braço e dizem não ter muita carne nele. Por fim, eles cansam e vão embora, deixando Bunny Boy "morto" no chão.

Se convertêssemos a cena no mesmo contexto de divertimento infantil para um Blockbuster de Hollywood, não veríamos tamanha violência. Provavelmente, os meninos estariam no quintal de suas casas jogando baseball enquanto esperam o almoço que suas mães preparam ficar pronto. Para o acontecimendo do diálogo agressivo e inclusive do roubo à carteira de Bunny Boy, os garotos deviam ter visto esse tipo de ação antes, o que para eles seria comum, tanto que aplicam a conduta num terceiro.

A desconstrução do American Way é clara pelo fato de a violência aplicada, mesmo que implícita, é real. Por ela não ser explícita, isso não diminui a sua intensidade, e como escreveu Rogério Paiva: “O ingresso é pago visando à diversão e o escapismo. (...)”. Sendo assim, violência infantil não é o maior agrado para a população se divertir. Crianças são tratadas com inocência nos longas usuais, e o fato de apontarem armas, mesmo que falsas, é assustador.

A segunda cena para análise começa com Solomon, um garoto com cerca de 13 anos enrolando com fita alguns talheres. Seu uso é descoberto depois: servirão como peso para malhar. Ele desce para o porão e liga o aparelho de som. Madonna toca enquanto ele se olha no espelho e pratica levantamento de peso. Sua mãe desce as escadas e começam a conversar. Ela dá dicas para ele realizar o exercício melhor e desliga o som. No ambiente, há muitos objetos desarrumados no canto. Ela encontra um par de sapatos de dança e conta a história daquele objeto ao garoto que continua a malhar. Sua mãe levanta e fica do lado dele o arrumando novamente para realizar o exercício com mais eficiência. Ela pergunta se ele sente falta do pai, mas o garoto continua quieto. Então, ela pede um sorriso a ele, mas sem resposta. Após um tempo insistindo, ela pega um revólver e aponta para a cabeça do filho, mandando-o sorrir, caso contrário o mataria. Ao fim, dá um tiro de brincadeira. A arma estava descarregada e ela sabia disso. O resto da cena é um do lado do outro, ele malhando e ela dançando sapateado. 

Segundo o site de críticas e cinema CCine10, a relação entre pais e filhos não costuma ser fácil ou violenta por parte dos Hollywood’s. Ou seja, normalmente os pais são cuidadosos e conselheiros das dificuldades que as crianças passam, possuindo assim uma relação de carinho e afeto. É claro que a mãe de Solomon não estava sendo verídica na ameaça, e que o comportamento que ela realizou não era incomum naquela realidade, tanto que o menino sequer se assustou, apenas continuou na mesma posição.

Além disso, a atividade realizada e a falta de recursos devido à problemas financeiros por equipamentos de malhação não ocorreriam nos outros filmes norte-americanos exemplificados na introdução, devido aos produtores priorizarem filmar histórias sobre as classes mais altas. O fato de que o menino sente a necessidade em malhar já é anormal considerando a sua idade. Ainda, a falta de noção em relação à sua idade e exercícios de musculação que ele possui demonstra a inocência, mas não é o mesmo tipo de ingenuidade das outras obras cinematográficas. Uma criança não costuma saber que apenas talheres sendo utilizados como instrumento de exercício não farão resultado algum a longo prazo, porque não é um universo em que pessoas daquela idade costumam frequentar: o de malhação com peso.

Não somos informados em que dia da semana a cena é passada. Esta informação poderia ser relevante para concluir se a mulher possui algum emprego. Mas, independente disso, nas outras cenas em que ela aparece, sempre parece desocupada. Sabemos que ela não é dona de casa devido à sujeira que a casa se encontra, o que aumenta as chances de ela se encaixar no padrão do estereótipo White Trash como uma desempregada.

5. Considerações Finais

A desconstrução do AWL é clara e objetiva. É facilmente identificada quando aplicamos as características do que Hollywood adere como ser o estilo de vida norte-americano, sendo uma questão de patriotismo e religiosidade nas cenas selecionadas. É importante ressaltar a diferença entre os conceitos de AWL e Hollywood. O segundo é caracterizado pelo primeiro, pelo estilo de vida, além de outros fatores como a produçao cinematográfica, etc. O primeiro é este modo de viver baseado em uma rotina tipicamente familiar. Nas duas partes, percebe-se a intensa violência verbal e psicológica, mas não a física. Seja a mãe ameaçando o filho de morte, ou seja duas crianças falsamente matando um outro menino.

Após o esclarecimento do estilo de vida White Trash, representado por pessoas de baixa renda e pouca formação, também pode-se concluir que, apesar da miséria, Vidas Sem Destino prova o contrário do que o espectador do filme tende a pensar num primeiro instante: de que as personagens são infelizes.

A questão da estética, como trilha sonora e direção de arte são aspectos que geram a originalidade que só Gummo possui.Em uma cidade pós-apocalíptica em que a sujeira predomina em todas as cenas, não sendo agradável visualmente de assistir, a direção de arte se destaca. Ademais, a maioria das músicas que tocam são agressivas e perturbadoras. Então, nem visão ou som são agradáveis para quem costuma assistir a qualquer outro filme que não esse. O que levaria uma pessoa a assistir a um filme perturbante visualmente e auditivamente sem história fixa? É uma tentativa de fuga ao filme tradicional que possui uma história de início, meio e final. Contudo, existem mensagens, e elas pode ser interpretadas de diversas maneiras, sendo essa possibilidade de interpretações a beleza do filme apresentado.

 

6. Referências

 

ADAMS, Nathan. Harmony Korine Got Gross With ‘Kids,’ But ‘Gummo’ Saw Him Achieve Maximum Sleaze. <http://www.filmschoolrejects.com/features/harmony-korine-kids-gummo.php>. Acesso: 24 nov. 2013.


CCine 10. As Relações Conturbadas Entre Pais e Filhos no Cinema. <http://www.ccine10.com.br/as-relacoes-conturbadas-entre-pais-e-filhos-no-cinema> Acesso: 20 maio. 2015


Dicionário Informal. <http://www.dicionarioinformal.com.br/gutural> Acesso: 15 maio. 2015


FARINA, Modesto. PEREZ, Clotilde. BASTO, DORINHO. Psicodinâmica das Cores em Comunicação, Edgard Blucher, 2011, p.96


GUMMO. Direção de Harmony Korine. Produção de Cary Woods. Roteiro: Harmony Korine. Elenco: Jacob Reynolds (Solomon), Nick Sutton (Tummler), Jacob Sewell (Bunny Boy), Darby Dougherty (Darby), Chloe Sevigny (Dot), Carisa Bara (Helen), Linda Manz (Solomon's Mom) and Max Perlich (Cole). Nashville: Fineline Features, 1997. Son., color. Legendado.


Harmony Korine. Gummo’s Whammo <http://www.harmony-korine.com/paper/int/hk/whammo.html> Acesso: 10 maio. 2015


IMDb. Vida Sem Destino (1997), Trivia. <http://imdb.com/title/tt0119237/trivia> Tradução nossa. Acesso: 26 maio. 2015


InfoEscola. Monomito. <http://www.infoescola.com/literatura/monomito/> Acesso: 20 junho. 2015


Klick Educação  <http://www.klickeducacao.com.br/conteudo/pagina/0,6313,POR-1307-10082-,00.html>  Acesso: 22 maio. 2015


Merriam Webster: American Way <http://www.merriam-webster.com/dictionary/american%20way> Tradução nossa. Acesso:  10 maio. 2015


NY Times. Gummo (1997) FILM REVIEW; Cats, Grandma and Other Disposables

<http://www.nytimes.com/movie/review?res=9907E6DA123FF934A25753C1A961958260> Acesso: 22 maio. 2015


Norton Books. What is White Trash <http://nortonbooks.typepad.com/everydaysociology/2009/04/what-is-white-trash.html> Acesso: 22 maio. 2015


PAIVA. Rogério. Indústria Cultural de Guerra em Hollywood, p22, 2012 . Acesso: 10 maio. 2015

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Wellstone High School: 12 Concepts That Shape the American Way of Life, Outubro 1992 <http://wellstone.mpls.k12.mn.us/12_concepts_that_shape_the_american_way_of_life> Acesso: 22 maio 2015

WRAY. Matt. White Trash: The Social Origins of a Stigmatype, 2013. <http://thesocietypages.org/specials/white-trash>. Tradução nossa. Acesso: 11 maio. 2015