208 – GREVE DOS CONTOS – 2

De Romano Dazzi

 

- “Alô, é o Senhor Editor? Sou o Romano. Como vai?... Bom, aqui também, tudo continua normalmente. Estamos levando, obrigado....O senhor soube da manifestação dos contos, ontem, na frente da minha casa? Ah é?...E o que me diz? ... Sei, sei.... sim..... Não estou falando de responsabilidades, não.  Essa é exclusivamente minha.

Sabe, dar à luz um conto, é uma obra de criação. Mas um conto é descartável, um  pigmeu insignificante, comparado com os gigantes, romances com 400, 500 paginas, dezenas de personagens, seqüências de aventuras e de surpresas.

....Sim, exatamente, não tem comparação; é outro mundo, de verdade.

Contos são literatura menor; modestos, íntimos, sem pretensões.

Mas continuam sendo minhas criaturas.

E agora que estão aqui, não sei mesmo como fazer para que alguém os publique;

as pessoas lêem, gostam, dão os parabéns  e.... e esquecem.

Dizem, com razão, que o problema é meu e eu tenho que resolvê-lo.  

Mas... senhor Editor, não estou falando bobagens. 

Gosto deles e eles gostam de mim; tanto que , na sua tristeza,  lembraram-se de mim,  recorreram ao Autor, ao pai, sem tomar nenhuma atitude extremada.

Poderiam ter posto fogo nas prateleiras – já aconteceu de bibliotecas inteiras, abandonadas e solitárias, pegarem fogo sozinhas, como se fossem fanáticos orientais imolando-se, desesperados. 

Se aconteceu isso em Alexandria? Não sei dos detalhes, não, senhor Editor.

Ou poderiam ter voado pelas janelas, em sinal de revolta.

Imagine um bando de folhas soltas, milhares delas, navegando sem rumo, ao sabor do vento, ofuscando o sol, assustando os motoristas, provocando acidentes e engarrafamentos....    

Por outro lado, estou numa sinuca . O que me aconselha?

Que esperanças posso dar aos meus originais?

Anúncios na TV? Na Internet? Nas livrarias? E quem tem dinheiro para isto?

Vendê-los na rua, embrulhadinhos um a um, com um chocolate e um chiclete,

ou com uma oração a Santo Expedito, para que ajude numa causa perdida?

Fazer uma edição única, juntando todos em um feixe, tornando-os assim, mais fortes, resistentes e duráveis? Mas sai mais caro ainda! E o retorno é a longo prazo... Se é que vai haver algum!...

Está bem. Sim, senhor Editor; vou aguardar o seu telefonema. Uma orientação será muito útil, qualquer que seja. Darei suas lembranças aos contos, hoje, quando voltarem aqui.  Obrigado. Muito obrigado.

 

Não tem solução. Preciso escapar desta, mas vejo que não tenho saída.

Esta madrugada vai quebrar o pau.

Creio que renunciarei à paternidade. Vou dizer que não são meus. Que nunca os vi.

Só espero que não me forcem a fazer o teste de DNA.

Porque aí descobrem que eu sou o pai, sem dúvidas.

 

Oh, porque inventei de escrever?

Porque não estudei para me tornar lenhador no Canadá?

Ou treinador de cangurus na Austrália? 

Qualquer coisa, menos escritor!