JOSÉ DE ARIMATÉIA AMADOR

MARIA GUADALUPE TAVARES ISHIMOTO

ROSINEIDE MARTA MAURICIO DE SOUSA

VÂNIA DE ALMEIDA KLEZEWSKY PIRES

 

 


 

GÊNERO INJUNTIVO REGRAS DE JOGO: A CRIANÇA E SUA VISÃO DO LÚDICO - DO ORAL À NECESSIDADE DE BRINCAR..

 

 

Trabalho de conclusão da Disciplina de Mestrado - Aquisição da Linguagem - sob a orientação da Profª. Drª. Evangelina Maria Brito de Faria, do Programa de Pós-Graduação em Lingüística - PROLING - da Universidade Federal da Paraíba.

 

 


 

 

João Pessoa, 2009

 

GÊNERO INJUNTIVO REGRAS DE JOGO: A CRIANÇA E SUA VISÃO DO LÚDICO - DO ORAL À NECESSIDADE DE BRINCAR.

 

José de Arimatéia Amador

Maria Guadalupe Tavares Ishimoto

Rosineide Marta Mauricio de Sousa

Vânia de Almeida Klezewsky Pires

 

 

RESUMO: Este trabalho tem como finalidade verificar como o gênero injuntivo - regras de jogo - é realizado por crianças de 3 a 6 anos de idade, através da análise da fala das mesmas, e nas instruções contidas nas caixas dos brinquedos infantis, através da análise dos conteúdos dos encartes. Tudo isso visando a levantar os pontos em que haja convergência entre as partes e aqueles pontos que as crianças não conseguem desenvolver durante suas falas. Além disso, pretendemos, ao final do trabalho, apontar soluções para os problemas que surgirem. .

 

Palavras-chave: gênero textual, regras de jogo, linguagem oral.

 

ABSTRACT: This study aims to determine how injunctive gender - games rules - is presented by children from 3 to 6 year old, analyzing the speech of them, and the instructions contained in boxes of children's toys, analyzing the folder. All this aimed to raise the situations where there is convergence and those situations that children can not develop during their speeches. Furthermore, we intent at the end of the work to solve the problems that arise.

 

Key words:.Texts, games rules, oral language.

 


 

 

É sabido que a língua é uma atividade cognitiva e social. A língua é heterogênea e se faz pelo seu próprio uso, pela sua necessidade comunicativa.

 

A língua oral é o ponto de partida para o desenvolvimento da criança e das reflexões que acontecerão com elas ao longo do caminho. Isso porque a oralidade é o meio de comunicação desse indivíduo com o mundo, com a satisfação de suas necessidades imediatas.

 

Todas as esferas da atividade humana, por mais variadas que sejam, estão relacionadas com a utilização da língua. Não é de surpreender que o caráter e os modos dessa utilização sejam tão variados como as próprias esferas da atividade humana (...). O enunciado reflete as condições específicas e as finalidades de cada uma dessas esferas, não só por seu conteúdo temático e por seu estilo verbal, ou seja, pela seleção operada nos recursos da língua - recursos lexicais, fraseológicos e gramaticais - mas também, e sobretudo, por sua construção composicional. (Bakhtin, 1953/1992)

 

Bakhtin distingue ainda o que chamamos de gêneros primários dos classificados como gêneros secundários. Para ele são considerados gêneros primários todos aqueles em que haja a necessidade de comunicação no âmbito social, dentro de nossas comunidades, grupos de pessoas mais próximas. Estes gêneros são as cartas, os diálogos e, naturalmente, aqueles momentos de interação frente a frente.

 

Além disso, a concepção de Bakhtin sobre gênero não é estática, pois os gêneros sofrem transformações. E isso nós podemos verificar analisando as características de determinado gênero na sua origem e percorrendo a trajetória deste mesmo gênero. Em determinado momento desta análise verificamos as mudanças ocorridas sobre este gênero, seja ele qual for, para satisfazer as necessidades de comunicação, quer sejam transformações sociais, ou a mudança de procedimentos de organização.

 

Para o nosso trabalho estamos selecionando os gêneros instrucionais. Estes são definidos como formas estáveis, aliás, relativamente estáveis de enunciados reais. Neste trabalho, essencialmente, versaremos sobre “regras de jogo”. Aliás, este trabalho foi motivado pelo estudo desenvolvido no mestrado sobre gênero oral “regras de jogo” e gênero escrito ‘bilhete”, nas aulas de Aquisição da Linguagem.

 

Nos encartes de jogos infantis encontramos o gênero injuntivo “regras de jogo”. Esse material é sempre constituído de um título, que é o próprio nome do jogo, de instruções claras sobre a idade indicada para os participantes, o número de participantes para que o jogo possa se iniciar, quais as peças que compõem o jogo, o objetivo a ser alcançado, as instruções de como jogo e quem é considerado o vencedor, entre outros pequenos detalhes que não cabem ao nosso trabalho.

 

Independentemente do tipo de jogo, da faixa etários ou objetivos, as instruções parecem sempre acontecer da mesma forma. Inclusive, a idéia é chamar a atenção para o nome do brinquedo, já que o fabricante tem interesses comerciais sobre isso.

 

Quando nos reportamos às crianças, esperando que eles nos ajudem a entender o jogo, ou seja, quando elas precisam nos informar como proceder para que o jogo aconteça, a realidade é exatamente o oposto que nas caixas dos brinquedos. Não interessa aos pequenos o nome do jogo. Aliás, muitos deles, segundo a nossa pesquisa, sequer sabiam o nome da brincadeira que iriam nos ensinar.

 

Para melhor esclarecer aos leitores, lembramos que as crianças entrevistadas têm entre 3 e 6 anos de idade. Todas já se encontram inseridas no ambiente escolar e algumas já gozam do privilégio de dominar a habilidade escrita da língua.

 

As crianças sempre impressionam ao fazerem relações entre as coisas com as quais elas estabelecem contato. Assim, não será difícil de observar o que acontece em alguns trabalhos selecionados por nós, e que passaremos a apresentar agora.

 

Estas entrevistas que se seguem foram feitas com 25 crianças de várias escolas, incluindo algumas da capital - João Pessoa - e outras do interior - Rio Tinto. Essas crianças são de classes sociais diferentes cujos pais têm níveis de escolaridade bastante distintos. Nós selecionamos 4 casos que consideramos interessantes para explanar as nossas descobertas.

 

ORALIDADE - JOGOS EDUCATIVOS

CRIANÇAS DE 3 A 6 ANOS.

 

A intriga diante do universo infantil mobiliza muitos pesquisadores. Dentre esses pesquisadores, as grandes contribuições vêm de Piaget e Vygotsky no campo da psicologia cognitiva. E à psicanálise devemos inúmeras contribuições nos estudos sobre as relações entre a imaginação e a formação da identidade da criança.

 

Seus estudos permitiram aos educadores e à pedagogia, reavaliar o uso dos recursos utilizados na escola, como os jogos, brincadeiras e as histórias infantis. Brincar e contar histórias ganharam novos significados que ultrapassam a idéia de deixar os pequenos calados por um bom período de tempo.

 

Constatamos que as brincadeiras e histórias desempenham um papel fundamental no desenvolvimento afetivo e cognitivo das crianças.

 

Os estudos sobre o jogo infantil possibilitam identificar a construção da função simbólica que se faz através da representação e permite destacar o pensamento da ação.

 

Segundo Vygotsky, na brincadeira os objetos perdem sua força determinadora sobre o comportamento da criança, pois a ação, numa situação imaginária, ensina a criança a dirigir seu comportamento não apenas pela situação que a afeta de imediato, mas pelo significado destas situações.

 

A brincadeira fornece um estágio de transição em direção à representação. A chave da função simbólica é a utilização dos objetos como signos e a possibilidade de executar com eles ações representativas.

Na brincadeira, o que é regra torna-se desejo e fonte de prazer, o que no futuro, segundo Vygotsky, constituirá o nível básico da ação e da moralidade.

 

O desenvolvimento da imaginação associa-se diretamente à aquisição da linguagem, que possibilita à criança imaginar um objeto que ela nunca viu antes, ou seja, a criança aprende a separar-se da ação real através de outra ação, desenvolvendo a vontade, a capacidade de fazer escolhas conscientes e operar com situações que levam ao pensamento abstrato. A ação na esfera imaginativa, numa situação de faz-de-conta, permite a criação da intenção voluntária, de planos de vida real e do que se quer ou se quer ser. Assim, observaremos agora algumas das crianças que entrevistamos para a construção do nosso trabalho.

 

Já neste primeiro momento algo de interessante acontece. A criança, denominada por nós de Ricardinho, sem saber que estava sendo gravada se reporta da seguinte forma quando lhe foi perguntado como se joga bola, futebol:

 

Ricardinho- (.) Tem que ((?)) uma lista pa formar um campo...  Aí joga a bola aí bate na barra pa fazer gô.

 

Ao perceber que estava sendo filmada ela pede para explicar novamente. Observamos que há, ainda que pequeno, um interesse por parte da criança em fazer melhor a apresentação do jogo.

 

Ricardinho –((?)) um campo pa fazer o verde. Pa virá um campo aquele negócio.  Vai ((?)) a bola entra fica e faz um GOL.

 

/tu sabe jogar isso?/

 

Ricardinho –SEI,SEI.

 

/Quem te ensinou?/

 

Ricardinho –Meu pai.

[[

 

Ricardinho – [[ :AÍ,AÍ vai com a bola, vai com a bola vai com a bola e entra.

/.../

:aí((?))

((?))  AÍ(...) CAMPIÃO.

 

A nossa segunda criança, que chamaremos de Aninha, já se preocupa com o fato de estar sendo filmada e tenta explicar tudo da melhor maneira possível.

 

É assim... você pega o vídeo game acessa o site... Ai... fica jogando até ver o monstro...ai aperta, tem um coringa de batina... ai a gente fica lutando...ai matou... matou o homem... mata homem monstro...ai na parte do coringa ele mata vez ele o coringa mata ...

(Neste momento alguém no ambiente da gravação começa a rir)

O que foi...? ta rindo de mim...? depois... ai o homem pa o filme e mata... serve pa matar e fica também a parte dos filmes...fica só conversando...

(como é que faz para ganhar o jogo?)

Tem que ficar o dia inteiro...

 

 

Este é outro caso curioso. Embora a criança não estivesse preocupada com o fato de estar sendo filmada, sua oralidade se realiza de forma díspar do que se espera para uma criança de 5 anos.

 

Carlinhos

V: Quantos lápis há nesta caixa?

C: au, io, des, oio, ói, inho, ói, inho, au.

V: Tudo isso?

C: É... Exe é meu... Esse aqui é o nhão... Nhãããão.

V: Ah, já sei! Você vai voar. E no avião você vai brincar de massinha, não é isso?... Tudo bem! Cê sabe que cores tem aí? Que cores são essas?

C: atu

V: Mostra a cor que eu quero ver...

C: atu, atu, atu, atu, atu, atu, atu, atu, atu, atu, atu, atu

V: todas essas?

C: É... Aí, ó

E você vai brincar com todas elas?

C: É... Aí... Ó

V: Muito bem!

C: É aí...

V: Eu posso abrir pra você?

C: É

V: Posso? Deixa eu te ajudar, então. Peraí. Deixa eu dar uma pausa aqui... Agora eu quero ver o que que você vai fazer. Eu quero ver o que que você...

C: Eu vou rascá ete... Ete cá. Ete atui.

V: E que cor é essa?

C: Túiu

V: É? Muito bem!

C: Aque raigá.

V: muito bem! Você vai fazer oq eu daí?

C: Eu testá... Oi

V: Ok

C: A... Ô...

V: E qual que var ser o peixinho:

C: O peixinho aqui (fala baixinho)

V: Faz um para mim que eu quero ver o que você vai fazer... Você só me conta, tá? O que você vai fazer? Isso! Muito bem!

C: aaaai. Caiu

V: O que que aconteceu aí?

V: O peixe? Muito bem! Eita, mas tá ficando um peixe tão lindo! Você vai fazer desse tamanho ou vai fazer grande?... Nossa que peixe grandão que você fez...

C: iu, dá, a, oi... Uh...uh...

V: Pode falar que eu to te ouvindo

C: a... A... Ao qui a tuz.

V: a luz está acesa ou apagada? (a luz da filmadora)

C: a tuz

V. Tá acesa?

C: (balança a cabeça negativamente)

V: eu posso olhar?

C: (balança a cabeça positivamente)

V: tá apagada? Ah... Ela está apagada... Eu vi...o. Ela está apagada... Tá vendo...

Percebe-se claramente que as crianças começaram a contar como se desenvolvem os jogos partindo do ponto que elas acreditavam ser mais importante. Elas vão direto ao modo de jogar.

 

A partir da oralidade a criança começa a estabelecer algum vínculo com a escrita, portanto, é importante considerarmos o trabalho com a oralidade em sala de aula. Não há mais lugar para aquelas aulas onde o professora fala, a criança somente escuta e não tem direito de se manifestar. Aliás, não se pode permitir que se peça para a criança ficar em silêncio.

 

A influência no desenvolvimento oral da criança tem diferentes significados para o desenvolvimento da escrita. Os pequenos escrevem números de palavras diferentes e ensinam a jogar de diferentes formas.

Como observamos durante a apresentação das falas das crianças, verificamos que elas passaram pelos vários processos, tais como intuitivo, cognitivo, emotivo e de interação, que é o instrumento para o desenvolvimento de suas funções na linguagem falada e escrita

 

A capacidade do que se espera na aprendizagem dessas crianças parte da interação da criança com o social. É particular no sentido de que quando pedimos algo para a criança fazer, seja na fala ou na escrita ela jamais fará da maneira que ensinamos ou pedimos, a sua subjetividade mais o seu cognitivo, decodificam, transformam e criam seu próprio estilo de aprender a falar, ler e escrever.

 

A compreensão da criança parte de visões diferentes que ela tem. Essas visões estão condicionadas dentro dos processos comunicativos, desenvolvem-se da atenção conjunta que adquire por memória visual, observação e às vezes de técnicas criativas para a concretização do objetivo que é o que se quer que a criança faça ou aprenda

 

Torna-se fácil observar tanto na linguagem verbal ou não verbal que para formular palavras houve uma construção do pensamento e só assim a criança pôde fazer a representação do que foi pedido/imposto a ela passando do mundo real para o surreal, da realidade para a fantasia.

 

A criança tem uma sensibilidade muito grande ao perceber o que queremos dela e o que de imediato ela consegue transmitir. Para isso acontecer houve um processo extraordinário - passar do universo de pensamentos para aquisição da fala. As ações levaram a representação das relações figurativas do conhecimento do que aprendeu e o que as transformações mentais fizeram, modificando, aprendendo, registrando na sua cognição tudo que aprenderam e como elas explicaram as regras dos jogos e a forma de jogar.

 

Parece-nos uma forma de solução para que a criança possa realizar plenamente a descrição de um jogo, por exemplo, iniciar essa atividade em um ambiente especial. Seria interessante preparar o ambiente da contação de história, pois, neste momento que é reservado para contar e recontar histórias a criança se sente à vontade para expor suas ideias.

 

O professor deve marcar os pontos importantes. Dizer o nome da história e chamar a atenção das crianças para esse fato, pois toda história, assim como jogos etc, tem nome e o nome é algo importante. Todas as vezes que ouvimos o nome de determinada história já sabemos qual é.

 

Depois da contação de história, conversar com as crianças como essa ordem (introdução, desenvolvimento, conclusão) é importante para tudo na vida. As coisas não acontecem de qualquer jeito.

 

Pedir que uma delas recontasse a história lembrando a importância de todas as etapas anteriores.

 

Esta atividade deve ser uma constante na vida desses alunos para que eles possam fazer essa leitura do mundo, cronológica. Isso traz o amadurecimento e, conseqüentemente, a escrita, quando surgir, se fará de forma cronológica, sem atropelos de idéias.

 

Portanto, concluímos que se faz necessário que nos interessemos em conhecer um pouco mais sobre a mente infantil. É importante verificar suas fragilidades em relação à construção do raciocínio, do experimento, para que possamos nos preparar adequadamente a fim de que consigamos extrair o melhor delas. As crianças são fantásticas e estão cheias de vontade de fazer. Se este trabalho for cheio de dedicação, as nossas crianças não terão problemas para alcançar a escrita de forma coerente, expressiva e clara.

 

 

 

AGRADECIMENTOS

 

 

A Escola Doce Infância (particular), a E. E. E. F. Frederico Lundgren todos localizados em Rio Tinto/PB, ao Instituto Senhora da Paz, localizado em João Pessoa, e aos pais das crianças da cidade do Recife que colaboraram para realização desse trabalho.

 


 

Bibliografia

 

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FIORIN, J. L. Elementos de análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2001

 

BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. 3ª ed. São Paulo: Hucitec, 1986.

 

______. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1953 e 1992.

 

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TOMASELLO, Michael. Origens culturais da aquisição do conhecimento humano? Michael Tomasello; tradução Claudia Berliner - São paulo: Martins Fontes, 2003 - (coleção tópicos) GÊNERO INJUNTIVO REGRAS DE JOGO: A CRIANÇA E SUA VISÃO DO LÚDICO - DO ORAL À NECESSIDADE DE BRINCAR.