OS PROBLEMAS DO FRACASSO ESCOLAR EM NOSSA SOCIEDADE

 

O fracasso escolar de crianças e adolescentes do ensino fundamental é tema de pesquisas e estudos com grande relevância, especialmente entre crianças e adolescentes de escolas públicas, pois estas apresentam os piores índices estatísticos de avaliação do ensino. Com a obrigatoriedade escolar, tem-se percebido consideráveis aumentos de crianças e adolescentes que apresentam dificuldades de aprendizagem, isso se deve à abertura e a possibilidade de ingresso de uma classe social desfavorecida, que antes não tinha o acesso à educação escolar gratuita.

Sabemos que existem muitas relações entre o fracasso escolar de alunos de escolas públicas ou de meios sociais excluídos, isto não quer dizer que estaremos agindo de forma preconceituosa ao analisarmos esse grupo social.

Ferreiro, Emília – 1986, em seu livro A Psicogênese da Língua Escrita, relata uma pesquisa com crianças em fase de alfabetização e destaca as diferenças de níveis de conceituação da aquisição da linguagem escrita entre crianças oriundas de camadas sociais menos favorecidas, comparadas a outras classes sociais.  Esta diferença nos faz refletir sobre a questão e buscar explicações para o fato.

Relacionaremos a dificuldade aqui sugerida às questões da afetividade como principal fator de intervenção no desenvolvimento cognitivo e a gênese da formação da inteligência. Mas não consideraremos como única causa do fracasso escolar. Consideramos afetividade como todos os sentimentos que permeiam nossas ações, sejam eles positivos ou negativos (amor, ódio, alegria, tristeza, prazer, dor, satisfação, decepção, etc.).

O fracasso escolar inicia-se desde cedo, ainda no seio familiar a criança desenvolve suas estruturas cognitivas e afetivas que serão a base para o sucesso ou o insucesso nas aprendizagens, tanto escolares, como extra-escolares. Segundo Piaget, 1896 em seu livro, o Nascimento da Inteligência, relata que o bebê com apenas alguns meses, demonstra emoções ao sorrir. Apesar de ser um comportamento adquirido de forma hereditária, demonstra os primórdios do reconhecimento que irá evoluir como um sinal social. Este reflexo motor demonstra que as emoções e prazeres iniciam-se no período sensório-motor, evoluindo para comportamentos intencionais, que segundo Piaget, esses comportamentos comprovam o nascimento da inteligência por volta do seis meses de idade. Portanto, uma criança que recebe os cuidados necessários para seu desenvolvimento sadio ainda bebê, tem maiores chances de um desenvolvimento cognitivo e afetivo apresentando condições mais adequadas de adaptar-se à escola vivendo plenamente todas as oportunidades de crescimento continuo.

Piaget não desenvolveu grandes pesquisas sobre a afetividade, mas os seus escritos sobre o tema nos fazem compreender melhor a importância do tema diante do desenvolvimento cognitivo. Segundo ele, não existe aprendizagem sem afeto e não existe afeto sem aprendizagem. Um depende do outro e os dois juntos constroem a base do desenvolvimento cognitivo. São indissociáveis. A afetividade interfere no funcionamento da inteligência estimulando-a ou retardando-a através de sentimentos agradáveis ou desagradáveis. A motivação e o interesse aceleram a aprendizagem, enquanto que perturbações e emoções negativas retardam ou impedem. A afetividade impulsiona a aprendizagem e o interesse pela descoberta do objeto, considerando-se assim a assimilação. Já a acomodação, é o ajuste das estruturas cognitivas do pensamento advindas do objeto. Ou seja, a aprendizagem ocorre quando há um objeto um sujeito e as relações entre os mesmos. Na prática, podemos dizer que a aprendizagem ocorre quando as estruturas cognitivas estão em equilíbrio com as emoções. As emoções, assim como a inteligência são aprendidas a partir do meio, sendo necessário o amadurecimento de ambas para que ocorra a adaptação.

As crianças que não recebem afeto familiar e social, não são compreendidas e aceitas na sua individualidade apresentam mais dificuldades de relacionamentos interpessoais e consequentemente defasagens na suas aprendizagens.

O fracasso escolar não se refere somente a repetências, desistências ou dificuldades de aprendizagem dos conteúdos. A escola em sua proposta democrática e social apresenta conteúdos que vão além das aprendizagens de conteúdos comuns obrigatórios. Busca desenvolver habilidades para que a criança ou o adolescente possa conviver e relacionar-se em uma sociedade, com igualdade de condições. Diante deste aspecto, o aluno deve aprender  tomar decisões, criticar, planejar, organizar e muitas outras habilidades que serão essenciais para seu sucesso tanto profissional quanto pessoal. A afetividade é um importante fator para a contribuição da aprendizagem dessas habilidades já que estas estão intimamente ligadas às emoções.

Arantes, Valéria Amorim, 2003, em seu Livro A Afetividade na Escola, expõe que os problemas de aprendizagem na escola declaram que há algo errado na educação. A violência, agressividade, indisciplina, falta de interesse são sintomas de problemas afetivos e prejudicam a aprendizagem.

Segundo Freud, a participação dos pais e fundamental para o desenvolvimento sadio da mente da criança. E educá-las é decisivo para a construção do lugar da criança no mundo. É de responsabilidade dos pais tais problemas, já que estes tem uma participação importante na estrutura da mente. Mas deixaremos claro que os problemas de aprendizagem não são culpa dos pais, pois esses participam de forma inconsciente na educação dos filhos e carregam conceitos e preceitos de longos anos. Uma criança que convive em um ambiente familiar conturbado ou em uma família desestruturada (a situação socioeconômica em condições de classe subalterna gera uma vida sofrida, desumana, privada de informações), está carente não apenas de aspectos materiais, mas de esperanças, de cuidados, de estímulos, o que pode retardar o amadurecimento de estruturas necessárias ao aprendizado.

Em nossa sociedade, o trabalho é um meio de sobrevivência e imprime uma realidade complexa. Os pais, na grande maioria, deixam de oferecer uma educação familiar aos seus filhos, delegando esta a instituições educadoras, que não conseguem suprir esta carência. Ficando os filhos com brechas afetivas e cognitivas. Gerando problemas de aprendizagem ou sintomas que prejudicam a aprendizagem, muitas vezes, antes mesmo de freqüentarem a escola. O fracasso escolar já está decretado mesmo antes da criança conhecer a realidade de uma educação formal.

A escola e alguns profissionais da educação também contribuem para o fracasso escolar, já que é um meio de exclusão social mascarada. Ao reprovar um aluno, além de afastá-lo da instituição escolar, deixa marcas de fracasso individual, gerando conflitos pessoais e emoções negativas no aluno. Essas emoções interferem diretamente no desenvolvimento cognitivo e afetivo. Além do que, a escola ainda apresenta uma dualidade sobre a aprendizagem, valorizando os aspectos racionais em detrimento dos emocionais, o que fortalece a exclusão e fortifica o fracasso.

O problema aqui apresentada, não busca remeter a culpa do fracasso escolar do aluno nele mesmo, nem na família ou na escola. Mas busca encontrar explicações e possíveis soluções para o evento. Sabe-se que a educação tem dado pouca importância para o desenvolvimento afetivo em vista disto, encontramos crianças e jovens com problemas existências e comportamentais, com nenhum interesse pelo aprendizado escolar ou com sérios problemas de aprendizagem, sintomas de uma sociedade em desequilíbrio.

 

Bibliografia:

ARANTES, Valéria Amorim. A afetividade na escola. São Paulo, 2003

COSTA, Dóris Anita Freire. Fracasso escolar: diferença ou deficiência? Porto Alegre 1994.

FERREIRO, Emilia. A psicogênese da língua escrita. 1986

PIAGET, Jean. O nascimento da inteligência na criança. Rio de Janeiro, 1896.