Fome, uma violação aos direitos humanos.

Amanda Dias*

Daniel Novais

Jacqueline Lins

Lorena Guimarães

Lorena Queli

Maiara Almeida

Tereza Dourado

Resumo:

Este artigo procura mostrar como a fome vem sendo tratada diante da sociedade mundial, evidenciando que a atual postura sobre o problema contraria a Declaração dos Direitos Humanos, acordo firmado na década de 40. O objetivo central é abordar o tema dentro das perspectivas filosóficas, antropológicas, cívicas, constitucionais e econômicas , de acordo com a realidade atual, não visando condenar , nem encontrar soluções pitorescas para o assunto, mas conduzir a uma reflexão e mudança de atitude. Finalmente, após análise partindo desses perspectivas, buscou-se reforçar a importância da aplicação prática da Declaração dos Direitos Humanos para a garantia da equidade entre os seres humanos e a minimização do problema Fome em nosso planeta.

Palavras-chaves: Fome; Responsabilidade Social; Direitos Humanos; Economia Social.

ABSTRACT:

This article tries to show how hunger is being treated in the face of global society, showing that the current stance on the issue contradicts the Declaration of Human Rights, agreement in the decade of 40. The central objective is to address the issue within the philosophical perspective, anthropological, civic, economic and constitutional, according to current reality, not aimed at condemning, or find solutions to this picturesque, but lead to reflection and change of attitude. Finally, after analysis on these perspectives, trying to reinforce the importance of practical implementation of the Declaration of Human Rights for ensuring equality between human beings and downplaying the problem Hunger in our planet.

Keywords: Hunger; Social Responsibility; Human Rights; Social Economy.

1. INTRODUÇÃO

O presente artigo é resultado de pesquisa bibliográfica e reflexões teóricas, no sentido de trazer alguma contribuição para o debate sobre o tema proposto. Longe da pretensão de apresentar conclusões, tampouco um conteúdo exaustivo, constitui-se, antes de qualquer coisa, numa análise sob as perspectivas filosóficas, antropológicas, cívicas, constitucionais e econômicas, no intuito de, minimamente, subsidiar o início de uma reflexão.

Na atual conjectura social, onde a violência alcança índices alarmantes, onde as ações criminosas são cada vez mais organizadas e desenvolvidas em relação ao próprio Estado, onde a vulgarização de valores morais e éticos são alicerces para grandes males, onde conflitos são iniciados em nome de um capitalismo sem escrúpulos e, em especial, a fome faz ecoar por todo o globo o grito das entranhas dos miseráveis que a cada dia vêem suas vidas definhando devido à falta de alimentos, é indispensável refletir sobre os Direitos Humanos nessas perspectivas.

Não é uma tarefa fácil essa abordagem, mas a sociedade e o Direito, como mecanismos de controle e organização social, devem interagir para encontrar os motivos e buscar soluções para o assunto que iremos abordar no presente artigo.

A Fome, foco principal deste trabalho está a séculos corroendo a vida de centenas de milhares de pessoas, e diante do recente e gritante aumento monetário dos alimentos esse assunto volta à pauta mundial. Organizações mundiais, com o temor da possível falta de alimentos, estão se pronunciando e condenando alguns setores como culpados. Sendo assim, temos por finalidade revelar as condutas, abordagens, conteúdos e regras que dispõem no âmbito Antropológico, Filosófico, Civil, Constitucional e Econômico sobre o problema Fome, por ser este uma grave afronta à Declaração Mundial dos Direitos Humanos.

2. A questão da fome ao longo do tempo e sua abordagem antropológica atual.

No início da humanidade o homem era um ser nômade, que corria atrás do próprio alimento, procurando um melhor acesso a alimentação. A partir do momento em que a arte da produção de alimentos foi inserida em sua cultura, constituindo assim sociedades com regras e valores éticos foi possível a esse mesmo homem firmar-se em determinado lugar, criando normas de coexistência objetivando um melhor convívio dentro das sociedades (senso comum) que acabavam de se formar. Por muito tempo, a força ou a habilidade do homem foram fatores de lideranças, em outro momento histórico quem passa a governar é o ser mais velho e sábio da tribo, mais adiante surgem os líderes natos que dominam com o uso da força e inteligência. A partir de então líderes se formavam e grandes batalhas surgiam, pois grandes sociedades tinham o intuito de conquistar outras começando assim a surgir grandes Impérios.

Com o surgimento dos grandes Impérios, surgem também grandes desigualdades, algumas trazidas com as batalhas, haja vista que o governo gastava muito com armamento e não investia na subsistência da população. Inicia-se assim a surgir uma história de fome[1], além da escravidão - dois fardos que acompanharão o homem por um longo período da história.

Nesse contexto grande parte da população não tem mais saúde e passa fome, não tendo como manter sua própria dignidade.

Sendo um fato muito mais antigo do que imaginamos, não foi no período pós-guerra que a fome surgiu, como acima observado, contudo foi nesse período que se passou a tratar do tema sem vergonha. A fome foi o estopim de grandes guerras e alimentou algumas revoluções, que trouxeram garantias, as quais obrigaram o Estado a dar à população condições para que a pessoa humana vivesse com o mínimo de dignidade. Em meio a tantas revoluções o homem luta por seus direitos básicos, por sua dignidade, e o mais importante, neste momento a população mundial se vê obrigada de alguma forma a proteger todos esses direitos, o que propiciou o nascimento da Declaração Universal de Direitos Humanos.

Se este tratado internacional fosse cumprindo à risca não estaríamos vendo tantas desigualdades, todavia não é o que se vê hoje em todo o mundo, o que vemos são milhares de pessoas vivendo na miséria, não tendo condições básicas de saúde e higiene e morrendo de fome. Segundo Josué de Castro (1969) [2]:

A fome é, conforme tantas vezes tenho afirmado a expressão biológica de males sociológicos.Está intimamente ligada com as distorsões econômicas, a que dei, antes de ninguém, a designação de subdesenvolvimento.

A fome é um fenômeno geograficamente universal, a cuja ação nefasta nenhum continente escapa. Toda a terra dos homens foi, até hoje, a terra da fome. As investigações científicas, realizadas em todas as partes do mundo, constataram o fato inconcebível de que dois terços da humanidade sofre, de maneira epidêmica ou endêmica, os efeitos destruidores da fome.

Com isso podemos ver que a fome sempre foi um problema a ser resolvido, a população buscava uma solução para combater um dos piores males que aflige o ser humano. Essa dificuldade não é apenas do passado, pois ainda hoje, depois de tanta evolução o homem enfrenta tais dificuldades. Notamos que antes a fome era conseqüência de guerras, catástrofes e falta de avanços da agricultura, entretanto a fome contemporaneamente dar-se devido à ganância capitalista, da falta de comprometimento com a Declaração, dentre tantos outros motivos. Mesmo diante de inúmeros avanços tecnológicos estamos fadados a viver com as políticas econômicas que priorizam esmagar os pequenos e aumentar ainda mais os grandes, fazendo com que a comida não alcance todas as partes do globo.

3. Ética, Moral, Direitos Humanos e Fome.

Para ajudar a nossa compreensão sobre a problemática Fome, devemos nos adentrar no tema de compreensão dos valores éticos e sua aplicação na Declaração dos Direitos Humanos.

Mesmo passando por momentos dificeis na sociedade grega, os filósofos ainda assim refletiam sobre as mais altas virtudes humanas e creditavam a felicidade justamente àprática da bondade, conceito que unifica as três noções de ética, ainda que divergindo sobre o significado da eudaimonia , entendida como posse de bens reais, dotados de um valor objetivo à felicidade derivada da harmonia entre os componentes da alma.

Podemos dizer, a partir dos textos de Platão e Aristóteles, que, no Ocidente, a Ética ou Filosofia Moral inicia-se com Sócrates. Para ele, o conceito de ética iria além do senso comum da sua época, o corpo seria a prisão da alma, que é imutável e eterna. Existiria um "bem em si" próprio da sabedoria da alma, e que pode ser rememorado pelo aprendizado. Já Aristóteles subordina sua Ética à Política, acreditando que na monarquia e na aristocracia se encontraria a alta virtude, já que esta é um privilégio de poucos indivíduos. Ele também diz que na prática Ética, nós somos o que fazemos, ou seja, o Homem é moldado à medida que faz escolhas éticas e sofre as influências dessas escolhas.

Se imaginais que, matando homens, evitareis que alguém vos repreenda a má vida, estais enganados; essa não é uma forma de libertação, nem é inteiramente eficaz, nem honrosa; esta outra, sim, é mais honrosa e mais fácil: em vez de tampar a boca dos outros, preparar-se para ser o melhor possível." (Palavras atribuídas a Sócrates por Platão, ao final do seu julgamento)[3]

A Ética é algo intrínseco a cada individuo, abrange o comportamento de cada um, regulando o que pode ser feito ou não. É a parte da filosofia que se ocupa com a reflexão a respeito das noções e princípios que fundamentam a vida moral, é o conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens na sociedade em que vivem, garantindo, assim, o bem estar social, ou seja, é a forma que o homem deve se comportar no seu meio social.

As atitudes éticas de uma sociedade quando são aplicadas corretamente promovem um melhor bem-estar entre todos, ajudando o próximo e a si mesmo. Se isso ocorresse, como foi intencionado, aprovado e sancionado na Declaração dos Direitos Humanos em 1948, decisivamente estaríamos gozando de melhor qualidade de vida, em todos os sentidos.

Como já é nítido, a fome no mundo atinge milhões de pessoas. Esses indivíduos não possuem os recursos necessários para obter uma nutrição mínima que atenda às necessidades físicas. Assim, quando citamos o respeito à vida, não significa apenas a vida corporal de estar vivo, mas também lhe conceder a garantia de que todas as suas necessidades básicas serão atendidas, ou seja, a garantia de uma vida digna com a segurança de que as necessidades primárias de um bem estar serão atendida. Todo cidadão tem necessidades temporais e do corpo, que se não forem atendidas o levarão a morte, ou a uma vida incompleta, sem dignidade. Um exemplo de agressão a sua existência é a situação da pobreza, essas pessoas que vivem na penúria estão morrendo rapidamente por falta de alimentos, de assistência médica e de condições mínimas para conservação de suas vidas, e com o noticiado aumento dos preços dos alimentos volta às manchetes o problema da fome mundial. Esse aumento de preços pode vir a aumentar drasticamente os problemas ligados à miséria. A fome é uma grande ameaça não só a vida, mas à dignidade humana.

A vida é o bem mais precioso do ser humano, é o seu primeiro valor moral e deve ser respeitada em todos os sentidos, seja a vida humana, animal ou e a vida do meio ambiente. A tendência mundial de só se preocupar com as questões econômicas e sempre deixar de lado outros fatores, criará, e já criam seus castigos, pois, entre várias conseqüências estão: o aumento dos preços de alimentos, o degelo polar, aumento da camada de ozônio entre outros, dessa maneira o descaso da humanidade com as questões relacionadas com a sua própria perpetuação denota ser uns dos maiores problemas éticos do mundo contemporâneo.

Existe, porém, grandes exemplos da conduta ética, que fazem prevalecer a força do respeito entre as pessoas. São pessoas e organizações que invariavelmente contribuem na tentativa erradicar ou então amenizar a fome mundial. Órgãos como Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), uma organização internacional que lidera esforços ao combate a fome e ainda ajuda alguns países a aperfeiçoar suas atividades agrícolas, florestais e pesqueiras, tentando assegurar assim uma nutrição saudável a todos. Há também a Associação de Agricultura Orgânica (AAO), que defende o direito que uma pessoa tem de ter alimentação sadia e equilibrada, preservando o homem e o meio ambiente. No Brasil, podemos citar o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome, que nos últimos anos realizou com eficiência programas de combate a miséria, entre os mais conhecidos o Bolsa Família dentre diversas outras organizações que lutam contra esse mal.

Percebemos que se nós procurássemos ter uma vida pautada nas condutas éticas e realizássemos a fiscalização aos órgãos que não seguem eticamente seus objetivos, colocando interesses políticos e econômicos à frente dos seus reais objetivos, poderíamos ajudar na redução da fome mundial. Se as nações deixassem de lado suas posturas usurpadoras, ou seja, anti-éticas, de apenas contrair riquezas e passassem a ter a questão social como prioridade, poderíamos ter um mundo melhor. Em suma, percebemos que o maior mal da fome, não é a falta de comida, mas sim a falta de escrúpulos dos homens que possuem o poder, e mesmo assim nada fazem para acabar com esse mal.

4. A proposta do Direito Civil para combater as Desigualdades Humanas.

O homem, enquanto ser social está sujeito ao convívio com outros indivíduos para poder realizar seus atos. O convívio social se faz necessário para a manutenção da nossa própria vida, de modo que as necessidades das pessoas, como seus interesses, são satisfeitos com a troca de bens, informações ou serviços. Sendo assim, desde os primórdios, de modo direto ou indireto, concreto ou não, o ser social desempenha relações políticas, econômicas, culturais e familiares em seu meio para assim possibilitar que todos possam sobreviver entre si, seja coletiva ou individualmente.

No intuito de efetivar a vida em sociedade foi necessário o estabelecimento de normas de convívio. Essas ações, obviamente, não poderiam ser regidas pela vontade singular, pois as mesmas não poderiam florescer atendendo à vontade individual, mas, estas regras, deveriam ser criadas de modo coletivo visando atender a todos com legitimidade e eficácia. Destarte as normas que regulam o convívio das pessoas em sociedade é o Código Civil.

Na frente da fiscalização das condutas do Estado e do homem está o próprio Estado. Ele, na classe de instituição destinada à organização da sociedade e no dever de proporcionar o bem comum, possui, entre outras funções, criar normas jurídicas aplicáveis a todos. Assim, o Código Civil que foi instituído pelo Estado e seus legisladores, respeitando a Carta Magna, visam proteger e regular as inter-relações dos cidadãos de uma sociedade na esfera jurídica e social.

Além do Código Civil como lei fundamental da Nação, há também a Constituição. Uma forma as estruturas e as pertinências do Estado em razão do indivíduo e da sociedade civil, essa seria a Constituição, já a outra menciona à pessoa humana e à sociedade civil como tais, abarcando suas atividades essenciais. E esta, obviamente, seria o Código Civil.

Muitos autores e estudiosos do Direito, entre eles Miguel Reale, pactuam que a visão do atual Código Civil é voltada para o sentido social .

Se não houve a vitória do socialismo, houve o triunfo da "socialidade", fazendo prevalecer os valores coletivos sobre os individuais, sem perda, porém, do valor fundante da pessoa humana. Por outro lado, o projeto se distingue por maior aderência à realidade contemporânea. (REALE, 1998,p. ?)

Evidentemente percebemos que a postura adotada a equivaler as regras do positivismo jurídico, até então, praticamente, unânimes no meio jurídico do período antes de 1948 e ao lado dos conceitos jus naturalistas advindo e revivido com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, contribuíram para formalização, elaboração e concretização de um Código Civil dotado de espírito social e humanista, voltado a observar os direitos, deveres e avanços no contexto de uma nova sociedade. Essa sociedade, que saiu traumatizada de duas guerras mundiais, decidida a ter uma inovação na postura perante as atrocidades cometidas em um mundo "injusto".

Diante destes pressupostos é que o Código Civil se emparelha à Declaração dos Direitos Humanos, pois ao entendermos os Direitos Humanos como algo inerente a cada ser e como melhor explica seu preâmbulo.

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo [...] (DECLARAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS)

Torna-se lastreado e digno a composição de um Código Civil ponderado em considerações que respaldam a dignidade humana, a isonomia entre pessoas, o respeito à individualidade e a vida, entre outros. É que seus efeitos de mudanças , bem como seu foco, que é a regulação do convívio em sociedade mostram-nos a ligação existente entre o Código Civil e a Declaração dos Direito Humanos.

Será então a fome, que assola milhões de pessoas por todo mundo, um sério descumprimento dos Direitos Universais? E ainda, o embelezamento de normas "praticamente perfeitas" existente nas constituições, e em especial no Código Civil, não deveriam ser efetivamente colocados em prática para atender as necessidades sociais, em especial o problema da fome, a que eles se destinam?

Ao adentrarmos no quesito fome nos deparamos, talvez, com um das maiores males da humanidade contemporânea. Esse é um mal silencioso, que corrói, desmoraliza, violenta e mata. Quando nos referirmos ao silêncio pretendemos mostrar a inércia dos Estados, Políticos e Sociedade diante do caso.

A Declaração Universal tem previsto o direito à vida e uma vida digna. Por sua vez, o Código Civil, em sua parte geral, prevê regular as regras de convívio social dos indivíduos entre si e em relação ao Estado e deste modo podemos assegurar que o direito à vida e a uma vida de dignidade é uma regra importantíssima para o bom convívio social. Podemos mencionar ainda que o problema Fome como algo propulsor de querelas, se não existisse poderia contribuir para uma melhor harmonia social, e assim menor necessidade das intervenções jurídicas.

Então surge mais uma pergunta: Seremos fadados a conviver com a miséria humana do outrem e a só tomar alguma atitude quando o problema chegar ao nosso meio diretamente?A resposta é sim, visto que só agora, com as recentes altas dos alimentos a nível mundial este assunto vem à pauta nas grandes nações e em organismos mundiais.

Estamos vendo recentemente o aumento de gêneros alimentícios e órgãos como a ONU vinculam a culpa ao uso de solos produtores para a produção de culturas voltadas ao biocombustível, alegando que nações, entre elas o Brasil, estão deixando de produzir alimentos para cultivar tais lavouras. Contudo, o mais aceitável sobre a recente alta dos alimentos é que o mundo em geral está comendo mais devido ao crescimento econômico de nações, como a China, Índia, o próprio Brasil, entre outras. Desta maneira, a agricultura mundial não estaria preparada para atender essa demanda, provocando as especulações e altas dos preços. É bem verdade que grandes potências mundiais nunca deram a devida importância ao problema Fome, sempre se preocupando mais em fabricar armas do que investir em políticas de combate à fome no mundo. Dessa maneira torna-se aceitável que essas mesmas grandes potências só se mobilizaram contra a alta dos alimentos porque o custeio de subsídios a seus produtores e as despesas em importação de alimentos batem a suas portas.

O Direito Civil, como mecanismo jurídico altamente importante na regulação da conduta publica e privada, tem estreita ligação com o problema Fome, até porque a fome causa mortes e conflitos sociais. Dentre outras previsões, o direito civil consiste em regular a vida social entre os indivíduos, e a fome é um inimigo que contribui para o surgimento de conflitos causadores de desordem e conseqüentemente fere o direito.

5. Direitos Humanos dentro da Perspectiva Constitucional.

A fome é um dos temas mais preocupantes no mundo como já fora visto. É um assunto que pede bastante atenção e solução imediata. É uma luta diária que tem diversas causas, dentre elas, e talvez uma das principais a fragilidade das constituições de determinados paises que não conseguem pôr em pratica o que regulamenta as suas leis, como também, a existência de normatizações que não prevêem determinadas proteções para o individuo em relação ao problema em baila. É importante ressaltar os motivos que causam tanta miséria, entre essas razões encontramos a situação socioeconômica de alguns paises, as desigualdades sociais que são fatores preponderantes que alimentam a fome.

No âmbito global nos deparamos com o jogo de interesses de nações desenvolvidas que para a manutenção dos seus poderes não se preocupam com a fome do resto do mundo.

De acordo com notícia vinculada à Agência Internacional Reuters, um coordenador da ONU, disse em Genebra "que a escassez de comida e o aumento do preço dos produtos alimentícios no mundo todo tendem antes a provocar subnutrição do que a matar de fome, ao menos no curto prazo", ou seja, o aumento dos alimentos, pelo menos em curto prazo, não será o efetivo causador de mortes por fome. Acontece que esta subnutrição causa sérios problemas de saúde, levando assim à morte. Alguns economistas acreditam que tal crise está sendo provocada devido à alta dos combustíveis e dos fertilizantes e o uso de terras aráveis para produção de biocombustíveis, como já foi mencionado no próprio artigo. É importante ressaltar que o Brasil não passa por problemas de falta de terras para produção de alimentos, entretanto a da fome sim. Pesquisa realizada pelo IBGE em junho de 2006 revela que pelo menos 14 milhões de pessoas passaram fome quase todos os dias, 25,5 milhões em vários dias e 35,5 milhões se alimentam em menor quantidade do que a considerada ideal, a maioria desta população mora no norte ou nordeste.

Tal fato é uma total violação aos direitos das pessoas e contrariam princípios constitucionais. Durante a Conferência Mundial sobre Alimentação (1974), as Nações Unidas estabeleceram que "todo homem, mulher e criança, têm direito inalienável de ser livre da fome e da desnutrição.", reafirmando os objetivos dos Direitos Humanos.

Na Constituição Brasileira de 1988, artigo 4°, inciso II é assegurado a "prevalência dos direitos humanos", no artigo 5° garante a "inviolabilidade à vida", e o art.1° tem como um dos seus fundamentos a dignidade da pessoa humana. Enfim, são inúmeros os artigos que garantem os direitos do cidadão, que garantem o direito à vida.

A fome é algo que viola esses princípios acima mencionados, podendo causar até a morte, o que nos leva a afirmar que os índices mostrados são um total desrespeito ao cidadão, pois não permite que os seus direitos sejam devidamente atendidos, ao contrário, o que ocorre é um total descaso para com a população, já que uns sem número de brasileiros convivem com a fome.

Evidentemente o principio de igualdade entre todos não está sendo respeitado. No preâmbulo da Constituição Brasileira de 1988, os nossos representantes, assim declaram:

Nós, representantes do povo brasileiro, (...) para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional (...)

Infelizmente podemos constatar que esse principio da igualdade não tem passado de uma letra morte, distante da prática que se revela bastante desigual e desumana.

No nosso ordenamento a Declaração dos Direitos Humanos foi recepcionada e normatizada. Sendo assim, os direitos humanos estão totalmente previstos e assegurados, os tratados de direitos humanos ocupam posição elevada e vigoram mais que lei ordinária, são supra legais.

Os direitos humanos têm como principio fortalecer e promover uma maior observância dos direitos de uma forma justa e equilibrada, isto de forma mundial. Mas vemos que em determinadas nações todos os habitantes têm o que comer e em outras a fome é algo comum que assola boa parte dos seus habitantes. Isso revela que o Tratado dos Direitos Humanos, definitivamente, não vem sendo cumprido. Existe um total desrespeito, descaso, para com o nosso próprio ordenamento, pois este diz que os Direitos Humanos devem ser seguidos, e a própria Constituição, no art. 5°, que é clausula pétrea, assegurando o direito a vida, a liberdade e a igualdade, entre outros.

Segundo a organização internacional Pime, onze mil crianças morrem de fome a cada dia, e pelo menos uma a cada sete pessoas morrem por conseqüência da fome no mundo, esses dados são vergonhosos e demonstram que as leis não são seguidas como deveriam. Talvez se as punições previstas no ordenamento fossem efetivamente cumpridas esses índices poderiam sofrer mudanças positivas.

Não podemos nos conformar com essa situação. Temos que ajudar, temos que mudar, pois se ficarmos parados a tendência é o aumento dos índices que revelam a morte de pessoas por causa da fome no mundo.

A lei diz que somos iguais, que todos tem direito à vida. O poder é nosso, nós podemos ajudar a mudar esses dados. "Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta constituição." (CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA, art.1°, incs. I a V, parágrafo único.).

6. Economia : Os índices da miséria

A fome é certamente o problema cuja definição se mostra mais controversa. Haveria inicialmente que se distinguir a fome aguda, momentânea, da fome crônica. A fome aguda equivale à urgência de se alimentar, a um grande apetite. A fome crônica, permanente, ocorre quando a alimentação diária, habitual, não propicia ao indivíduo energia suficiente para a manutenção do seu organismo e para o desempenho de suas atividades cotidianas. A fome crônica resulta em uma das modalidades de desnutrição: a deficiência energética crônica.

6.1 A Dimensão da Fome

Cerca de 14 milhões de pessoas convivem com a fome no país e mais de 72 milhões de brasileiros estão em situação de insegurança alimentar - ou seja, dois em cada cinco brasileiros não têm garantia de acesso à alimentação em quantidade, qualidade e regularidade suficiente. As informações foram divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e fazem parte de uma pesquisa inédita no país sobre segurança alimentar.

A aferição da dimensão da fome ou da deficiência energética crônica em uma população pode ser feita a partir da avaliação das reservas energéticas dos indivíduos ou, mais especificamente, a partir da proporção de indivíduos emagrecidos. Embora a deficiência energética crônica seja um evento essencialmente familiar, acometendo simultaneamente crianças e adultos, sua aferição se torna mais específica quando feita sobre indivíduos adultos – crianças podem responder à deficiência energética com a redução do crescimento linear, enquanto adultos sempre respondem com o emagrecimento. Consideram-se magros os adultos que têm relação peso/altura (Índice de Massa Corporal) inferior a 18,5 kg/m2. Em populações onde se sabe não existir fome, adultos magros não ultrapassam 3% a 5% da população, considerando-se proporções acima desses valores como indicativas de risco de deficiência energética crônica. A OMS classifica proporções de adultos magros entre 5% e 9% como indicativa de baixa prevalência de déficits energéticos, o que justificaria a necessidade de monitorar o problema e estar alerta para sua eventual deterioração. Proporções entre 10% e 19% caracterizariam prevalência moderada da deficiência energética crônica enquanto proporções entre 20% e 29% e proporções iguais ou superiores a 40% caracterizariam, respectivamente, prevalências altas e muito altas (WHO, 1995).

Atualmente 840 milhões de pessoas sofrem de subnutrição crônica no nosso país, dentre elas, 200 milhões de crianças padecem de deficiência aguda e crônica de proteínas e energia. A fome, segundo os estudiosos, não significa apenas falta de alimentos, mas, falta de nutrientes necessários ao desenvolvimento da vida. O número de desnutridos nos países em desenvolvimento cresce à razão de 4 a 5 milhões de pessoas por ano, criando um estado desolador de insegurança alimentar.A dimensão da fome é tamanha que chega a ser surpreendente que esse assunto não ocupe papel central entre as preocupações do mundo.

6.2 Programas Sociais

Nosso país tem criado programas de alimentação popular que têm servido mais aos propósitos dos governantes, firmando-se como noção de favor em vez da certeza de cidadania.

Em 2003, nosso atual presidente se comprometeu a erradicar a fome do Brasil até o último ano de seu mandato: 2006. Criou diversos programas, como o Fome Zero, Bolsa-Família, além dos bancos de alimentos. Criou também o Ministério de Ação Social denominando-o, taxativamente, "Ministério de Ação Social e Combate à Fome". Porém, no ano de 2006, o resultado real de tantas promessas, não foram satisfatórias como podemos verificar nas estatísticas que revelam que em 2005, morreram 114 mil crianças de fome no nosso país.

Os programas governamentais, infelizmente, não estão dando resultado, embora se apliquem milhares de reais para o combate à fome e para um melhor atendimento médico-hospitalar às crianças, mães e idosos.

A luta contra a fome, ou ao que resta desse problema no país, igualmente se beneficiará do combate à pobreza. Contudo, as evidências reunidas neste trabalho indicam que ações específicas de combate à fome, em particular ações de distribuição de alimentos (diretamente ou através de créditos ou cupons), deveriam ser empregadas no Brasil de modo focalizado, com atenção especial para segmentos da população rural da região Nordeste. A expansão desmedida de ações de distribuição de alimentos, ao contrário do que talvez indiquem o senso comum e a indignação justificada diante de uma sociedade tão injusta e plena de problemas como a brasileira, implicaria consumir recursos que poderiam faltar para ações sociais mais bem justificadas e mais eficientes.

7. Considerações Finais

Diante dos fatos apresentados neste trabalho, e de tantos outros com os quais convivemos em nosso dia-a-dia, constatamos que a Declaração dos Direitos Humanos vem sendo desrespeitada.

É possível perceber, com o aprofundamento na temática Fome, que as posturas capitalistas prevalecem sobre as questões sociais e que as atuais posturas da sociedade e do homem constatam a prevalência do individualismo sobre o coletivismo. Muitas vezes esses interesses não são ligados somente ao individuo de modo literal, mas também as nações e blocos econômicos.

Na seara jurídica é possível notar como a justiça age e como deveria agir ante tanta desigualdade e miséria que causam, conseqüentemente, a Fome.É obvio que a Declaração há muito tempo não está sendo seguida e temos a consciência que a mesma não é uma normatização adotada por todas as nações dentro das suas respectivas Constituições, mas sim é um instrumento acordado e aceito por todos os membros da Organização das Nações Unidas. Em tese, todos os paises participantes da ONU deveriam seguir a supra referida, mas o que é possível notar é o não cumprimento da mesma, o que propicia conseqüentes problemas sociais, como a fome, assolando o mundo.

Como fora revelado no corpo do texto, a existência de vários descumprimentos dos artigos da Declaração Internacional de Direitos Humanos, confirmam o não seguimento das normas que deveriam ser utilizadas para garantir o direito à vida e o direito à dignidade humana, entre outras previsões.

Enfim, o problema Fome assombra o mundo e suas conseqüências são catastróficas, mas existem mecanismos capazes de serem utilizados para resolver as questões da falta de alimentação. Basta existir o consenso entre todos para que seja alcançada a equidade e igualdade, que garantirão o exercício pleno dos Direitos Humanose a solução para tantos problemas.

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http://jus2.uol.com.br/Doutrina/texto.asp?id=509

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11200

http://www.pime.org.br/mundoemissao/fomesolucao.htm

http://www.miguelreale.com.br/



* Alunosdo Curso de Direito do Centro Universitário da Bahia, 2º semestre

[1] Podemos também ligar a historia da fome à pré-história, quando o homem não dominava a agricultura e dependia da natureza para se alimentar, mas em nosso contexto é melhor se apegar à problemática fome no momento em que as sociedades se encontram organizadas.

[2] Trecho da Entrevista a Gonçalves de Araujo (1969) apud http://www.josuedecastro.com.br/port/indice.html#10

[3]Disponível em :http://www.josuedecastro.com.br/port/fome.html