Libertação, Filosofia e a Filosofia da Libertação

João Gilberto Engelmann

Até que ponto pode-se dizer que a libertação é a essência da Filosofia? A própria gênese filosófica identifica-se com a libertação. O mitológico fantástico das (i)reflexões primitivas, por exemplo, é suprassumido numa racionalidade que desprende o homem da ignorância natural e o põe na condição de sophoi. A partir disso, uma vez que se pensa na América Latina determinada libertação, a Filosofia da Libertação (FdL) não fugiria à essência universal do filosofar lograda dos gregos. Criar ou dar continuidade ao processo de constituição de uma filosofia latino-americana, a partir desse olhar sobre a essência, não destituiria a legitimidade do pensar/agir filosófico. Ser a própria atividade de libertação, enquanto filosofia situada na realidade, seria a própria comunhão com os processos históricos, desde a gênese, de a filosofia constituir-se como libertadora. No entanto, o que difere, sobretudo, é o método e o conteúdo sobrando a forma universal que é a essência da razão filosófica.

O contexto da América Latina, vislumbrado a partir das pretensões imperialistas de colonização, dá-se proeminentemente específico em sua constituição cultural, política, econômica, etc. Sintetizamos aqui a cultura do mundo através da aparente expressão das diversidades consagradas à história. Porém, a cultura incorporada externaliza seu caráter paradoxal de universalização, por um lado, e de difusão de ideologias aliciadoras, por outro. Se de uma forma se comunga com o mundo a efetividade das manifestações humanas traduzidas na riqueza cultural, de outra, incorpora-se as tendências imperialistas de propagação ideológica.

Por isso, a constituição de uma FdL perpassa o caráter objetivo do dado (criado) cultural e político inerente à América Latina. Excentrificando-se do meramente especulativo, típico da Tradição Ocidental, a realidade latino-americana é como que o ponto de partida pelo qual se constitui uma FdL da América Latina que seja ao mesmo tempo filosófica, enquanto idéia universal, e libertadora, enquanto identificação essencial. Ainda, a ação que se pensa para a América Latina requer a ação política dos sujeitos coletivos, devendo esses serem exortados ou não na dinâmica da libertação, na construção de uma situação de liberdade que, paralelamente, liberte a América Latina das amarras dominadoras e a Filosofia da abstratividade vazia. Por mais que se pense que a FdL, pressuposta a partir do situacional geográfico latinoamericano, destituiria a Filosofia de seu caráter universal abstrato comprometendo, assim, a capacidade teórico/especulativa própria de sua dimensão clássica, a FdL percebe a necessidade de uma realização histórica, enquanto cultura inalienável, de uma América Latina liberta.

Sobretudo, a partir de uma ruptura com o ideológico ocidental/europeu; da postulação de nossa realidade como fundamento da ação político/filosófica; do povo latinoamericano como ator (sujeito) coletivo, é que pensar uma FdL faz sentido. Esta precisa ser a síntese entre a essência da Filosofia, a saber, seu caráter libertador, e a realidade latinoamercana. A FdL da América Latina precisa considerar-se filosófica e libertadora, para que filosofia e libertação possam ser realmente integradas em seu conceito, de forma a serem processos conjuntos de legitimação histórica de (re) conhecimento universal.

Este artigo resulta dos debates ocorridos na disciplina História da Filosofia Latinoamericana, cursada no Primeiro Semestre de 2007 do Curso de Graduação em Filosofia do Instituto Superior de Filosofia Berthier – IFIBE.

Acadêmico do 4º semestre de Filosofia IFIBE.