DURKHEIM, Émile. O Suicídio. Tradução Alex Martins. Editora Martin Claret, 2002. 445 p.

 

Fenômeno social sobre a liberdade humana

 

Émile Durkheim descreve os motivos do suicídio no seu livro O Suicídio a partir da visão sociológica. A leitura desta obra é extremamente gratificante e estimulante, conduzindo a uma reflexão sobre as mazelas sociais que afetam diretamente a vida das pessoas, exercendo uma força que obriga o sujeito a seguir os ditames do capitalismo. Um aspecto que me chamou a atenção foi por que o suicídio (ato individual) foi estudado por Durkheim como um fenômeno social?

Durkheim trata o suicídio de forma não psicológica, e sim, de forma social, buscando padrões empíricos em diversas sociedades e seguindo um método comparativo. É daí que Durkheim consegue definir os quatro tipos de suicídios do ponto de vista sociológico (egoísta, altruísta, anônimo e fatalista – e suas combinações). O suicídio egoísta – que resulta de uma individualização excessiva e cujo grau de integração do indivíduo na sociedade não se apresenta suficientemente forte; o suicídio altruísta – que ao contrário resulta de uma individualização insuficiente e o suicídio anômico – que se relacionam com uma situação de desregramento, típicas dos períodos de crise, que impede o indivíduo de encontrar uma solução bem definida para os seus problemas, situação que favorece um sucessivo acumular de fracassos e decepções propícias ao suicídio. Sociedades tradicionais onde a solidariedade mecânica prevalece, sendo que o último tipo de suicídio é o suicídio fatalista, que embora Durkheim o visse como de pouca relevância contemporânea, ele acreditava que isso acontece quando o indivíduo é regulado demais pela sociedade.

Pela observação de estatísticas oficiais, este autor concluiu que o suicídio era mais frequente nas comunidades protestantes que nas comunidades católicas, fenômeno que explicou através da noção de integração religiosa. No mesmo sentido, Durkheim verificou que o suicídio ocorria menos entre os indivíduos casados que entre solteiros, situação que, segundo ele, se explicaria através da noção de integração familiar. Neste trabalho, notou ainda que as taxas de suicídios diminuíssem em períodos de grandes acontecimentos políticos, em que aumentava a coesão sociopolítica em torno da ideia de nacionalidade, isso não quer dizer que o suicídio seja ontologicamente um fato social, ele o é enquanto a sociologia o encara de maneira pautada pelo exposto e pelo sociólogo. Assim o suicídio é um fato social a partir do momento em que se pode enquadrá-lo nos termos do objeto típico da sociologia na visão de Durkheim e segundo as características intrínsecas desse objeto. Segundo Durkheim, ainda que os humanos vejam a si mesmos como indivíduos que tem a liberdade de arbítrio e de escolha, seus comportamentos são frequentemente padronizados e moldados socialmente. Há uma concordância de que a sociedade molda e padronizam muitos dos comportamentos individuais, mas nem todas as atitudes e atos são padronizados pela sociedade como afirma o sociólogo.

Certamente que há suicídios que podem ser explicados por fatores sociais, mas, outros, no entanto, é um ato individual em que a sociedade não tem nenhuma responsabilidade. Ele relacionou sua explicação à ideia de solidariedade social e a dois tipos de laços dentro da sociedade – a integração social e a regulação social. Entende-se que o sociólogo baseou seus estudos em estatísticas, e em parte, suas explicações fazem sentido, levando-se em conta o processo industrial à época da elaboração de suas ideias acerca do suicídio motivado por fatores sociais. Entretanto, percebo certo radicalismo nas ideias de Durkheim sobre o suicídio, pois, compreendo que o estudo do suicídio, que é um fenômeno especificamente individual, apesar de só em aparência, permitiu a Durkheim demonstrar as fortes relações entre o indivíduo e a coletividade.

A partir dessas observações, o sociólogo Durkheim pode assim concluir que o suicídio variava na razão inversa do grau de integração da sociedade religiosa, familiar e política. O livro prima pela maneira que usa observações estatísticas para buscar na realidade aspectos de toda e qualquer cogitação de seu autor e por usar estes aspectos como guia fundamental às conclusões propostas. Além disso, trata-se de uma obra que aborda o homem em suas características essenciais enquanto atua na coletividade, alcançando uma produtividade que perdura na condição social dos dias atuais, embora seja fruto de um pensamento predominantemente social, o estudo serve aos propósitos psicológicos, amparado pela pesquisa de campo. Para este livro aconselho a leitura para estudioso das áreas sociais, professores, psicólogos e curiosos pelo fenômeno da atuação social sobre a liberdade humana.