"Entregar as notas, fechar o planejamento, definir as férias... Já estamos em dezembro e mais um ano está acabando. No mês que vem tudo começa outra vez. Mas um momento! Por que organizamos a vida dessa maneira? Como começou essa história de contar o tempo?

O ser humano sempre foi exposto a fenômenos que indicam o passar da existência: o escurecer do dia, o crescimento dos cabelos, as rugas na pele... Mas nem sempre esses sinais foram bem entendidos. "Foi por meio do desenvolvimento da memória e da comparação que o homem criou a noção de tempo, uma forma de adequar as tarefas necessárias aos períodos e às condições da natureza", explica Suzana Herculano, neurocientista e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

As primeiras relações desse tipo podem ter surgido na Idade da Pedra, quando um homem de Cro-Magnon notou que a Lua se modificava de modo previsível. Comparando e usando a memória, ele começou a contar por quantas noites a Lua ficava cheia, parcialmente encoberta e completamente escura. A prova de que ele foi o primeiro a contar logicamente esses ciclos é um osso de águia do tamanho de uma faca de manteiga, encontrado na França, em que estão entalhadas diferentes ranhuras o primeiro calendário lunar.

Tal conhecimento serviria mais tarde para, por exemplo, traçar paralelos entre os movimentos celestes e a mudança das estações, garantindo assim a sobrevivência dos povos primitivos que passaram a saber, ainda de forma pouco precisa, quando plantar e quando colher. Tornou-se possível, assim, prever os períodos de privação, fartura e festa. "Surgiram ciclos, feitos de momentos de trabalho que se realizavam em consonância com o movimento da natureza. O céu passou a ser o primeiro relógio da humanidade", explica Renato Las Casas, professor de astronomia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Lua ou Sol?

Inúmeras sociedades desenvolveram e ampliaram essa técnica, mas a Lua acabou conduzindo os idealizadores de calendários para um caminho confuso. Os gregos e os povos que entregaram a sorte à Lua produziram calendários que traziam distorções com relação às estações do ano. "O céu não se presta a contagem de números inteiros. Um ano lunar (o período que a Lua leva para dar uma volta na Terra) não é compatível com um ano solar, o responsável pelas mudanças cíclicas do clima", explica o professor Renato Las Casas.

Essa inconsistência e outras tantas fizeram com que o general romano Júlio César (100 a.C.- 44 a.C.) promovesse uma reforma no calendário, adotando o Sol como referência. Para fazer a alteração estrutural, ele decretou que o ano 46 a.C. apelidado posteriormente de ano da confusão tivesse 445 dias e que todos os seguintes tivessem 365. A cada quatro anos, um dia seria adicionado ao mês de fevereiro. Ele acreditava que dessa forma todo o problema estaria resolvido.

Mas o calendário Juliano também não era perfeito, pois criava um excesso de três anos "bissextos" a cada 385 anos, provocando uma discrepância na datação dos equinócios e solstícios, períodos em que as estações mudam. Como o equinócio do outono início da primavera no hemisfério norte era importante para a igreja por marcar a Páscoa, outra mudança fez coincidir a data da ressurreição de Cristo com o início da estação que simboliza o renascer.

Ao lado do astrônomo Christopher Clavius (1538-1612), o papa Gregório XIII (1502-1585) inaugurou o alendário gregoriano. No decreto baixado por ele, 11 dias desapareceram da história. Os europeus dormiram em 4 de outubro e acordaram no dia segunte, 15 do mesmo mês. Nem todos ficaram satisfeitos. A Inglaterra só adotou o calendário Gregoriano em 1752. Os protestantes alemães achavam que a nova marcação era obra do diabo. Até hoje a definição de um ano redondo não pode ser feita corretamente devido à variabilidade dos movimentos da Terra.

Os pontos de partida

Estima-se que cerca de 40 calendários diferentes sejam usados hoje no mundo, sem contar os que se perderam ao longo da história. Por questões administrativas, a maioria dos países usa como padrão oficial o calendário gregoriano, que tem como ano zero o que se supõe ser o do nascimento de Cristo. Mas, paralelamente, outros sistemas são utilizados, seja para fins religiosos, festivos ou para unir os povos dispersos pelo mundo.

Para os judeus, o ano 1 seria o da criação do universo, segundo o Gênesis, no Antigo Testamento. Eles estão no ano 5764. O ano judaico iniciou-se no último 27 de setembro e terminará em 15 de setembro de 2004 (no calendário gregoriano). Já o calendário muçulmano tem como marco zero a Hégira a fuga de Maomé (570-632), fundador do islamismo, de Meca para Medina , ocorrida em 16 de julho de 622. Os muçulmanos estão no ano 1424. Já os chineses celebrarão a entrada em 4701 no dia 22 de janeiro próximo.

Do natural ao mecânico

Quase todas as sociedades pré-capitalistas definiam o tempo com base no trabalho. Os períodos diziam respeito às tarefas a serem feitas e acompanhavam seu ritmo, que era medido pelas condições naturais do meio. Atualmente utilizamos medidas de tempo independentes das atividades que desempenhamos. Principalmente depois da invenção do relógio. O primeiro aparelho surgiu em 1542. No início ele marcava apenas as horas o ponteiro de minutos surgiu 100 anos depois.

Hoje a produção mundial de relógios chega a 252 milhões de aparelhos por ano. Com eles, dividimos e ordenamos o tempo para realizar atividades independentes dos ciclos da natureza. Com o aparecimento do cronômetro, a contagem ficou ainda mais rígida. "O ritmo que dava a noção de duração natural dá lugar aos períodos arbitrários e externos. Criou-se a noção de que o tempo não pode ser desperdiçado", explica Roseli Fontana, professora da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). "O passado é o ontem. Há uma mudança do tempo que passa para o tempo que se gasta", explica. Surge então a célebre frase "tempo é dinheiro".

Hoje parece natural perceber o tempo como fruto do movimento dos ponteiros do relógio. No entanto, como vivemos dentro dessa seqüência de momentos, não pensamos sobre as diferentes maneiras com que sentimos o passar dos minutos. Um fenômeno rotineiro e curioso acontece quando achamos que a duração de determinada tarefa muda de acordo com nosso ânimo em executá-la. "Uma atividade maçante e inconveniente faz nosso corpo sentir que as horas custam a passar. Já quando fazemos algo prazeroso, nosso cérebro acha que tudo acaba mais rápido", explica Suzana Herculano, da UFRJ. O motivo dessas diferenças está na memória. "Quando estamos desatentos e não curtindo o trabalho, prestamos mais atenção na passagem das horas. Criamos mais memória sobre os instantes anteriores, aumentando a nossa capacidade de percepção da duração das ações", completa. Moral da história: reflita sobre o período que você tem disponível e pense melhor nas atividades que merecem seu esforço. "Quanto mais gostosa for a ação, menos pesado será o ato de praticá-la", diz.

Rápido? Devagar? Tudo é relativo

No início do século 20, o tempo era absoluto e passava de maneira igual tanto para nós aqui na Terra quanto para um eventual extraterrestre numa galáxia distante. Era o que a física defendia, de acordo com os princípios formulados pelo inglês Isaac Newton (1642-1727). Em 1905, o físico Albert Einstein (1879-1955) derrubou essa concepção ao expor sua Teoria Espacial da Relatividade. Entre outras coisas, ele descobriu que o tempo pode passar mais rápido pra uns e mais devagar para outros. Para quem está andando, por exemplo, as horas vão ser mais vagarosas do que para alguém que esteja parado. Mas como as velocidades com que nos movimentamos no dia-a-dia são pequenas, a diferença na passagem do tempo é ínfima. Em compensação, se você passasse um ano dentro de uma espaçonave que se deslocasse a 1,07 bilhão de km/h e depois retornasse à Terra, as pessoas pessoas que ficaram por aqui estariam dez anos mais velhas! Como elas estavam praticamente paradas em relação ao movimento da nave,o tempo passou 10 vezes mais rápido pra elas - de acordo com seu ponto de vista. Para os outros terráqueos, foi você quem teve a experiência de sentir o tempo passar mais devagar. Assim, ele deixa de ser um valor universal e passa a ser relativo ao ponto de vista de cada um.

Aproveite cada minuto
Estima-se que uma pessoa de 30 anos tenha aproximadamente 410 mil horas de vida pela frente. No entanto, cerca de 30% desse total serão gastos dormindo e outros 10% serão aplicados em atividades como tomar banho e ir de casa para o trabalho. O tempo realmente utilizável não é tão grande. Diante dessa realidade, siga um conselho: use seu saldo de tempo de forma inteligente, inclusive reservando períodos para refletir sobre os objetivos de vida e para relaxar.

Uma viagem no tempo para a sala de aula

A origem e as formas de contar o tempo podem render uma interessante discussão na classe. Pesquise sobre o tema na biblioteca da escola ou na de sua cidade. Procure pelos verbetes "relógio", "calendário" e "tempo". "Para os estudantes de 1ª a 4ª série, o ideal é abrir a discussão tentando quebrar a naturalização do tempo, ou seja, o sentimento de que ele é uma coisa concreta e imutável", explica Roseli Fontana, da Unicamp. Mostre as evidências da passagem dos anos na escola, como uma maçaneta enferrujada ou uma parede trincada. Depois levante com a turma outras formas de contagem do tempo, como o período entre os sinais que indicam o início de cada aula ou a repetição de datas comemorativas. Explique o que significa o ontem, o hoje e o amanhã. "Muitas crianças não têm a noção de calendário", alerta. Outra alternativa é pedir a cada um que diga em que dia nasceu. "Provavelmente poucos saberão a resposta. Esse é um bom gancho para passar a noção de passado e oferecer essa informação a eles", afirma a professora. Para as classes de 5ª a 8ª série, Roseli sugere uma apuração na comunidade para saber dos idosos qual era a noção de tempo antigamente. "Isso criará uma consciência da passagem do tempo e da nossa capacidade de voltar ou avançar nele", completa".