FEDERALISMO: uma proposta para a democratização do acesso à justiça

Maysa Pinheiro dos Reis*

Sumário: Introdução; 1 FEDERALISMO E DEMOCRACIA: uma dimensão histórica e política; 2 CIDADANIA E ACESSO À JUSTIÇA: uma reforma premente; Considerações Finais; Referências


RESUMO

O presente trabalho trata inicialmente da adoção do sistema federal no Brasil, bem como da origem e dos objetivos do federalismo no tocante às forças políticas divergentes. Em seguida constata-se que a democracia é pressuposto para a vigência do federalismo, estando esta condicionada à soberania popular. Posteriormente, propõe a democratização do acesso à justiça, no sentido de disponibilizá-lo a todos isonomicamente. Sugere uma revolução democrática do direito na busca pela erradicação das desigualdades sociais, visando tornar efetiva a cidadania e o acesso indiscriminado à justiça. Elenca as dificuldades do acesso ao sistema judiciário e ainda a responsabilidade deste para com o crescimento da pobreza. Por fim, estuda propostas de desburocratização do acesso à justiça assim como transformações destinadas aos aplicadores do Estado Democrático de Direito.


PALAVRAS-CHAVE: Federalismo, Democracia, Cidadania e Acesso à Justiça.


INTRODUÇÃO


O presente estudo viabiliza ampla compreensão do significado e das implicações da forma de Estado federativo. Ao propor um conhecimento em caráter científico sob o aspecto histórico, político e sociológico inerente ao contexto de Federação, Democracia e Acesso à Justiça, surgem para nós questões preliminares que formam o alicerce para o desenvolvimento desta pesquisa.
Há relação entre o federalismo e a democracia? Observa-se a correlação entre o regime democrático e o federalismo, na medida em que a democracia é tida como uma pré-condição para a vigência efetiva do sistema federal e o federalismo pressupõe uma resposta democrática ao problema de constituir ou manter um governo unificado em contextos de marcadas heterogeneidades (pluralidades) territoriais.
No que concerne à adoção do Federalismo, qual sua origem e objetivos? A partir desta compreensão, pretende-se uma apreciação mais aprofundada e crítica acerca do Sistema Federativo Brasileiro, apresentando sua origem no Federalismo dos Estados Unidos da América a partir das treze colônias que buscavam a independência política e a autonomia mediante sua metrópole inglesa. Cumpre, portanto, analisar que o federalismo também imprime feições a um regime democrático relacionadas à descentralização territorial de poder político, haja vista que cada unidade política tem sua autonomia e seu próprio poder político voltado para os interesses centrípetos e centrífugos. Nesse sentido, a democracia está para consolidar um equilíbrio entre tais interesses dentro de uma unidade federativa.
Com vista para a noção de cidadania e acesso à justiça, explana-se que a democracia só se concretiza através da participação efetiva do cidadão, através de políticas públicas destinadas a garantir seus direitos e através do acesso à justiça de forma mais indiscriminada. Neste viés, a sociedade aspira por uma postura proativa do sistema judicial quando constatada a relevância do papel do judiciário, bem como sua responsabilidade mediante as necessidades sociais, no que tange a uma concepção de justiça fulcrada na cidadania e na igualdade.
Com referência ao acesso à justiça, o que este tem haver com a função do Poder Judiciário? É mister admitir que, há muito tempo, os necessitados de justiça demonstram seu descontentamento com a atividade jurisdicional no Brasil, ficando esta caracterizada pela onerosidade, morosidade, etc., na distribuição da justiça. Devido à inadequação na organização judiciária, entre outros problemas, pode-se descrever: a deficiência dos serviços de assistência judiciária e a insuficiência de oralidade. E sendo tais deficiências, comuns entre muitos outros ordenamentos jurídicos, é necessário que sejam realizadas as reformas de natureza organizacional, processual e educacional.
Por estes motivos observa-se a necessidade da verificação do direito pelo vértice da acessibilidade dos cidadãos à Justiça entre estes os necessitados, por serem hipossuficientes financeiramente e também por não terem como superar os obstáculos existentes para o acesso à Justiça, esta desigualdade sócio-financeira tem como resultado uma desigualdade processual.
Em relação ao papel do judiciário, como ocorre a efetivação do Estado Democrático de Direito? Faz-se necessário, outrossim, estudar propostas para romper com os obstáculos ao avanço democrático e satisfatório do Estado Democrático de Direito, tão relevantes e tão urgentes para os anseios contemporâneos de nossa sociedade.


1 FEDERALISMO E DEMOCRACIA: uma dimensão histórica e política

O sistema federativo brasileiro tem como mérito a primazia das relações de poder, sobretudo por constituir o meio de organização territorial que garante, via democracia, estabilidade e legitimidade política aos governos dos Estados nacionais, haja vista ser a sociedade marcada por grande heterogeneidade de base territorial. (SOARES, 1998)
A forma de organização Estatal presente em nosso país é caracterizada pela dupla autonomia territorial do poder político, na qual se distinguem duas esferas autônomas de poder: uma central, que constitui o governo federal, e outra descentralizada, que constitui os governos-membro, sendo que ambas têm poderes únicos e concorrentes para governar sobre o mesmo território e as mesmas pessoas. (BONAVIDES, 2007)
O fator geral que explica a adoção do sistema federal no Brasil é o mesmo que levou à formação do federalismo nos EUA. Trata-se da presença de forças políticas centralizadoras (centrípetas) e forças políticas descentralizadoras (centrífugas) que precisam ser acomodadas possibilitando à formação do Estado nacional ou para estabilizar democraticamente as relações políticas territoriais num território nacional já constituído.
O surgimento do sistema federal se deu nos Estados Unidos da América em 1787 como um conjunto de preceitos constitucionais acordados entre forças divergentes (centrífugas e centrípetas) ? "pacto federativo" ? no duplo intuito de estabelecer a unidade nacional das treze colônias inglesas independentes e garantir a autonomia política dessas colônias. (SOARES, 1998, p. 139)
Assim, o sistema federativo foi criado e posteriormente adotado por diversos países tendo como objetivo prioritário dar solução conciliatória a interesses territoriais antagônicos presentes na estrutura do Estado nacional.
O Estado brasileiro reside em ampla extensão territorial composta por heterogeneidades de correspondência étnica, linguística, religiosa ou simplesmente clivagens de identidades sociais que se definiram pela ocupação comum dentro do seu território nacional. (SOARES, 1998)
Uma breve análise da composição institucional federativa faz-se necessária no intuito de desvendar o papel das instituições políticas na manutenção do equilíbrio de forças centrípetas e centrífugas no âmbito federativo. Neste sentido, este equilíbrio federal pressupõe que cada nível territorial de poder, com sua estrutura institucional, se torne uma força política expressiva dos interesses territoriais. (SOARES, 1998)
Desta forma, o Poder Executivo, o Poder Legislativo e o Poder Judiciário dos Estados-membros não só têm o papel de implementar, legislar e fiscalizar as políticas governativas de sua atribuição, como são instituições que representam os interesses centrífugos e, como tal, sustentam a autonomia dos Estados-membros frente ao Estado federal. Mas, se a existência dos três poderes é necessária para a constituição de Estados-membros autônomos, ela é insuficiente para garantir a autonomia, bem como a participação destes Estados mediante o processo de elaboração da vontade política válida para as deliberações da organização federal . (BONAVIDES, 2007)
Neste contexto de autonomia e participação política dos governos dos Estados-membros na organização federal, a proposição é que a federação só tem efetividade e só pode subsistir em condição democrática de governo nacional. Ou seja, a democracia no nível nacional é condição indispensável para a vigência do federalismo. (BONAVIDES, 2007)
Federalismo este que designa um pacto corporificado em uma constituição, ou seja, uma organização territorial do poder que requer garantias legais, e estas só podem ser sustentas num estado liberal democrático, onde o governo está subordinado à lei, assim como a condição de democracia está condicionada à vigência da soberania popular:
Para buscar um conceito preciso de democracia, basta dizer que a soberania popular que caracteriza o regime democrático se expressa, no mundo moderno, na participação igualitária dos indivíduos na escolha de seus governantes através de "eleições livres, periódicas e competitivas". (SOARES, 1998, p.146)

Compartilharemos, portanto, da definição de democracia como "sistema de poder no qual as decisões que interessam a todos [?] são tomadas por todos os membros que integram uma coletividade" (BOBBIO, 1998, P.24). Entende-se que, se o governo formado por ideais democráticos não proporciona à população uma evolução da igualdade política para a igualdade social ? conseqüência da igualdade material ? é porque a democracia não está sendo exercida pela esmagadora maioria da sociedade (KELSEN, 2000, P.101).

2 CIDADANIA E ACESSO À JUSTIÇA: uma reforma premente

O desafio democrático para a construção da cidadania é, justamente, a transformação da maioria social em maioria política, pela ampliação da inserção das camadas sociais menos favorecidas. A frustração sistemática das expectativas democráticas pode trazer como conseqüência, a desistência de uma idéia centrada na crença do papel do direito na construção da democracia.
Com as desigualdades sociais e a precarização dos direitos econômicos e sociais do mundo atual, a sociedade aspira por uma postura proativa do sistema judiciário, levando este a um relevante papel diante da sociedade, no que tange à justiça e igualdade social. Esse papel traz consigo a necessidade de um sistema judicial eficiente, célere, que permita a previsibilidade dos negócios, garanta a segurança jurídica e a salvaguarda dos direitos de propriedade, primando por uma justiça cidadã. (SANTOS, 2007)
Entretanto, para satisfazer tais necessidades, na concepção do sociólogo Boaventura de Sousa Santos (2007), é necessária uma vontade política e uma verdadeira mudança na cultura jurídica que propicie uma revolução democrática do direito capaz de superar a realidade em que nos encontramos no que concerne a uma nova relação de poder jurídico, nova formação dos operadores de direito, novas concepções de independência judicial, de reformas processuais, em tese, novos mecanismos de acesso aos direitos. Possibilitando, contudo, uma cultura realmente democrática que proporcione a dignidade da pessoa humana, expressões de acesso efetivo à justiça.
No Brasil, as transformações jurídicas trazidas pela revolução democrática foram sentidas mais fortemente após a promulgação da Constituição Federal de 1988, marco na democratização do país e conscientização da nossa sociedade em relação aos direitos dos cidadãos, dentre eles o direito ao livre acesso à justiça (SANTOS, 2007, p. 210).
Os autores Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988), com muita propriedade, em sua obra Acesso à Justiça, fazem referência aos problemas socioeconômicos, políticos e culturais que envolvem nossa sociedade contemporânea, elencando suas dificuldades, tais como a falta de aptidão para reconhecer e reivindicar seus direitos fundamentais, a carência de recursos financeiros para custear os honorários advocatícios, a falta de experiência e conhecimento jurídico para prover um melhor planejamento dos litígios, a insignificância da demanda individual de ações em defesa de interesses públicos ou coletivos, entre outras dificuldades perpetuadas ao longo deste caminho de clamor pela efetivação dos direitos e garantias constitucionais, bem como da realização de uma justiça igualitária que proporcione acesso indiscriminado às classes e às pluralidades sociais.
Desse modo, acrescenta Boaventura Santos que o nosso sistema jurídico busca precipuamente a satisfação dos interesses de mercado em detrimento dos interesses das classes populares: há sobreposição do individual sobre o coletivo. E esta política gera efeitos negativos para parcela acentuada da sociedade brasileira, evidenciando-se as necessidades básicas da população como as questões relacionadas à moradia, alimentação, emprego, atenção à saúde e educação. Assim cada vez mais são destacados os enormes índices de desigualdade social existentes no Brasil e, nesse sentido, o sistema de justiça é co-responsável por este déficit. Sobre este tocante, há notória e manifesta insatisfação por parte da sociedade, que frequentemente atribui suas frustrações ao Poder Judiciário, chamado a garantir a efetivação dos direitos fundamentais constitucionalmente previstos.
No que compete às dificuldades e limitações anteriormente mencionadas, cumpre a nós estudarmos estratégias de desburocratização das questões de acesso à justiça no Brasil, considerando um paradigma mais amplo que versa sobre a noção de cidadania e democratização dos direitos.
Faz-se imprescindível um aprimoramento da acessibilidade, para que todos, sem distinção, tenham conhecimento e possibilidade de usufruir e lutar por seus direitos e que possam fazê-lo de forma democrática, igual e equilibrada. As dificuldades de acesso à justiça trazem como conseqüência o descrédito na instituição e, assim, provocam o afastamento da população, inibindo ainda mais o referido acesso. Porém, este não se limita a um direito à ordem jurídica ou simplesmente à possibilidade do ingresso em juízo. (SANTOS, 2007)
Em verdade, por acesso à justiça, deve-se entender a proteção a qualquer direito, sem qualquer restrição, ou seja, proteção material desses direitos, assegurada a todos os cidadãos, independentemente de qualquer condição social. Este acesso gesta-se no processo de exercício da democracia, uma vez que não é possível conceber que o povo possa exercer seus direitos se a justiça não lhe conferir meios de fazê-lo. (SANTOS, 2007)
A estagnação do judiciário, por sua vez, deve-se principalmente à falta de políticas públicas e sociais destinadas a garantir aos cidadãos o que foi assegurado na constituição de 1988.
As Políticas públicas visam responder a demandas, principalmente dos setores marginalizados da sociedade, assegurando à população o exercício de direito de cidadania: Educação, Saúde, Trabalho, Assistência social, Previdência Social, Justiça, Agricultura, Saneamento, Habitação Popular e Meio Ambiente. Além disso, visam ampliar e efetivar direitos gestados nas lutas sociais e que passam a ser reconhecidos institucionalmente; promover o desenvolvimento, criando alternativas de geração de emprego e renda como forma compensatória aos menos favorecidos. (TEIXEIRA, 2002, p. 8)
Afirma a cientista política Marta Arretche que a existência dessas políticas sociais pode ser considerada como um fenômeno associado à constituição do Estado Democrático de Direito.
Informando o acesso à justiça, quando se discute estratégias de desburocratização do sistema de justiça, são estudadas iniciativas de natureza organizacional, processual e educacional que deverão ser incentivadas, a começar pela observância das deficiências relacionadas à estrutura das Defensorias Públicas da União e dos Estados, que são consideradas pequenas em relação às necessidades da sociedade brasileira.
Foi através dessa perspectiva de reformas no judiciário que surgiram os Juizados Especiais e, com isso, foi ampliado, consideravelmente, o acesso à justiça e tornado mais célere o processamento das ações cíveis de menor valor.
Outras alternativas surgidas com a finalidade de se criar um novo conceito de justiça, dentro desse perfil inovador, foram os tribunais multiportas, que são sistemas judiciais que acolhem formas híbridas de resolução dos litígios jurisdicional e não jurisdicional, sem interferência do Estado. Neste sentido, o cidadão optaria pelo método convencional de justiça ou, conforme assim o desejar, pela arbitragem e mediação através de Centros Integrados de Cidadania (CIC), criados dentro dos bairros mais afastados, possibilitando às pessoas daquela região uma imediata prestação jurisdicional e garantindo, assim, a efetiva democratização da justiça. (SANTOS, 2007)
Manifesto ainda que as questões da democratização da justiça mantenham uma relação estreita com a formação dos magistrados no Brasil:
A tendência de não responsabilidade (sistemática) ante aos maus resultados do desempenho do sistema judicial e o refúgio dos profissionais do direito na burocracia (preferências por decisões processuais), bem como na fuga às penas alternativas, desenvolvem uma atitude destes de se manterem longe das aspirações da sociedade, que o leva a entender a independência do judiciário como autossuficiência, consubstanciado na aversão ao trabalho em equipe e interdisciplinar. (SANTOS, 2007, p. 221)
É notório que somente com uma educação jurídica intercultural, interdisciplinar e profundamente imbuída da idéia de responsabilidade cidadã é que se poderá fazer frente à cultura normativista, técnico-burocrática, então existente.
Considera-se premente a necessidade de revolucionar o modo de pensar utilizado pelas instituições de ensino jurídico, tanto na graduação, como na pós-graduação, haja vista a cultura exclusivista ser de extrema indiferença diante das mudanças experimentadas pela sociedade, tendendo a formar profissionais sem maior comprometimento com os problemas por ela enfrentados.
Ponderamos que não é só a Justiça que precisa de uma revolução democrática. O próprio Estado, como se vem mostrando, ainda está com a cabeça presa ao seu passado de aparente glória, no qual o poder econômico e político ainda dita as regras da vida social. Uns mais, outros menos, mas os aplicadores do Estado Democrático de Direito tendem a sofrer grandes transformações para alcançar os objetivos democráticos. Novos direitos precisam ser estudados para preencher lacunas e romper paradigmas que impedem o avanço democrático e satisfatório do Estado Democrático de Direito, tão necessário e tão urgente para os anseios contemporâneos de nossa sociedade. (SANTOS, 2007)
Nesse diapasão, são louváveis as iniciativas de acesso elencadas pelo sociólogo Boaventura como a advocacia popular, ação direcionada, em especial, para a efetivação de direitos coletivos; as promotoras legais populares, cuja metodologia consiste em socializar, articular e capacitar mulheres nas áreas do direito, da justiça e no combate à discriminação de gênero; as assessorias jurídicas universitárias populares, prática jurídica desenvolvida por estudantes de direito, tendo como ponto de partida a "comunhão entre ensino, pesquisa e extensão", atuando em prol da construção de uma visão crítica do direito e da justiça e ainda a iniciativa de capacitação jurídica de líderes comunitários, por sua vez, relacionada a programas governamentais e não-governamentais voltados para a capacitação jurídica de integrantes da comunidade que atuarão como mediadores na solução de conflitos locais. (SANTOS, 2007)
Em suma, ao propor transformações para alcançar os objetivos democráticos e o cumprimento dos princípios constitucionais, dentre eles o acesso à justiça, os juristas Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988), ponderam que a criação de novas e ousadas reformas não implica em dizer que podemos ignorar seus riscos e limitações, devendo ser observados os limites e potencialidades dos tribunais regulares, dos procedimentos comuns e dos procuradores, para que tais reformas não tragam consequências como a baixa qualidade da justiça mediante a economia e celeridade processual, a arbitragem e a conciliação, além da criação de vários tribunais especializados que operam de forma muito estreita provocando a desistência dos litigantes.
Ao consentir que a qualidade da justiça, em seu produto final, pressupõe um empenho oneroso, lento e minucioso do sistema judiciário, é de suma importância, no entanto, enaltecer a magnitude e beleza inerente à sua efetivação.
Parafraseando o juízo de Mauro Cappelletti e Bryant Garth (1988), sintetizamos que o objetivo não é empobrecer a justiça na tentativa de torná-la mais acessível, mas sim, ao ampliar o seu acesso, viabilizá-la a todos, sobretudo, aos pobres. Diante da incessante busca pelo ideal democrático da igualdade de todos perante a lei, perpassando os limites formais, devemos primar por um acesso à justiça que vá além deste que nos dispomos até então. Acesso este que tenha como fim, um produto de muito mais "beleza" e maior qualidade.










CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta análise crítica pretendeu demonstrar inicialmente a importância do federalismo ao constituir uma forma de organização Estatal capaz de estabelecer um equilíbrio das relações de poder entre os estados nacionais e, sobretudo por conter, em condições democráticas, as clivagens presentes na extensão do território brasileiro.
O federalismo, no que compreende a expressão da vontade popular, é a melhor forma de governo até então experimentada, pois promove a representatividade do governo para com as pessoas, incentiva a participação dos cidadãos, bem como sua responsabilidade cívica ao eleger os seus representantes que, por seu turno, compete-lhes autonomia política, administrativa e fiscal.
Entretanto, o que se tem observado é que, nas últimas duas décadas, houve um aumento das complexidades sociais paralelamente ao surgimento de um extenso conjunto de direitos e garantias constitucionais, porém sem que houvessem políticas públicas destinadas a dar sustentação e efetividade de tais garantias aos cidadãos. Proporcionando, portanto, o desequilíbrio econômico-social, o crescimento das desigualdades e da pobreza.
Inteiramente previsível é a tendência que a sociedade tem de projetar a responsabilidade pela não realização dos direitos ao poder judiciário, que por sua vez, não dispõe de estruturas para efetivá-los. Neste sentido, cumpre entender que é imprescindível um novo contexto de sociedade que evolua simultaneamente ao sistema de justiça, acompanhando suas transformações para uma evolução do Estado Democrático de Direito.
É necessário, portanto, criar um sistema de governo em que as pessoas pobres exerçam, efetivamente, o papel de sujeitos de direitos e deveres, produzir um modelo de assistência jurídica que reúna iniciativas de natureza estatal e privada de acesso à cidadania participativa e contenha critérios suficientes à comprovação da carência econômica e à definição de prioridades para o atendimento.
A falta de compreensão destas premissas tem sido fator de incremento à crise no campo do acesso à justiça, a ponto de se configurar uma situação dramática na qual, sem atentar para os fundamentos políticos e democráticos de seu papel, o judiciário deixa a desejar no cumprimento de seu escopo, fazendo da lei uma promessa vazia.
O objetivo não é reduzir a qualidade da justiça para disponibilizar seu atendimento a todos, mas ampliar a qualidade da assistência jurídica, inclusive no que diz respeito ao seu acesso.



REFERÊNCIAS


ARRETCHE, Marta. Federalismo e Políticas Sociais no Brasil: problemas de coordenação e autonomia. 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/spp/v18n2/a03v18n2.pdf. Acesso em: 29 de outubro de 2010.

BOBBIO, N. A Teoria das Formas de Governo. 10.ed. Trad. Sérgio Bath. Brasília: Ed.
Universidade de Brasília, 1998.

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 14ª ed.. São Paulo: Malheiros, 2007.

CAPPELLETTI, Mauro. GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução por Ellenm Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1988.

KELSEN, H. A Democracia. Trad. Ivone Catilho Benedetti, Jefferson Luiz Camargo,
Marcelo Brandão Cipolla e Vera Barkow. 2.ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. São Paulo: Cortez, 2007.

SOARES, Márcia Miranda. Federação, Democracia e Instituições Políticas. Lua Nova. CEDEC, São Paulo, n. 44, 1998.

TEIXEIRA, Elenado Celso. O Papel das Políticas Públicas no Desenvolvimento Local e nas Transformações da Realidade. 2002. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/dados/cursos/aatr2/a_pdf/03_aatr_pp_papel.pdf. Acesso em: 29 de outubro de 2010.