Facebook  é o fast-food do pensamento

Outro dia, decidi entrar no Orkut mesmo sabendo que há tempos ele não passa de um grande deserto virtual. Ao visitar comunidades e ler alguns tópicos, senti uma certa tristeza por ver que uma rede social muito mais interessante que o Facebook,  foi abandonada não porque se  tornou obsoleta, mas porque alguns  ditadores do que é  moda (até na internet eles mandam), num dado momento sentenciaram que a “onda a partir dali seria migrar para o Face”.

A esta altura, os menos avisados já devem ter concluído: “Ah, isso é papo de velho que sempre diz que na sua época tudo era melhor”, cabe então um esclarecimento: Facebook e Orkut foram criados exatamente no mesmo ano: 2004. Sabe-se lá por qual motivo, o Orkut logo virou febre por aqui, com direito até a dezenas de matérias que tentavam explicar seu sucesso. Enquanto isso, o Facebook  era um total desconhecido para a imensa maioria dos internautas brasileiros.

Durante quatro, cinco anos, o Orkut reinou absoluto por aqui. Milhões de pessoas acessavam-no o dia todo para trocar ideias e para isso contavam com comunidades específicas para abordar o assunto que cada um queria tratar. É bem verdade que em muitas comunidades nada se aproveitava, mas em outras,  havia uma real troca de ideias que iam desde debates mais sérios até simplesmente o ato de jogar aquela deliciosa conversa fora sobre cinema, música, etc. O grande barato é que assim que você postava uma opinião ou criava um tópico, logo vinham respostas  de várias pessoas que tiveram o interesse de ler o que você escreveu, algumas concordavam outras não, mas o mais importante era que você passava o que pensava e tinha gente disposta a ler.

Da mesma forma que o Orkut virou moda do nada, há dois, três anos foi a vez do Facebook  virar mania nacional, só que dessa vez de maneira imposta. Como o Orkut tinha se popularizado demais, algumas pessoas com ar blasé passaram a difundir que moderno mesmo era entrar no Face.  Relutei muito para aderir a essa rede social, mas para não ser do tipo “Não vi e não gostei”, decidi entrar. No começo acessava muito pouco, preferia  o Orkut, mas com o tempo, passei a frequentá-lo mais e para minha decepção, percebi que ele é um retrocesso espantoso em termos de ferramenta de comunicação, mas que vem bem a calhar com o momento em que vivemos, onde as pessoas não querem perder tempo para pensar e escrever, muito menos para ler algo que tenha mais do que duas linhas.

No Facebook, quase todo mundo “entende de política” e para mostrar isso, colocam imagens com uma mensagem curta e uma foto de um político ou de algo errado. Muitas vezes a curta mensagem conta uma mentira gigantesca, mas para os facebookianos, a verdade é só um detalhe irrelevante, importante mesmo é saber quantos curtirão o seu “comentário”. Se Goebblels, mestre da propaganda nazista, vivesse nos dias atuais, poderia adaptar seu pensamento de que: “Uma mentira repetida mil vezes se torna verdade” para: “Uma mentira compartilhada no Facebook se torna verdade e com muito mais rapidez!”

A rede social do momento também é responsável pelo curioso fenômeno do torcedor virtual “ultrafanático”. Nada contra comemorar uma grande vitória ou tirar aquele sarro do torcedor rival (convenhamos, é gostoso), mas tem gente que posta 40, 50 vezes a mesma coisa. Não adianta explicar a essas bizarras criaturas que após a 2º imagem, as pessoas não lerão mais, simplesmente passarão batido, a solidão e a ociosidade são tão grandes que eles querem chamar a atenção.  Sem perceber, tornam um momento de alegria deles que poderia  ser comemorado com amigos num bar ou em casa com a família, em algo tedioso e deprimente.

Por falar em deprimente, muita gente acredita que frases curtas de autoajuda serão milagrosas e trarão conforto e paz a quem está sofrendo. Novamente, não se dão ao trabalho de criar nada, apenas bombardeiam com todo tipo de mensagem pseudopositiva. A intenção pode ser boa, mas a forma está errada, pois ninguém que está com um grave problema ficará bem porque leu uma frase de duas linhas.

Nada contra, compartilhar uma foto/mensagem engraçada ou importante, muitas vezes ela vem bem a calhar, assim como uma citação em um artigo, mas é temerário imaginar que alguém só possa se expressar dessa forma em uma rede social. Nada contra também os que querem utilizar o Facebook apenas como passatempo, mas até nesse caso  é preciso bom senso para não poluir visualmente as páginas dos amigos com dezenas de imagens seguidas.

Comparando a troca de ideias que o Orkut proporcionava em muitas de suas comunidades com o que vemos no Facebook, é inegável chegarmos a conclusão de que o Face foi um retrocesso em termos de comunicação na internet. Da mesma forma que uma grande rede de lanchonetes serve  seus fast-foods para encher a barriga de produtos sem qualidade, o Face serve para encher a cabeça com frases prontas e sem conteúdo. A diferença é que no caso da rede de lanchonetes não são os usuários que fazem os lanches nada saudáveis, apenas os consomem, já no Facebook, a maioria dos usuários (não todos, por favor) faz e consome a porcaria.

Não poderia terminar o texto deixando uma lacuna em aberto, afinal de contas o que ocorreu com aquele mundo de gente que gostava de passar suas próprias ideias no Orkut? Foram abduzidos por ETs? Tomaram um chá de Amazônia e estão vendo o mundo sobre outra perspectiva? Não, nada disso, muitos após entenderem como funcionava o Facebook, simplesmente abandonaram os debates na internet, os que migraram e ainda continuam se dividiram em dois grupos: o dos conformistas que se adaptaram rapidamente a artificialidade da comunicação e o dos corajosos que ainda resistem bravamente tentando postar links, informações e ideias importantes, mesmo cientes que na maioria das vezes elas serão engolidas pelos tsunamis de futilidades.

Aguardemos uma nova rede social, onde as pessoas possam realmente fazer o poderoso uso de suas próprias palavras. Utopia? Provavelmente.