Experiência de monitoria: A reorganização das fotos do Projeto “Memória e História dos Campos Gerais Paraná”

 

Vanderley de Paula Rocha[1]

                               

                                               "Onde o homem passou e deixou marca de sua vida e inteligência aí esta a História"   

                   Fustel de Coulanges

Introdução

 

        O ponto de partida para o presente trabalho foi o desenvolvimento de atividades como monitor no Laboratório de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa, programa cuja finalidade é proporcionar aos acadêmicos o contato com pesquisadores e no caso do curso de História o contato com documentações.

        Nesse sentido percebemos essa importante e estreita relação que a História estabelece com a Arquivistica, pois a cada dia que passa os historiadores se apropriam desses acervos, não somente para se debruçar sob as fontes, mas também para salvar-guardar documentos. Outro sentido pertinente a essa discussão é o conhecimento que os historiadores tem desses espaços, já que, nesse passamos a maior parte de nossas vidas. A partir desse conhecimento sabemos o quanto é complicado procuramos fontes para nossas pesquisas, em acervos poucos organizados.

        Assim, decidiu-se organizar o acervo fotográfico correspondente ao Projeto “Memória e História dos Campos Gerais - Paraná”. Para isso, estabelecemos como principal objetivo: salvar-guardar, mas principalmente disponibilizar essa documentação de forma sistemática para facilitar o trabalho de pesquisadores.

       

 

1. Fotografias como fonte

 

        Com os novos rumos direcionados pela Escola de Annales, os quais possibilitaram o pensamento de uma história não mais formada do individual, mas sim formada pela pluralidade, ou seja, a construção da concepção de que todos sem exceção são sujeitos da História. Também foi o momento de ampliar a noção de documentos, pinturas, cinema, fotografia, entre outras criações humanas passaram a ganhar espaço no meio documental, também ocorreu a aproximação da História com as Ciências Sociais, tanto no âmbito teórico, quanto metodológico (Le Goff. p. 34. 1994).

         Nessa perspectiva, a fotografia ganha espaço enquanto fonte para pesquisas, pois além de transmitir informações ao pesquisador, traz consigo lembranças do passado, memórias, flagrantes, emoções cristalizadas, também transmitem mensagens, muitas dessas, são as que uma determinada sociedade quis transmitir. Mas, ao trabalhar com fotografias temos que ter a consciência de que,

 

Há que se perceber as relações entre signo e imagem, aspectos da mensagem que a imagem fotográfica elabora, e principalmente, inserir a fotografia no panorama cultural, no qual foi produzida, e entendê-la como uma escolha realizada de acordo com uma dada visão de mundo (Cardoso & Mauad. p. 406).

 

        Nesse sentido, a imagem fotográfica, vista como fonte histórica tem o seu valor quando passa a se compreendida como um documento, pois vai trazer a tona o momento fotografado, podendo assim ser o "elo" de interpretação entre o homem do presente e o homem do passado, portanto, a fotografia revela com riqueza de detalhes, aspectos da arquitetura, indumentária, formas de trabalho, locais de produção, elementos de infra-estrutura urbana, tais como tipo de iluminação, fornecimento de água, obras públicas, redes viárias etc, ou ainda se a imagem for rural, tipo de mão de obra, meios de produção instalações diversas(Cardoso & Mauad, p.406). É nessa perspectiva que a fotografia pode ser vista como elemento de informação, ou seja, traz na imagem cristalizada registros de determinados contextos, cabe ao pesquisador indagar essas informações, nesse sentido que a fotografia deve ser vista como fonte, ou seja um material produzido pela ação humana.

        É por isso, que devemos que ter em mente que a imagem, expressa na fotografia é um olhar do passado, podemos dizer que foi o "ângulo privilegiado " pelo olhar do fotografo, ou ainda foi o que uma determinada sociedade quis transmitir ao futuro, assim,

Em tais imagens podem estar partes de uma história, noções de bem-vestir, aspectos do desenvolvimento urbano, ou rural, flagrantes da vida real, memórias de guerra, um conjunto de programações sociais de comportamento relativas a uma determinada ideologia (Cardoso & Mauad. p. 411).

 

  

        Assim entendemos que a fotografia pode disseminar discursos, demonstrar relações sociais, econômicas e históricas estabelecidas, além de proporcionar uma série de análise de momentos e contextos congelados no instante retratado, entretanto, a imagem por si não recupera a realidade. O que ela faz é trazer para sua mente associações de imagens. Em realidade o enquadramento da foto corresponde ao recorte oferecido pelo documento, é importante também ter em mente que há sempre um campo conceitual mediando à relação espectador-fotografo (Kossoy, 2001. 26).

        Outra característica das fotografias e indagações que essas proporcionam é buscar interpretar e entender aquilo que não foi revelado pelo olhar do fotografo. É nesse sentido que muitos historiadores defendem o uso de fotografias com reserva, para esses historiadores é necessário o uso conjunto de outras fontes, ou seja, o cruzamento de informações, para assim construir interpretações. Nesse mesmo sentido, compreendemos que mesmo a imagem cristalizada, pode ser uma imagem manipulada. Assim, pode ser vista como uma mensagem, pois traz á tona códigos e valores sociamente estabelecidos, no entanto, essa questão não é malfazeja, ao contrario possibilita ao pesquisador buscar o entendimento dessas relações estabelecidas em determinados contextos e épocas, nas quais estão inseridas as imagens. É também possibilita as múltiplas problematizações, seja da imagem retratada, ou de quem a retratou. 

 

2. O desenvolvimento das atividades

 

        A partir dessas reflexões, cada vez mais fotografias se tornam fontes para pesquisadores, e foi pensando em salvar-guardar fontes para pesquisas que foi idealizado e executado o Projeto "Imagem da Memória e História dos Campos Gerais" Pelos professores: Ainda Manssani Lavalle, Elizabete Alvez Pinto, Joselfredo Cercal de Oliveira, Carmencita de H. Mello , Márcia Dropa, Cláudio Guimarães  e Cirlei Francisca Gomes Carneiro, esses todos do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa.                                 

         Esse projeto acima citado consistiu-se em reunir documentos e imagens que retratassem a memória e história da região dos Campos Gerais do Paraná, para fim de proporcionar fontes para futuras pesquisas. Nesse sentido, esse projeto se deu inicio no ano de 1988, durante dez anos os professores-coordenadores do projeto reuniram uma vasta documentação, sobre a história dos Campos Gerais. Nesse trabalho optamos por nos debruçar sob as fotografias que compõem o acervo, no entanto os outros documentos foram citados de forma não analítica, apenas informativa.

        Essas fotos passaram a compor o acervo documental do Laboratório[2] de História da UEPG. E ao desenvolver atividades no acervo por meio de Monitoria, Programa que visa capacitar acadêmicos para auxiliar pesquisadores no trabalho de consulta as fontes, além de possibilitar ao acadêmico realizar trabalhos na conservação e organização de acervos. Foi isso o que permitiu o Projeto, o contato com pesquisadores e a organização de acervos. Nesse caso, o trabalho ficou restrito especificamente a reorganização do acervo fotográfico do Projeto em questão, devido ao número expressivo de fotografias. Desse modo, inicio-se o trabalho de reorganização do Acervo Fotográfico[3]. É pertinente ressaltar que o que foi realizado foi um processo de reorganização do acervo, já que o mesmo, já havia passado por um processo de organização, que se constituiu em: catalogação, identificação e guarda. Sendo assim, esse acervo passou por uma reorganização e por um processo de informatização, para isso, partimos da premissa de uma facilitação do trabalho do pesquisador, principalmente no que se refere à busca dessa documentação, pois com a informatização essa objetivo foi alcançado.

        Há princípio esse acervo de fotografias estava armazenado em três gavetas de "armário-arquivo", inicialmente separados por cidades (Carambeí, Castro, Colônia Terra Nova, Curiúva, Prudentopólis, Telemaco Borba, Ponta Grossa). Mas com o início da reorganização, constatou que necessitava de um novo arranjo-intelectual, pois algumas fotos não estavam nas pastas correspondentes as suas respectivas cidades, isso ocorreu devido a mudança da sala do acervo, que passou do Campus Central para o Campus de Uvaranas, ambos da UEPG.      

        Assim, o primeiro passo restringiu-se em saber de fato o "que temos e de que forma temos", foi o momento de conhecer o acervo e como o mesmo se encontrava. E foi desta forma que se constatou que compõem o acervo: fotos originais e reproduções, em preto e branco e coloridas, além de documentos, tais como: planta de residências, títulos de eleitores, lembranças de aniversário, batismo, casamento e falecimentos, escrituras de terrenos e cartão postais.

        No que diz respeito à metodologia de trabalho desenvolvido, optou-se pela verificação de todo o acervo e a separação dos documentos pelas cidades correspondentes, foi realizado a descrições das fotos, frente a uma tabela padronizada, a qual possuía as seguintes informações: Cidade, número de fotos total de cada cidade, número do envelope, quantidade de foto, descrição da foto, data da foto, temática, material de condicionamento da foto e observações.

         Após o contato com essa documentação, foram efetuados os seguintes procedimentos:

1- Higienização das fotos e trocas de envelopes antigos por novos.

2- Arranjo intelectual criou-se uma numeração para cada cidade, seguindo ordem alfabética, assim Carambeí 01, Castro 02, Colônia Terra Nova 03, Curiúva 04, Imbituva. 05, Ipiranga 06, Ivaí 07, Lapa 08, Palmeira 09, Pirai do Sul 10, Ponta Grossa 11, Prudentopólis 12, Reserva 13, Teixeira Soares 14, Telêmaco Borba 15, Tibagi 16, União da vitoria. 17 e cidade não identificada 18.

 

3- Criou-se temáticas para a separação dentro das cidades, tais como: Logradouros, Retrato pessoais, Retrato de Grupo, Cemitérios, Edificações, Fazendas, Casamentos, Igrejas, Objetos, Escolas e Famílias).

4- Como o trabalho foi de reorganização do acervo, foi verificado foto por foto, observando se as fichas de descrição estavam com os dados corretos.

5- Confecção de fichas para fotos que não as tinham.

6- Separação das fotos em envelopes correspondente as temáticas, pois existia um número excessivo de envelopes com a mesma temática.

7- Algumas fotos encontravam-se coladas as fichas de descrição, deslocamo-las e reorganizamo-las de fora correta em papel manteiga e sem o uso de cola.

8-Mudança da documentação já organizada para outro arquivo-armário, onde as fotos ficaram mais bem dispostas e melhor condicionadas.

9- Construção do banco de dados no programa do Br Oficce, seguindo a tabela padronizada,(Anexo I).

10- Alimentação do banco de dados com o intuito de facilitar a busca e “agilizar” a disponibilização dos documentos para o pesquisador.

         Em termos quantitativos o acervo contém: 18 cidades e mais um grupo cuja cidade não foi identificada. Desse modo, Carambeí possui 16 fotos , Castro 590, Colônia Terra Nova 30, Curiúva 06,  Imbituva 32,  Ipiranga 61, Ivaí 01, Lapa 02, Palmeira 295, Pirai do Sul  477,  Ponta Grossa 303,  Prudentopólis 210,  Telêmaco Borba 08,  Tibagi 54,  União da vitoria 01, Teixeira Soares 26, Reserva 143,  Fotos de cidades não identificadas 99. Por fim, foram reorganizadas: 2354 fotos.

 

Considerações finais

         As fotos que compõem o acervo são fontes ricas para possíveis pesquisas tanto no campo de graduações, quanto de pós-graduações, por isso entendemos a importância de preservar essas fontes, mas também disponibilizá-las, por isso o sentido de reorganizar esse acervo, para melhor atender os pesquisadores, também sabemos que as ciências estão em constantes transformações, e essa união entre arquivistica e história só vem a contribuir com essa discussão.

 

Referencias:

CARDOSO, Ciro Flamariom, MUAD, Ana Maria. História e Imagem: O exemplo da fotografia e do cinema. IN: CARDOSO, Ciro F. e VAINFAS, Ronaldo (org). Domínios da História: Ensaios de Teoria e Metodologia. 5a Ed. São Paulo: Editora Campus Ltda. 1997.

 

LE GOFF. Jacques. História e Memória. Terceira Edição. Campinas. UNICAMP. 1994.

 

KOSSOY, Boris. Fotografia e História. São Paulo: Ateliê Editorial, 2001.

 

 

 

 

 


[1] Bacharel em História pela UEPG e Pós – graduando no curso de Especialização em História, Arte e Cultura, pela mesma instituição.

 

[2]O referido laboratório é fruto da iniciativa dos professores do Departamento de História em busca de organizar um elenco documental para pesquisas. Assim é possível encontrar nesse espaço: monografias, dissertações e teses. Também se pode encontrar jornais, livros e processos crimes da Vara Criminal de Ponta Grossa/PR desde o final do século XIX. Além de um acervo de discosem vinis. A responsável por esse acervo é a Mestreem Ciências Sociais: Josélia de Maria de Loyola de Oliveira Gomes.

 

[3] O período em que essa reorganização ocorreu foi entre os meses de Março a Junho de 2011, não se estendendo até o fim do ano devido à outra proposta de trabalho. A Bolsa de Monitoria foi patrocinada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa.