Em escolas e vários outros ambientes, a sensação generalizada é de que muitos estão se tornando “eletrônicos”, com mais relacionamentos virtuais que pessoais, como se as pessoas próximas ou distantes fossem apenas imagens e caracteres - e o espaço da informação,exclusivo para a expressão de fantasias e divulgação de realidades pessoais idealizadas.

Todas as vidas são interessantes, embora a maior parte delas interesse mesmo apenas a quem a vive e ao seu círculo familiar e de amizades. No entanto,parcela ponderável de usuários de redes sociais torna público praticamente tudo o que pensa, faz e gostaria de fazer. E, num paradoxo, supõe que todos estão assistindo, e ao mesmo tempo ninguém está vendo nada, como se algo posto na rede fosse visto apenas por aqueles a quem se dirige, quando a webé totalmente aberta, praticamente tudo pode ser acessado por todos, embora usada como se fosse o mais confidencial dos canais de comunicação.

Na Commediadell’arte, teatro popular na Itália renascentista, havia um personagem que interagia com a plateia, o Polichinelo; representação da malandragem, em busca da cumplicidade dos espectadores, que sempre sabiam o que se passava. Criou-se daí a expressão “segredo de Polichinelo” para referir algo que se supõe reservado, mas que é de conhecimento de todos. E a internet é um palco desse teatro - todos cumprindo seus papéis, acreditando que seus segredos estão resguardados, enquanto operam em um ambiente que, por definição, é a antítese da privacidade.

Têm-se tornado frequentes os casos de demissões de pessoas que criticaram a empresa em que trabalham através de twitter ou Facebook, que acessaram ou transmitiram material inadequado ou ilegal em horário de trabalho e com o equipamento de uso profissional. Representa a mesma síndrome o suicídio de duas meninas que tiveram divulgadas fotos íntimas por amigos ou namorados, a ocorrência de prisões de bandidos que publicam fotos com armas pesadas (e produtos de roubos) e de pedófilos e exploradores sexuais que montam redes de contato. Levamtudo a público e imaginam que não serãovistos por alguém fora do grupo mais íntimo.

Muitos estudantes surpreendem-se quando professores não aceitam seus trabalhos de pesquisa. Julgam-se injustiçados – afinal, cumpriram fielmente as exigências da matéria, espaço, apresentação, até mesmo citação de fontes; sendo recompensados por tanto esforço com a observação de que sua obra não passa de um conjunto de arquivos “copiados e colados”.

Na verdade, tornou-se muito fácil localizar, por meio dos sites de busca, tudo aquilo que se relacione com o assunto proposto pelo mestre, com um pouco de bom senso montar um mosaico de textos que até fazem sentido e guardam relação com o tema. Todavia, um trabalho de pesquisa é muito mais que mera compilação: envolve busca, leitura, reflexão, compreensão e até mesmo alguma proposta original. Alunos esquecem que bons professores conhecem a maioria dos artigos publicados sobre sua especialidade - os que não conhecem,identificarão com os mesmos recursos de procura.

Pode-se usar a informática para facilitar o trabalho de escrita, com moderação e destacando os trechos efetivamente copiados. Porém, isso envolve maturidade e a capacidade,cada vez mais rara, de distinguir o que é da esfera pública daquilo que é privado. E isso afeta não apenas as instituições educacionais, mas toda a vida comunitária.

 

Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência das Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil.