ÉTICA, MORAL E DIREITO. 

Claudênia Pereira da Costa

V período – Direito – FaP

Ética Profissional – Danielli Sampaio. 

RESUMO: A importância da relação entre a ética-moral e a relação com o direito é objeto de análise deste artigo objetivando demonstrar a importância da influência da moral na ciência jurídica. Sobretudo em sua interpretação constitucional sob a luz, principalmente, dos ensinamentos de Miguel Reale. Um dos objetivos precípuos da ética é justificar as regras propostas pela moral e pelo direito no intuito que um seja o resultado do outro.

Palavras – chaves: Ética. Moral. Direito.

Introdução

No clássico livro de Miguel Reale Lições Preliminares de Direito, o autor fala que diferenciar ou relacionar a ética, o direito e a moral é um dos problemas mais belos e mais difíceis da filosofia jurídica. As ponderações do professor deixam clara a importância no tratamento ao tema.

Neste viés, questionamos qual a relação direta, de fato existente, entre a moral, a ética e o direito? Qual o atual conceito de ética, ele é mutável? O que corresponde a moral em nossa sociedade? E o direito, não seria apenas um conjunto de regras positivadas destinadas a regular as relações entre os indivíduos numa sociedade e nada mais? O conceito de justiça tem relação com a ética e a moral ou justiça seria apenas a pura aplicação da norma ao caso concreto? Para demonstrar estas questões, dentre outras que o tema demanda, iremos estabelecer nossa visão sobre o assunto.

Neste artigo procuramos demonstrar como a evolução do pensamento jurídico não pode desprezar a importância da ética e da moral, há quem fale “ético-moral” que de tão ligadas que estão, seriam uma única palavra composta.

O entendimento mais moderno dado ao direito hoje é o de compreender a impossibilidade de enxergar o direito, numa visão constitucional, separada da ética e da moral sob pena de um formalismo exarcebado e, obviamente, acobertando injustiças.

É neste espírito que esperamos demonstrar a dimensão ético-moral do direito dada numa interpretação constitucional contemporânea.  

1 – Breve Histórico

De inicio, devemos ter ciência que esta preocupação entre a relação aqui estudada não é recente, praticamente por toda história se perfez esta análise. Aristóteles foi um dos precursores do estudo da ética. Várias teorias já foram elaboradas, dentre elas, citamos a comparação feita por Dimitri Dimoulis (2003) sintetiza o assunto, mostrando como existem cinco teses sobre esta relação: a) os mandamentos jurídicos e morais coincidem (tese da identidade); b) as regras jurídicas constituem o núcleo das regras morais (o direito como mínimo ético); c) as regras morais constituem o núcleo do direito que compreende muitas normas moralmente indiferentes (a moral como mínimo jurídico); d) as regras jurídicas são aparentadas com as morais, sendo impossível criar e interpretar o direito sem levar em consideração a moral (tese da conexão); e) entre ambos os ordenamentos há plena e absoluta separação (tese da separação).

Não iremos analisar em pormenores todas estas teorias devido às circunspecções, são muitos complexas para serem tratadas num artigo. Em análise sobre a evolução do pensamento ético-moral do direito, temos a lição da Bijos (2009, pag. 8): 

Numa visão histórica evolutiva da progressiva diferenciação pela qual passou a ética, desde a ênfase que lhe foi data pela “virada socrática”, refletimos sobre o seu estudo geral, isto é sobre o que é bom ou mau. Um dos objetivos precípuos da Ética é a busca de justificativas para as regras propostas pela Moral e pelo Direito. A Ética é diferente de ambos – Moral e Direito, pois não estabelece regras. 

Ética é uma palavra que teve origem na Grécia, que significa propriedade de caráter. Ética é uma investigação geral sobre aquilo que é bom, o plano ético permeia todas as ações humanas e isto ocorre porque o homem é um ser livre e por meio de decisões pautadas na investigação naquilo que é bom, age. Este é o cerne da ética. A moral e o direito estão ligadas pelo fato de estabelecerem uma certa previsibilidade para as ações humanas. A moral estabelece regras a serem seguidas por uma pessoa para garantir seu bom viver, gera uma identidade entre as pessoas, um referencial moral comum. O direito busca estabelecer os regramentos do Estado dentro de suas fronteiras. Relacionando os três, aduz Bijos (2009, pag 9): 

Alguns autores afirmam que o Direito é um subconjunto da Moral. Esta perspectiva pode gerar a conclusão de que toda a lei é moralmente aceitável. Inúmeras situações demonstram a existência de conflitos entre a Moral e o Direito. A desobediência civil ocorre quando argumentos morais impedem que uma pessoa acate uma determinada lei. Este é um exemplo de que a Moral e o Direito, apesar de referirem-se a uma mesma sociedade, podem ter perspectivas discordantes. Descartes, Kant e Weber possuem a tese que o comportamento justo é originado na razão. A razão deve avaliar os melhores meios para atingir objetivos comportamentais. A razão deve atingir valores universais, incondicionais e que não admitem exceção14. Nesse ínterim, sob o ângulo especificamente ético, não há escolha, prima-se pelo exercício da liberdade, pela definição ética, se não houver avaliação, dar-se-á preferência às ações humanas. Eis porque na base da ética, como acabamos de afirmar, encontra- se desnecessariamente a liberdade e a valoração; a ética só se põe no mundo da liberdade, da escolha entre ações humanas avaliadas. Se não houvesse liberdade, não haveria apreciação possível sobre as condutas do homem, não haveria preferências axiológicas e, portanto, não se daria o campo para o exercício da liberdade. 

Da forma apresentada vimos que o direito está intimamente ligado a ética e moral, estão indissociáveis e devem evoluir no mesmo sentido. O direito é reflexo da sociedade, ainda neste intuito Miguel Reale diz que a norma só surge após o fato e o valor, este é a ética pessoal e a moral defendida pela sociedade que vai julgar os fatos existentes e sobre eles debruçar-se e saber se a estes existem normas, em que proporção serão aplicadas.  Juiz não é um mero aplicador da lei, é um interprete. Inaugurou-se na doutrina o chamado “pós – positivismo” que, a nosso ver, é a forma garantidora de se interpretar o direito de acordo com os princípios ético-morais. 

2 – Reflexões Ético-Moral Sobre o Direito

A moral diferencia-se da ética, embora de ter um fim igual: o ordenamento do comportamento social. Elas partem de premissas distintas. A moral tem como pedra angular o próprio comportamento social e a ética, uma reflexão sobre ele. E o Direito? Estudamos nos manuais do curso jurídico que o principal papel do Direito é ordenar a vida social. Esse ordenar a vida social carecerá respeitar os limites da ética e da moral? A posição dos autores é de responder afirmativamente a essa interrogação; o Direito deve respeitar o campo de atuação delimitado pela Ética; como esclarece Miguel Reale (REALE, 1999. p. 219), o Direito está contido na Ética e é sua garantia:

 

Donde pode dizer-se que a Ética é a realização da liberdade, e que o Direito, momento essencial do processo ético, representa a sua garantia específica, tal como vem sendo modelado através das idades, em seu destino próprio de compor em harmonia, liberdade, normatividade e poder. 

É neste preceito que pensamos sobre a prática da liberdade e o comportamento humano: trabalhar ou roubar, elogiar ou ofender, por exemplo, qual o liame entre um elogio ou ofensa que dará ensejo a uma ação de injúria? Este parâmetro será dado pela moral preponderante na sociedade, ética são valores individuais que somados formam a moral da sociedade. Se o direito existi para garantir a paz social no Estado é impossível dissociamos. Dentre estas várias significações ressalte-se a empreitada difícil da ação moral, cuja habitualidade comportamental atribui ao indivíduo a particularidade de ser único e domínio de governar-se a si mesmo, de conduzir atitudes na vida. Esta conduta deve ser dirigida pela convicção pessoal, isto é, o auto-convencimento de que vamos transformar ideias, mover o ser humano para o aperfeiçoamento de sua conduta. Neste sentido leciona Bijos (2009, pag 19): 

Percebemos, de antemão, a diferença entre direito e moral, conceitual e comparativo estudo do dever-ser jurídico com relação ao dever-ser moral. Há que se deter na análise, buscar semelhanças e diferenças. De princípio abordar-se-á a unilateralidade, a incoercibilidade e autonomia do Direito, e as notas essenciais da moral. Inquirimos a respeito de fatos: Como trabalhar com penas para o incesto (que não é considerado crime no sistema jurídico repressivo brasileiro), a dívida do jogo (descrita no art. 814 do Novo Código Civil), a preocupação constitucional com o princípio da moralidade pública,  expressa no art. 37, caput: “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...”. Aqui se comprova a relevância do princípio moral para a própria organização, manutenção e credibilidade cívica dos serviços públicos. O que é moralmente recomendável tornou-se juridicamente exigível do funcionalismo público. Como balizar a teoria do negócio jurídico e dos tratos comerciais em torno da ideia da boa-fé, estabelecendo inúmeras presunções a ela concernentes (art. 164 do novo CC). 

Assim, entendemos que há uma intrínseca relação entre a moral, o direito e a ética. A moral alimenta o direito, sem levarmos em conta isso, viveríamos em um estado positivado, regrado por normas tecnicitas de pouca aplicabilidade social. 

3 – Conclusões

Diante do apresentado, concluímos que é impossível a separação do direito e da moral, visto que um é o alimento do outro. Direito sem moral, ou contrário às aspirações morais passa a ser puro arbítrio. Se entendermos o direito apenas como um conjunto de leis a serem aplicadas, seu campo de normatividade e aplicação se afasta totalmente da ética. O raciocínio jurídico deixará então de julgar o que é certo ou errado, que ficaria a cargo da moral, mas a moral não possuiria coercitividade para impor suas normas morais e viveríamos em constates conflitos, pois o interesse de cada um iria sempre se sobrepor ao do outro. Precisamos compreender o Direito não apenas como fato do homem, mas sim como fato social, que torna possível a coexistência humana. 

4 – Referências Bibliográficas

ADEODATO, João Maurício. Filosofia do direito: uma crítica à verdade na ética e na ciência; (em contraposição à Ontologia de Nicolai Hartmann), 3ª edição, revista e ampliada, São Paulo: Saraiva 2005.

BITTAR, Eduardo. Curso de Ética Jurídica: ética geral e profissional, 2ª ed.. São Paulo: Ed. Saraiva 2004.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 26ª ed.. São Paulo: Editora Saraiva 2007.

GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 9ª ed.. São Paulo: Forense, 1999.

KELSEN, Hans. O que é justiça. Tradução Luís Carlos Borges e Vera Barkow. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

KELSEN, Hans. O problema da justiça. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

MOORE, George Edward. Princípios Éticos. São Paulo: Abril Cultural, 1975.

REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 20ª ed., Saraiva: 2002.