ESCOLA CICLADA:

DA TEORIA A PRATICA EM TAPURAH - MT

Msc. Luciana Fatima Grazziola ¹

As Escolas Públicas da Rede Estadual de Mato Grosso até 1997 tinham o ensino fundamental organizados em séries. 

Por entender que a Educação Escolar é um direito social inquestionável e inviolável do cidadão, a Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso – SEDUC (2000)  desde o ano de 1996 vem apresentando novas   propostas e  alternativas para a educação . Iniciando no ano de 1998, uma reestruturação do Ensino Fundamental, com a proposta de implantação do Ciclo Básico de Aprendizagem – CBA, onde o Ensino Fundamental passou a ser organizado em três ciclos de aprendizagem, e cada um com  duração de três anos.

O estado de Mato Grosso optou por uma nova proposta com base na lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional/ LDB e nos Parâmetros Curriculares Nacionais. Independente de a escola oferecer um ensino Ciclado ou Seriado é necessário que cumpra com o artigo nº 32 da Lei de Diretrizes e Bases, segundo esse artigo “ o ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 ( nove) anos, gratuito na escola pública. Iniciando aos 6 ( seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante”.( LDB, redação dada pela Lei nº 11.272, 2006). Inserido na rede Estadual de Ensino, o Ciclo Básico de Aprendizagem  estabeleceu-se  numa importante iniciativa que implantou uma estratégia político - pedagógica de caráter democrático para encarrar  o fracasso escolar, abolindo a reprovação no primeiro ano de escolaridade e colaborando para a permanência de crianças em idade escolar no sistema de ensino, garantindo, o direito a alfabetização. E no final de 1999, a Secretaria de Estado de Educação sugeriu a implantação de ciclos de formação para todo o Ensino Fundamental, visando a permanência  dos  educandos  que concluíam o Ciclo Básico de Aprendizagem a prosseguirem com os  estudos no mesmo ritmo da proposta de Ensino.

Os ciclos de aprendizagem têm as mesmas características dos ciclos de estudos, com a diferença posta em relação ao sistema de promoção. Em um ciclo de aprendizagem, “proíbe-se a repetência  no interior do ciclo, exceto em seu ultimo ano. ( PERRENOUD,2002b,p.37). Para o autor, “ a proibição parcial da repetência  aumenta um pouco a fluidez das progressões”, no entanto ressalta que se nada for feito, os desvios entre os alunos aumentaram, embora não sejam sancionados por um atraso escolar. ( Ibid.,p.37).

A implantação dos ciclos de formação humana em todas as escolas de Ensino Fundamental no Estado de Mato Grosso tem instigado a promover mudanças expressivas, no fazer pedagógico do cotidiano de cada um dos professores. A preocupação em garantir a aprendizagem dos educandos motivou a necessidade de estabelecer o Referencial Pedagógico para orientar o processo ensino-aprendizagem e sistematizar o trabalho de todos os educadores no Ensino Fundamental.

Com a implantação da Escola Ciclada na Rede Estadual de Mato Grosso, o Ciclo Básico de Alfabetização esta concentrado em uma estrutura que irá   compor grupos de educandos  com idade  aproximada. Esta configuração de grupos supõe que os educandos  com seus colegas da mesma idade terão mais facilidade nas trocas de experiências  e na construção de seu conhecimento, isso porque são considerados interesses, curiosidades e anseios adequados de cada ciclo da vida.  

Segundo proposta da Secretaria do  Estado de Mato Grosso a escola ciclada esta organizada da seguinte forma:

No Estado de Mato Grosso o Ensino Fundamental tem duração de 09 anos e está organizado em 03 (três) ciclos de Formação Humana. Os Ciclos são organizados em três anos continuados (no entanto na prática isso não vem acontecendo, pois o estudante tem que fazer a matricula anualmente, percebemos e pensamos que isso tem gerado um certo conflito ou ainda comparação com a escola seriada)  com 200 dias letivos (que deveriam ser 600) e carga horária mínima de  800 (que deveriam ser 2.400) horas por ciclo, garantindo,  ao termino do ciclo um total de 600 dias letivos e 2.400 horas, cada um. Nessa definição, a carga horária semanal nos Ciclos é de 20 horas, distribuídas conforme o Projeto Político Pedagógico (PPP) de cada unidade escolar.

Percebemos que a proposta de ensino pretende atender as necessidades do educando de forma particular, acarretando benefícios ao educando. Nesse sentido é pertinente o que diz Elba Siqueira de Sá e Eleny Mitrulis,1999, segundo elas;

Visando enfrentar o fracasso escolar dentro de uma concepção assumida como Construtivista, os ciclos contemplam, de um lado, o trabalho com as especificidades de cada aluno e, de outro, permitem organizar com  maior coerência a continuidade da aprendizagem a partir de uma perspectiva mais ampla, bem como integrar os professores que nele atuam. Os argumentos sobre a adequação às faixas de idade e às caraterísticas de aprendizagem dos alunos são os conhecidos: dão ênfase, contudo à preocupação com o desenvolvimento do aluno, não só do ponto de vista cognitivo, como social e afetivo, permitindo que sua história de vida seja levada em conta. Assim como nas demais propostas, o foco de avaliação é deslocado para o diagnóstico. Maior ênfase é atribuída  aos processos de ensino propriamente ditos do que aos produtos da aprendizagem.( BARRETTO e MITRULIS 1999, p. 41). 

            Pode-se entender que a implantação do ensino Ciclado representa um avanço na educação do Brasil, porém ainda enfrenta  muitos problemas em relação a aceitação por parte dos educadores.

Portanto percebesse  que a falta de conhecimento relacionados ao sistema de ciclos decorre de uma falta de conhecimento prévio dos  professores sobre o  funcionamento de uma escola que aderiu a essa forma de ensino. Segundo Perrenoud, 2004:

Os sistemas educativos que impõem os ciclos plurianuais aos professores como qualquer reforma de estrutura, criam ciclos “ no papel” sem interferir nos funcionamentos tradicionais, logo reconstituídos sobre um novo rótulo. Lamentavelmente, os que decidem as reformas sempre subestimam o trabalho prévio sem o qual os professores não se posicionam. Ora, se eles não são os primeiros a se empenhar ativamente em construir ciclos plurianuais dignos desse nome, ninguém fará em seu lugar, mesmo que o sistema colocasse à disposição enormes recursos de pesquisa, de formação ou de controle...( Perrenoud, 2004.p.4).

Nesse  discurso , Perrenoud faz um alerta sobre a necessidade de comprometimento dos professores com as mudanças reais que o ensino com base nos ciclos impõe. Segundo ele, nenhum sistema deveria ser implantado pelas entidades educacionais, mas sim pelos professores, diretores e demais envolvidos com essa implantação, pois uma imposição nesse sentido levaria ao fracasso  do ensino e consequentemente  a dificuldade de apreensão do conhecimento por parte do educandos.

O  discurso  sobre a idealização dos ciclos e sua relação com a organização  de um currículo coesivo com tal organização anda  lentamente e ainda não faz parte de uma reflexão mais profunda por parte das políticas praticadas. Phelippe Perrenoud, em sua proposta de uma pedagogia diferenciada, se aproxima do cotidiano da escola e do trabalho do professor e  defende a organização curricular a partir  de objetivos de alto nível, entendendo que a escola deve trabalhar para formar  competências nos educandos.

Observamos que e a escola hoje convive com um modelo curricular que, obedece a lógica do conhecimento seriado, mas vem implementando  novas propostas visando alongar os objetivos  a serem alcançados pelos educandos num período de  dois ou três anos de um ciclo. Portanto, cabe ao professor identificar os interesses dos educando e relacionar os conhecimentos com a realidade   que o cerca, as informações   trabalhadas  devem estar de acordo com as possibilidades cognitivas   e afetivas do aluno.

Entretanto o desenvolvimento e a aprendizagem, essencial a abordagem sociocultural, são idealizados como processos que se consolidam na cultura. Desse modo, para Vygotsky, desenvolvimento e aprendizagem interagem desde o primeiro instante de vida, uma vez que não há  como se desenvolver sem a participação do aprendizado. A aprendizagem nessa percepção, movimenta o desenvolvimento. Portanto não se pode resumir esses processos em um único, dadas as suas particularidades. Mesmo  em constante interação, o desenvolvimento e a aprendizagem não se identificam, pois, como o próprio autor afirma:

[...] aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humana. ( L. Vygotsky 1991, p. 101).

                            

De acordo com Vygotsky, há dois níveis de desenvolvimento: o nível de desenvolvimento real, com funções psicológicas, atividades que o sujeito realiza sozinho, mas anteriormente houve a interação com o outro. E o nível de desenvolvimento potencial, com funções ainda não amadurecidas que precisam de outra pessoa experiente para se desenvolver.

No Brasil a compreensão da escola por  ciclo  de formação presente nas diferentes proposta implementadas esta inteiramente pautada na trajetória  de diferentes experiências  de reversão do fracasso escolar ( tentativas como a de promoção automática, ciclo básico de alfabetização). Determinadas experiências incorporam os elementos de autores como Perrenoud, que formulou abertamente uma proposta de uma Pedagogia diferenciada que tem como premissa uma organização em ciclos plurianuais. Ressaltamos que o experimento de reverter o fracasso escolar torna a proposta  brasileira de ciclos única.

       Conforme  Paulo Freire em suas propostas aponta para a necessidade de o educador ser alguém que tenha perspectiva, que acredita na utopia. Não aquela utopia cega, mas aquela que nos estimula, que nos faz mais humanos.

Portanto pensar na escola em ciclos significa pensar em uma escola diferente daquela que conhecemos. Uma vez que  a escola em ciclos de hoje é uma escola indispensável e transitória para uma escola que estamos construindo, que seja mais coerente com as questões do mundo hoje.

Deste modo, o educador inserido nesse processo educacional tende a  ser agente passivo de flexibilidade para as mudanças entendendo que a educação é mais ampla que aquela   absorvida dentro da escola, mas também a que trás de conhecimento e/ou adquiri nas relações sociais do seu desenvolvimento social.

           

Referências  Bibliográficas:

BARRTETO,E.E.S.; MITRULIS,E. Os Ciclos Escolares: elementos de uma trajetória. Cadernos de Pesquisa, São Paulo:n.108, p. 27-48. Nov.1999.

LDB, Lei de Diretrizes e Bases da Educação. 2009.

PERRENOUD, P . Pedagogia Diferenciada – das intenções à ação. Porto Alegre: ed. Artmed, 2000b.

______________ Faculdade de Psicologia e das Ciências da Educação, Universidades de Genebra. Os ciclos de aprendizagem: novos espaços – tempos de formação. 2004.

SECRETARIA DO ESTADO DE EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO. Escola Ciclada de Mato Grosso: Novos  tempos e espaços para ensinar – aprender a sentir, ser e fazer. Cuiabá, 200, 2ª edição.

VYGOSTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. 4º ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.

__________________ Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994.