Todos aqueles que lidam com o ser humano, estigmatizado, excluído e rotulado como “doente mental”. Pode-se dizer assim que faz parte de uma equipe interdisciplinar social.

O especialista em saúde mental, que escolhe ser um membro de sua profissão deverá abraçar essa causa e a defender contra a todos que a critica, sua ideologia se contrapõem neste contexto, na sua especificidade, totalidade de estudar, pesquisar, descobrir embasamentos práticos onde definem que a essência da saúde mental é a, desestruturação social.

O CAIS Clemente Ferreira em Lins, conta com profissionais capacitados e envolvidos nos projetos, objetivos e principalmente comprometidos com a missão institucional.

É fundamental destacar a riqueza do momento vivenciado pelo CAIS, onde o trabalho é direcionado para o resgate do ser humano, sua diversidade, conflitos e limites. A equipe inter-disciplinar, altamente capacitada, atua buscando se inserir verdadeiramente neste processo, o que vem refletindo num amadurecimento das reflexões e consequentemente das relações.

Num esforço coletivo, as ações conjuntas são colocadas em prática e vem favorecendo a todos os envolvidos no processo. A revisão da prática institucional, a avaliação individual dos moradores dando a estes a oportunidade de ser de fato ‘ouvidos’, proposta de Projetos Terapêuticos institucionais constantemente revistos, proposta de projeto terapêutico individual anexado ao prontuário de cada morador, foram as ações iniciais objetivando a transformação radical do manicômio num Centro de Atenção Integral à Saúde, que faz diferença pelo trabalho especializado e humanizado.

Trabalham conscientes de que estão diante de sujeitos concretos, que vivenciam experiências particulares, cuja condição de existência – sofrimento os coloca , por definição, em estado de não – equilíbrio, base da instituição inventada e não determinada, entendendo-se como determinismo, estar fadada ao objetivo inicial posto pela psiquiatria: de exclusão social e todas as sua consequências.

O doente não está reduzido à sua doença. A ciência tende à uniformização do tratamento e não à sua singularização, cujas ações, no contexto da atual Reforma Psiquiátrica, deverão ser desenvolvidas e contempladas, visando o aumento do poder contratual das pessoas portadoras de transtorno mental.

A doença mental tem permitido, ao longo do tempo, a retirada de liberdade das pessoas, encarcerando-as em hospitais.

Por 300 anos esta tem sido a prática dos alienistas e/ou dos psiquiatras, contra apenas 30 anos de experiências e de possibilidades de tratamento em serviços abertos, ou serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico.

A pessoa ao adentrar no hospital psiquiátrico, perde sua identidade. O processo inicia-se pela perda das próprias roupas e o uso do uniforme do anonimato. Os longos períodos de permanência nas instituições vão proporcionando outras perdas, sendo visíveis a aparência física desleixada, a perda dos dentes, unhas e cabelos mal cuidados, infestados por piolhos (pediculose), pontas dos dedos escurecidas pelo uso do fumo, ombros caídos, andar robotizado, acentuado pelo uso de remédio, olhar perdido, baixo nível comunicacional.

Os códigos de proibição, explícitos ou implícitos vão alienando o indivíduo, separando-o de si, cindindo sua personalidade. É a alienação elevada ao quadrado.

Outras perdas se sucedem à internação: do vínculo familiar, de amigos, de emprego, num processo de interdição crescente e que se formaliza na interdição judicial com o rótulo da incapacidade, ratificado pelo psiquiatra e pela psiquiatria forense.

E porque a escuta? Por entender que a rigor não se escutam os doentes mentais, nem individual, nem coletivamente. Seus familiares não o entendem, antes se desentendem, e os próprios doentes não conseguem formar corporações competentes para defender seus interesses. A sua própria doença conspira contra si e alguém deve zelar por seus direitos, seu tratamento, a proteção de seu patrimônio, o que remete à ética da responsabilidade, que deve ser assumida por aqueles que cuidam ou deveriam cuidar de pessoas. Pitta conclama a psiquiatria a desalienar sua prática, colocando-a a favor da sua dignidade pessoal e da dignidade dos cidadãos que necessitam de seus cuidados.

Os aspectos levantados por Pitta alinham-se mais à ética pública e à formação e atitude dos profissionais frente ao sofrimento do outro. Embora não seja possível, nem viável ou tolerável, medicalizar todo o sofrimento, o maior sofrimento da doença é a solidão de não se poder ou se fazer ouvir. Cuidar é ouvir e a recusa em fazê-lo, por parte de quem quer que seja, caracteriza-se em exclusão, proscrição ou excomunhão do paciente.Nas entrelinhas destas considerações está o fato de alguns profissionais não terem a disponibilidade interna necessária para solidarizar-se com a dor do outro, ou não são educados para tal, no sentido ampliado de educação.

Quaisquer das éticas aqui citadas são um chamado nesta direção e reveladoras de que traçar regras de conduta ou códigos de proibição, remetem necessariamente à restrição da liberdade, sobretudo a liberdade daqueles cujas ações e pensamentos escapam ao entendimento. Temos a infeliz tendência de aprisionar o que não conseguimos conhecer, o que foge a qualquer teoria do conhecimento, o que a epistème não alcança. A este vazio, a este ‘desconhecido’, procuramos estipular prescrições, num ato de ‘preenchimento estratégico’ como diria Foucault. Uma ética, ou modelos éticos defensáveis estariam mais à altura de nossa humanidade. Ações éticas poderão um dia ser contadas como o momento em que nos desfizemos de um passado de dor e sofrimento a que foram condenados muitos seres humanos no aprisionamento do hospital psiquiátrico e sentir-nos-emos dignos por termos lhes tirado as amarras. Este é o nosso sonho. Esta é a nossa utopia útil. Esta é a história que, entre enfrentamentos, confrontos e dificuldades poderemos deixar como exemplo e como marco de um caminho, cujo percurso é por vezes solitário, espinhoso, mas que vale a pena, porque fala de liberdade.

Libertando identidades, constituindo novas subjetividades, inventando e reinventando, criando e recriando, desvendando os dispositivos disciplinares, desenvolvendo ações que supram deficiências ou incapacidades e ampliem chances de vida, entendendo os jogos de poder e sua força performativa, poderemos redescrever os doentes mentais e a nós mesmos em novos e impensados jogos de linguagem, que nos forma e conforma, numa outra estilística da existência, dentro do tempo e da história, como seres contingentes, simplesmente humanos, ‘demasiadamente humanos’, onde o homem se preserva humano e não se bestializa como animal. (CESAR, 2001)

Esta maneira de pensar, incluindo a loucura em um sentido ampliado, como experiência de libertação, supõe uma nova interpretação de nós mesmos, de como nos pensamos, das práticas implicadas e suas relações, porém deve considerar o sujeito que as funda como objeto do próprio conhecimento. Este é um cuidado que se deve tomar...

Quando o homem se coloca como objeto de seu próprio conhecimento ele se coisifica sob a ideologia do humanismo, em nome do qual muitos serão trancafiados em manicômios pelo crime de não conseguirem cumprir determinados contratos ou fazer o jogo social.

O pensamento psiquiátrico brasileiro se constitui muito mais como política pública de saúde mental. Sua trajetória irá culminar com a reforma psiquiátrica, “enquanto processo permanente de reflexão e transformação (Amarante, 1994), cujo coroamento se dá com a promulgação da Lei 10.216 de 06 de abril de 2001, pela Presidência da República, que tem propósitos não