UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ ? UVA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO TEOLÓGICA DO NORDESTE
LICENCIATURA PLENA EM CIÊNCIAS DA RELIGIÃO












ENSINO TRANSRELIGIOSO: O DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO COMO PROPOSTA EM PROL DA DISCIPLINA ESCOLAR





ANDREIA PESSÔA DE OLIVEIRA







MARANGUAPE - CEARÁ/2005

ANDREIA PESSÔA DE OLIVEIRA








ENSINO TRANSRELIGIOSO: O DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO COMO PROPOSTA EM PROL DA DISCIPLINA ESCOLAR




Monografia submetida á Universidade Estadual Vale do Acaraú ? UVA - como parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de Licenciatura Plena em Ciências da Religião.
Prof. Orientador: Francisco Edmilson Sousa Arruda - M.s




MARANGUAPE ? CEARÁ
2005
Monografia apresentada à Universalidade Estadual Vale do Acaraú como requisito parcial para obtenção do título de Licenciatura plena em Ciências da Religião.


Andreia Pessoa de Oliveira


Monografia aprovada em: 08/02/2006

Prof. Orientador: Ms.Francisco Edmilson Sousa Arruda

Rosana Sales Tayra
1º Examinador

Suelene Silva Mineira
2º Examinador:

Cláudia Monteiro
3º Examinador:

Prof. Coordenador: Carlos Alencar






DEDICATÓRIA


Aos meus pais, Paulo e Eralda, por sua coragem e integridade, que tem sido um referencial de vida aos seus filhos.
Ao meu filho Jefferson, Clara e Helânio que são o sol de minha vida; aos meus irmãos Gerson e Paulo; aos meus sobrinhos Felipe, Lucas, Géssica e Ana. Para que possam ver na minha luta um exemplo de esforço, persistência e dedicação aos estudos; a minha querida avó Ermila, por sua torcida.
Ao professor Edmilson Arruda, que me ensinou a capacidade de escolher novos rumos, o respeito, aquilo que é indispensável e a ação de buscar no interior de mim a resposta e a força para encontrar a saída.
À memória de meu vozinho Belmiro, professor em vida, que tem sido meu exemplo quanto a dedicação a minha profissão educacional.
À memória de minha inesquecível e amada irmã Elaine, que sempre acreditou em mim. "O brilho do seu sorriso alegra meu coração"
À Deus que dá sentido e felicidade plena a todos os homens e a mim.





AGRADECIMENTOS


A Deus, fonte suprema e inesgotável de amor, de misericórdia e de esperança, que me sustenta nos embates da vida me dando forças e coragem para continuar nos momentos difíceis da vida, quero dizer: "Obrigada, por esta conquista!".
Aos meus filhos, que diante de sua inocência, soube compreender a minha ausência no decorrer desses anos e que é o motivo de minha vontade de lutar pelos meus ideais.
Aos meus pais que me deram a oportunidade de estudar e pelo muito que se esforçaram para que eu pudesse vencer cada etapa da minha vida escolar.
Aos meus professores ao longo do curso, destacando o amigo professor Alencar, Silvanne, Joana Estela, Mário Thé e Gláucia Narciso.
Em especial ao professor orientador, Edmilson Arruda, pelo seu auxílio, e revisão do trabalho ao longo de sua preciosa orientação. Pela compreensão, companheirismo e apoio nessa caminhada árdua, mas gratificante. "A alegria dessa conquista também é sua. O seu amor, estímulo, carinho e dedicação são a alma dessa vitória."
Ao reitor Augusto Ferreira, por sua iniciativa de trazer o curso de Ciências da Religião e pela sua incansável vocação para o Ensino Religioso.







"Creio na verdade fundamental de todas as grandes religiões do mundo.
Creio que são todas concebidas por Deus e creio que eram necessárias para os povos a quem essas religiões foram reveladas.
E creio que se pudéssemos todos ler as escrituras das diferentes fés, sob o ponto de vista de seus respectivos seguidores, haveríamos de descobrir que, no fundo, foram todas a mesma coisa e sempre úteis umas as outras".

Mahatma Gandhi





RESUMO


Neste trabalho monográfico procuramos desenvolver mecanismos através de uma ampla pesquisa com objetivo de compreender o ensino transreligioso numa dimensão dialogal e nesse sentido traçar alternativas afim de minimizar a indisciplina escolar, e para isto partimos em busca de uma visão histórica do Ensino Religioso no Brasil, buscando compreender através de seus aspectos legais que tipo de identidade cultural se projetava na religiosidade catequética. Concluímos que o Ensino Religioso tem uma identidade não catequética e sim pluricultural em virtude da matriz religiosa brasileira e suas diversidades em termos étnicos. Nesse sentido o objetivo fundamental do Ensino Religioso de acordo com as normas vigentes, ultrapassa a idéia de qualquer tipo de exclusividade denominacional, o que poderia suscitar divergência e indisciplina dentro do espaço da sala de aula. A nossa proposta pedagógica passa por duas questões básicas: uma se refere a visão curricular transreligiosa, mostrando os valores transcendentais e os valores éticos. Numa segunda proposta tem a ver com o diálogo inter-religioso sendo dimensionado na perspectiva do conhecimento transdisciplinar.








SUMÁRIO


INTRODUÇÃO ..........................................................................................................08

1. BREVE HISTÓRCO DO ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL................................11

1.1. Retrospectiva Histórica...................................................................................13
1.2.Aspectos Legais. ............................................................................................18

2. O ENSINO RELIGIOSO E SUA IDENTIDADE PLURI-CULTURAL.....................22


2.1. A diversidade cultural-religiosa do ensino religioso. ......................................24
2.2. Buscando sua identidade própria...................................................................28
2.3. O fenômeno religioso como fundamentação: uma abordagem
pedagógica na escola e na sala de aula........................................................31

3. O ENSINO RELIGIOSO EM PROL DA DISCIPLINA NA ESCOLA PÚBLICA .....37

3.1. A sala de aula como espaço propício para o Ensino Transreligioso:
uma alternativa a disciplina escolar ................................................................39
3.2. Disciplina na sala de aula ? Educação ou repressão ....................................44
3.3. A (in) disciplina ? Questão da escola ou da sociedade .................................51
3.4. A disciplina que desejamos............................................................................54

4. PROPOSTA PEDAGÓGICA DE UM ENSINO TRANSRELIGIOSO:
DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO NUMA VISÃO HOLÍSTICA. ................................60

4.1.O que é o Diálogo Inter-religioso ...................................................................63
4.2.O ensino religioso como área de conhecimento transdisciplinar. ..................67
4.3.Disciplina e Diálogo Inter-religioso ? uma análise na perspectiva
vygotskyana....................................................................................................74

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................79


BIBLIOGRAFIA ..........................................................................................................83





INTRODUÇÃO


Este trabalho monográfico deverá somar-se a outros já existentes sobre o assunto, na tentativa de contribuir para a ampliação dos conhecimentos sobre o Ensino Religioso nas escolas públicas, procura destacar a problemática educacional, que é a (in)disciplina escolar.
Teve como objetivo mostrar que através da transdisciplinaridade do Ensino Religioso é possível trabalhar de forma concreta a questão da (in)disciplina na escola pública , contribuindo com a metodologia quanto ao diálogo em prol de sua diminuição.
Muitos educadores se preocupam com a (in)disciplina escolar e apresentam um vasto quadro teórico sobre este assunto. Apesar da grande contribuição literária e científica, a prática dialogizante na escola e entre as religiões torna-se difícil pela forma lenta com que se conseguem os resultados, portanto, constitui um grande desafio para educadores e demais cientistas da religião.
A educação enfrenta grandes desafios para o cumprimento de sua missão na atualidade. Compreendendo educação como o processo contínuo que visa desenvolver o homem de forma integral (nas suas diversas dimensões biopsicossociais, antropológicas e religiosas), constata-se a importância de refletir sobre o modo como isto pode se dar num contexto sócio-econômico e político até certo ponto, tão adverso ao próprio homem.
Desde os anos 60, o capitalismo ingressa em uma nova fase de desenvolvimento, baseado numa dinâmica produtiva com sofisticada tecnologia. As suas bases principais passam a ser a microeletrônica (envolvendo a computação, as comunicações, a robótica), a biotecnologia e a química fina. Esta, chamada por alguns de Terceira Revolução Industrial tem provocado a parceria entre fortes conglomerados empresariais, concentrando capitais, globalizando mercados, exigindo qualificação profissional bem maior, reduzindo o volume de trabalho, gerando grande índice de desemprego, e reduzindo ou anulando conquistas sociais já obtidas pela população que fica sujeita à barganha livre com os patrões.
Toda essa realidade marcada por tantas contradições sociais, políticas e ideológicas têm reflexos profundos na vida deste homem, para qual todas as coisas foram criadas no objetivo de impulsioná-lo à realização plena. Não há realização plena para o homem sem construí-la com os outros, no respeito à sua dignidade de homem, na justiça e na solidariedade.
A escola também agoniza em suas contradições, entre, responder produtivamente ao sistema econômico com suas exigências e sua proposta de educar para os valores essenciais da vida humana. Tocam-se neste universo os pólos opostos: competitividade/ação coletiva; produtividade/qualidade de vida; individualismo/solidariedade; hedonismo e consumismo alienantes/bem comum, a partilha, a comunhão com o outro, etc. Essas forças muitas vezes, confundem o homem, esvaziam sua vida do seu significado mais profundo, levando-o à frustração e ao vazio existencial com suas inúmeras conseqüências.
Não é possível menosprezar a cultura do homem, que dentro da sua realidade, representa o seu pensar, o seu agir. Este confronto de saberes entre indivíduos que conhecem e que desconhecem, que ensinam e que aprendem, e que com seus diferentes graus de conhecimento, constroem juntos um novo saber, envolve o ser humano, o aluno no concreto do seu pensar e do seu agir, no qual todos somos aprendizes e ensinantes, numa interação conjunta, constitui o ato mais sublime do ser humano e por que não dizer, um desafio aos educadores, a escola, as instituições religiosas, e a sociedade.
Os conhecimentos colocados nessa dissertação revelam uma forma provocativa, corajosa e esperançosa de ver o Ensino Religioso interagir e perceber que o diálogo, a disciplina, a educação integral do homem decorre de uma pedagogia fundada nos princípios éticos, no respeito à dignidade do aluno, enquanto sujeito sócio-histórico-cultural do ato de conhecer, saber e transformar o mundo, mostrando que há saídas para quem está disposto a construir uma sociedade onde não se tenha mecanismo de exclusão, mas onde se enaltecem os valores que dignificam a espécie humana.
Assim sendo, este trabalho não tem a pretensão de realizar uma abordagem exaustiva desse tão importante assunto. Pretende-se que ele seja uma reflexão para o problema da (in)disciplina escolar, na tentativa de um maior comprometimento dos elementos básicos da ação educativa: professores, alunos, escola e sociedade, como garantia de uma prática educativa do Ensino Religioso mais coerente e eficaz, numa cosmovisão transreligiosa e holística do ser.
É nesta vertente o desenvolvimento desta produção monográfica, cujo primeiro capítulo refere-se a um breve histórico do Ensino Religioso no Brasil e de seus aspectos legais até os dias atuais, analisando que no decorrer da historicidade da humanidade, o ensino Religioso esteve fortemente presente nas diversas dimensões da vida. A análise compreendida no segundo capítulo focaliza a identidade pluri-cultural do Ensino Religioso: sua diversidade cultural-religiosa, sua identidade própria e fundamentação, a abordagem pedagógica na escola e na sala de aula do fenômeno religioso. O terceiro capítulo aborda o Ensino Religioso e a Disciplina na escola pública: a sala de aula como lugar apropriado a um ensino transreligioso, a discussão a cerca da disciplina como meio de educação ou repressão, instrumento da escola ou da sociedade e a disciplina que almejamos, tentando assim, compreender melhor esses fenômenos marcantes em nossa sociedade. Foram ressaltados no quarto capítulo à apresentação da proposta à um Ensino Transreligioso: o diálogo inter-religioso e sua definição, o ensino religioso como área do conhecimento transdisciplinar e uma discussão na ótica vygotskyana. Em todos os capítulos, há indicações bibliográficas criteriosamente selecionadas e de grande valor para posteriores indagações.
Finalizamos não com conclusão estabelecida, mas com considerações finais acerca do assunto dissertado propondo ações viáveis ou sugestões, a fim de subsidiar escolas, professores e instituições governamentais e não governamentais, e demais pessoas interessadas em ações preventivas.





1. BREVE HISTÓRICO DO ENSINO RELIGIOSO NO BRASIL


A clarividência do legislador, ao regulamentar o Ensino Religioso Escolar como matéria obrigatória para a escola, embora de freqüência facultativa, levou-o a excluir todo proselitismo, na forma de ministrar a disciplina. Repudia-se qualquer sorte de doutrinação, sem querer dizer, entretanto, que a disciplina se deva limitar à pura transmissão de conhecimentos, pois isso seria pedagogicamente pouco recomendável. Se há matéria que não possa ser ensinada como simples desenrolar de fatos histórico-culturais é exatamente o estudo do fenômeno religioso. Não se pode falar seriamente de religião sem questionar a vida, já que a religião não é outra coisa senão um construto simbólico. Rejeitando o proselitismo, o legislador pressupõe, portanto, que o Ensino Religioso se faça numa perspectiva crítica, levando assim os alunos a perceber a significação real da linguagem simbólica, nas diversas tradições religiosas. Tal enfoque requer do docente, uma dupla aptidão: o conhecimento das diversas tradições religiosas no que são de fato e o domínio de critérios abalizados, que permitam emitir um juízo crítico objetivo sobre os fatos religiosos. Esses dois elementos, conhecimento histórico e critérios de avaliação, embora distintos, caminham sempre juntos no Ensino Religioso escolar.
No campo religioso brasileiro observa-se um processo progressivo de diversificação religiosa. O último censo do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (TEIXEIRA, 2003, p. 22), mostrou ainda a força da presença do cristianismo, pelo menos no âmbito da crença declarada. Os cristãos somam 89% da crença declarada (73,8% de católicos e 15,4% de evangélicos). Em seguida aparece o grupo dos sem religião somando 7,3%. As demais tradições religiosas estão reduzidas aos 3,5% da declaração de crença (1,38% de espíritas; 0,34% de afro-brasileiros; 0,15% de budistas; 0,06% de judeus; 0,01% de muçulmanos; 0,11% de participantes de outras religiões orientais; 0,01% de seguidores de religiões de origem brasileira, como Santo Daime, União do Vegetal; e outros). Os dados mencionados indicam a presença maciça do cristianismo, com cerca de 90% dos seguidores declarados, ou seja, em torno de 150 milhões de brasileiros. É verdade que não se deve omitir a realidade daqueles que declaram vinculação a uma certa tradição religiosa, e que na verdade mantêm uma dupla ou tripla pertença religiosa. Trata-se de um traço presente na religiosidade brasileira, tão bem sublinhado por Guimarães Rosa no seu livro Grande Sertão: Veredas (2001, p. 61): Muita religião seu moço! Eu, cá, não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio... uma só para mim, é pouca, talvez não me chegue. É o perfil do Brasil que se apresenta, está presente em cada família, em cada espaço geográfico. Em cada comunidade verificamos esta característica linear do religioso.
Historicamente pode-se situar a abordagem filosófico-científica do fenômeno religioso no início do século 19. Prevalecia até então no Ocidente a abordagem dogmática, como se a religião dependesse inteiramente do que Deus havia positivamente estabelecido para ser cumprido. Diante do enaltecimento da razão, Friedrish Schleiermacher, graças à sua formação pietista, que valorizava a experiência religiosa, formulou a tese de que a religião tem uma originalidade própria como procedimento humano. Distingue-se, dizia ele, tanto da metafísica, que busca a verdade pelo puro exercício da razão, como da moral, que se constrói a partir das exigências da consciência. Religião é "sentimento", percepção misteriosa e profunda do que é verdadeiro e bom. Em continuidade com esse passo inicial, generalizou-se aos poucos a observação sistemática das sociedades humanas, na sua diversidade cultural e histórica, o que levou a se tornar manifesto que, em todas as épocas e culturas, o ser humano exprimiu sempre a sua percepção sobre o que dá sentido à vida. É o que hoje denominamos o fenômeno religioso, que a visão preconceituosa e míope do laicismo ocidental procurou até há pouco tempo desconhecer, mas que hoje se impõe como um aspecto indissociável de todo o fenômeno humano, cujo estudo não pode ficar fora da escola, sob pena de se atentar gravemente contra a educação. Muitos profissionais da educação têm a percepção de que as mudanças não ocorreram apenas neste componente curricular isoladamente, mas que o Ensino Religioso assumiu uma nova forma porque a educação brasileira mudou. A escola repensou sua presença na sociedade, todas as ações realizadas neste espaço foram impulsionadas a assumir uma participação na formação da cidadania. O diálogo na diversidade para a formação de um cidadão ético exige que as áreas do conhecimento permitiam um reolhar sobre o ensino e o aprender para atingir o desafio de educar e o Ensino Religioso participa de tal cenário.


1.1 Retrospectiva Histórica


Cruz (1997), observa em uma de suas obras que o Ensino Religioso (ER) hoje está longe de ser um assunto que rege consenso, seja entre professores, seja nas famílias, seja entre alunos ou entre autoridades religiosas. Diante desta discussão ouvimos uma variedade de conversas a respeito do Ensino Religioso nos dias de hoje, o que em outros tempos ninguém questionaria as chamadas "aulas de religião". Para melhor entender a questão, convém recordar a evolução desse assunto entre nós ao longo de nossa história. Juntamente com os colonizadores chega à América a religião, com o objetivo de conquistar também almas para Deus e súditos aos reis de Portugal e Espanha. Esta mentalidade da época era por igual aceita mesmo por pessoas muito sensíveis dos direitos humanos dos habitantes do novo mundo (Bartolomeu de Las Casas, defensor dos índios é um exemplo), o bom cristão era identificado com o súdito leal.

No Brasil, desde os primórdios da história é notável a presença dos colonizadores portugueses que diziam ter como objetivo primeiro a evangelização dos índios. Porém, ficou evidente que suas pretensões voltavam-se a riqueza existente na região. (FERNANDES, 2000, p. 20)

Evangelizar os nativos foi a forma encontrada pelos europeus de manter o controle para obter seus fins, isto é, a conquista da região e de tudo que lhe trouxe capital. Analisando o quadro dessa época em torno do ensino religioso, é possível notar uma desenvoltura direcionada a um ensino de moldura, focado nas premissas de uma religião única, à dos colonizadores. Percebemos assim que consequentemente, as primeiras escolas, dirigidas e mantidas por religiosos, destinavam-se a transmitir a religião junto com a cultura européia, sem consideração de alternativas. Com o sistema de padroado no Brasil colonial, congregações e ordens religiosas permaneciam predominantes no ensino livre da religião católica, embora houvesse muita interferência por parte do estado nos assuntos eclesiásticos. Sendo assim o ensino da religião, se fez parte integrante do currículo escolar no sentido de instrumento "coercitivo", dominação. Desde o Brasil Colônia, a religião católica era a única permitida no Brasil Império que, por força da concordata de Roma, continuou sendo a religião oficial. Com tudo, na primeira constituição política do Império do Brasil não há menção a educação, continuando assim o ensino da religião ainda com a Igreja em seu privilégio e sub judice do Estado. O Ensino religioso passa a ser um forte aparelho ideológico do Estado e, todo sistema se torna doutrinário, dogmático e intolerante de predominação Católica Romana.
Os processos de descolonização ou de independência, ocorridos desde o início do século IX até os nossos dias, foram responsáveis por importantes mudanças neste quadro. Todavia, nem os processos de colonização e descolonização nem os inúmeros deslocamentos de populações resultantes de outros fatores ocorridos neste período, (apesar da intensificação de contatos que promoveram), foram solos propícios ao respeito às diferenças. Em regra, foi o desrespeito às mesmas que prevaleceu. O respeito à diversidade é uma reivindicação recente e não tem sido uma conquista fácil, embora venha se ampliando no sentido de abranger um número cada vez maior de oprimidos. A luta pelo reconhecimento não se circunscreve às diferenças raciais ou étnicas (negros, índios, ciganos, por exemplo), mas também se estende às diferenças de gênero (no caso, a mulher), de opção sexual (no caso, lésbicas, homossexuais masculinos) e a outras tantas minorias.
No regime republicano (1890 ? 1930), temos o primeiro debate sobre o Ensino Religioso em decorrência da separação entre Igreja e Estado, isto leva a Constituinte de 1891 declarar leigo o ensino ministrado nos estabelecimentos públicos. Mas, mesmo com este dispositivo, o Ensino Religioso se mantém sob o prisma católico por zelo e cultura. A partir de 1934, esta disciplina passava a ser admitido em caráter facultativo através do decreto de 30/04/1931 por conta da reforma Francisco Campos (BRASIL, 1934).
O artigo 153 dizia que, o Ensino Religioso será de freqüência facultativa e ministrado de acordo com os princípios da confissão religiosa do aluno, manifestada pelos pais ou responsáveis, e constituirá matéria dos horários nas escolas públicas primárias, secundárias, profissionais e normais. À medida que se sucedia o período republicano, as constituições que se seguem mantêm o Ensino Religioso embora com algumas variantes. Porém, com o dispositivo a seguir, há uma abertura maior contemplando o ensino religioso.
O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais dos estabelecimentos oficiais de 1º e 2º graus. (FONAPER, 1998, p.17). É uma disciplina obrigatória na escola assegurada pela lei, mas para o aluno é de ordem facultativa, este não é obrigado à assistir as aulas que por sua vez, deve ser oferecida na escola. Para uma matéria legalizada onde o consenso geral é de valor importante para a educação integral do ser humano, ser de fato facultativa traz a tona um polêmico questionamento. Sendo essencial para a vida em todas as suas dimensões: cultural, social, econômica, religiosa, política, espiritual, é constrangedor assistir dentre outras coisas, o desinteresse por esta área de conhecimento.
Fica a desejar o oferecido à esta disciplina pelas forças competentes, levando a comunidade estudantil a receber muito pouco da contribuição e objetivo do fenômeno religioso. O que vivenciamos sobre o Ensino Religioso nas escolas públicas em todos os estados do Brasil, é um descaso grandioso ao ponto de ainda hoje não existir a disciplina e quando é oferecida não possui profissionais adequados, há escolas ministrando o ensino religioso como se ainda estivéssemos no tempo colonial onde se utilizava esta área de conhecimento como fonte de domesticação do povo. O direito do cidadão que freqüenta a escola pública, implica em nenhum cidadão ser discriminado por motivo de crença; em ter assegurada uma educação integral, incluindo o desenvolvimento de todas as dimensões do seu ser, inclusive a religiosa, independente de concepção religiosa ou filosófica de qualquer natureza.
O novo para o Ensino Religioso começa a ser vislumbrado a partir dos anos 90 quando, por circunstâncias históricas, diversos segmentos da sociedade se manifestam e, principalmente os educadores que não mediram esforços para constitui-lo de fato em uma disciplina:

A emenda constitucional para o Ensino Religioso foi a segunda maior emenda popular que deu entrada na Assembléia Constituinte, em determinado prazo do primeiro período aberto à participação, pois obteve mais de 78000 assinaturas, sendo a primeira, em tal momento, a da Reforma Agrária. (CARON, 1997,p. 17)

O que era antes feito somente pela Igreja Católica, foi assumido, de modo especial, pelos próprios educadores, graças ao incentivo da própria Igreja em devolver à sociedade as suas funções por dever, na conquista de seus direitos de cidadania, dentre os quais o da garantia do Ensino religioso na escola pública. Esse fato mobilizou os educadores, entidades religiosas e outros setores da sociedade que, durante meses, tomaram algumas iniciativas, dentre elas a atuação junto ao Congresso Nacional e ao Ministério da Educação, em vista da alteração do referido dispositivo.
Dentre todas as modificações realizadas no Ensino Religioso, atualmente, faz-se uma distinção entre o ensino das escolas particulares e das escolas públicas, cada uma recorrendo as suas particularidades. Dentro do espírito da nova lei do Ensino Religioso, é preciso ter presente que não se deseja dar catequese na escola pública, mas fazer um ensino que respeite a pluralidade cultural e a diversidade religiosa inerente a maior parte de nossa população estudantil. Não é função da escola pública educar a fé, nem fazer proselitismo, isto é, propaganda de uma outra confissão religiosa. O objetivo é apresentar o transcendente, tal como é concebido nas mais variadas culturas e tradições religiosas.
Contudo, podemos verificar que as escolas religiosas já percebem que o pluralismo de opções religiosas não existe só na rede oficial. Também dentro de um colégio católico, metodista, batista e outras, há alunos que escolhem o estabelecimento de ensino por motivos diferentes da formação religiosa. Este início de afirmação do pluralismo religioso no Brasil, realidade que tende a se ampliar nos próximos anos, deve provocar não uma lógica proselitista e de conversão, mas o desafio de um exercício dialogal permanente. Sobretudo aqueles que trabalham no campo do ensino religioso deverão estar atentos a alguns requisitos essenciais para uma dinâmica educacional que respeite o pluralismo religioso, ou seja, a afirmação e o zelo em favor de um clima propício ao reconhecimento da alteridade; o respeito às convicções religiosas dos educandos e de sua liberdade religiosa; o exercício de uma abordagem honesta e digna do fenômeno religioso e das tradições religiosas; a sensibilização para a riqueza e o valor de um mundo plural e multifacetado; e a recuperação da dimensão ética das religiões.
Percebemos que, há poucos anos quando se discutia o Ensino Religioso dentro do curso de licenciatura, o debate girava em torno da legitimidade de se ensinar religião num sistema educacional caracterizado pela laicidade. As professoras cristãs, conforme a história nos revela que o movimento tinha nítida predominância de mulheres, encontraram formas de salvaguardar uma iniciação religiosa, ainda que mínima, nas escolas públicas, visto que, nas confessionais dispunha-se de outros recursos para ministrar o Ensino Religioso em pé de igualdade, quando não em condições privilegiadas, relativamente às demais disciplinas.
O problema que hoje se coloca é diverso, apesar de as pessoas responsáveis, nem sempre se darem conta da mudança ocorrida. Ontem a tendência era pensar a vida humana, a sociedade e a cultura em termos racionais e positivos, na expectativa de que as ciências seriam cada vez mais capazes de satisfazer a todas as aspirações do homem e de oferecer solução a qualquer problemas do universo e da humanidade. Nessa perspectiva, por que ensinar religião? Quem insistia em introduzir a religião na escola dava provas de estar ainda preso aos tempos sombrios em que a ignorância e o autoritarismo religioso prevalecia contra as progressivas e crescentes evidências da ciência.
A grande mudança a que estamos assistindo hoje é o reconhecimento público de que a religião é imprescindível para o ser humano. A irreligiosidade dos tempos modernos, o ateísmo e a indiferença religiosa que deram origem aos sistemas culturais laicos, estava baseada na rejeição e na ignorância da importância que tem o sentido da vida para as pessoas e para as sociedades humanas. O mundo comandado pela ciência e pela tecnologia anula a questão do sentido, de que sempre se ocupou a religião e que está se revelando cada vez mais indispensável para a construção de uma sociedade e um universo verdadeiramente humanos, como o demonstra hoje a aspiração generalizada por uma ética abrangente, que esteja presente em todas as atividades humanas. Pode-se até perguntar se as grandes perturbações que assolam o mundo globalizado atualmente não provêm, por um lado, da deterioração das religiões que foram excluídas ou se excluíram da evolução cultural que faz a grandeza do Ocidente; por outro, da textura laica das instituições e dos processos sociais, que pretendem proporcionar melhores condições de vida aos indivíduos e às coletividades, sem se colocar claramente nem se definir em relação ao que dá sentido à vida.




1.2 Aspectos Legais


A Constituição Federal estabelece a obrigatoriedade do Ensino Religioso para a formação básica da criança e do adolescente no ensino fundamental, cabendo a escola garantir matrícula facultativa para o mesmo. O Ensino Religioso de matrícula facultativa constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental. (BRASIL, 1988). A lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 9394/96, artigo 33, alterado, em sua redação, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei n.º 9495/97, prevê a forma de organização do Ensino Religioso, ao estabelecer:
Art. 33 ? O Ensino Religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.
§ 1º - Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores.
§ 2º - Os sistemas de ensino ouvirão entidades civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso.
De acordo com a nova redação desse artigo, o Ensino Religioso insere-se em um novo paradigma, cuja Lei destaca os seguintes enfoques: é parte integrante da formação básica do cidadão - é um direito do aluno como cidadão Ter acesso ao conhecimento sobre o fenômeno religioso. Cabe a escola a responsabilidade de oferecer a disciplina em horários normais; é assegurado o respeito a diversidade cultural religiosa do Brasil - a Educação Religiosa ou Ensino Religioso deve ser ministrada respeitando a pluralidade religiosa presente na realidade sociocultural do aluno. A realidade brasileira é constituída de uma pluralidade cultural religiosa imensa.

O pluralismo é uma realidade que marca o comportamento religioso das sociedades do nosso tempo como um fenômeno complexo e em continua mutação. Ao lado de todas as religiões clássicas e tradicionais, surgem novos grupos com características próprias, de inspirações árias, oriental, sincretistas, cristãs ou não. (VELASQUES, 1997, p. 119)

O Brasil em sua origem foi berço das Tradições Indígenas. Com a colonização européia, chegou o Cristianismo católico Ibérico, depois as Tradições Africanas, e aos poucos com a vinda de imigrantes, aqui se estabeleceram diversas Religiões, Igrejas e Tradições Espirituais. Outras aqui se originaram, configurando-se assim um cenário de diferentes matrizes religiosas; são vedadas quaisquer formas de proselitismo - isto significa que a Escola pública não pode impor aos alunos praticas religiosas desta ou daquela Igreja ou religião. As orientações para a adesão à alguma crença religiosa, é responsabilidade da família e das comunidades de fé. O termo proselitismo significa fazer adeptos ou seguidores. Conforme a lei, é proibido no Ensino Religioso fazer catequese ou práticas religiosas com o propósito de influenciar os alunos a conversão ou adesão a alguma Religião ou Igreja. O Ensino Religioso escolar é diferente da catequese, não pressupõe a adesão e muito menos a propagação de uma opção de fé, sua ação pedagógica está centrada em dois aspectos: o informativo, que se atem ao conhecimento sobre o fenômeno religioso e ao formativo, a abertura ao diferente e a vivência dos valores humanos; a educação religiosa nos estabelecimentos de ensino - É trabalhada sistematicamente como área do conhecimento, articulada às demais áreas, no horário normal das escolas.
O Ensino Religioso possui seu próprio objeto de estudo, objetos, identidade, metodologia, tratamento didático, avaliação e conteúdos específicos; o ensino religioso é ministrado por professores habilitados e admitidos pelos sistemas de ensino - a lei deixa claro que o Ensino Religioso não pode ser ministrado por voluntários ou pessoas alheias á educação, os próprios professores, devidamente formados na área, é que devem assumir essa tarefa. É responsabilidade do Sistema de Ensino e das Secretarias Municipais de Educação capacitar e atualizar os professores, promovendo cursos e assessoramentos, nesta área do conhecimento, garantindo assim, o processo da formação continuada dos mesmos; a entidade civil deve ser constituída por diferentes denominações, a qual será ouvida pelo Sistema de Ensino sobre a definição de conteúdos do Ensino Religioso ? entendo que a entidade civil tem a incumbência de definir os conteúdos de acordo com a lei em vigência, acompanhar e apoiar o desenvolvimento do ER, sem interesses proselitistas, respeitando a pluralidade e promovendo o diálogo inter-religioso a partir dos valores universais comuns às Tradições Religiosas.
A Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, define através da Resolução CEB Nº. 2 de 7 de abril de 1988: a Educação Religiosa ou Ensino Religioso, como área do conhecimento, em seus escritos afirma que em todas as escolas deverá ser garantida a igualdade de acesso para alunos a uma Base Nacional Comum, de maneira a legitimar a unidade e a qualidade da ação pedagógica na diversidade nacional. A Base Nacional Comum e sua Parte Diversificada deverão integrar-se em torno do paradigma curricular, que vise estabelecer a relação entre a Educação Fundamental, exemplificando:

a) A Vida Cidadã através de sua articulação entre vários dos seus aspectos como:
1. a Saúde
2. a Sexualidade
3. a Vida Familiar e Social
4. o Meio Ambiente
5. o Trabalho
6. a Ciência e a tecnologia
7. a Cultura
8. as Linguagens

b) As Áreas do conhecimento:
1. Português
2. Língua materna (para populações indígenas e Língua Portuguesa migrantes)
3. Matemática
4. Ciências
5. Geografia
6. História
7. Língua estrangeira
8. Educação Artística
9. Educação Física
10. Educação religiosa (na forma do art. 33 da LDB ? nova redação).

O Ensino Religioso fundamenta-se na fenomenologia religiosa e objetiva instrumentalizar o aluno com o conhecimento do fenômeno religioso, tendo como ponto de partida a realidade sociocultural do mesmo, com enfoque centrado no conhecimento religioso, historicamente produzido e acumulado pela humanidade, sem perder de vista as questões que se relacionam ao aprendizado da convivência baseada em valores éticos. Muitos pedagogos defendem a educação religiosa na escola, considerando que a religião é um fenômeno permanente da humanidade e atende a uma necessidade espiritual, mas que esse ensino religioso deve ser feito sem caráter ou matiz confessional da mesma maneira, por exemplo, que se dá uma educação cívica sem referencia a nenhum partido político.
Segundo o papa João Paulo II:

[...] a educação da consciência religiosa é um direito da pessoa humana. O jovem exige ser encaminhado para todas as dimensões da cultura e quer também encontrar na escola a possibilidade de tomar conhecimento dos problemas fundamentais de existência [...]. (CNBB, 2000, p.107)

Nascemos inseridos em um meio religioso, seja na família ou nas instituições secundárias, essa consciência é construída paulatinamente, fazendo parte de uma cultura social. Desse modo é indispensável que o homem exerça seu direito de conhecer e compreender sua realidade religiosa. Estar diante desses conhecimentos é permitir ao ser humano uma tentativa de auto conhecimento, é desejo do ser descobrir-se, localizar-se no tempo e espaço distinguindo sua essência através das dimensões culturais a qual faz parte. Não é possível valorizar os acontecimentos atuais, detectar avanços, retrospectos, desafios, estabelecer novos paradigmas para melhoria da qualidade das ações em todas as áreas sociais, dentre elas a educação religiosa sem pensar uma dimensão pluri-cultural religiosa.
Ela nos permite a compreensão, ou a leitura da realidade, sob a ótica dos direitos humanos. Uma época é obviamente sucedida por outra. A concepção filosófica que rege os fatos de hoje não pode ser feita sob a ótica das concepções que presidiram aos fatos de ontem. O passado é, porém, o grande mestre do presente, se aponta novos caminhos. Não é, contudo, possível avançar, desconhecendo a história, deixando de apurar e aprender desta o que melhor convém para a sociedade agora e amanhã.

2. O ENSINO RELIGIOSO E SUA IDENTIDADE PLURI-CULTURAL


Estamos diante de um novo eixo da história. Vivemos não só um tempo de mudança, mas de mudança de tempo. Tempo esse fortemente marcado pelo pluralismo religioso, fenômeno que está na agenda do mundo a preocupar estudiosos das diversas áreas do conhecimento, e se constitui o grande desafio do novo milênio. Isso é muito surpreendente. Somos, por assim dizer, sacudidos pelas ondas gigantes da modernidade, ora açoitado, ora ferindo o pensamento religioso. O fenômeno religioso vem sacudindo o mundo inteiro;. Se por um lado, a modernidade decretou a morte da religião desmoronando a imagem tradicional do mundo, construída ao redor do sagrado, por outro lado, na pós-modernidade, temos a volta do sagrado. Isso é algo surpreendente. O sagrado parece Ter se deslocado do seio das grandes religiões. Anda solto percorrendo os espaços da sociedade. Saiu, por assim dizer, do retraimento, da clausura das grandes instituições seculares que o davam suporte e o monopolizavam com coisa sua. Em meio a tudo isso, o mais espantoso é que o sagrado tornou-se móvel, sem residência fixa, anda errante num contínuo êxodo.
Porém, esta volta do sagrado de forma multifacetada vem preocupando as religiões em seus sistemas rígidos e preestabelecidos e cria um novo paradigma para o ensino religioso pluri-cultural. Se por um lado esse fenômeno se apresenta como fascinante e sedutor, por outro lado, não é algo tão tranqüilo. Ele apresenta uma face ambígua. Isso, portanto, é desafiador nos obrigando uma leitura não só religiosa, mas, sobretudo fenomenológica. Nesse sentido o Ensino Religioso tem que acompanhar o aluno nesse processo de pós-modernidade numa peregrinação desafiadora. Acordar do seu sono dogmático, deitada há séculos, para se deixar ser interpelada pelo surto do sagrado. Assim, vê-se obrigada a repensar suas categorias e sua linguagem para falar a um mundo plural. Sabemos, outrossim, que compete ao Ensino Religioso o cuidado de mostrar também o ministério do sagrado que habita nossa existência. Porém, terá que deixar suas velhas roupagens e vestir-se de novas para tornar-se atraente e sedutora. Agora, o Ensino Religioso e sua identidade pluri-cultural, vê-se defrontado por um mundo marcado pelo ceticismo e secularismo que levanta suspeita e coloca suas antigas vestes religiosas em crise, levando a um desinteresse e relegada a um produto supérfluo. Diante das perguntas novas e dos novos desafios, o Ensino Religioso se sente inquieto e deverá tentar elaborar uma reflexão teológica, corajosa, profética, capaz de assumir caminhos novos. Um Ensino Religioso que sinta a necessidade de reformular a linguagem do seu discurso. Uma fenomenologia que passa olhar o mundo como lugar onde o sagrado se manifesta, onde todas as transformações que realizamos são formas de aproximação e concretização desse mesmo sagrado. Para nosso conhecimento, o fenômeno religioso é anterior às religiões, é tão antigo quanto o homem. Está presente na vida de todas as sociedades, vem da necessidade que o homem tem de se posicionar face ao sentido da vida, horizonte de sentido e afirmação da vida.
Assim, estamos diante de um novo sinal dos tempos a nos interpelar como cristãos. Hoje, passamos do diálogo das culturas para o diálogo das religiões. Isso implica a abandonar um paradigma exclusivista para adotar um novo paradigma pluralista, isto é, deixar de ser um ensino religioso imponente e detentor da verdade, sair do seu isolamento sócio religioso para o encontro das diversas religiões, enriquecendo-nos com as mais diferentes formas de expressão do sagrado.
Armas eficientes têm sido usadas no processo de desqualificação dos "outros", ao longo da nossa história. O etnocentrismo, aquela visão de mundo que nos autoriza a julgá-lo a partir dos nossos valores, ou seja, a avaliar os seus modos de ser, fazer e sentir a partir dos nossos modos de ser, fazer e sentir, parece ser a mãe de muitas outras, como o preconceito e a discriminação. O preconceito é a atitude que, contida no etnocentrismo, se forma a partir das representações que construímos em relação aos outros, informadas pelas nossas referências.
Por sua vez, a discriminação é o comportamento efetivo traduzido em ações que põem em prática o preconceito e que nos levam a negar ao outro aquilo que queremos só para nós, a excluí-lo das oportunidades que estão ao nosso alcance, mas às quais ele não deve ter acesso. O desafio de conviver com a diversidade tem sido enfrentado de muitos modos pela humanidade. Conflitos, alianças, acomodação, indiferença, etc. Na verdade, os conflitos parecem ter sido preponderantes; as alianças sendo feitas ou desfeitas em razão dos mesmos; e a acomodação, em regra, se instaurando depois da solução duradoura ou precária dos mesmos, depois que as novas relações se estabelecem ou se torna rotina.

A diversidade dentro dos aspectos religiosos não podem ser considerados algo excluído do processo de globalização na interação de outros aspectos; por que as culturas e a diversidade se completam. (ROCA, 1999, p. 59)

Todavia, pensamos que a diversidade, é renitente e, ao contrário do que se poderia esperar de um mundo globalizado, não apenas se reproduz e se afirma, como desabrocha em novas modalidades. Em todos os tempos, o deslocamento de populações de seus lugares de origem para outros rincões do planeta tem ensejado a formação de novas variedades físicas e culturais, a partir dos contatos que, necessariamente, se estabelecem na nova situação. Não importa quão estranhos sejam os universos culturais de dois grupos, nem em qual situação entrem em contato, trocas culturais estão fadadas a ocorrer na nova conjuntura e novas formas culturais a emergirem, por que os humanos constroem seus mundos a partir da atribuição de sentido ao que lhes acontece. Não importa quanto o desejo de manter intactas as suas tradições, de preservar a "pureza" dos seus costumes, os sincretismos estão sempre tendo lugar. Do mesmo modo, a mestiçagem é irrefreável, respondendo pelo aparecimento de variedades físicas, a despeito das barreiras que costumam a ela se opor.


2.1 A diversidade cultural-religiosa do ensino religioso


Há poucas dezenas de anos essa problemática quase não existia entre nós; a sociedade era mais homogênea de cristandade, quase todos falavam a mesma linguagem católica, ou a entendiam. Hoje não se trata de cultivar nossa identidade madura em uma sociedade pluralista dialogante. O artigo 33 da LDBEN nº. 9394/96, aponta o Ensino Religioso na "diversidade cultural-religiosa do Brasil". Entender essa concepção de Ensino Religioso supõe assumir a escola brasileira no contexto do pluralismo desta nação.
Segundo Steil, apud Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso (1998), a relação sociedade-escola pluralista é fundamental para que se desenvolva o Ensino Religioso proposto. Eu acredito que ministrar esta disciplina a partir desse pressuposto requer trabalhar com o fenômeno histórico em destaque, isto é, a pluralidade, para que se implante um ensino religioso pluralista em que a escola se compreenda como um projeto aberto, promotor de uma cultura de diálogo e comunicação entre os grupos sociais e religiosos que se apresentam no seu cotidiano. Penso que o pluralismo é real quando existe a possibilidade efetiva de manifestação da variedade das crenças e concepções religiosas sem restrições impostas por preconceitos e proselitismos. O pluralismo religioso é um evento relativamente recente na nossa história. Ao longo dos quatro primeiros séculos, o Brasil se constituiu, tendo o catolicismo como sua religião oficial. Ser católico não era uma opção pessoal, mas uma precondição para a plena cidadania. Noutras palavras, só eram considerados cidadãos de direito aqueles que professavam a fé católica. Essa situação estava relacionada com um contexto mais geral em que a religião aparecia como o princípio fundante das sociedades humanas. Nessa perspectiva, a cada sociedade deveria corresponder uma única religião que cimentasse os laços sociais que uniam as pessoas. E, quando surgiam discordâncias de crenças e práticas religiosas estas eram tratadas como formas desviantes da religião dominante sendo por isso mesmo proscritas e seus praticantes perseguidos.
Preiswerk afirma que:

Não se pode esquecer que o termo religião é ocidental e que, durante muito tempo esteve se referindo apenas a uma realidade cristã. Todos os fenômenos ligados a outras crenças religiosas eram consideradas falsas religiões ou idolatrias. (PREISWERK, 1998, p. 150)

Esta realidade era consentida devido o monopólio a cerca da religião que era majoritariamente ocidental, de cultura européia. Até a Proclamação da República, as religiões afro-brasileiras, os judeus e os protestantes não só estavam proibidos de manifestar publicamente suas crenças e práticas, mas também tinham seus direitos sociais e políticos restringidos. Verificamos que o pluralismo religioso era combatido como um perigo e uma ameaça ao próprio fundamento sobre o qual estava construída a nação brasileira. A religião Católica, na verdade, sustentava ideologicamente as relações sociais que garantiam uma determinada ordem política. Com a república observa-se uma mudança profunda no quadro. A separação da ligação orgânica que havia entre o catolicismo e o Estado Imperial acaba permitindo a fragmentação do campo religioso brasileiro. Não se trata mais de colocar uma base religiosa para a sociedade, mas de construir um Estado que se institui a partir de princípios filosóficos e políticos laicos.
Afirma Gomes (2003, p. 09), "À medida que o Estado brasileiro consegue se legitimar sem precisar apelar para a religião católica, o pluralismo religioso pode se afirmar sem ameaçar a unidade Nacional." A liberdade religiosa, associada aos direitos individuais, forma-se um valor que o Estado laico passa a promover. Em lugar de uma religião única, vai surgir uma grande variedade de religiões e a definição por uma ou outra entre estas múltiplas possibilidades torna-se uma questão de opção pessoal. A diversidade cultural-religiosa, que necessita ser respeitada no Ensino Religioso, parte da admissão da existência de uma sociedade pluralista que busca uma escola onde essa diversidade se efetue no contexto da sala de aula. Acredito que discutir o pluralismo religioso no espaço da escola brasileira, significa discutir a questão de uma educação religiosa capaz de colocar a diversidade de religiões que compõem o campo religioso no Brasil, no dia-a-dia dos alunos, ou melhor, na sala de aula. Uma questão que não se apresenta de modo algum tranqüila, quando analisada a partir de critérios democráticos que buscam respeitar os direitos das religiões populares ou minoritárias.
De acordo com Preiswerk, (1998, p.157), [...], a educação é hierógena, isto é, produtora do sagrado. Ela reforça o poder religioso, instaura e institui relações sociais sob o modelo da religião. A educação é muitas vezes um mito, oferece à sociedade a imagem do que ela desejaria ser. O mito da educação ou da formação é auto validação de uma atividade social que se apresenta como natural, e não como o produto de uma determinada sociedade. Nesse caso, a educação seria uma necessidade imanente e não uma produção social. Seria inteiramente positiva e teria a mesma função em todos os lugares. A análise das finalidades não esgota as relações entre a educação e as crenças, mas, freqüentemente, as cria. A comunicação de uma palavra de verdade, qualquer que seja seu conteúdo, seu lugar e momento, aparece em sua realidade efetiva, operativa, sob a dependência de uma matriz hierárquica potencialmente religiosa. O crer não está sob o saber, nem é seu resíduo: é coextensivo ao ato de sua transmissão.
Neste sentido, a questão da diversidade religiosa na escola não diz respeito apenas aos interesses das religiões, mas se manifesta também como uma questão de cidadania, de relações sociais. Talvez aí se possa entender a polêmica que se produziu nos últimos anos na grande imprensa sobre a legitimidade ou não do Ensino Religioso na escola pública. Para muitos articulistas, o problema se colocará com uma questão de direitos de grupos religiosos populares ou minoritários num contexto democrático.
Inserida numa tradição científica de caráter racionalista, a tendência da escola é a de homogeneizar a diversidade religiosa dentro de uma única religião humana purificada que se colocaria acima das religiões e grupos da premissa de que há um só Deus, igual para todos, procuram-se reduzir as diferenças a um denominador comum. Este denominador, no entanto, geralmente se apresenta como o Deus cristão das religiões dominantes e mais racionalizadas.
A educação popular assim como a educação em geral, corre o risco de construir mitos, de confundir a realidade à analise de seus resultados, com seus próprios desejos. Ela trabalha em função de premissas e de postulados pouco explicitados, que refletem, os interesses às vezes contraditórios de seus portadores. Na verdade, o que vemos na escola reflete uma situação mais abrangente da sociedade como um todo. Mesmo porque a escola não opera no vazio. Os valores e sentidos que aí se transmitem não são definidos apenas neste âmbito, mas em consonância com os valores e sentidos da cultura como um todo. Aqueles que aprendem dentro da educação escolarizada são pessoas com uma bagagem prévia de crenças e atitudes adquiridas fora da escola. A TV, o cinema, os quadrinhos, a imprensa, a fala cotidiana dos adultos e dos grupos de amigos estão cheios de estereótipos culturais sobre o que são as diferentes religiões.
Pensamos que a forma como o aluno na escola representa um católico, protestante, umbandista, pentecostal, judeu, etc., está sempre relacionada suscitada por um currículo extra escolar que é proporcionado pelas diferentes fontes do conhecimento, de crenças e de sentimentos presentes na nossa sociedade. A perspectiva plural, ou a sua ausência, é uma realidade que afeta decisivamente os alunos através desse currículo extra classe. A atitude de abertura à pluralidade religiosa se revela não apenas nas intenções definidas nos documentos e programas de Ensino Religioso, mas particularmente no cotidiano da escola. Um projeto pluralista deve estar intimamente relacionado com um sistema de comportamentos a serem assimilados. Isto aponta, portanto, para uma concepção de pluralismo que se verifica na experiência vivida, no jogo de intercâmbios e nas interações que o espaço escolar procura promover entre os alunos.
As diferenças de base racial-étnica vêm alcançando por sua natureza grande visibilidade, na medida em que tais grupos, inseridos em estados nacionais já constituídos ou em vias de constituição, têm lutado pelo respeito às suas diferenças, usando todos os meios, inclusive os mais violentos, como condição essencial ao exercício pleno de sua cidadania.
No caso brasileiro, é notório a luta das populações indígenas e dos afro-descendentes. No que concerne estes, a luta pelo respeito às matrizes culturais africanas tem se dado em muitas frentes, dentre as quais a do reconhecimento das religiões afro-brasileiras (culto dos orixás em suas várias nomenclaturas e a umbanda) com religiões de pleno direito, e assume importância especial.
Os prejuízos advindos do respeito à diversidade são difíceis de avaliar, na medida em que a negação do "outro" equivale a uma repressão sem limites à sua capacidade de criação e expressão. A riqueza da cultura brasileira é propalada aos quatro ventos, como fruto da nossa diversidade, e muito nos orgulhamos dela ? nossa música, nossa dança, nosso futebol, nossa ginga, nosso "jeitinho", nossa alegria, nosso modo de ser, enfim. Mas estamos longe de imaginar o que poderemos vir a ser se o respeito à nossa diversidade fizer aflorar as nossas possibilidades ainda latentes.


2.2 Buscando sua identidade própria


Segundo Wilges (1982, p. 34), o ser humano é essencialmente um ser religioso. A história e outras ciências constataram unanimemente que não há povo algum, por mais primitivo que seja, sem religião, sem uma tradição religiosa. De fato por mais que recuemos no tempo, sempre encontramos algum indício de culto religioso, e por mais variadas que sejam as culturas humanas, sempre nelas encontraremos alguma forma religiosa. Trata-se de uma atitude pessoal do ser com relação ao mundo que ele integra e ao mesmo tempo contesta em busca de uma solução fora e acima do mundo. Na historicidade de várias culturas constatamos que podemos encontrar uma cidade sem muralhas, sem edifícios, sem ginásios, sem leis, sem o uso de moedas como dinheiro, sem cultura das letras, mas um povo sem Deus, sem oração, sem juramentos, sem ritos religiosos, sem sacrifícios, tal nunca se viu. Desse modo, definir Ensino Religioso em sua identidade própria requer percorrer um processo de compreensão de alguns termos, a fim de situarmos adequadamente as questões do Ensino religioso em sua termologia. É básico a priori compreendermos o termo religioso.

No século XIX e nas primeiras décadas do século XX, elaborou-se o conceito de religioso através da análise das diversas religiões: chamou-se "religioso" o que era comum a todas elas, desde as mais primitivas até as "grandes religiões"; a crença em alguma força ou ser superior, subsistindo até hoje, está na base de muitos planejamentos de ensino religioso... a pesquisa pêlos métodos fenomenológico e hermenêutico, bem como o uso popular bem generalizado, são unânimes em sublinhar um dado básico; o religioso é uma categoria que supõe alguma relação entre o homem e o sentido radical de sua existência. Religioso, nesta acepção, será o homem que leva a sério tal relação; que faz dela a orientação básica de seu projeto de vida. Progressivamente, este conceito foi sendo ampliado; considera-se hoje religiosidade a atitude dinâmica de abertura do homem ao sentido radical da sua existência. (FILHO, 1998, p.96)

Fernandes salienta que:

Religiosidade: é a dimensão mais profunda da totalidade da vida humana. É a busca da abertura ao transcendente, àquilo ou àquele que ultrapassa a superfície da vida, o sentido radical da existência. Os maiores inimigos da religiosidade são a alienação e a superficialidade [...]"."Religião: É a vivência comunitária da religiosidade. As diversas religiões são maneiras concretas de as pessoas viverem a sua religiosidade [...]. (FERNANDES, 2000, p. 27)

O Ensino Religioso ajuda a compreender uma dimensão humana importante. O ser humano em sua essência é um ser em relação, que busca sobreviver e dar sentido à sua existência. Ao longo da história, vai construindo formas de relacionamento na tentativa de superar sua limitação, fragmentação, provisoriedade, ou seja, sua finitude. Desde que desenvolveu a capacidade de raciocinar e sentir, o ser humano tem formulado indagações que o inquietam e exigem dele uma postura diante da vida e do universo. Quem sou? Porque estou aqui? Para onde vou? A resposta a cada uma dessas perguntas implica respectivamente na busca do autoconhecimento, do sentido de vida e do transcendente. Como podemos observar, a questão da transcendência sempre esteve e está presente nas mais diferentes comunidades, sejam elas de floresta, deserto, cidade ou outras. A busca de respostas aos questionamentos existenciais torna-se cada vez mais complexa numa sociedade que passa por mudanças rápidas, marcadas pela industrialização, pela tecnologia, pela secularização e pelo materialismo.
Preiswerk (1998, p. 152) citando, "[...] os fundadores da sociologia (Marx, Weber, Durkheim) apresentam a religião como um modo de construção social da realidade e da explicação do mundo". Assim, em meio a todo esse processo de transformação que ocorre no mundo, o ser humano cria e aprimora novas formas de relacionamento e, a partir de seus questionamentos existenciais, constrói os conhecimentos que permitem interferir no meio em que vive e em si próprio. O conjunto de conhecimentos que constrói e atividades que desenvolve representa um ser humano, como um ser dotado de um outro nível de relação: a relação com a Transcendência, ou seja, de ultrapassar seus limites, de experienciar o Sagrado, o infinito, e este anseio se manifesta de maneira diferenciada em cada pessoa. É disso que trata basicamente o ensino religioso. Compreendendo a necessidade de ser uma disciplina essencial na vida do indivíduo, pode-se afirmar que, como não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no vazio, impõe-se na busca dos fundamentos éticos religiosos da educação moral e cívica, partir do homem como ele é dado na experiência cotidiana, na sua realidade existencial.
Desse modo podemos concordar que: Os bens presentes nas diversas culturas ajudarão não só a aperfeiçoar, mas também a conhecer melhor o sujeito da educação (ESCALONA, 1983, p. 26). A riqueza nas paisagens religiosas e históricas de uma comunidade devem ser percebidas como fonte não só de conhecimento, mas de subsídios que permitirão o desenvolvimento integral do educando. Nessa bagagem cultural diversificada existente não só no Brasil, mas também no mundo, é que encontramos significações para a vida, são os fatos cotidianos de povos essencialmente religiosos por natureza, que no seu íntimo de ser, vive sua religiosidade concretamente através de ritos, símbolos, vivenciando o sagrado, o transcendente. Penso que essa vivência mostra a identidade da comunidade que perpassa de gerações a gerações, desse modo conhecer esta realidade, esses bens presentes de diversas culturas, permite entender e melhorar cada ser, cidadão, o homem como um todo, em busca de aprimoramentos de respeito e tolerância uns com os outros.
O diálogo inter-religioso, na ótica de um ensino transreligioso, ajudará os alunos a darem um passo em frente: a perceberem como é bom aprofundar e formar as nossas motivações ao mesmo tempo respeitando as dos outros; não segundo modelos químicos de mistura e combinação, mas com o cuidado de valorizar elementos presentes em todas as posições. Far-se-á até um esforço para compreender o porquê das divergências: comunidades ou ambientes diversos têm tradições e espaços hermenêuticos diversos; por isso provocam experiências diversas: necessariamente se exprimirão em linguagem diversa. Por isso, aprendemos a expressar nossas convicções em duas linguagens: a da nossa comunidade de fé e a da sociedade em que vivemos.


2.3 O Fenômeno Religioso como fundamentação: uma abordagem pedagógica na escola e na ala de aula


Tendo o fenômeno religioso como objeto de estudo, o ensino religioso para ser fiel à sua especificidade de disciplina, não deve ser confundido com história, com sociologia ou com outras ciências humanas; nesse sentido o Ensino Religioso enfrenta o grande desafio de como despertar as crianças, os adolescentes e os jovens para a percepção da transcendência, sem fazer proselitismo, isto é, sem querer se transformar numa catequese de iniciação a tal ou qual expressão, por legítima que seja, da percepção de Deus, numa determinada tradição religiosa.
O desafio é tanto maior quanto parece paradoxal querer educar independentemente dos caminhos trilhados até aqui para a educação religiosa, pois as religiões, sob certo aspecto, outra coisa não são pedagogias da progressiva caminhada para Deus, na direção do que dá sentido á vida. Uma educação religiosa sem proselitismo é um verdadeiro paradoxo.
Entende-se, dessa forma, a resistência que inúmeras religiões e igrejas opõem ao Ensino Religioso. Para os seus líderes não se pode desvincular educação religiosa de religião. Admitem, quando muito, que a escola leiga abrigue em seu seio a educação ministrada por diferentes religiões, mas são incapazes de perceber a possibilidade de se construir a educação religiosa, não a partir da religião, mas do ser humano, que é ao mesmo tempo uno e plural, devendo a escola trabalhar a partir da criatura, visando antes de tudo o aprendizado, em lugar da transmissão de ensinamentos e comportamentos.
Afirma Wilges (1982, p. 09), o fenômeno religioso é universal. Em todos os tempos, lugares e povos encontramos tal fenômeno. Esta afirmação é atestada pela etnologia e pela história das religiões. Para melhor percebermos a possibilidade real de um ensino religioso desvinculado, como tal, de qualquer tradição religiosa particular, é preciso distinguir os dois aspectos do fenômeno religioso: o científico e o hermenêutico. A comunidade acadêmica entende ser a religião um fenômeno humano e de ser analisado basicamente sob a ótica das ciências humanas. Entretanto, é um fenômeno humano específico, na medida em que as atitudes em que se concretizam são expressões de uma percepção original, a da Transcendência. A arte do professor de Ensino Religioso parece-nos consistir na capacidade de despertar o educando para a Transcendência. Esse aprendizado específico não se faz por transmissão de conhecimentos e de comportamentos, mas a partir das próprias experiências de vida do educando. Somente então se poderá alcançar a dupla finalidade da disciplina Ensino Religioso: conhecer a verdadeira natureza das diversas tradições religiosas e se iniciar, pessoal e comunitariamente, na percepção da Transcendência, a partir não de uma religião particular, o que tornaria o ensino proselitista, mas sim da própria vida e dos valores que caracterizam o ambiente humano e nesse aspecto pode se encontrar parâmetros para um processo de disciplina escolar.

Deparamos sempre com o fenômeno religioso, por mais que recuemos no tempo, desde as épocas líticas ? o período paleolítico com a ?domesticação do fogo?, as sepulturas, o enterramento dos corpos, as pinturas rupestres, os mitos e ritos dos povos caçadores, a crença na possibilidade da existência de uma outra vida; mesolítico com a ?domesticação das plantas alimentares"., os mitos de origem, os espaços sagrados e a mitologia da idade de ferro ? até a época atual, da revolução industrial, das grandes descobertas científicas, da conquista dos espaços, da cibernética e da informática, etc. Apesar da diversidade das culturas e civilizações, esse fenômeno se encontra constantemente presente, o mais das vezes como marco cultural. (JORGE, 1994, p. 11).

Essa universalidade do fenômeno religioso não impede que a Tradição Religiosa conserve sua singularidade, ela apresenta sempre características próprias, independentes da cultura dos povos, da forma social, da estrutura econômica e mesmo da índole psicológica dos povos. As tradições religiosas dizem respeito à totalidade da ida ? e à morte ? do ser humano. Por milhares de anos as pessoas têm buscando o sentido e a verdade da sua própria natureza e do universo; as religiões que lidam com a totalidade da ida e morte humanas resultam dessa busca. Mesmo as ciências naturais eram originalmente religiosas; somente nos últimos trezentos anos religião e ciência se separaram como caminhos de conhecimento. Precisamos, antes, de um esforço de comunhão e harmonia entre religião e ciência, tendo em vista um ideal maior, isto é, o desenvolvimento integral do homem, já que ambas têm credenciais para tanto. Religião e ciência representam dois meridianos diferentes ? e seria um equívoco confundi-los, mas, se pretende salvaguardar o valor da verdade e a unidade do ser humano, é preciso haver convergência entre eles. Se visamos ao desenvolvimento material do homem fora de qualquer perspectiva do seu progresso espiritual, podemos cair ?numa maldição e não bênção?.
Mas, o fenômeno religioso não é redutível nem à antropologia, nem à filosofia, nem à psicologia. Só poderá ser adequadamente entendido quando for focalizado no seu modo próprio de ser, isto é, na perspectiva religiosa. Estudar o fenômeno religioso é apreender o significado último de suas manifestações e expressões, pois é um verdadeiro fenômeno religioso humano, que se traduz por atitudes e costumes característicos, nos quais podemos observar tanto o "acontecimento religioso quanto a sua significação religiosa; Por este princípio é decisivo para o comportamento humano e para a estruturação da sociedade e, por isso, deve Ter um" significado próprio e profundo, no intuito de proporcionar o aprendizado.

O Ensino Religioso tem no fenômeno religioso o seu objeto de estudo, e em sua prática de sala de aula, ele se desenvolve a partir da decodificação desse fenômeno. Não trata, portanto de codificar com os educandos os elementos constitutivos do fenômeno religioso. Tratar de decodificação do fenômeno religioso é observar como se dá essa busca de transcendência a partir da experiência que pode ser: espiritual, religiosa, comunitária e institucional (CROATTO, 2001, p, 77).

Constatamos que fenômeno religioso é manifestação, o que aparece, nesse sentido observamos que o recorde de público numa apresentação ou missa, a busca em sites de astrologia, quiromancia, e outros, a aparição de fantasmas numa casa abandonada, a venda dos livros "Harry Potther", o aumento de fiéis da igreja Universal do Reino de Deus, o crescimento de religiosos, principalmente de neo-pentecostais na política são fenômenos diferentes, porém reais. E é nesse contexto que nos interessa, os de natureza religiosa.
Mas, o fenômeno religioso tem presença permanente na história humana, no entanto, precisamos situá-lo diante da modernidade que trouxe consigo ateísmo, materialismo, desenvolvimento técnico-científico, dessacralização e secularização, negando valores metafísicos e religiosos. Uma questão de capital importância é definir quais fenômenos se deve considerar de ordem religiosa, e o que podemos observar sobre esse ponto é que não há uma concordância de opiniões. Contudo, Eliade (1992, p.34) diz que geralmente admite-se como essências ao fenômeno religioso os elementos: um conjunto de crenças e de práticas concernentes a uma realidade considerada objetiva, de algum modo pessoal, suprema, em relação à qual o homem professa uma dependência e de quem espera favores e salvação. É o que o Fonaper também focaliza como premissas ao fenômeno religioso, especificando o sagrado.
Pensamos que no cotidiano vivemos experiências boas e ruins, estas geram em nós sentimentos e emoções as quais, por sua vez, despertam o desejo: quando são boas queremos que perdurem, quando são ruins preferimos que acabem. Desejantes, temos sempre um vazio, um sinal de incompletude. Inquietados, buscamos uma saída, uma forma de superação desse imanente gerador, até mesmo, do sofrimento; temos a necessidade de transcender, superar, esperamos que algo ou alguém preencha o vazio. Não raro procuramos, impelidos pela cultura capitalista em que vivemos, preencher este vazio através do Ter: há múltiplas opções, escolhas, possibilidades, cabendo a nós escolher. Somos "ajudados" nesta escolha pela mídia, que nos apresenta tudo rotulado, classificado, para que não corramos o risco de achar que é "tudo igual" ou "dá na mesma". A diferença é assumida na perspectiva de tornarmo-nos iguais no desejo de Ter, de possuir e, consequentemente de comprar. E a relação imposta com o outro é de competição, de comparação. Conforme Simões Jorge:

se por um lado, na modernidade, o fenômeno do ateísmo dificulta o discurso religioso, por outro, o materialismo generalizado da sociedade zomba dos valores fundamentais ensinados pelas religiões. Sem maiores questionamentos, o homem atual se deixa levar, descurado e desligado dos valores afirmados pela religião, fechado num mundo sem horizontes, num imanentismo total, preocupado apenas com o seu devir no "aquém". Ateísmo e materialismo já vêem a fé, centro da religião, sendo conduzido para o cemitério, o que são estas igrejas e templos", pergunta Nietzsche, "senão túmulos de Deus?", "religião", diz Marx apoiando-se em críticas da religião anteriores a ele, "é o ópio do povo". E Sigmund Freud, na esteira de Feuerbach "religião é ilusão (JORGE, 1998, p. 15).

Entendemos que a busca da transcendência através do ter, mostra-se cedo ou tarde, incapaz de concretizar-se, pois quanto mais temos, mas queremos ter, do que decorre uma experiência ainda pior: na maioria das vezes não podemos Ter, mas continuamos desejando, então o vazio aumenta em vez de diminuir. Diante de todo um discurso que parece bloquear o avanço da religião, podemos concluir que o que primeiramente nos chama a atenção é um grande pluralismo de valores, uma caótica proliferação de antivalores, como conseqüência da filosofia-relativista, própria da pós-modernidade e hoje divulgada amplamente na sociedade e nos meios de comunicação; na maior parte das vezes sem atender o verdadeiro valor ético da educação e da existência.

Chamamos de valor ao que é provocar no indivíduo uma atitude de avaliação, porque contribui de alguma forma para a realização pessoal, satisfazendo algumas de suas necessidades: vitais, intelectuais, afetivas, estéticas, religiosas, etc. (GASTALDI, 1994, p.31).

Não existe nada absoluto, vale tudo, a lista de valores está sempre inacabada, surge os valores filhos do relativismo. Frente ao desencanto da razão e a perda do fundamento, surgem valores como o pluralismo e a diversidade, fragmentação, ceticismo, secularização, tolerância,... ao desaparecer crença em verdades absolutas, a Pós-modernidade, afundou-se no campo do efêmero, do instável, do banal; do "viver cada instante", do "viver bem o aqui e o agora", à margem de toda moral. Criou uma cultura "individualizada", feita sob medida, adequada à espontaneidade de cada um. A mudança de orientação cultural e ideológica foi tão acelerada na atualidade, que o diálogo entre as gerações transformou-se em conflito, e os pais facilmente se tornam avôs dos seus filhos. Os valores, nós o sabemos, são o núcleo da vida social, porque neles se fundamenta tanto a criação como a conservação das normas sociais. Se não há valores, não há conduta, porque no núcleo de qualquer estrutura há um conjunto de valores, que se desenvolve através da interação entre as pessoas, das relações. Entre estes valores emerge a religião.
A indisciplina em sala de aula seria decorrência da falta de valores de nosso tempo. Somos obrigados a lembrar que somos humanos, incompletos e diferentes, singulares, porém iguais enquanto espécie humana. Encontramos nossa completude através e com o outro, com o mundo abrem-se para nós muitas possibilidades, sobretudo para assumirmos nossa condição de ser humano. Assim esta condição talvez, seja o primeiro desafio pedagógico, até porque é dessa verdade, a de que somos humanos, que resulta a educação para sobreviver, diferentemente dos animais que sobrevivem graças ao instinto. Nós necessitamos aprender para nos manter vivos. Precisamos da educação para aprender a viver, isto é, nos humanizarmos e a humanização se dá na relação, daí as premissas de que a educação é uma tarefa humana por excelência e de que a escola é espaço/tempo de relações, e intermediadora de valores concretos e humanos. Para o filósofo Kant, por exemplo, a disciplina é condição necessária para arrancar o homem de sua condição natural selvagem. O que significa dizer que a disciplina não é necessariamente para um bom funcionamento da escola ou para o educando ter bons modos, mas necessário para a humanização, trata-se de analisar a disciplina pela ótica da relação, interagir com o outro.
Sendo assim, a escola e a sala de aula cabe afirmar-se como espaço/tempo de relações, de fato, humanizadoras, através de um comprometimento efetivo com a educação voltada para o ser em detrimento com o ter. Mas, não sejamos ingênuos! Nós, pais, mães, professores (as), somos também vitimados pela pseudonecessidade de ter, do que decorre a necessária revisão crítica e mudança de postura que só pode acontecer no desejo verdadeiro de ser mais.

3. O ENSINO RELIGIOSO E A DISCIPLINA NA ESCOLA PÚBLICA


O Brasil é um país onde o nível da educação básica, levando em conta sua potencialidade econômica, encontra-se quase em último lugar no mundo. Fazendo um pequeno levantamento sobre a realidade escolar hoje, o que vemos no cotidiano da escola é: a agitação das crianças; conversas paralelas; as agressões físicas; palavrões; desrespeito ao professor; furtos; presença de alunos drogados; defasagem etária; alunos oriundos de classes especiais; a não existência de normas de convivência, ou quando as tem, não são respeitadas; apego a práticas tradicionais; prática pouco comum de trabalho em grupo; espaços não apropriados para o desenvolvimento pedagógico, falta de material didático-pedagógico, etc. Diante desta problemática, podemos constatar que a indisciplina está fortemente presente na escola, e que a escola aparentemente não tem conseguido cumprir o seu papel social em sua totalidade.
Atualmente é na indisciplina dos alunos nas salas de aula que vemos centrarem-se as atenções, porque não dizer as preocupações de professores, técnicos, pais, diversas escolas brasileiras (pública e particular). Parece ser esta a causa, o motivo pelo qual os alunos não aprendem, esta tem sido uma das angústias dos profissionais da educação. A instituição escolar perplexa diante de comportamentos indisciplinados, pergunta o porquê e o que fazer para manter o controle do comportamento, a motivação da criança dentro da sala de aula, visando ao aprender crítico. Vale ressaltar que a idéia de disciplina tem se confundido com a educação, aponto de a disciplina e a manutenção da ordem nas salas de aula passaram a ocupar um papel central no interior do sistema de ensino, chegando mesmo a ter maior ênfase à própria transmissão de conhecimentos.
Eliminarmos os conflitos nas relações dos grupos sociais é uma missão quase que sobrenatural, já que existe a dinâmica que é própria das relações sociais e a escola, constituindo-se como espaço social, não poderia deixar de existir todas as possibilidades de mazelas, virtudes, conflitos que são próprios do ser humano. O conflito nos revela com que intensidade e de que forma se dá a dinâmica interpessoal, resultado da participação e fonte de criatividade nas relações entre os grupos. Fazendo uma retrospectiva sobre as origens da indisciplina na escola, apontamos como uma das causas, a falta do diálogo na família, é importante que olhemos esta questão dentro de sua totalidade e da dinâmica existente entre seus elementos integradores: sociedade, família, escola, professor e aluno.
Este estado de desordem que o Brasil vive hoje, reflete diretamente em nossas escolas e salas de aulas. O que se vê na sociedade brasileira é que ela tem primado pela desorganização, pêlos privilégios, interesses e desmandos de uma minoria, pelo desrespeito aos valores humanos, dignidade, solidariedade, violência e a qualquer tipo de norma ou regra. Essas são as questões que fazem parte do cotidiano das nossas escolas, portanto não podemos colocar as famílias, os professores e os alunos como os únicos responsáveis. Penso que diante dos fatos que supostamente geram a indisciplina, entendo que, devemos rever estas posições, redimensionando o problema. A questão não está em centralizar o problema em um ponto, mas na organização do trabalho coletivo em sala de aula para se realizar a construção do conhecimento. Quando o professor é o articulador da proposta, o coordenador do processo de aprendizagem, há de assumir seu papel de agente histórico de transformações da realidade, por meio de um ensino exigente e inteligente. É uma das tarefas do professor, por tanto também do professor de Ensino Religioso tentar resgatar os valores do passado, mas deve estar com a mente aberta para entender os novos valores que emergem das relações sociais, políticas, econômicas, culturais, religiosas, postas em funções das necessidades que são colocadas pelas contradições geradas por essas relações. O ideal seria uma disciplina consciente e interativa, marcada pela participação, diálogo, respeito, responsabilidade, pela construção do conhecimento, pela formação do caráter e da cidadania.
Equivale dizer que às vezes tentamos criar, em sala de aula, um ambiente em que a disciplina é um fim em si mesma, e não um coadjuvante do aprendizado, e que é estéril por ser diferente da vida. Disciplina imposta cria seres heterônomos, apenas capazes de obedecer às regras criadas pelos outros. Disciplina como resultado do interesse desenvolve seres autônomos, em condições de participar da elaboração das regras e de obedecer às mesmas não por medo do castigo, mas por concordar com elas.
Renato Russo parecia falar com os alunos quando disse que "disciplina é liberdade", pois seria fantástico se houvesse a compreensão generalizada de que, enquanto a liberdade é um bem precioso, seu pressuposto é a autonomia responsável e esta costuma vir acompanhada da disciplina de vida. Mas, na seqüência da música, o poeta parece falar com os mestres ao dizer que "compaixão é fortaleza", lembrando que a força do educador é retirada especialmente de sua capacidade de compreender os mistérios da alma humana, para então ajudar a aprimorá-la. E parece terminar a estrofe falando com ambos, alunos e professores, ao dizer que "ter bondade é ter coragem", lembrando que crescer às vezes dói, e o maior ato humano de nossa profissão é compreender essa dor, ao mesmo tempo em que ensinamos o respeito pela dor alheia.
Nesta perspectiva, o Ensino Religioso equivale a um subsídio positivo e inovador, não só para a escola, mas também para o transcender humano, em sua plenitude. Cabe a escola socializar entre os diversos conhecimentos, também o conhecimento religioso, promovendo o estabelecimento de novas relações de respeito ao outro em suas diferenças, a valorização da vida e dignidade humana. O Ensino Religioso é dinâmico, permitindo a interação, o diálogo e uma postura reflexiva perante a vida e o fenômeno religioso. A abordagem interdisciplinar do conhecimento é um princípio importante para a estruturação curricular" (ROCA, 1999, p. 25). Acredito que o Ensino Religioso sendo uma área de conhecimento, ele é enfocado em articulação com os demais aspectos da cidadania e com outras áreas de conhecimento, dando suporte também, à um ensino transdisciplinar, com o intuito de ir além dos conhecimentos gerais dessas disciplinas, buscando a totalidade concreta, visível e social do relacionamento pessoal e comunitário da pessoa com o transcendente.


3.1 A sala de aula como espaço propício para o Ensino Transreligioso: uma alternativa a disciplina escolar


Apesar do fenômeno religioso ter caráter universal, conviver com a diversidade tem se mostrado um sério problema para a espécie humana. Longe de representar riqueza, ele é geralmente percebida com a grave ameaça externa, fonte permanente de desconfiança, empecilho para a realização dos nossos projetos. O "outro" é aquilo que nós não somos. Ele coloca em xeque a nossa verdade, questiona os nossos valores, relativiza a nossa identidade, assim, é preciso desqualificá-lo. Diante dessa realidade universal nas escolas é claramente percebido e distinto da catequese; devido a pluri-religiosidade-cultural no Brasil.

Baseados no princípio de que o homem deve se formar numa dimensão integral, pressupõe-se que na escola, por ser um espaço para todos ? o Ensino Religioso é indispensável (FERNANDES, 2000, p. 35).

Sem este, o educando, como pessoa, não pode realizar-se plenamente, pois, por natureza, busca todas as dimensões do seu ser: social, cultural, política, criativa, lúdica, religiosa, sapiencial, somática ou corpórea e outras mais. Sobretudo a religiosa, pois é justamente esta área que busca respostas às mais fundamentais perguntas do homem como: Quem é o homem? Por que viver, vale a pena? O que existe depois da morte? Por conseguinte, à medida que o educando tiver consciência do seu ser: é alguém; para quê; para quem; dentro do ambiente escolar que é também apesar de ser um espaço limitado, espaço político, e portanto com possibilidades transformadoras, ele perceberá a sua atual missão de sujeito da história. A escola é entendida como espaço de construção e de socialização de conhecimentos historicamente produzidos e acumulados. Desse modo, o conhecimento religioso deve ser visto como patrimônio da humanidade. Nesse sentido, é que o ensino religioso deve enfocar três fatos de suma importância, que são a incidência do pluralismo religioso que se manifesta, sobretudo nos planos dos pais. Ela passa por pais convictos em sua fé, pelos indiferentes, pelos contrários e pelos ateus; o pluralismo religioso dos alunos não é diferente do de seus pais; por honestidade é preciso também acenar ao pluralismo religioso dos educadores. Respeitar as diferenças entre os alunos e a comunidade escolar, é uma tarefa que exige, sobretudo, sensibilidade e cooperação entre os professores. Educar para ser implica em considerar uma educação para a realidade, ter como ponto de partida o lugar, o contexto em que está inserido o ser dos alunos, dos professores, dos pais, uma séria análise capaz de dar conta de quem é o nosso educando, e é aqui que nos deparamos com a pluralidade, a diferença. Mas o que dizer de uma educação preocupada com o contexto que não se abre para a superação desse imanente?. Disso decorre a educação para a transcendência, a qual, para corresponder à realidade, precisa considerar os diferentes caminhos capazes de levar à experiência do sentido. A educação para transcendência compete a escola com um todo, enquanto ambiente de vivência de valores, enquanto lugar onde se reconheça a pluralidade, a diferença e se valorize o convívio, a troca de experiência.
Se é próprio do valor ser reconhecido num processo intersubjetivo de busca de consenso, a educação para os valores só poderá ser uma educação libertadora. (LIBÂNIO. 1983, p. 128). Diante do exposto, concordo com o autor, uma educação libertadora é uma educação aberta ao diálogo, possibilitando ao educando, como sujeito de seu próprio desenvolvimento, intuir e descobrir os valores. Descoberta que se torna possível exatamente porque o Ensino Religioso antecipa o novo tipo de sociedade que buscamos, favorecendo a livre autodeterminação das novas gerações e promovendo seu sentido comunitário. Uma educação que se quisesse pretender libertadora sem visar a transformação da sociedade, seria altamente ideológica (no sentido da ideologia dominante). Os valores só podem ser descobertos, na medida em que se põem as condições da situação lingüística ideal, que é uma situação em que vigem estruturas sociais simétricas. A descoberta dos valores depende assim, do econômico e do político. Daí a necessidade de transformar a sociedade no sentido de justiça, como base para uma educação religiosa para os verdadeiros valores. Não é do Ensino Religioso que provém a transformação social, embora esta, por sua autonomia relativa com relação ao econômico e ao político, já possa antecipar, na sociedade velha, em algum grau a nova sociedade e ter sua influência na derrocada final do modelo de sociedade estruturalmente injusta.
No Ensino Religioso, educar para a realidade de uma nova sociedade, significa pretender essa educação libertadora partindo das experiências concretas dos educandos, conhecer suas opções e as condições destas, saber o que lhes dá sentido para a vida. Não impor uma religião exigindo a adesão dos educandos e sim abrir um leque de possibilidades em que caibam todas as experiências trazidas por eles. Para a compreensão da experiência religiosa, Croatto (2001, p. 25), em seu livro sobre a fenomenologia da religião, utiliza a categoria Sagrado, bem como os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso, elaborados pelo Fonaper. Eliade, considera a relação entre o sagrado e o profano como a essência das religiões, em sua obra (1992, p. 106), o autor considera as diferentes modalidades da experiência religiosa a partir daquilo que elas têm em comum que é exatamente o Sagrado, que apresenta características especiais que o distinguem de todas as outras realidades, entre elas, o mistério, a majestade, o fascínio e, também, o medo, o respeito e a reverência e, de outro, a alegria, a atração, a confiança. Esta experiência é mistério porque se trata de algo que vai além das realidades deste mundo e contém em si algo maravilhoso, em sua autenticidade, o homem se sente tomado de certo estupor diante de qualquer coisa que transcende a sua compreensão natural ou comum, como seja um acontecimento na ordem cosmológica ? um milagre ? ou um acontecimento comum mas inexplicável na ordem biológica ? a vida. Notemos que não basta que o fato seja insólito, mas é necessário que seja percebido como algo maravilhoso. Uma enchente, por exemplo, pode ser insólita, mas pode também ser um sinal do poder e da justiça divina como, por exemplo, o dilúvio bíblico. O homem interpreta a sua experiência do sagrado segundo as estruturas culturais em que vive, mas a experiência do Sagrado apresenta-se em todas estas culturas como algo que transcende.
Os clássicos e os contemporâneos da sociologia atribuem à religião um caráter central na cultura, visto que a religião é um valor e, aqui o essencial, é fonte de significados para a existência humana. A fé atribui valor, porque dá significado a objetos, pessoas, tempos, lugares, mas, sobretudo a comportamentos. (GASTALDI, 1994, p. 35). As coisas têm valor (sagrado) porque as desejamos ou as desejamos porque têm valor, independente da nossa consciência que avalia. Em suma, não é o homem quem cria os valores, e sim quem "os descobre", como descobre uma verdade física ou matemática. Independentemente do sujeito, uma fruta tem valor nutritivo, e uma pedra não. Noutras palavras, as coisa estão revestidas de valor na medida em que servem à pessoa em visas de realização; é isto o que as torna apreciáveis, amáveis, úteis, dignas de aprovação, numa palavra, valiosas. Quando nos referimos à realização da pessoa, falamos de uma "vida em plenitude", que afeta todas as dimensões da pessoa, inclusive sua dimensão transcendente. Os valores contribuem para alcançar esta vida em plenitude.
Para Eliade (1992, p. 134), manifestando o sagrado, um objeto qualquer se torna outra coisa sem deixar de ser ela mesma. Para aqueles que têm uma experiência religiosa, toda a natureza pode se revelar como sacralidade cósmica. O sagrado e o profano constituem duas modalidades de ser no mundo e dependem das diferentes posições que os humanos conquistaram no cosmos. Este é também o entender do Fórum Nacional Permanente do Ensino Religioso (FONAPER), que aponta nos PCNER que esta disciplina deve fazer parte dos currículos das escolas, a fim de se trabalhar o substrato religioso presente em todas as culturas, consequentemente, um patrimônio da humanidade a ser conhecido. Sobre isso, diz Eliade:

conhecer as situações assumidas pelo homem religioso, compreender seu universo espiritual é, em suma, fazer avançar o conhecimento geral do homem. É verdade que a maior parte das situações assumidas pelo homem religioso das sociedades primitivas e das civilizações arcaicas há muito tempo foram ultrapassadas pela História. Mas não desapareceram sem deixar vestígios: contribuíram para que nos tornássemos aquilo que somos hoje; fazem parte, portanto, da nossa própria história. (ELIADE, 1992, p. 134)

São válidas as comparações entre fatos religiosos de diferentes culturas porque partem de um mesmo comportamento, que é o do homo religiosus. Este acredita que existe uma realidade absoluta, o Sagrado, que transcende este mundo, que aqui se manifesta, santificando-o e tornando-o real.
Crê, além disso, que a vida tem uma origem sagrada e que a existência humana atualiza todas as suas potencialidades na medida em que é religiosa, ou seja, participa da realidade. As experiências oníricas ou imaginárias do homo religiosus se integram numa concepção do mundo e fundam um comportamento. Baseado nesta compreensão é que o Fonaper propõe o estudo das Tradições Religiosas inseridas na cultura, como resposta aos questionamentos humanos. Propõe também o estudo dos ritos e da ética, já que estes denotam a compreensão de mundo e levam a um comportamento proposto pelas Tradições Religiosas aos seus fiéis. Para o homem religioso, no interior do mundo sagrado, o mundo profano é transcendido e este lugar sagrado pode ser revelado a ele por diferentes meios., também o homem moderno, seja qual for o seu grau de irreligiosidade, é sensível aos encantos da natureza, embora recuse a sacralidade do mundo. O grupo que se coloca de maneira contrária ao Ensino Religioso na escola pública, baseado nos pressupostos da modernidade: a secularização, o reconhecimento da ciência como única forma de explicar a realidade e a concepção do estado laico, nos dá pistas da necessidade do Ensino Religioso trabalhar a categoria Sagrado, a essência das religiões, para além de uma única religião.
O sagrado pode estar no(a), amigo(a), em ser ouvido, poder falar na natureza, como afirmam as tradições indígenas e afro-brasileiras. Como experiência do sentido, assim como afirmou Eliade (1992, p.142) pode estar presente mesmo para aquele que se diz não religioso. Por ocasião do ano novo, por exemplo, você já se perguntou sobre o que leva milhões de pessoas a se dirigirem ás praias para a passagem do ano? Da mesma forma o uso do branco, o casamento, o batizado, o velório, a inauguração da casa nova, a hora da alimentação. Momentos repletos de sacralidade ? experiências de sentido.
Muitos textos disponíveis na Internet citam a frase atribuída a Albert Einstein: "Se as pessoas são boas só por temerem o castigo e almejarem uma recompensa, então realmente somos um grupo muito desprezível". De fato, se assim o for, podemos descrer da humanidade. Também podemos entender que ser verdadeiramente humano não é um atributo apenas daquele que tem uma religião e é aqui que abrimos precedentes para o Ensino Religioso Transreligioso, que busca o conhecimento das diferentes Tradições Religiosas e as ultrapassa buscando sua essência. Na busca constante pela essência, nos deparamos com o sagrado. Fazer da escola e da sala de aula um espaço para o olhar atento ao fenômeno religioso é propiciar a este indivíduo, antes escravizado, a experiência de ser e ser livre, não mais consumidor, receptor, mas sobretudo gerador, intérprete e condutor do sentido de sua própria vida.


3.2 Disciplina na sala de aula ? educação ou repressão?


A palavra disciplina tem origem do latim de discere que significa aprender, discípulo. Entretanto, no dicionário, vemos a seguinte definição: regime de ordem imposta ou livremente consentida; relação de subordinação do aluno para com o mestre ou instrutor; doutrina, matéria de ensino, conjunto de conhecimentos que se professam em cadeira de um estabelecimento de ensino. (VOLKER, 2003, p.13)
Rigorosamente, disciplina e indisciplina estão na escola na justa medida em que estão as informações, o conhecimento, os processos de ensino/aprendizagem, alunos e professores. Ou seja, disciplina e indisciplina estiveram na escola ontem, estão nela hoje e nela ficarão amanhã, enquanto houver um espaço e um tempo para que alunos e professores tratem dos saberes. Portanto, não é correto colocar essa "estrutura acadêmica" como um problema, simplesmente porque, se acabamos com a indisciplina na escola, estaremos eliminando a disciplina e, por conseqüência, a própria escola.
Veja bem, a palavra disciplina diz da relação do aluno para com o mestre, o que identifica a origem da palavra com a prática educativa. Portanto, somente do ponto de vista do educador é possível circunscrever a palavra, já que a grande maioria dos seus significados dizem respeito à relação professor/aluno. Disciplina, possui a mesma raiz da palavra discípulo e discente, significa ensino, instrução, ciência, educação, sistema, princípios éticos. Deste modo,, disciplina é educação em sentido amplo. A raiz da palavra é disco, que significa aprender, estudar, conhecer, ter conhecimento. Dessa forma, essa palavra quer dizer estar apto a aprender. Estar disposto à aprendizagem. Estar em posição de aprender. Estar desejando conhecimento, querer ser educado. Isso é disciplina. Então disciplina é postura, é um desejo, é a vontade de querer aprender algo, através da relação professor/aluno, na escola.
Seu conceito encontra algumas dificuldades de definição. É um termo polissêmico, ou seja, significa coisas diversas para diferentes escolas, professores, épocas e lugares. Ultimamente, a disciplina tem sido bastante discutida tanto no senso comum como cientificamente. E o que observamos é a necessidade de refazermos os conceitos para reorientar as condutas. Precisamos encontrar o equilíbrio entre o autoritarismo e a permissividade, tão presentes nas últimas gerações, para que haja um contínuo e consciente desejo de disciplina por prazer e não por obrigação, e encararmos a disciplina como essencial à educação.
Ouvindo professores sobre sua concepção de bom aluno, as características: bem comportado, obediente, cumpridor de suas tarefas são apontadas com freqüência. Em contraposição, ser crítico e reflexivo aparecem raramente nesses depoimentos. Tais posicionamentos levam-nos a reflexões e à procura de maior compreensão sobre a questão da disciplina na escola. Dentre os pensadores da atualidade que se preocuparam em aprofundar este tema e que, portanto, poderão nos ajudar, destaca-se Foucault, (1997). Seus estudos sobre a questão do poder e as modalidades pelas quais ele se organiza e é exercido em nossa sociedade trazem valiosos subsídios à compreensão da disciplina enquanto prática escolar.
A disciplina é conceituada por Foucault, como uma forma de dominação e de exercício de poder nos espaços sociais menores. Ela permite, portanto, nestes locais, o "controle" do corpo e da alma, isto é, do comportamento integral dos que neles se encontram e "lhes impõe uma relação de docilidade e utilidade". Essa situação domesticadora tem suas origens no funcionamento das prisões e dos quartéis, nos fins do século XVII e início do século XIX, "uma sociedade disciplinar". Em seus trabalhos Foulcault chama a atenção para o fato de muitos procedimentos desta sociedade disciplinar, terem sidos transferidos para as escolas produzindo respostas automáticas e obediência. Essa posição vem alertando os educadores a refletir melhor a problemática da disciplina na escola e tem motivado na busca de uma visão mais humana, na qual haja lugar para questionamento e participação sem a sutileza dos mecanismos de manipulação. Considerando a disciplina como uma tecnologia específica do poder, Foulcault afirma que não cabe mais uma análise negativa do poder, pois o poder produz realidade, objetos, indivíduos e até conhecimento. Portanto, é importante acenar para uma concepção positiva do poder e uma perspectiva democrática para a disciplina.
Sabendo que a disciplina é uma técnica e o poder é uma relação de força que pode estar em todo lugar, precisamos estar atentos para a multiplicidade dos poderes, o poder do saber, do dinheiro, da influência, da comunicação e a relação que temos com as nossas práticas disciplinares. É necessário buscar coerência e os caminhos que podem nos levar a consolidação de uma sociedade democrática e dialogante.
O que nos chama a atenção de valorizar a disciplina no seu intimo, isto é, deixar de promover a abertura do não e substitui-la por uma cultura positiva da disciplina em que se estimula o aluno a praticar os atos considerados positivos, pelo prazer de fazer e não sob a ameaça do "se não fazer...". Em contexto escolar, a indisciplina deve ser estudada com preocupações não da indisciplina pela indisciplina, mas antes como fenômeno perturbador da aprendizagem, como um "incidente na fluência" da aula e da comunicação professor/aluno ou aluno/aluno, que será tanto mais atenuado quanto mais cedo o problema for percebido pelo professor e antecipadamente superado. Correndo o risco de parecer paradoxal, diremos que a verdadeira disciplina só se alcança pela liberdade não pela coação essencial para a disciplina ser assumida, não duma forma coerciva mas como autodisciplina. Caso contrário teremos de nos questionar sobre a viabilidade de formar cidadãos autônomos e respeitadores do outro quando, na escola, para se alcançar estas finalidades, se recorre a processos coercivos e, até, a agressão física.
Pelo fato da disciplina ser um termo muito genérico, quando se refere à escola, somos levados a reduzi-la à indisciplina do aluno e a punição deste para torná-lo obediente, dócil. Ainda que tenha muitos estudos abordando a questão da disciplina em seus mais variados aspectos, ainda carece de maior atenção, em decorrência de confusões quanto ao seu sentido e aplicação, o que causa muitas dúvidas. Partindo dos estudos de Foucault (1997), podemos notar o aspecto negativo/positivo do poder disciplinar, vindouro de suas aplicabilidades no decorrer da história com propriedades repressiva. Suas pesquisas em volto o sistema penal francês, abordando também o sistema social e escolar, são imprescindíveis, pois mostram que este poder disciplinar submete as pessoas a violência coercivas ou simbólicas, tornando-as vítimas da sociedade, da cultura.
Este proceder são baseadas na distribuição de papéis de trabalho onde ocorre a exclusão de muitas vantagens auferidas por alguns. Foulcault e outros estudiosos como Franco Basaglia e colaboradores partem do pressuposto de negação dessas instituições. A importância desses autores e estudos para o nosso trabalho deve-se ao fato de a escola, como um organismo social, refletir muito das práticas realizadas nas duas esferas tratadas na historicidade - segundo essas pesquisas ? prisões e manicômios. Não podemos esquecer que certas práticas desenvolvidas pela escola se dão em função de um sistema administrativo-burocrático como: o livro ponto, o livro de freqüência onde o professor controla o comparecimento dos alunos e é controlado pelo pessoal técnico-administrativo; o sinal de entrada/saída, como os espaços entre uma aula e outra, os portões cerrados, os inspetores com sua visão do mundo escolar (vigilância continuada, controle rígido dos passos do pessoal escolar); boletins individuais de avaliação, uniformes padronizados, punição, rótulos que estigmatizam o aluno, a retenção, a exclusão, os livros didáticos, as fichas de avaliação. Tudo isso tem configurado a escola como um centro de discriminação, espaço fértil para a circulação de ideologias que embora já provada sua falácia, têm encontrado espaço ideal para circular livremente. Uma maneira de o professor ajudar o aluno a superar os rótulos em que é enquadrado, é colocar o rotulado à parte, discutir e questionar com ele condições que levaram a sociedade a forjar ideologias que o rotulam e fazê-lo acreditar que os rótulos têm metas a atingir e que, por essa razão, não é o rótulo ou o nome que lhe dão que permite a condição de homem no mundo, agindo dentro do mundo, mas aquilo que ele é e faz.
Por outro lado, se o professor nada faz para superar essa condição do aluno, o poder que o perpassa é negado por ele mesmo, quando acredita piamente que o aluno é mais um rótulo dentre todas as mercadorias do ensino. É mais um objeto a ser rotulado a seu bel-prazer. Se nas prisões e nos manicômios, a maneira hierárquica do próprio vestir influência o modo errôneo e preconceituoso de pensar das pessoas é por que esse aparato faz parte da lógica de nossa cultura e de nossos hábitos mentais. No hospital psiquiátrico essa maneira hierárquica no trajar tem, no topo, o médico; na base, o doente; no meio, posição intermediária, os enfermeiros. Na escola podemos ver a reprodução desse modelo. Poderíamos permanecer laudas e laudas verificando a complexidade e ambigüidade do tema em tela. Paramos aqui. Devemos, agora, anunciar como vamos tratá-lo. Vamos fazê-lo pelo prisma da desordem na relação professor/aluno. Embora o fenômeno da indisciplina seja um velho conhecido de todos, sua relevância teórica não é tão nítida. E o pouco número de obras dedicadas explicitamente á problemática vem confirmar este dado. Um tema, sem dúvida, de difícil abordagem. Os relatos dos professores testemunham que a questão disciplinar é, atualmente uma das dificuldades fundamentais quanto ao trabalho escolar. Segundo eles, o ensino teria como um de seus obstáculos centrais a conduta desordenada dos alunos, traduzida em termos como bagunça, tumulto, falta de limite, maus comportamentos, desrespeitos às figuras de autoridade, etc.

A indisciplina seria, talvez, o inimigo número um do educador atual, cujo manejo as correntes teóricas não conseguiriam propor de imediato, uma vez que se trata de algo que ultrapassa o âmbito estreitamente didático-pedagógico, imprevisto ao até insuspeito no ideário das diferentes teorias pedagógicas. (MAGALHÃES, 1989, p. 40)

É certo, pois, que a temática disciplinar passou a se configurar enquanto um problema interdisciplinar, transversal à pedagogia, devendo ser tratado pelo maior número de áreas em torno das ciências da educação. O reconhecimento social da escola é proveniente do ensino que se desenvolve e isso depende do tipo de "autoridade" que o professor exerce na sala de aula. Entre outras questões, podemos citar a degradação do salário dos professores que, desde a década de 60, com as mudanças na ordem política e econômica do país, vem decaindo e causando um sentimento de frustração e exploração. A má formação dos professores, a burocracia escolar e a falta de interesse da maioria em atualizar-se constituem, também, em elementos agravantes do trabalho escolar que devem ser percebidos criticamente á luz da história, criando procedimentos individuais e/ou coletivos para combatê-los e superá-los. Estudiosos e pesquisadores da educação afirmam a necessidade de o professor mudar sua postura frente à classe, ensinando os alunos a pensar , aprender a ser cidadãos, a analisar, decidir, resolver problemas, expor idéias, ouvir a dos outros, para que possam ter uma participação ativa na sociedade em que vivem. Estas competências são desenvolvidas com base na realidade dos alunos compatibilizando com os princípios filosóficos da escola.
Segundo aulas de Psicologia do Desenvolvimento (Curso de Graduação em Licenciatura Plena em Ciências da Religião ? FAETEN), Vygotsky e Piaget, estudiosos dos ensinamentos da Psicologia, explicaram a interdisciplinaridade e a contextualização porque ambas as perspectivas teóricas se completam naquilo que é o mais importante: contextualizar o ensino à vida do jovem e adulto como forma de se aventurarem na ousadia e no prazer da descoberta do vir-a-ser, do pensar e do agir. Vê-se, pois, que a metodologia proposta para o ensino transreligioso deve ser coerente com os objetivos e filosofia de ensino a que se propõe. Devem ser utilizados livros, textos, filmes, vídeos, disquetes, que, além de ampliar o universo do conhecimento dos alunos, constituem um grande desafio para o professor, em despertar no aluno à autodisciplina, consciente e prazerosa, perceber que sua autonomia é algo interessante para o seu cotidiano, sua vivência diária, para a realização do sonho de cada um. Com tantas mudanças na sociedade, a política da sala de aula também tem que mudar de forma dinâmica, onde a diversidade de saberes favorece uma visão crítica da realidade. Os conhecimentos são adquiridos na dialogicidade, na troca, na descoberta de si e do mundo, na tomada de consciência que envolve ação e reflexão sobre essa nova realidade.
Na perspectiva do Ensino Religioso, enquanto forma de representação criada na história social do homem, também vem a desempenhar no aluno papel fundamental em sua forma de apreensão e ação sobre a sociedade em que vive. Os textos devem ser escritos sobre temas de seu interesse, compreendendo a educação como objeto de libertação do educando capaz de descobrir-se como sujeito ativo do e no mundo e de nele atuar de modo inovador. Para trabalhar no enriquecimento do conhecimento religioso, o docente apresenta curiosidades, dinâmicas, estratégias interativas, agindo como intermediador, não dando de imediato as soluções e respostas de seus anseios, deixando que os discentes enfrentem e superem os desafios.
É muito importante que o professor de Ensino Religioso demonstre afetividade, pois os alunos devem ter elevada a sua auto-estima, estimulando a se tornarem criativos, responsáveis, sujeitos de sua própria história. Evidentemente, a afetividade também fortalece a busca do conhecimento e interfere na aprendizagem e na avaliação, o que significa dizer que não se aprende só com a razão, antes que tudo, com a afeição. O respeito e à afetividade é que faz induzir sobre a dinâmica da vida. No processo de autodisciplina, o afetivo-emocional do aluno deve ser considerado, pois o professor que não trabalha a sensibilidade não consegue olhar e perceber o significado das ações dos alunos. Interesses afetivos despertam novas curiosidades intelectuais no sujeito e essas novas descobertas geram novos interesses, sem que haja início ou fim nesse processo. Daí ser necessário o Ensino transreligioso lançar um olhar reflexivo sobre as crianças e jovens, tornando o docente do Ensino Religioso consciente, curioso de uma atualização permanente, buscando redesenhar um modelo de educação capaz de beneficiar o discente, de encaminhá-lo para a vida plena e não para a exclusão.



3.3 A (in) disciplina: Questão da escola ou da sociedade?


A escola, é bom lembrar, é parte integrante da sociedade. Ela não é um nicho onde as contradições e os antagonismos de classe deixam de aparecer. Aí eles também vicejam. Na sociedade classista toda educação é classista. Educar nessa ordem, de forma significativa, isto é, em prol da classe majoritária, significa: fazer conhecer, conscientizar esta classe para lutar contra essa ordenação. É relevante mostrar que [...] a escola não é linear. (AQUINO, 1996, p. 68).
Sendo um lugar de contradições, a luta de classes se dá também dentro dela. Ao mesmo tempo, a escola constitui espaço onde se pode forjar a contra-ideologia de classe trabalhadora, que, apesar das dificuldades, consegue nela permanecer, abrindo uma senda, mesmo que estreita para a maioria que dela se vê alijada. Num país onde a crise econômica, cultural e moral nos apresenta as mais drásticas situações de corrupção advindas do abuso da autoridade e do poder, não é difícil entender por que a sociedade tem configurado os mesmos atos. Num país onde o saber quase faz parte do "proibido" pois não vê na educação o marco para o seu desenvolvimento, não podemos encontrar a escola muito distante desta paisagem, já que existe uma interação entre o macro e o microssocial. A escola inserida na sociedade recebe, mas também contribui para que ocorram modificações nessa sociedade, pois, por mais negativas que sejam as críticas feitas a ela, ainda é o principal agente de educação formal, ainda ensina e proporciona pequenas aberturas de horizontes que podem ampliar-se pela disciplina.
É evidente que a disciplina por si só não terá forças suficientes para mudar a organização escolar. Esta deve advir com resultado daquela, em conseqüência, se considerarmos que o ato pedagógico também se dá através da disciplina (intelectual) para a apropriação do saber, este não está inserido apenas na escola. O ato disciplinar bem como a apreensão do mundo pelo sujeito se fazem inclusive no espaço exterior à escola. A disciplina externa traduzida em normas, na obediência aos modelos preestabelecidos, leva os sujeitos, inevitavelmente, a adquirir outro tipo de disciplina essencial para a apreensão do conhecimento, tanto dentro, quanto fora da escola. É a disciplina interior ou a autodisciplina. Além disso, instala-se no país uma cultura de vidência e de terror, caracterizada pelo abuso de poder de representantes de instituições que deveriam, constitucionalmente, garantir a segurança do cidadão. Tais fatos que não são isolados, vêm contribuindo, pelo clima de impunidade que impera, pela a efetivação de práticas semelhantes que partem, até mesmo de classes sociais privilegiadas como foi o caso do assassinato do índio Pataxóis, em Brasília, queimado vivo. Todo esse quadro analisado vem concorrendo para acentuar a desmotivação que se apodera do povo que pela ausência de projetos sociais identificados com seus reais interesses e sem valores que apontem para uma perspectiva de melhoria de sua qualidade de vida, fecha-se sobre si mesmo, atomizando suas lutas, desanimando seu poder de organização, ao mesmo tempo que pela sua inércia, reforça a dominação dos poderosos.
É nesse contexto social, político e econômico de crises, que se inscreve a disciplina/indisciplina na escola tema que mais do que nunca vem sendo alvo de debates e preocupações de educadores e pais. A cultura política autoritária nas relações macrossociais reproduz-se no interior das instituições microssociais (CANDIDO, 1997, p. 8). É possível perceber atentamente essa estrutura autoritária na sociedade brasileira, por exemplo as relações: governo/sociedade; Igreja/fiéis; partido/militante; direção/base sindical; pais/filhos; patrão/empregado; homem/mulher. Pode ser feita uma comparação também na instituição escolar, onde as relações democráticas são a reprodução de uma cultura política autoritária: diretor/professor; diretor/equipe técnica; equipe técnica/professor; equipe técnica/aluno; professor/aluno.
Por este prisma, o conceito de disciplina acha-se intrinsecamente vinculado ao conceito de poder, e está ligado à dominação, embora nem sempre esta dominação seja exercida pela utilização da força física direta. Pode ser exercido de forma simbólica. Por exemplo o poder do charme do ser amado, o princípio de autoridade do professor, o pátrio poder. Nesses marcos conceituais, a atenção da disciplina se dá pela vigilância hierarquizada em micro penalidades, castigos, humilhações e privações. Assim, é preciso compreender que tratar da questão do poder na sociedade global ou do micropoder num organismo da sociedade civil, no caso concreto na escola, exige uma compreensão teórica e prática de como as relações sociais se estabelecem e de que a correlação de forças define tanto o conteúdo, quanto a forma da disciplina nesse espaço social.
Na escola, portanto, as relações sociais não são mecânicas nem lineares, pelo contrário, inscrevem-se num jogo dinâmico de contradições em que as formas assumidas pelo exercício do poder definem as regras desse jogo e, por conseguinte, da disciplina. Vale destacar que as escolas católicas vêm, crescentemente, introduzindo, em seu dia-a-dia, a metodologia do planejamento participativo na elaboração de seu plano global, com ênfase na definição do seu projeto educativo. Acreditamos ser uma prática louvável por possibilitar a participação de professores, alunos, pais, equipe técnica, funcionários e direção na análise da conjuntura, em seus vários níveis, buscando caminhos e alternativas que efetivamente contribuam para a melhoria da qualidade da educação em suas escolas.
Construir uma disciplina consciente e emancipatória na escola significa reconstruir a própria escola, imprimindo-lhe uma nova essencialidade que a torne verdadeiramente solidária, democrática, autônoma e desafiadamente alegre. Alegria enquanto desafio imposto pela própria disciplina, capaz de não adiar a felicidade, mas de fazer dela um fim e uma prática de seu projeto humano-social. Uma alegria que só a escola é capaz de propiciar, aquela particular, insubstituível que se traduz na paixão cultural, no prazer pela cultura elaborada. Construir, portanto, uma escola que consiga aliar liberdade e obrigação é tarefa histórica urgente. É quando o Ensino Religioso pode e deve dar sua contribuição, oportunizando o diálogo inter-religioso como forma de exercer essa consciência de liberdade, produzindo uma cultura elaborada, a partir das riquezas vindouras de cada tradição cultural. A questão da relação entre liberdade e obrigação é, para nós, professores, muito difícil de equacionar.
A cada dia nos convencemos mais que a escola é hoje, dentro do contexto familiar, social e político, a instituição que detém o "poder" de resgatar os valores morais e fortalecer o cidadão e, conseqüentemente, a família e a sociedade, para que se estabeleça um novo perfil social ? mais harmônico, mais estável e responsável. É claro que a escola jamais suprirá o papel da família e nem o pretende. Porém, entende-se que hoje a escola é o "fórum" onde o educando se manifesta, o educador intermedia e a família s expressa. É o local do encontro onde as relações e as mudanças se realizam. Nesse sentido, é importante compreender que a ação educativa não é simples. Ela exige reflexão, coerência, firmeza e ternura. Toda escola necessita explicitar seus princípios e valores para pautar suas normas e regras de convivência, pois a rotina de uma escola é, portanto, dinâmica e imprevisível.
Toda essa análise até aqui tecida permite ratificar que a indisciplina encontra suas raízes, em cinco grandes níveis; sociedade, família, escola, professor e aluno. Enquanto determinação mais geral, a raiz do problema encontra-se na atual forma da organização da sociedade, base de todas as outras indisciplinas. Esta determinação não se concretiza por si só, ela é concretizada pela mediação dos diferentes agentes (pais, professores, alunos, diretores, governantes).
Em síntese, podemos dizer que a disciplina possa ser um dos mecanismos que colabora para a melhor organização escolar, e em conseqüência, para a apropriação do saber, agindo como um dos elementos de transformação que proporcionará ao sujeito maior autonomia, liberdade e senso crítico. Assim fazendo, estará, de forma muito pequena, provocando um princípio de modificações também na sociedade, já que sociedade e escola estão em contínua interação.


3.4 A disciplina que desejamos


Ganhamos clareza da disciplina que não queremos: autoritária. O desafio agora é vislumbrar ? e concretizar ? a superação dela. O que almejamos em termos de disciplina em âmbito geral é buscarmos construir uma nova disciplina que deixe de ser a expressão das relações sociais alienadas (VASQUES, 1997, p. 259). Basicamente, podemos dizer que o objetivo é conseguir o auto governo dos sujeitos participantes do processo educativo, e dessa forma as necessárias condições para o trabalho coletivo em sala de aula (e na escola), onde haja o desenvolvimento da autonomia e da solidariedade, ou seja, as condições para uma aprendizagem significativa, crítica, criativa e duradoura. Almejamos uma disciplina consciente e interativa, marcada pela participação, respeito, responsabilidade, construção do conhecimento, formação do caráter e da cidadania. A disciplina significa a capacidade de comandar a si mesmo, de se impor aos caprichos individuais, enfim, uma regra de vida. Além disso, significa a consciência da necessidade livremente aceita, na medida em que é reconhecida como necessária para que um organismo social qualquer atinja o fim proposto. A disciplina não deve ter fim em si mesma; deve estar relacionada aos objetivos maiores da escola, que deve formar o aluno ajudando a construir uma nova hegemonia, a hegemonia das classes populares. A realidade está sendo assim, mas pode ser mudada; a partir da experiência de mudança social mais ampla. A experiência de não poder, de impotência, repetida constantemente, vai levando a um estado de apatia, de descrença no mundo e na humanidade, facilitando, inclusive, o campo para busca de subterfúgios alienantes (drogas, fanatismo político ou religioso, misticismo, jogos de azar, etc). Antes de tudo, nossa disciplina deve ser sempre uma disciplina consciente. Nossa disciplina como fenômeno moral, político e religioso, deve vir acompanhada de consciência, isto é, de uma noção do que é disciplina e nesse mister o Ensino Religioso possui os mecanismos curriculares para esse fim.
Freqüentemente, trabalha-se a disciplina de forma restrita: dá-se muita ênfase aos limites, ao que "não pode", em detrimento das possibilidades, do que se espera. É a disciplina do "não", "não" e "não". Portanto, deve apontar os limites ? como normalmente se faz, mas também as possibilidades ? geralmente esquecidas. Numa visão dialética-libertadora compreende-se que a disciplina se constrói pela interação do sujeito com outros e com a realidade, até chegar ao autodomínio; podemos afirmar, parafraseando Freire: Ninguém disciplina ninguém. Ninguém se disciplina sozinho. Os homens se disciplinam em comunhão, mediados pela realidade (1987, p. 52). O educador num primeiro momento, pode assumir a responsabilidade pela disciplina, enquanto articulador da proposta, levando no entanto, a classe a assumi-la progressivamente. Tem como parâmetro não a sua pessoa ( "sua autoridade"), mas as necessárias condições para o trabalho coletivo em sala de aula. Ocorre que as relações entre os homens podem ser alienadas, reificadas, coisificadas, ou seja, os limites estabelecidos podem não corresponder ás reais necessidades dos sujeitos, mas à necessidade de um ou outro, ou de apenas um grupo em detrimento dos demais. Desejamos muito, na escola e na sala de aula, a disciplina, a aceitação da proposta de trabalho, mas esquecemos que a resistência, a não concordância, ou pelo menos sua possibilidade, é um fator fundamental para a sociedade não parar, não se acomodar, não se submeter a eventuais tiranos. Quando se está sob a tirania, desejamos que as pessoas se rebelem, que se levantem contra, enfim, que se indisciplinem. Esta tensão entre adaptação e transformação é constante.
O Ensino Religioso trabalha o sujeito, adaptando-o a uma série de valores, costumes, práticas sociais e religiosas, etc., que fazem parte de sua cultura, mas ao mesmo tempo, deve estar atento para a necessária transformação destes valores, práticas, etc., naquilo que tem de desumano de alienado, que precisa ser superado. A disciplina consciente e interativa, portanto, pode ser entendida com o processo de construção da auto-regulação do sujeito e/ou do grupo, que se dá na interação social e pela tensão dialética adaptação-transformação, tendo em vista atingir conscientemente um objetivo.
É preciso explicitar o conceito de disciplina. Cremos que não é possível desvincular a construção da idéia de disciplina da totalidade dos aspectos que determinam a prática pedagógica, sejam os específicos como planejamento, definição de objetivos, estratégias de ensino e avaliação, sejam aqueles relacionados à organização escolar e ao sistema educacional. A definição de disciplina deve estar, ainda, iluminada por valores que orientem um processo educativo capaz de contribuir para a transformação social. Logo, o conceito de disciplina está comprometido com princípios de participação e cooperação (MAGALHÃES, 1989, p.43).
As normas e regras são produtos da necessidade de se estruturar o trabalho escolar e resultado de uma prática coletiva. Por isso guardam em sua essência o espaço para uma constante revisão de sua adequação às necessidades dos membros da comunidade, preservando a dinâmica existente nas relações interpessoais e grupais de maneira geral. O conceito de disciplina diz respeito a comportamentos e atitudes que promovam na aprendizagem eficiente, autodisciplina, consciente. Consideramos que o professor de Ensino Religioso possui um papel relevante na organização dessas atividades e, portanto, na obtenção de atitudes disciplinadas. Seu trabalho envolve uma competência técnica que o habilita a lidar com o conteúdo e a metodologia de ensino. Envolve, ainda, uma dimensão de transcendência e humana expressa na relação que estabelece com o aluno.
E, também, pressupõe uma dimensão política na medida em que partilha com os membros da escola (educadores, educandos, supervisão, direção) suas idéias e convicções, respeitando as decisões e criações coletivas. A disciplina na escola é o resultado de compromissos firmados pelo grupo. Apoiando-se e alimentando-se na comunidade escolar, cabe ao professor mediar situações de diálogo e de confronto.
Neste contexto, a disciplina inerente a qualquer ação educativa eficiente ? já que, a nosso ver, sem esforço, compromisso e engajamento não há aprendizagem - não é nem só uma questão de autoridade (seja do professor ou do grupo), nem só uma questão de participação. Mas, sim, a disciplina é fruto de uma prática pedagógica que resgate e estabeleça relações com a finalidade de conscientização, e o equilíbrio entre autoridade e participação. Antes de mais nada, conscientização só é possível através do diálogo. É uma tomada de consciência em grau mais profundo, o que significa: apreender o mundo num primeiro momento espontaneamente, naturalmente e num segundo momento fazer a leitura do mesmo assumindo postura crítica. Quanto mais se entende a realidade, maior o grau de conscientização. Esta é ação e reflexão, reflexão e ação para a transformação.
Somente pela práxis consciente, os homens podem "pronunciar o mundo", libertando-o, humanizando-o, daí ele dizer que a conscientização é um compromisso histórico. Compromisso este leva que leva a assumir uma posição utópica frente ao mundo, ou seja, existir no mundo, fazendo e refazendo a história pela denúncia e anúncio; denúncia das estruturas desumanizantes e anuncio das boas e justas. Ser utópico é ser profético, é levar a palavra de esperança, e estar permanentemente comprometido no processo radical de transformação do mundo. Mergulhar na realidade das tradições culturais é conscientização, onde educadores e educandos se confrontam com o objeto que desejam conhecer, é pelo diálogo que desencadeia o processo, relação dialogizante dos homens uns com os outros.
Dialogar, é antes de tudo, comunicação, crença na possibilidade de transformação e de humanização das relações interpessoais, porque "o recurso dialógico funciona como neutralizador de muitas formas de violência.
Moscovici (1995, p.09) falando sobre as táticas para administrar os conflitos interpessoais, que aqui entende-se como geradores das questões da indisciplina escolar, aponta para as táticas de diálogo como forma de lidar com o conflito. Dentre as táticas de diálogo, a autora aponta a da resolução de problemas como a mais adequada, considerando que o processo encaminha os participantes a uma reformulação de posicionamento pessoal. Cada um conscientiza-se de sua atuação pregressa e sua contribuição conflitiva. (MOSCOVICI, 1995, p. 12).
Ainda que usada essa tática, é possível que não se alcance a efetiva resolução dos problemas, considerando as inúmeras variáveis que os provocam e, inclusive, as objetivas limitações dos envolvidos. Mesmo assim, ela oferece a possibilidade de controle e de conscientização sobre a responsabilidade de resolvê-los e, ainda, de manter o conflito bem delineado e compreendido (MOSCOVICI, 1995, p. 13). Penso que para a construção de uma disciplina com fundamentos éticos entendendo que a organização coletiva das regras de trabalho em sala de aula é, também, outra alternativa, de extrema importância. Para mim, a questão de fundo desta organização é que ela, além de objetivar solidariamente os limites do grupo, educa para o exercício da vontade, da decisão de forma livre, consciente e responsável. Em outras palavras, educa para a participação ? coisa bonita e furiosa, educa para a liberdade, educa para a autonomia.
Em seu último livro Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa, Freire nos diz:

A liberdade sem limite é tão negada quanto a liberdade asfixiada ou castrada. [...] Quanto mais criticamente a liberdade assuma o limite necessário tanto mais autoridade tem ela, eticamente falando, para continuar lutando em seu nome. (FREIRE, 1996, p. 118)

Obviamente, o nível de desenvolvimento dos alunos virá exigir diferentes encaminhamentos para dar conta das diferentes formas de participação na elaboração das regras de trabalho. O certo é que quando os alunos participam da elaboração das regras, maior é a probabilidade de que os alunos venham a assumi-las porque toda disciplina envolve autodisciplina [...] a disciplina é o fazer o que posso, o devo e o que preciso fazer. (FREIRE, 1989. p, 12).
Ainda que necessitando desenvolver estas questões com maior profundidade, entendo que são importantes para um começo de discussão e absolutamente indispensáveis como motivo de estudo tanto de minha parte como de meus colegas professores. Não se trata de, sob hipótese alguma, pensar que são da exclusiva responsabilidade do professor de Ensino Religioso. Como já nos referimos antes, esta deve ser de todos os que trabalham com a educação. Porém, no nosso entendimento, isto é inevitavelmente da competência nossa, como educadores que somos, e entendida a competência como a qualidade de saber uma coisa que deve ser feita e querer fazê-la do melhor modo possível (FREIRE, 1989, p.10).
Desejamos uma disciplina que abra novas perspectivas, lance desafios, que nos faça sonhar sonhos possíveis e que seu discurso e sua ação visem uma educação integral e libertadora, uma prática dialética, dinâmica, entre a denúncia e o anuncio do sonho possível de uma sociedade justa e humana.



4. PROPOSTA PEDAGÓGICA DE UM ENSINO TRANRELIGIOSO: DIÁLOGO INTER-RELIGIOSO ? NUMA CONCEPÇÃO HOLÍSTICA


Após o Concílio Vaticano II (1962-1965), a Igreja católica romana foi progressivamente assumindo este desafio dialogal, entendendo-se como peregrina que caminha com os outros em direção a um horizonte que é gratuidade e surpresa permanente. Com a abertura ecumênica e inter-religiosa, a Igreja Católica ganhou uma nova sensibilidade e a consciência de que os outros crentes são igualmente portadores de um precioso patrimônio espiritual. Este caminho não aconteceu sem dificuldades, resistências e mesmo oposições. Há ainda hoje muitos que desacreditam este itinerário, recusando-se a apostar na positividade das religiões.
Não pode haver disponibilidade ao diálogo inter-religioso sem a receptividade ao pluralismo religioso, seria limitado, porém, reconhecer unicamente este pluralismo como uma realidade de fato, resultado de uma situação conjuntural que tenderia a ser dispersa posteriormente com a afirmação radiosa de uma única experiência religiosa considerada como o remate ou realização de todas as tentativas humanas de busca do divino. Esse efetivo exercício dialogal pressupõe uma perspectiva distinta. Não é possível realizar o diálogo a não ser quando se reconhece o valor da convicção do outro e de que esta se funda numa experiência de relação. Não é correto e justo para com as outras tradições religiosas restringir a presença e o "falar" de Deus para a religião cristã, como se as mesmas fossem simplesmente religiões naturais. As religiões não são apenas genuinamente diferentes, mas também autenticamente preciosas. Há que honrar esta alteridade em sua especificidade peculiar. E honrar a alteridade é ser capaz de reconhecer algo de irredutível e irrevogável nas outras tradições religiosas, ou melhor, reconhecer o valor e a plausibilidade do pluralismo religioso de direito ou de princípio.
Esta diversidade de religiões não deve ser reconhecida como expressão da limitação humana ou fruto de uma realidade conjuntural passageira, mas como traço de riqueza e valor. A diferença deve suscitar não o temor, mas a alegria, pois desvela caminhos e horizontes inusitados para a afirmação e o crescimento da identidade. Devemos estar atentos e sensíveis à percepção deste valor plural onde as religiões não são muros para se atacar ou abater. Constituem morada do Espírito que nós ainda não visitamos; são receptáculos da palavra de Deus que nós optamos pôr ignorar.
A abertura ao pluralismo em sala de aula constitui um imperativo humano e religioso, trata-se de uma das experiências mais enriquecedoras realizadas pela consciência humana. Reconhecer o pluralismo religioso de princípio significa desocultar o significado positivo das diversas tradições religiosas na globalidade do único desígnio salvador de Deus. Esta acolhida positiva da pluralidade revela uma ampliação do olhar e atesta a imensa generosidade do Deus multiforme que brindou com inúmeras e distintas riquezas a sua criação e a história. Antes mesmo que os seres humanos se dispusessem a buscar a Deus, eles já se encontravam num espaço habitado por sua presença. O diálogo inter-religioso encontra o seu fundamento principal nesta convicção da universalidade da graça de Deus. Não há possibilidade de um controle humano sobre a dinâmica da gratuidade do Deus sempre maior, do mistério do "Deus que se dá". São caminhos impenetráveis que animam as tradições religiosas daqueles que devem ser considerados como amigos e não concorrentes. A afirmação do pluralismo de princípio não significa a sedimentação de uma perspectiva relativista, e isto pode ser exemplificado pôr três razões. Primeiramente, há de sublinhar que esta abertura ao pluralismo não significa um nivelamento das experiências diversas, mas a consciência de sua diversidade. Em segundo lugar, há que frisar que esta mesma abertura não abafa o valor do testemunho particular, exigindo, porém, uma mudança em seu exercício e estilo. Em terceiro lugar, a consciência do pluralismo não significa a exclusão do discernimento crítico com respeito às religiões específicas (TEIXEIRA, 2003, p.20).
A nossa busca é intempestiva e, em meio a tanta diversidade, torna-se muito difícil encontrarmos nossa singularidade. A construção da identidade fica diluída e esmaecida diante da pluralidade de expressões e possibilidades, a pressão dos interesses e possibilidades, a pressão dos interesses mercantilista e utilitaristas da sociedade contemporânea, e do confronto com o diferente, que estimula o comportamento de manada que dá o sentido de pertença, um desejo íntimo da natureza humana. Somente o ser humano maduro, conhecedor de muitas outras culturas, pode começar a compreender a enormidade e a amplidão da realidade através da diversidade, das diferenças étnicas e sociais, além de se deparar com a compreensão de mundo dos povos tradicionais, estudados pela Antropologia, que concebem que tudo está em harmonia com tudo, tudo está em tudo e cada um é responsável por esta harmonia, sem fazer a exclusão de nada e sem dar tanta importância a um único elemento, pois tudo e todos são passageiros de uma mesma realidade, sem ser uniformes. Em tais premissas, somente nesta dimensão compreensiva, é que o ser humano poderá reconhecer e aceitar as diferenças entre si, permitindo e possibilitando a construção de uma personalidade própria, uma identidade alinhada com o si mesmo e com a sua vocação interior, podendo trilhar seu caminho com decência, entendendo que cada pessoa tem um chamado único. Existe uma sabedoria em tudo e em todos os seres do planeta. Não é necessário ser xamã, pajé, pastor, sacerdote, homem santo ou peregrino para contribuirmos com a evolução. Basta se colocar numa atitude harmônica com o todo, como se estivéssemos seguindo o fluxo do rio, que não tem pressa. Basta praticarmos nossas ações buscando o equilíbrio do Universo, que já estaremos cooperando significativamente com a evolução. Esta é a lógica da teia, cada um dos elementos vivos segura uma ponta do fio da vida e toda atitude que fere, machuca e viola atinge qualquer elemento, ferindo, machucando e violando a tudo e a todos, inclusive nós, os filhos da Terra. Com isso, a diversidade dos povos, das etnias, das raças, dos pensamentos é imprescindível para colorir a teia, do mesmo modo que é preciso o sol e a água para dar forma ao arco-íris.
Uma proposta educativa que concebe o homem de forma integral (em suas dimensões biopsicossociais e espirituais), vem favorecer uma prática educativa aberta que atenda às necessidades individuais do educando inserido no contexto não só escolar, mas familiar e social, em vários níveis. Considerando a complexidade cada vez maior do contexto social em que este educando está inserido (do micro ao macrossistema, ou seja, do lar ao mundo da globalização ao qual tem acesso através de vários meios de comunicação social, como a TV e a Internet), é um grande desafio prestar uma ajuda significativa no âmbito da formação integral do indivíduo, já que o percebemos envolvido numa rede bastante ampla de influências que agem à sua volta, contribuindo para a construção de sua personalidade e sistema de valores de forma atraente aos sentidos e pouco estimuladora da reflexão crítica, pressuposto para uma consciência crítica bem solidificada, já que esta consciência necessita, para construir-se solidamente, da experiência interpessoal de qualidade. Num contexto que estimula profundamente o consumismo, o hedonismo, a produtividade por ela mesma, a competitividade nem sempre ética, indicadores do próprio sistema de produção capitalista, é fundamental que este homem seja considerado em todas as suas necessidades, para que, consciente delas, possa ser sujeito de sua aprendizagem e autodetermine-se na análise e escolha de um sistema de valores capaz de facilitar sua auto-realização como pessoa e como cidadão consciente de sua missão na sociedade.


4.1 O que é o Diálogo Inter-religioso?


Um aspecto polêmico merece a nossa atenção: diz-se que o ensino religioso, se não for ele mesmo uma experiência de ecumenismo, deve ser trabalhado com forte espírito ecumênico. Todavia, é comum que se faça certa distinção de vocábulo: ecumenismo seria o nome aplicado à relação entre grupos cristãos de igrejas diferentes (católicos, ortodoxos...), diálogo inter-religioso seria a relação dos cristãos e outras religiões (muçulmanos, budistas, cultos africanos, etc.). Vale ressaltar que essa distinção não é aceita por todos. Há quem aplique o termo ecumenismo a todos os casos, pois a própria classificação de cristãos é um aspecto complexo. Alguns grupos que se autodenominam cristãos não são reconhecidos como tais pelas igrejas cristãs majoritárias.
O ecumenismo de fato não é um conjunto de ações. É muito mais um modo de entender a própria vida e a fé. É, basicamente, um tipo de espiritualidade, se entendemos como espiritualidade aquele "filtro" através do qual vemos e interpretamos pessoas e acontecimentos. Ou melhor, não há prática ecumênica que funcione quando não se é ecumênico de fato, sinceramente, do fundo do coração. Em quanto a conversão não nos transforma em pessoas que querem paz, que se despem de preconceitos, que se alegram com o bem praticado pelo outro, qualquer ato ecumênico pode ser dominação diplomaticamente disfarçada. Este diferencial de vocábulo, permite-nos esclarecer a relevância de cada referencial religioso na vida.
É necessário lembrar que o diálogo inter-religioso apresenta-se, neste início de milênio, como um dos grandes e fundamentais desafios para as religiões. Trata-se da possibilidade real de afirmação de um horizonte de paz para a humanidade, pois esta não pode acontecer fora do exercício dialogal entre as diversas tradições religiosas. Obstante, Freire (1987), entendeu logo de início que era preciso uma atenção maior a respeito do princípio dialogal, onde o povo pudesse ter a sua palavra. O homem deve ser o sujeito se sua própria educação e não objeto. A preocupação inicial era exatamente encontrar um meio ou meios que levassem o povo a superar suas atitudes ingênuas diante da realidade. A resposta só viria por: um método ativo dialogal. Diálogo, ele mesmo responde:

É uma relação horizontalmente de A com B. Nasce de uma matriz crítica e gera criticidade. Nutre-se do amor, da humildade, da esperança, da fé, da confiança. Por isso só o diálogo, comunica e quando os dois pólos do diálogo se ligam assim, com amor, com esperança, com fé um no outro, se fazem críticos na busca de algo. (FREIRE, 1987, p.60)

O diálogo enquanto encontro dos homens uns com os outros desencadeia o processo de libertação individual e coletiva. O papel do animador (educador) é fundamentalmente o de fomentar o diálogo a partir de situações concretas do dia a dia. A comunhão entre professor/aluno é imprescindível. O diálogo se nutre do amor, da humanidade, da fé e da esperança. Somente com amor pode haver educação para a libertação. Não só o amor tem de estar presente no diálogo, também a humildade é requisito. É preciso humildade no sentido pleno da palavra, isso se estende a todas as dimensões da vida: não há homens com saber absoluto nem homens ignorantes absolutos, mas sim homens que em comunhão buscam encontrar respostas. É importante também no diálogo a fé nos homens. Fé nas suas potencialidades criadoras, fé na sua vocação como criaturas de Deus ou da natureza. E ainda, só é diálogo se desenvolver nos dialogantes um pensar crítico, isto é, um ver, um captar, um agir. Outro elemento necessário ao diálogo é a esperança. Não é simplesmente um ato de espera mas antes é uma busca para alcançar algo. O homem busca porque ele é ainda um ser incluso. A esperança é uma virtude dinâmica que impede o homem a buscar a realização de sua "vocação" histórica, isto é, não cruzar os braços, entrar na luta ? luta dialogizante. O ingrediente do diálogo é a palavra autêntica, é ação e reflexão dos homens sobre o mundo, com o objetivo de transformá-lo.
O momento atual não abre muitas margens para a esperança. Em âmbito mundial, observa-se o aumento da violência, dos conflitos étnicos, do fascínio pelo poder e do aperfeiçoamento da máquina da morte algumas teses problemáticas que falam em "choque de civilizações" acabam suscitando o temor da afirmação presente em movimentos de revitalização religiosa, como no Islã, obstruindo a esperança nos canais de conversação. Na verdade é na parceria e no diálogo e na dinâmica de empreendimento cooperativo que as culturas alcançam sua realidade mais rica e profunda. O mesmo pode ser dito sobre o diálogo inter-religioso, enquanto experiência que motiva não apenas o mútuo conhecimento entre tradições religiosas distintas, mas igualmente o seu recíproco enriquecimento. Isto não ocorre quando as tradições em questão permanecem fixadas em sua identidade, deixando de admitir e perceber a presença de verdade, valor e graça na experiência alheia. Concordamos que, para que o diálogo ocorra em sala de aula em prol da disciplina, em primeiro lugar é necessário a consciência da vulnerabilidade e dos próprios limites. Reconhecer que a verdade não é uma posse garantida, mas fruto de uma posse garantida, de uma experiência de caminhada comum, de partilha e de busca permanente (TEIXEIRA, 2003, p.21).
O atual crescimento e acirramento dos fundamentos religiosos revela uma dificuldade real de acolhida do pluralismo religioso. Trata-se, na verdade, de uma reação religiosa face à condição de incerteza que acompanha a realidade da globalização e do pluralismo. Ao sentimento de incerteza e insegurança identitária responde-se com uma reação defensiva ou ofensiva: uma defesa da tradição de forma tradicional. O etnocentrismo ganha hoje uma fisionomia problemática, lançando uns povos contra os outros e afirmando a dinâmica de uma incomunicabilidade aos valores da alteridade, torna-se mais do que urgente o desafio do diálogo e, em particular, do diálogo inter-religioso.

Os seres infra-humanos, não dialogam. No máximo, interagem: tocam-se, atritam-se, acasalam-se... Já os seres humanos, na mesma medida em que existem como pessoas livres e encarnadas, dialogam, intercambiando grandezas e limitações, num processo constante, porque o diálogo é muitíssimo mais que conversa e convivência. Representa comunicação autêntica e entrega mútua nos mais variados graus e níveis. (VANNUCCHI, 1982, p. 13)

O ser humano não vive propriamente de contatos, mas sim de relações. Como pessoa, é um ser-com-outros e um ser-para-outros. É livre, mas não independente, porque não se pode ser pessoa sem os outros. Vivemos em tempo de homens-massa, de homens-máquina, de homens-robô, ou seja, de pessoas descaracterizadas, porque reduzidas a números, peças e autômato, sem possibilidade de diálogo. Sem oportunidade de dizerem a própria palavra. Vale a pena então levar os alunos a refletirem e debaterem juntos sobre as bases e os canais de diálogo, em nível de escola, de família, de país, etc.
A primeira coisa que salta aos olhos é que hoje nos encontramos com uma ampliação incrível do mundo religioso, temporal e espacial. Assumir a afirmação que as religiões, cada uma delas, são totalidades de resposta ao divino com suas diferentes formas de experiência religiosa, seus próprios mitos e símbolos, seus sistemas teológicos, suas liturgias e sua arte, suas éticas e estilos de vida, suas escrituras e tradições ? todos elementos que interagem esse reforçam mutuamente. E estas totalidades diferentes constituem diversas respostas humanas, no contexto das diferentes culturas ou formas de vida humana, à mesma realidade divina, infinita e transcendente. Fechar os olhos diante desta semelhança fenomenológica ou negar-se a reconhecer sua eficácia real na vida das pessoas, significaria ter o coração como o de Jonas e pouco entendimento para a história das religiões. O qual deve, por sua vez, constituir um chamado a estudá-las com cuidado, procurando inclusive interpretá-las à luz de sua própria auto-compreensão. Não o respeito, mas a própria justiça é que o exige, pois, como muito acertadamente se observa é que também a teologia das religiões está sob o mandamento de não pronunciar nenhum falso testemunho contra o próximo.
À luz destas mudanças tão profundas, compreende-se que a teologia busque hoje novos enfoques do "problema" e tente novas saídas. Race, citado por Queiruza (1997, p.18), no mundo anglo-saxão, é onde a discussão está mais viva, impôs-se uma divisão tripartida das posturas: Exclusivismo, Inclusivismo e Pluralismo. Exclusivismo: é a postura que só admite revelação real e verdadeira e por conseguinte, salvação ? na própria igreja ou religião)para nossa discussão, no cristianismo). Em sua forma rígida, hoje é sustentada por quase ninguém; Inclusivismo: não inclui nem verdade nem salvação nas demais religiões, mas mantém ao mesmo tempo a centralidade de si própria, que inclui a verdade das demais, mas que tende a postura primeira ou a terceira. Pluralismo; todas as religiões são iguais, manifestações equivalentes em seu valor salvífico e em sua verdade, pois a diversidade nasce unicamente dos diversos contextos culturais em que se tematiza e se concretiza a experiência do divino.
Trata-se como se vê, de uma tensão interna à própria fé, que a interroga em si mesma, desapropriando-a de todo egocentrismo e obrigando-a a aprofundar sua auto-compreensão. O encontro com as religiões se insere nessa dinâmica interna, emoldurado em um regime de Dom e gratuidade, dentro do qual a concorrência ou a tentativa de domínio acaba desmascarada como soberba e pecado. O absoluto corresponde somente a Deus; o que cabe ao homem é a tarefa inacabável de ir assimilando-o, tanto na glória e na humanidade do serviço, oferecendo aos demais o que descobriu, como na dura e prazerosa aprendizagem do que os outros lhe oferecem e que ele reconhece como pertencente a seu mesmo deus, que é o de todos. Daí o diálogo inter-religioso não vai esquivar-se das exigências da sensibilidade moderna, e sim as tomará como pedra de toque da própria autenticidade. Porém as enfrentará em um segundo momento, a partir da resolução interna das próprias tensões; ou, se quisermos formulá-lo melhor, depois de deixar-se instruir pelas implantações da própria experiência reveladora, muito maior que nossas expectativas e muito mais generosa que nosso afã de domínio.


4.2 O Ensino Religioso como área de conhecimento transdisciplinar


Não é somente o Ensino Religioso que está em crise. Neste século experimenta-se uma crise mundial complexa e multidimensional sem precedentes, que atinge todas as dimensões da existência. Crise vital, portanto, pois a vida no Planeta corre o risco da autodestruição total, o ecossistema global está ameaçado pelas catástrofes ambientais e nucleares, pela superpopulação, pela tecnologia, pelas doenças nutricionais e infecciosas, pelas epidemias e pandemia desta civilização, pêlos sinais patológicos de desintegração social e de anomalias econômicas e políticas. Percebe-se, então, com este declínio lento e inevitável, transformações radicais nas instituições, nos valores e nas idéias dessa cultura. E os indicadores sociais desta crise cultural são apontados pêlos estudiosos como antecedentes idênticos aos dos períodos de transição cultural: sensação de alienação, aumento de doenças, crise violentas e desintegração social. E, no atual há também um interesse maior pela busca religiosa (VIESSER, 1995, p.37).
Então, vê-se como um paradigma, característica desta cultura ocidental que enfatiza a eficiência e sustenta o antropocentrismo na forma de dominar, consumir, possuir. E pelas suas contradições não mais responde às situações geradas e ao perigo de extinção da vida no planeta. Atualmente, neste período de transição aparece como resposta à crise global, um novo paradigma não mais marcado pela separabilidade e fragmentação, mas que busca superar a redução do antropocentrismo em todas as suas facetas: científica, somática, religiosa, materialista, racionalista.

Repensar a prática do Ensino Religioso, no cotidiano de uma sala de aula, na concepção holística da vida, significa retomar a proposta desse ensino em cada uma de suas partes (planejamento, objetivos, conteúdo, metodologias, avaliação, relações), onde o todo se faz presente para que a nova didática aconteça na unidade, nas interconexões, na transdisciplinaridade, no desafio à transcendência. (VIESSER, 1995, p. 43)

O modelo holístico, que quer dizer totalidade, com a cosmovisão da vida no grande cosmo e exige sempre uma atitude frente a ele. Na consmovisão holística tudo se interliga, interrelaciona e interdepende, pois é uma concepção sistêmica. Por isso, encontram-se nesse paradigma as possibilidades de soluções criativas para os problemas específicos que a atual era acumulada. Nesta concepção, o ser humano não constitui o centro do universo, mas uma das suas partes, uma manifestação dele. Esse desfocamento do antropocentrismo, é um dos sinais de transformação não só nas instituições sociais, dos valores e ideologias dessa cultura, mas indica mudança também na educação, pois esse deslocamento de visão revela que é necessário educar não mais considerando o ser humano e as coisas isolados em si, mas sempre em relação com. Dessa forma, a educação como processo dinâmico e harmônico é tarefa para uma ação comum da escola, superando a crise de comportamento, da desvinculação, do racionalismo, do cientificismo. E o caminho aponta não para uma interdisciplinaridade (associação de disciplinas ou de conteúdos, como possibilidade de chegar à síntese da totalidade do conhecimento) mas para novo enfoque pela transdisciplinaridade (desafio de ir além das próprias disciplinas). Assim, por transdisciplinaridade entende-se uma nova forma de conhecer, explicar, saber, fazer e conceituar, transcendendo métodos e lógicas pela integração da capacidade racional e intuitiva. Logo, a concepção holítica da vida traz à escola e ao Ensino Religioso a transdisciplinaridade que, indo além do enfoque disciplinar, aponta para a totalidade, sem veicular certezas absolutas. Mas, pelo permanente questionamento do real, chegar a uma abordagem aberta, sempre buscando mais e recolocando a vida, a totalidade, no centro das preocupações do ser humano. Atribuímos que a humanização se constrói nas relações que o ser humano estabelece consigo mesmo, com os outros, com o mundo e com o Transcendente.
Essas relações abrangem o paradigma ecológico, onde se permite compreender que um sistema determinado estará sempre imerso em sistemas maiores. Em toda cultura produzida com a tentativa de superação dos limites, está presente o substrato religioso. As expressões e manifestações religiosas estão intimamente ligadas à cultura. O ser humano fala do Transcendente usando uma linguagem mítico-simbólica, isto é, que se expressa através de símbolos e mitos, é o que se percebe na linguagem poética dos textos sagrados, sendo entendido de maneira diversa e, portanto, permitindo múltiplas interpretações. Numa dimensão antropológica, o Ensino Religioso como uma das áreas de conhecimento, favorece a compreensão das diferentes expressões religiosas, possibilitando uma visão global de mundo e de pessoa. Cada área do conhecimento possui eixos norteadores do seu fazer pedagógico, os quais estão relacionados com as concepções de educação, que por sua vez facilitam a compreensão e a razão de ser deste componente curricular. No Ensino Religioso é preciso conhecê-las e caracterizá-las, articulando-as com o objetivo deste ensino.
Relembrando ainda conhecimentos obtidos em aulas de Psicologia do desenvolvimento (Curso de Licenciatura em Ciências da Religião. Faculdade de Educação Teológica do Nordeste-FAETEN), nesse entendimento, integram-se no discurso pedagógico do Ensino Religioso as teorias de Vygotsky, na relação interacionista, cuja ênfase se dá através da compreensão de quem aprende e ensina para a construção do conhecimento histórico cultural, pois nenhuma cultura é insignificante. No desenvolvimento cognitivo abordado por Piaget, encontra-se a evolução do pensamento, a linguagem que possibilita e desenvolve a sensibilidade e a busca de perfeição e nos põe em contato com os outros e com o universo. Na pedagogia libertadora apresentada por Freire (1996), onde acentua a leitura do mundo, a experiência cultural do educando, o ensino religioso aproxima-se desta concepção, visto que, o seu agir pedagógico pressupõe subsidiar o educando para compreender, conhecer e situar-se no mundo, respeitando as experiências pessoais e culturais do ser humano.
Situado o Ensino Religioso na LDBEN n.º 9394/96 que define os princípios e fins da educação Nacional, apresentam-se numa relação com o campo de atuação deste Ensino Religioso, nos incisos:
II ? Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber;
III ? Pluralismo, idéias e de concepções pedagógicas;
IV ? Respeito à liberdade e apreço à tolerância;
IX ? Garantia de padrão de qualidade
Pode-se ampliar esta concepção nas Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental que objetivam orientar as escolas na elaboração de suas ações pedagógicas. Portanto, o Ensino Religioso compõe as áreas de conhecimento para a Base Nacional Comum do Currículo da Educação, estabelecidas na Diretriz IV. Esta área do conhecimento é parte da formação básica do cidadão, alicerça-se nos princípios básicos da cidadania, do entendimento do outro, da formação integral do educando inseridos na I Diretriz, assim sintetizamos que os princípios éticos da autonomia, da responsabilidade, da solidariedade e do respeito ao bem comum farão parte da vida cidadã dos alunos. Para o desenvolvimento deste princípio valorizam-se as experiências religiosas previamente construídas pêlos alunos favorecendo a este a capacidade de vivenciar uma relação emancipada e íntegra com as diferentes culturas, alcançada ao longo de toda a sua escolaridade pelas próprias escolhas assumidas. O princípio da solidariedade e do respeito se faz necessário para combater o individualismo e a competitividade, os quais marcam o mundo em que vivemos; os princípios políticos caracterizam-se pêlos direitos e deveres da cidadania, do exercício da criatividade e do respeito à ordem democrática, serão exercidos na sala de aula, a partir da articulação dos conhecimentos, das discussões, debate e do desenvolvimento, do direito ao diferente que se manifesta nas culturas e tradições; os princípios estéticos da sensibilidade, criatividade e da diversidade de manifestações artísticas e culturais serão desenvolvidos no processo de ensino-aprendizagem, facilitando ao educando a constituição de identidade capaz de acolher, conviver, valorizando e respeitando o outro, justamente naquilo em que sem ser como ele, o desafia para os pontos de convergência, superando preconceitos que desvalorizam qualquer experiência religiosa.
Nesta mesma perspectiva vale lembrar a visão de educação apresentada no capítulo quatro do relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre a Educação para o século XXI de Jacques Delors e citada nos Parâmetros Curriculares Nacionais, (FONAPER, 1998, p. 107) afirmando que a educação durante toda vida baseia-se em quatro pilares: aprender a conhecer, fundamenta-se no prazer de compreender, de conhecer e de descobrir o mundo que o rodeia, vivendo dignamente, para desenvolver as suas capacidades profissionais e para comunicar-se; aprender a fazer, é uma aprendizagem ligada ao aprender a conhecer, o que supõe por em prática os conhecimentos, atuando com competência o exercício pessoal e profissional; aprender a conviver, essa aprendizagem possui vias complementares que no primeiro nível se dá na descoberta progressiva do outro e num segundo nível e ao longo de toda vida a pessoa participa de projetos comuns, eliminando preconceitos, podendo dar lugar a cooperação mútua; aprender a ser, a educação contribui para o desenvolvimento total da pessoa ? corpo e espírito, inteligência, sensibilidade pessoal, espiritualidade. Assim, todo ser humano deve ser preparado para elaborar pensamentos autônomos e críticos, formulando seu próprio juízo de valor para poder decidir, por si mesmo e agir nas diferentes circunstâncias da vida.
Sendo assim, devemos cultivar o propósito de encaminhar o mundo para uma maior compreensão mútua, com mais sentido de responsabilidade e mais solidariedade, na aceitação de nossas diferenças espirituais e culturais. A educação permitindo o acesso de todos ao conhecimento tem um papel bem concreto a desempenhar no cumprimento desta tarefa universal: ajudar a compreender o mundo e o outro a fim de melhor se compreender. Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Religioso (FONAPER, 1998) a função básica da escola é a construção e socialização do conhecimento historicamente produzido e acumulado pela humanidade. Cabe a escola instrumentalizar o educando favorecendo-lhe o desenvolvimento integral, ou seja, contemplando todos os aspectos da pessoa: físico, mental, emocional, intuitivo, espiritual, racional e social. Assim, a escola pode possibilitar condições para aprendizagens múltiplas.

Conhecer significa captar e expressar as dimensões da comunidade de forma cada vez mais ampla e integral. Assim, entendendo a educação escolar como um processo de desenvolvimento global d a consciência e da comunicação entre educador e educando, à escola compete integrar dentro de uma visão de totalidade, os vários níveis de conhecimento: o sensorial, o intuitivo, o afetivo, o racional, o intuitivo e o religioso. (FONAPER, 1998, p. 29)

A escola é um espaço privilegiado de construção de conhecimentos, expansão da criatividade, desenvolvimento da humanização, vivência de valores universais, promoção do diálogo inter-religioso, valorização da vida e educação para a paz. Sendo assim, não pode ignorar a importância da disciplina Ensino Religioso como "parte integrante da formação básica do cidadão". (LDB ? art. 33). Através de uma metodologia que atenda a todos os aspectos ou dimensões do educando, o Ensino Religioso tem em vista o compromisso com a transformação social e histórica diante da vida e do transcendente. E dessa forma, contribui para estabelecer novas relações do ser humano com os outros, com a natureza e com o transcendente. Através da observação, reflexão e informação, sobre o fenômeno religioso presente no contexto social do educando e no mundo, o Ensino Religioso possibilita o diálogo e o respeito na convivência com as diferenças. O Ensino Religioso como disciplina requer um tratamento didático-pedagógico adequado, de acordo com as exigências de todo o ensino escolar.
O objeto de estudo do Ensino Religioso, compreende um conjunto de fatos, acontecimentos, manifestações e expressões, tanto de ordem material como espiritual, que envolve o ser humano na sua busca e relação com o transcendente. Essa busca e relação pode ter caráter individual e comunitário. O fenômeno religioso acontece no universo de uma cultura, é influenciado por ela e por sua vez, também influência a cultura. Tal fenômeno é inerente ao ser humano e tem como pressuposto a transcendência, a qual está na raiz de toda a produção cultural. Por ser parte da vida escolar é um processo de observação, reflexão e informação sobre o fenômeno religioso a partir do contexto social e cultural do educando , na busca de realização enquanto seres humanos, inseridos numa sociedade, onde devem ser reconhecidos e respeitados como cidadãos. Uma abertura ao diálogo inter-religioso, na perspectiva dos valores universais comuns a todas as Tradições Religiosas, tendo por base a alteridade e o direito à liberdade de consciência e opção religiosa.
Dentre os aspectos desenvolvidos pela disciplina Ensino Religioso, ela utiliza diferentes linguagens para o tratamento pedagógico. Seu conteúdo deve ser de modo a facilitar a compreensão dos educandos. Superar preconceitos e discriminação requer lidar com valores como: alteridade, respeito e direito à diferença. Nesse processo, a escola por ser um espaço a-confessional tem uma função importante, pois, nela convivem alunos de crenças, costumes e origens diferentes, com mentalidade, que favorecem o trabalho pedagógico do Ensino Religioso, possuem diversas características, entre elas podemos destacar a: pedagógica, adequada ao universo escolar, capaz de traduzir e decodificar o conteúdo, facilitando a compreensão e assimilação do conhecimento; a dialógica, aberta ao diálogo de forma a atender a pluralidade e promover o compartilhar de informações; a questionadora, que facilite uma reflexão crítica, sem pretender ser a verdade absoluta sobre os assuntos abordados; a cativante, que desperte o interesse pêlos temas e o entusiasmo em aprender; e a otimista que estimule o encantamento pela vida e a disponibilidade em construir um mundo de paz. Numa dimensão antropológica, o Ensino Religioso como uma das áreas de conhecimento, favorece a compreensão das diferentes expressões religiosas, possibilitando uma visão global de mundo e de pessoa. Desta forma na cosmovisão holística tudo se interliga, interlaciona e interdepende, pois é uma concepção sistêmica da vida, isto é, uma visão da totalidade e que exige sempre uma atitude frente a ele (VIESSER, 1995).


4.3 Disciplina e Diálogo Inter-Religioso: uma análise na perspectiva vygotskiana


A questão da indisciplina nas salas de aula é um dos temas que atualmente mais mobilizam professores, técnicos e pais (e, em alguns casos, até os alunos) de diversas escolas brasileiras (públicas e particulares de educação infantil, de 1º ou 2º grau) inseridas em contextos distintos. Entretanto, apesar de ser objeto de crescente preocupação, no meio educacional este assunto é, de um modo geral, superficialmente debatido. Além da falta de clareza e consenso a respeito do significado do termo indisciplina ou disciplina, a maior parte das análises parece expressar as marcas de um discurso fortemente impregnado pêlos dogmas e mitos do senso comum (nem sempre de bom senso). Isto se agrava na medida em que os estudos e pesquisas sobre a indisciplina (natureza, características, identificação de possíveis causas, o papel da escola e da família na produção da indisciplina, a questão da indisciplina na sociedade contemporânea, etc.), além de parciais, ainda são relativamente escassos.
Procuramos fazer uma reflexão, ainda que breve, sobre o assunto inspirado nas teses elaboradas pelo psicólogo russo Lev Semenovich Vygotsky, autor interessado em compreender a gênese do psiquismo humano em seu contexto histórico-cultural. Sem pretender apresentar uma síntese que se faça justiça à complexidade e à abrangência da obra Vygotskiana, nos limitaremos àqueles aspectos que têm especial relevância para a análise do tema em pauta. É importante ressaltar que não é possível encontrar em sua obra referência explícitas à questão da indisciplina. Todavia, e o fato de atribuir em suas teses um lugar central a noção de construção social do sujeito permite que façamos algumas relações com o plano educacional. Mas do que responder as inúmeras questões relacionadas a este complexo tema, os postulados vygotskyanos instigam algumas inquietações, nos levam a formular melhor nossas perguntas, a ampliar nosso olhar sobre o problema, bem como a questionar falsas certezas, já que contribuem para a compreensão das características psicológicas e socioculturais do aluno e de como se dão as relações entre aprendizado, desenvolvimento, ensino e educação.
Embora a questão da constituição humana ainda seja objeto de polêmicas e controvérsias no campo da psicologia, podemos afirmar que, do ponto de vista teórico, (que postulam a existência de características inatas, independentes das influências culturais e que ao enfatizar os fatores externos no processo de desenvolvimento, entende o sujeito como sendo um mero resultado da modelagem e condicionamento social), estão praticamente superadas. A Psicologia contemporânea, apesar de comportar uma pluralidade de enfoques teóricos e uma grande variedade de métodos de investigação sobre o assunto, tende a admitir que as características de cada indivíduo não são dadas a priori, nem tampouco determinadas pelas pressões sociais. Elas vão sendo formadas a partir das inúmeras e constantes interações do indivíduo com o meio, compreendido com contexto físico do social, que inclui as dimensões interpessoal e cultural. Nesse processo dinâmico, ativo e singular, o indivíduo estabelece, desde o seu nascimento e durante toda sua vida, trocas recíprocas com o meio, já que, ao mesmo tempo que internaliza as formas culturais, as transforma e intervém no universo que o cerca.
A teoria histórico-cultural elaborada por Vygotsky, também conhecida como abordagem sócio-interacionista ou sócio-histórica, se insere neste paradigma. Fiel as teses do marxismo dialético, Vygotsky concebe a cultura, a sociedade e o indivíduo com sistemas complexos e dinâmicos, submetidos a ininterruptos e recíprocos processos de desenvolvimento e transformação. Sendo assim, considera fundamental analisar o desenvolvimento humano em seu contexto cultural.
Este princípio originou o seu programa de pesquisa que objetivava

caracterizar os aspectos tipicamente humanos do comportamento e elaborar hipóteses de como estas características se formaram ao longo da história humana e de como se desenvolvem durante a vida de um indivíduo. (VYGOTSKY, apud OLIVEIRA, 1984, p. 21)

Ou melhor, suas teses identificam os mecanismos pelos quais a cultura torna-se parte da natureza de cada indivíduo, buscando a compreensão do ser humano. É por isso que suas teses, apesar de terem sido formuladas há mais de sessenta anos, são externamente contemporâneas, já que Vygotsky não só postula a interação indivíduo-meio mas, principalmente, procura explicar como se dá este processo bidirecional de influências. Esta é talvez a principal razão para o enorme interesse que seus trabalhos vêm despertando entre estudiosos de várias áreas do conhecimento.
Vygotsky se dedicou, dentre outros aspectos, ao estudo das chamadas funções psicológicas superiores, que caracterizam o modo de funcionamento psicológico tipicamente humano, tais como o controle consciente do comportamento, a capacidade de planejamento e previsões, atenção e memória voluntária, pensamento abstrato, raciocínio dedutivo, imaginação, etc. esses processos mentais são considerados superiores e sofisticados porque referem-se a mecanismos intencionais, ações conscientemente controladas, processos voluntários que dão ao indivíduo a possibilidade de independência em relação às características do momento e espaço presente. Segundo Vygotsky, estes processos psicológicos complexos se originam nas relações entre indivíduos humanos e se desenvolvem ao longo do processo de internalização de formas culturais de comportamento. São bastante diferentes, portanto, dos processos psicológicos elementares (presentes na criança pequena e nos animais), tais como: ações reflexas, reações automáticas e associações simples, que são de origem biológica (REGO, 2000).
As características do funcionamento psicológico assim como o comportamento de cada ser humano são, nesta perspectiva, constituídas ao longo da vida do indivíduo através de um processo de interação com o seu meio social, que possibilita a apropriação da cultura elaborada pelas gerações precedentes. Desta forma, em síntese, cada ser humano aprende a ser um homem. O que a natureza lhe dá quando nasce não basta para viver em sociedade. É lhe preciso adquirir o que foi alcançado no discurso do desenvolvimento histórico da sociedade humana. O desenvolvimento individual não visto, portanto, como resultado de uma propriedade ou faculdade primitivamente existente no sujeito ? definidas por razões divinas ou biológicas ? nem como puro reflexo de condicionamentos externos, não é imutável e universal, nem tampouco independente do desenvolvimento histórico e das formas sociais da vida humana. A cultura é, neste paradigma, parte constitutiva da natureza humana, já que a forma das características psicológicas individuais se dão através da internalização dos modos e atividades psíquicas historicamente determinados e culturalmente organizados. Ao mesmo tempo que internaliza o repertório social, o sujeito o modifica e intervém em seu meio. Neste processo bidirecional de influências, o indivíduo é capaz, inclusive, de renovar a própria cultura. É importante sublinhar que a cultura não é, portanto, como algo pronto, um sistema estático ao qual o indivíduo se submete, mas como uma espécie de palco de "negociações", em que seus membros estão num constante movimento de recriação e interpretação de informações, conceitos e significados"
Vygotsky esclarece que

a relação do homem com o mundo não é uma relação direta. São os instrumentos técnicos e os sistemas de signos, construídos historicamente, assim como todos os elementos presentes ao ambiente humano impregnados de significado cultural, que fazem a mediação dos seres humanos entre si e deles com o mundo. (REGO, 2000, p. 52)

A linguagem é um signo mediador por excelência, pois ela carrega em si os conceitos generalizados e elaborados pela cultura humana que permitem a comunicação entre os indivíduos, o estabelecimento de significados comuns aos diferentes membros de um grupo social, a percepção e interpretação dos objetos, eventos e situações do mundo circundante. Ele chama a atenção também para o importante papel mediador exercido por outras pessoas nos processos de formação dos conhecimentos, habilidades de raciocínio e procedimentos comportamentais de cada sujeito. De acordo com este paradigma, o desenvolvimento individual é sempre mediado pelo outro, entendido como outras pessoas do grupo social, que indica, delimita e atribui significados à realidade. É por intermédio dessas mediações que os membros imaturos da espécie humana vão paulatinamente se apropriando, de modo ativo, dos modos de funcionamento psicológico, do comportamento e da cultura, enfim, do patrimônio da história da humanidade e de seu grupo cultural.
Estamos convictos de que esta é uma evidência que se vai impor sempre com maior força no mundo atual, caracterizado como o de nenhuma época anterior pelo contato efetivo das religiões. Quem cristão ou não ? seriamente preocupado pelo religioso e por sua repercussão na humanidade não sentiu alguma vez a urgência de enriquecer a vivência de sua tradição com os contributos das demais? Mais ainda: não somos muitos os que experimentamos que nossa vivência atual já está, de fato, muito mais enriquecida do que geralmente se pensa pelo contato com outras religiões? Pense-se, simplesmente, na influência crescente da espiritualidade oriental sobre nosso modo de rezar ou de acolher a presença de Deus na vida. O diálogo inter-religioso é, assim, decidido e sinceramente real, pois enlaça com essa busca a partir de dentro de cada cultura e tradição religiosa. Então desaparece o espírito de competitividade para exercitar-se somente o de acolhida e oferecimento.
Em síntese, ao internalizar as experiências fornecidas pela cultura, a criança e o adolescente reconstroem individualmente os modos de ação realizados externamente e aprendem a organizar os próprios processos mentais, a controlar e dirigir seu comportamento (autogoverno) e agir neste mundo. O indivíduo, portanto, deixa de se basear em mediadores externos e começa a se apoiar em recursos internalizados (idéias, valores, imagens, representações mentais, conceitos etc.) Conforme podemos notar, o aprendizado é um aspecto imprescindível no desenvolvimento das características psicológicas típicas do ser humano, já que as conquistas individuais: informações, valores, habilidades, atitudes, posturas (por exemplo, mais ou menos indisciplinadas), resultam de um processo compartilhado com pessoas e outros elementos de sua cultura.. diferentemente dos animais que já nascem com o seu comportamento e desenvolvimento programado geneticamente, isto é, suas características estão previstas em seu código genético, o comportamento e desenvolvimento dos membros da espécie humana dependerão não somente de suas disposições orgânicas, mas, principalmente, das inúmeras influências culturais, das aprendizagens e das experiências educativas.
Podemos concluir que, a educação (recebida na família, na escola, e na sociedade de um modo geral) cumpre um papel primordial na constituição dos sujeitos. Apesar de se referir à educação num sentido amplo, a leitura da obra de Vygotsky nos permite identificar, em várias passagens, a atenção especial que dedica à educação escolar. A escola representa o elemento imprescindível para a realização plena dos sujeitos que vivem numa sociedade letrada, já que, neste contexto, as crianças são desafiadas a entender as bases dos sistemas de concepções científicas e a tomar consciência de seus próprios processos mentais. Essas atividades, extremamente importantes e complexas, possibilitam novas formas de pensamento, comportamento, inserção e atuação em seu meio.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Sobre o tema desta monografia, muito há que se indagar, questionar, verificar, refletir, sobre disciplina escolar, na busca de propor ações viáveis para minimizar esse problema, o que constituiu um forte desafio à pesquisadora.
Os conhecimentos e concepções de mundo que o aluno forma em sua história enfatizam a interação aluno/escola, aluno/professor e aluno/aluno, como forma de conceber e reconhecer a importância de construção de uma formação integral. Pensamos que se torna necessário que a escola incorpore os avanços tecnológicos, de modo a utilizá-los para melhorar a qualidade pedagógica e de permanência do aluno na escola, valorizando a inclusão social, bem como a sua postura disciplinar. No momento em que governo, sociedade, escola, trabalharem em parceria com objetivos voltados para que os alunos se desenvolvam como pessoas, tenham sucesso nas aprendizagens escolares e, principalmente, participem como cidadãos de pleno direito num mundo cada vez mais exigente sob todos os aspectos, o Brasil ocupará lugar de destaque no panorama mundial. Assim, o Ensino Transreligioso na escola pública tem condições de implementar o diálogo no centro das preocupações que é de suma importância na busca de uma nova racionalidade marcada pela solidariedade social, pela ética, pela diminuição das desigualdades sociais e pelo respeito às diferenças individuais. O aluno no seu desenvolvimento pessoal e na sua individual consciência ontológica me parece ser o ponto de partida de toda intervenção educativa, em vista de um amanhã sem violência e com atitudes disciplinares em sala de aula.
Mas a humanidade contemporânea vem sofrendo uma crise de fragmentação. Com o avanço tecnológico e o excesso de especialização, nossa sociedade está sem alicerces firmes para superar, de forma tranqüila, essa conjuntura. O resultado cultural dessa ocorrência instituiu uma superficialização dos valores éticos e morais associados à auto-indulgência do corpo. Esta situação acaba estimulando as pessoas a pensarem pouco e consumirem muito. Produzindo, conseqüentemente, uma apologia individualista competitiva, que cria cada vez mais exclusão social e consumo maníaco.
A sociedade moderna está obcecada e ávida pelo novo, perdida em ambigüidades e em discursos desprovidos de sentido e como já foi mencionado no capítulo 3, essa estrutura de sociedade se encontra também na escola pública e na sala de aula. Nesse contexto, busca-se, desesperadamente, algo que possa dar alívio. Porém com todo esse avanço científico e tecnológico, ainda estamos sem respostas para as três grandes perguntas existenciais: De onde viemos? O que somos? Para onde vamos?
Pensamos que quanto mais estudamos e observamos as várias expressões da vida humana, constatamos que tudo está interligado entre si e que nada escapa da trama da vida. Parece que cada coisa criada está em sintonia com um poder superior e que todo ser da natureza, inclusive o ser humano, contudo, especificamente o aluno dentro da proposta apresentada, precisa compreender o seu lugar e o seu valor de modo consciente e de autogoverno e conhecimento, no intuito de chegar a uma disciplina de vida que o liberte. Não é buscando atingir a perfeição, o absoluto, tornando-se semelhante com o que o senso comum idealiza sobre o Criador, que encontraremos o sentido existencial. Mas o verdadeiro sentido existencial poderá surgir quando nos disponibilizamos a nos tornar parceiros do princípio criador, alguém que tem o ofício sagrado com a evolução através do contínuo jogo do construir e do desconstruir, da ordem e do caos, orientados pela busca de harmonia, sentido e paz. Só assim, muito provavelmente, conseguiremos conquistar a realização de nosso ser.
Concluindo, vemos que um número crescente de professores e pedagogos tem manifestado o sentimento de que falta alguma coisa em nossas escolas. A educação não é uma função pública, nem tampouco uma empresa. Lida com pessoas, inseridas em comunidades humanas. Mas esse objetivo não se alcança pela simples transmissão de conhecimentos profissionais. Requer algo mais, mesmo sem saber exatamente o que é. Essa busca é a motivação específica da disciplina que denominamos Ensino Transreligioso, embora por razões históricas no Ocidente, onde se configurou, o termo "religião" provoque até hoje reações muitas vezes negativas de fanatismo ou rejeição.
A experiência transreligiosa acontece no coração do ser humano. Não no sentido simbólico, mas como um espaço sagrado dentro de nós. Envolve a pessoa como um todo, quando esta vive a emoção da presença do Sagrado que a fascina, deslumbra, assusta, aterroriza, aclama e tranqüiliza ou provoca a consciência e a contrição necessária ao seu crescimento interior, sempre na busca de transcender.
É o coração um lugar epistemológico, uma outra fonte de conhecimento, de onde se tem uma outra ótica da realidade que pode gerar uma nova linguagem: a da escuta atenta que abre ao diálogo e à descobertas do outro, verdadeiro exercício da transcendência, que permite subsidiar o professor de Ensino Religioso, compreender e implantar uma proposta para o Ensino Transreligioso que colabore na formação de um aluno cidadão capaz de dialogar na diversidade. Por esse caminho, transcender é educar de modo novo, a partir de novas razões: aquelas que a razão não conhece, mas são descobertas na experiência transreligiosa, na experiência da relação com nós mesmos, com os outros, com o universo, com Deus, acreditamos que, a nossa capacidade de construir uma área do saber que favoreça o diálogo na diversidade, no âmbito escolar, contribui para mostrar o rosto destes tantos "brasis", que possuem o direito de assumir as identidades de nossa gente que, mesmo silenciada por práticas religiosas homogeneizadas, consegue, ao longo da história, manter a herança de suas origens.
Nessa perspectiva, outro aspecto fundamental do trabalho educativo proposto neste trabalho monográfico em prol da disciplina escolar, a ser considerado, é oportunizar a recuperação da interioridade humana, no íntimo do aluno, na superação de experiências alienantes, estimulando e ampliando a visão de mundo e de si mesmo, oportunidade essa que o estudo das Tradições Religiosas e seu pluralismo cultural-religioso nos apresenta através da discussão e analise do posicionamento ético dessas tradições e sua influência no comportamento ético de diferentes sociedades; bem como a reflexão a respeito de uma ética civil, a qual não considera a religião a única condição para que haja ética; na prática social, reconhecendo que essas tradições cumprem um papel social, avaliando e buscando o desvencilhar da compreensão de que a prática social tenha como prerrogativa o ser religioso e no reconhecer da universalidade do direito à vida e do respeito à dignidade de todos os seres humanos, despertando a consciência, aprofundando o juízo crítico, para descobrir possibilidades novas, realistas e ricas de significados que impulsionem o aluno ao encontro consigo mesmo, com os outros e com o grande Outro (transcendental), fonte de todo o Bem e de toda a Verdade, força interior propulsora da realização humana em plenitude, capaz de mover o homem a se auto-superar no compromisso de construir com os outros uma sociedade melhor, pautada na ética, na justiça, na solidariedade e na promoção da dignidade do homem através de valores conscientes e construídos de diálogo, tolerância, respeito e alteridade, por isso, destinado à felicidade, no amor autêntico que é o dom de si mesmo.



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