Ainda que o que se intente através do direito seja a consecução da paz, deve-se empregar a luta como meio de atingi-la. Para tanto, é imprescindível que o direito transcenda, sobreponha-se aos seus teores fundamentalmente ideológicos, lançando mão da espada empunhada pela figura soberana da Justiça, e encarne a concepção supra-ideológica de que ele “não é uma simples idéia, é uma força viva”.

A luta é o elixir amargo que pereniza o direito. Nas estradas íngremes e sinuosas pelas quais trilha, o direito, tanto em seu sentido objetivo quanto em sua acepção subjetiva, encontra situações que buscam usurpar seus efeitos e suas forças. As guerras, as rebeliões e outros flagelos da história dos homens (excetuando-se aqueles que tiveram – e têm tido – intenções inescrupulosas e vis travestidas de motivações nobres e justas) servem perfeitamente para exemplificar que a espada ainda é o artifício no qual se deposita alguma fé para resguardar e reequilibrar a balança.

Há também aqueles que pensam – como Savigny e Puchta - que com o mesmo esforço ínfimo com o qual se forma a linguagem, pode-se formar e sustentar um novo direito. Dá-se por inverídica tal possibilidade – e, portanto, por inválido tal pensamento –, pois para a modificação de um direito existente se faz premente a agressão imediata a interesses privados. Tal pensamento leva à indolência, à inércia, a acreditar que se deve esperar passiva e covardemente por dias melhores, acreditando que tudo será resolvido sem qualquer empenho mais brioso.

Apesar disso, porém, analogamente à formação da linguagem, admite-se que a construção de uma consciência social capaz de promover quaisquer mudanças não é algo que se avulte da noite para o dia, ao contrário, é necessário tempo para que novos preceitos e novos princípios sejam criados, aceitos e uniformizados – muitas vezes de modo inconsciente – no seio de uma sociedade.

Portanto, é a partir dos motivos mais primitivos da luta pelos interesses que o homem chega à luta pela sua conservação moral (talvez o ponto apoteótico da obra de Ihering), daí partindo para a defesa de seus ideais, culminando no interesse (mais que ideal!) de manter e salvaguardar seu direito, que é onde “o homem encontra e defende suas condições de subsistência moral; sem o direito, regride à condição animalesca (...)”.


Pierre Chaves,
14 de dezembro de 2007.