Elaborando uma Resenha

Afinal, o que é uma Resenha?

Resenhar significa fazer uma relação das propriedades de um objeto, enumerar cuidadosamente seus aspectos relevantes, descrever as circunstâncias que o envolvem. Trata-se de um texto informativo, pois o objetivo principal é informar o leitor.

A resenha, como qualquer modalidade de discurso descritivo, nunca pode ser completa e exaustiva, já que são infinitas as propriedades e circunstâncias que envolvem o objeto descrito. O resenhador deve proceder seletivamente, filtrando apenas os aspectos pertinentes do objeto, isto é, apenas aquilo que é funcional em vista de uma intenção previamente definida 1.

De acordo com Santos, Rossi & Jardilino (2000), a resenha é uma síntese ou comentário de livros publicados que se faz em revistas especializadas, jornais, cadernos de pesquisa, material de divulgação, etc. O resumo se limita ao próprio texto e busca condensar as idéias do autor. A resenha apresenta um panorama amplo da obra, estabelecendo uma espécie de diálogo com o autor, com todo o contexto histórico que envolveu o tema, com áreas temáticas de pesquisa, com outros autores e obras sobre o mesmo tema. A leitura de uma resenha põe o leitor em contato com o tema estudado e o ajuda a decidir sobre a leitura em questão.

O que deve constar numa resenha?

Partes Essenciais de uma Resenha

Identificação da Obra:

Autor, título, edição, local, editora, ano, total de páginas resenhadas.

SANTOS, Antonio Raimundo dos. Metodologia científica: a construção do  conhecimento. 7. ed. Rio de Janeiro: DP&A, 1999. 144p. p.55-75

Credenciais do Autor:

Informações gerais sobre o autor

Autoridade no campo científico

Quem fez o estudo?

Quando? Por quê? Onde?

A finalidade de uma resenha é informar ao leitor, de maneira objetiva e cortês, sobre o assunto tratado no livro, evidenciando a contribuição do autor, mostrando novas abordagens , conhecimentos e teorias.

Conhecimento:

Resumo detalhado das idéias principais

De que trata a obra? O que diz?

Possui alguma característica especial?

Como foi abordado o assunto?

Exige conhecimento prévio para entendê-lo?

Conclusões:

O autor faz conclusões? (ou não?)

Onde foram colocadas? (final do livro ou dos capítulos?)

Quais foram?

Quadro de Referências do Autor

Que teoria serviu de embasamento?

Qual o método utilizado?

      Julgamento da obra:

Como se situa o autor em relação:

- às escolas ou correntes científicas,filosóficas, culturais?

- às circunstâncias culturais, sociais, econômicas, históricas etc.?

OBS: A resenha NÃO tem capa!

 

Resenha Crítica

É uma descrição minuciosa que compreende certo número de fatos: é a apresentação do conteúdo de uma obra. Consiste na leitura, no resumo, na crítica e na formulação de um conceito de valor do livro feitos pelo resenhista

  A resenha crítica não deve ser vista ou elaborada mediante um resumo a que se acrescenta, ao final, uma avaliação ou crítica. A postura crítica deve estar presente desde a primeira linha, resultando num texto em que o resumo e a voz crítica do resenhista se interpenetram 2.

     O tom da crítica poderá ser moderado, respeitoso, agressivo, etc.

     Deve ser lembrado que os resenhistas - como os críticos em geral - também se tornam objetos de críticas por parte dos "criticados" (diretores de cinema, escritores, etc.), que revidam os ataques qualificando os "detratores da obra" de "ignorantes" (não compreenderam a obra) e de "impulsionados pela má-fé".

Exemplos de resenhas


     Publicam-se a seguir três resenhas que podem ilustrar melhor as considerações feitas ao longo desta apresentação.

Atwood se perde em panfleto feminista

Marilene Felinto
Da Equipe de Articulistas


     Margaret Atwood, 56, é uma escritora canadense famosa por sua literatura de tom feminista. No Brasil, é mais conhecida pelo romance "A mulher Comestível" (Ed. Globo). Já publicou 25 livros entre poesia, prosa e não-ficção. "A Noiva Ladra" é seu oitavo romance.

     O livro começa com uma página inteira de agradecimentos, procedimento normal em teses acadêmicas, mas não em romances. Lembra também aqueles discursos que autores de cinema fazem depois de receber o Oscar. A escritora agradece desde aos livros sobre guerra, que consultou para construir o "pano de fundo" de seu texto, até a uma parente, Lenore Atwood, de quem tomou emprestada a (original? significativa?) expressão "meleca cerebral".

     Feitos os agradecimentos e dadas as instruções, começam as quase 500 páginas que poderiam, sem qualquer problema, ser reduzidas a 150. Pouparia precioso tempo ao leitor bocejante.

     É a história de três amigas, Tony, Roz e Charis, cinqüentonas que vivem infernizadas pela presença (em "flashback") de outra amiga, Zenia, a noiva ladra, inescrupulosa "femme fatale" que vive roubando os homens das outras.

     Vilã meio inverossímel - ao contrário das demais personagens, construídas com certa solidez -, a antogonista Zenia não se sustenta, sua maldade não convence, sua história não emociona. A narrativa desmorona, portanto, a partir desse defeito central. Zenia funcionaria como superego das outras, imagem do que elas gostariam de ser, mas não conseguiram, reflexo de seus questionamentos internos - eis a leitura mais profunda que se pode fazer desse romance nada surpreendente e muito óbvio no seu propósito.

     Segundo a própria Atwood, o propósito era construir, com Zenia, uma personagem mulher "fora-da-lei", porque "há poucas personagens mulheres fora-da-lei". As intervenções do discurso feminista são claras, panfletárias, disfarçadas de ironia e humor capengas. A personagem Tony, por exemplo, tem nome de homem (é apelido para Antônia) e é professora de história, especialista em guerras e obcecada por elas, assunto de homens: "Historiadores homens acham que ela está invadindo o território deles, e deveria deixar as lanças, flechas, catapultas, fuzis, aviões e bombas em paz".

     Outras alusões feministas parecem colocadas ali para provocar riso, mas soam apenas ingênuas: "Há só uma coisa que eu gostaria que você lembrasse. Sabe essa química que afeta as mulheres quando estão com TPM? Bem, os homens têm essa química o tempo todo". Ou então, a mensagem rabiscada na parede do banheiro: "Herstory Not History", trocadilho que indicaria o machismo explícito na palavra "História", porque em inglês a palavra pode ser desmembrada em duas outras, "his" (dele) e story (estória). A sugestão contida no trocadilho é a de que se altere o "his" para "her" (dela).

     As histórias individuais de cada personagem são o costumeiro amontoado de fatos cotidianos, almoços, jantares, trabalho, casamento e muita "reflexão feminina" sobre a infância, o amor, etc. Tudo isso narrado da forma mais achatada possível, sem maiores sobressaltos, a não ser talvez na descrição do interesse da personagem Tony pelas guerras.

     Mesmo aí, prevalecem as artificiais inserções de fundo histórico, sem pé nem cabeça, no meio do texto ficcional, efeito da pesquisa que a escritora - em tom cerimonioso na página de agradecimentos - se orgulha de ter realizado.

Estadista de mitra


Na melhor bibliografia de João Paulo II até agora, o jornalista Tad Szulc dá ênfase à atuação política do papa

Ivan Ângelo


     Como será visto na História esse contraditório papa João Paulo II, o único não-italiano nos últimos 456 anos? Um conservador ou um progressista? Bom ou mau pastor do imenso rebanho católico? Sobre um ponto não há dúvida: é um hábil articulador da política internacional. Não resolveu as questões pastorais mais angustiantes da Igreja Católica em nosso tempo - a perda de fiéis, a progressiva falta de sacerdotes, a forma de pôr em prática a opção da igreja pelos pobres -; tornou mais dramáticos os conflitos teológicos com os padres e os fiéis por suas posições inflexíveis sobre o sacerdócio da mulher, o planejamento familiar, o aborto, o sexo seguro, a doutrina social, especialmente a Teologia da Libertação, mas por outro lado, foi uma das figuras-chave na desarticulação do socialismo no Leste Europeu, nos anos 80, a partir da sua atuação na crise da Polônia. É uma voz poderosa contra o racismo, a intolerância, o consumismo e todas as formas autodestrutivas da cultura moderna. Isso fará dele um grande papa?

     O livro do jornalista polonês Tad Szulc João Paulo II - Bibliografia (tradução de Antonio Nogueira Machado, Jamari França e Silvia de Souza Costa; Francisco Alves; 472 páginas; 34 reais) toca em todos esses aspectos com profissionalismo e competência. O autor, um ex-correspondente internacional e redator do The New York Times, viajou com o papa, comeu com ele no Vaticano, entrevistou mais de uma centena de pessoas, levou dois anos para escrever esse catatau em uma máquina manual portátil, datilografando com dois dedos. O livro, bastante atual, acompanha a carreira (não propriamente a vida) do personagem até o fim de janeiro de 1995, ano em que foi publicado. É um livro de correspondente internacional, com o viés da política internacional. Szulc não é literariamente refinado como seus colegas Gay Talese ou Tom Wolfe, usa com freqüência aqueles ganchos e frases de efeito que adornam o estilo jornalístico, porém persegue seu objetivo como um míssil e atinge o alvo.

     Em meio à política, pode-se vislumbrar o homem Karol Wojtyla, teimoso, autoritário, absolutista de discurso democrático, alguém que acha que tem uma missão e não quer dividi-la, que é contra o "moderno" na moral, que prefere perder a transigir, mas é gentil, caloroso, fraterno, alegre, franco ... Szulc, entretanto, só faz o esboço, não pinta o retrato. Temos, então, de aceitar a sua opinião: "É difícil não gostar dele".

     Opus Dei - O livro começa descrevendo a personalidade de João Paulo II, faz um bom resumo da História da Polônia e sua opção pelo Ocidente e pela Igreja Católica Romana (em vez da Ortodoxa Grega, que dominava os vizinhos do Leste), fala da relação mística de Wojtyla com o sofrimento, descreve sus brilhante carreira intelectual e religiosa, volta à sua infância, aos seus tempos de goleiro no time do ginásio ""um mau goleiro", dirá mais tarde um amigo), localiza aí sua simpatia pelos judeus, conta que ele decidiu ser padre em meio ao sofrimento pela morte do pai, destaca a complacência de Pio XII com o nazismo, a ajuda à Opus Dei (a quem depois João Paulo II daria todo o apoio), demora-se demais nos meandros da política do bispo e cardeal Wojtyla, cresce jornalisticamente no capítulo sobre a eleição desse primeiro papa polonês, mostra como ele reorganizou a Igreja, discute suas posições conservadoras sobre a Teologia da Libertação e as comunidades eclesiais de base, CEBs, na América latina, descreve sua decisiva atuação na política do Leste Europeu, a derrocada do comunismo, e termina com sus luta atual contra o demônio pós-comunista. Agora o demônio, o perigo mortal para a humanidade, é o capitalismo selvagem e o "imperialismo contraceptivo" dos EUA e da ONU.

     Szulc, o escritor-míssil, não se desvia do seu alvo nem quando vê um assunto saboroso como a Cúria do Vaticano, que diz estar cheia de puxa-sacos e fofoqueiros com computadores, nos quais contabilizam trocas de favores, agrados, faltas e rumores. O sutil jornalista Gay Talese não perderia um prato desses.

     Entretanto, Szulc está sempre atento às ações políticas do papa. Nota que João Paulo II elevou a Opus Dei à prelatura pessoal enquanto expurgou a Companhia de Jesus por seu apoio à Teologia da Libertação; ajudou a Opus Dei a se estabelecer na Polônia, beatificou rapidamente seu criador, monsenhor Escrivã. Como um militar brasileiro dos anos 60, cassou o direito de ensinar dos padres Küng, Pohier e Curran, silenciou os teólogos Schillebeeckx (belga), Boff (brasileiro), Häring (alemão) e Gutiérrez (peruano), reduziu o espaço pastoral de dom Arns (brasileiro). Em contrapartida, apoiou decididamente o sindicato clandestino polonês, a Solidariedade. Fez dobradinha com o general dirigente polonês Jaruzelski contra Brejnev, abrindo o primeiro país socialista, que abriu o resto. O próprio Gorbachev reconhece: "Tudo o que aconteceu no Leste Europeu nesses últimos anos teria sido impossível sem a presença deste papa".

     Talvez seja assim também com relação ao que acontece com as religiões cristãs no nosso continente. Tad Szulc, com cautela, alerta para a penetração, na América Latina, dos evangélicos e pentecostais, que o próprio Vaticano chama de "seitas arrebatadoras". A participação comunitária e o autogoverno religioso que existia nas CEBs motivavam mais a população. Talvez seja. Acrescentando-se a isso o lado litúrgico dos evangélicos que satisfaz o desejo dos fiéis de serem atores no drama místico, não tanto espectadores, tem-se uma tese.

     O perfil desenhado por Szulc é o de um político profundamente religioso. Um homem que reza sete horas por dia, com os olhos firmemente fechados, devoto de Nossa Senhora de Fátima e do mártir polonês São Estanislau e que acredita no martírio e na dor pessoais para alcançar a graça.

Um gramático contra a gramática

Gilberto Scarton


     Língua e Liberdade: por uma nova concepção da língua materna e seu ensino (L&PM, 1995, 112 páginas) do gramático Celso Pedro Luft traz um conjunto de idéias que subverte a ordem estabelecida no ensino da língua materna, por combater, veemente, o ensino da gramática em sala de aula.

     Nos 6 pequenos capítulos que integram a obra, o gramático bate, intencionalmente, sempre na mesma tecla - uma variação sobre o mesmo tema: a maneira tradicional e errada de ensinar a língua materna, as noções falsas de língua e gramática, a obsessão gramaticalista, inutilidade do ensino da teoria gramatical, a visão distorcida de que se ensinar a língua é se ensinar a escrever certo, o esquecimento a que se relega a prática lingüística, a postura prescritiva, purista e alienada - tão comum nas "aulas de português".

     O velho pesquisador apaixonado pelos problemas da língua, teórico de espírito lúcido e de larga formação lingüística e professor de longa experiência leva o leitor a discernir com rigor gramática e comunicação: gramática natural e gramática artificial; gramática tradicional e lingüística; o relativismo e o absolutismo gramatical; o saber dos falantes e o saber dos gramáticos, dos lingüistas, dos professores; o ensino útil, do ensino inútil; o essencial, do irrelevante.

     Essa fundamentação lingüística de que lança mão - traduzida de forma simples com fim de difundir assunto tão especializado para o público em geral - sustenta a tese do Mestre, e o leitor facilmente se convence de que aprender uma língua não é tão complicado como faz ver o ensino gramaticalista tradicional. É, antes de tudo, um fato natural, imanente ao ser humano; um processos espontâneo, automático, natural, inevitável, como crescer. Consciente desse poder intrínseco, dessa propensão inata pela linguagem, liberto de preconceitos e do artificialismo do ensino definitório, nomenclaturista e alienante, o aluno poderá ter a palavra, para desenvolver seu espírito crítico e para falar por si.

     Embora Língua e Liberdade do professor Celso Pedro Luft não seja tão original quanto pareça ser para o grande público (pois as mesmas concepções aparecem em muitos teóricos ao longo da história), tem o mérito de reunir, numa mesma obra, convincente fundamentação que lhe sustenta a tese e atenua o choque que os leitores - vítimas do ensino tradicional - e os professores de português - teóricos, gramatiqueiros, puristas - têm ao se depararem com uma obra de um autor de gramáticas que escreve contra a gramática na sala de aula.

AUDREY DANEZI GARCIA – ACADÊMICA DE DIREITO – 4º PERÍODO

1 Universidade Severino Sombra – Central de Estágios de Licenciatura e Bacharelado (CELBS)

2 Como elaborar uma resenha – trecho e exemplos extraídos do Guia de Redação da PUCRS- site: http://www.pucrs.br/gpt/resenha.php - 05/05/2009