ELABORAÇÃO DE CONTRATOS MÉDICOS:
DIFERENTES RAMOS JURÍDICOS ENVOLVIDOS

EDUARDO BRUNO SANTANA TEIXEIRA
DIRCE BORDINHON LEMES
GERALDO AUGUSTO ALVES ROSA
MICHELLE CÁRITA SILVA
NATHÁLIA LEÃO SANTOS OLIVEIRA
WANESSA MARIA DE LIMA NERES

Este trabalho tem como tema principal a elaboração de contratos, mais especificamente os diferentes ramos jurídicos envolvidos na elaboração de contratos, que dizem respeito à serviços médicos.
Hoje é praticamente ponto pacífico que a relação que se forma entre médico e paciente é uma relação contratual. Configura-se como um contrato de prestação de serviços.
O contrato civil de prestação de serviços pode ser conceituado como aquele em que uma das partes se obriga para com a outra a fornecer-lhe a prestação de sua atividade, mediante remuneração (PEREIRA, 2003).
Já pela definição dada pelo Código de Defesa do Consumidor a prestação de serviços (artigo 3º, Lei 8.078/90) é toda aquela destinada ao consumidor, definido no artigo 2º do mesmo diploma legal, qualquer pessoa que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Explica César Fiúza (2003) que prestação de serviço é contrato consensual, bastando o acordo de vontades para que se repute celebrada. Decorre daí que sua forma é livre, podendo ser escrita, verbal, mímica, ou mesmo tácita.
Seus caracteres jurídicos são: a) bilateralidade, porque gera obrigações para ambos os contratantes, a remuneração para o empregador, a prestação de atividade para o empregado; b) onerosidade, porque dá origem a benefícios ou vantagens para um e outro contratante: c) consensualidade, uma vez que se considera perfeito mediante o simples acordo de vontades, independentemente de qualquer materialidade externa (PEREIRA, 2003).
César Fiúza (2003) acrescenta ainda:
? típico, porque tipificado no Código Civil;
? puro, visto que não é produto da fusão de duas ou mais outras espécies de contratos;
? pré-estimado, uma vez que, tanto a prestação de uma das partes, quanto a contraprestação da outra, são de antemão conhecidas;
? de execução diferida ou sucessiva, dependendo de como se execute. Se contrato bombeiro para fazer a manutenção do encanamento de edifício, a fim de que a cada vez que realizar serviço receba sua remuneração, a execução será diferida, por ter sido o contrato celebrado num momento e executado em outro.

No que tange aos serviços médicos o contrato de prestação desta forma de serviço inicia-se conforme explica a professora Maria Helena Diniz: "o médico que atende a um chamado determina desde logo o nascimento de um contrato com o doente ou com a pessoa que o chamou em benefício do enfermo". (sem grifo no original)
O tratamento jurídico da responsabilidade do médico é sempre de caráter contratual, ou seja, produz efeitos jurídicos civis, e muito raramente pode-se admitir que a responsabilidade deriva do ato ilícito, portanto originando-se como reflexo da responsabilidade penal. Assim, qualquer tratamento ou consulta médica revela-se em um contrato, não escrito, entre o médico e seu paciente, onde este se compromete a utilizar os meios de sua ciência para obter uma cura ou redução no sofrimento do doente, ou ainda, tomar medidas preventivas com o objetivo de manter a saúde do seu paciente.
Em face do exposto, o objetivo principal deste trabalho é determinar quais os diferentes ramos jurídicos utilizado na elaboração de contratos médicos. Para tanto foram traçados os seguintes objetivos específicos: analisar o princípio da boa-fé objetiva; levantar as cláusulas contratuais e identificar as áreas jurídicas correlatas; definir contrato médico e identificar em que situações serão utilizados.
Todo o médico deve ter uma consciência limpa, desenvolvendo o bem pensar, o bem-querer e o bem fazer (benevolência e beneficência), para uma correta conduta baseada na boa fé, na honestidade e na humildade. O médico deve ser competente, baseado na experiência e na cultura, que deve sempre aumentar e atualizar, fazendo parte dessa competência o sentido das suas limitações para que possa pedir ajuda a colegas quando essas limitações são excedidas.
Acontece que em razão de motivos diversos muitos pacientes deixam de formalizar tal relacionamento, o que em caso de lesão a direito o paciente não tem como respaldar-se legalmente para reaver valores pagos, serviços mal realizados ou, se for o caso, pagamento indenizatório.
Estabelece-se alguns deveres ao prestador de serviços, dos quais destacam-se: a prestação da atividade deve ser realizada pessoalmente por quem assumiu a obrigação, salvo se as partes tiverem ajustado de forma diversa; o dever de esclarecimento (Aufklarungspflicht, em alemão e obligation de renseignements, em francês) obriga o fornecedor do serviço, sobre a forma de utilização; o dever de aconselhamento (Beratungspflicht, em alemão e obligation de conseil, em francês) é um dever mais forte e só existe nas relações entre um profissional, especialista, e um não especialista.
Cumprir ou não o dever de aconselhamento significa fornecer aquelas informações necessárias para que o consumidor possa escolher entre os vários caminhos a seguir (por exemplo: diferentes tipos de planos, diferentes carências, diferentes exclusões etc.) (FIUZA, 2003).
Termos de consentimento escritos e personalizados devem ser utilizados, tomando-se o cuidado adicional de não recorrer a excesso de tecnicismo ou economia de informações.
O médico tem o dever de esclarecer ao paciente o funcionamento do tratamento a ser empregado, conforme disposto no art. 46 do Código de Ética Médica: "É vedado ao médico: Efetuar qualquer procedimento médico sem o esclarecimento e o consentimento prévios do paciente ou de seu responsável legal, salvo iminente perigo de vida".
E por tratar-se de obrigação de fazer exige-se como requisito objetivo que atividade contratada seja lícita, não vedada pela Lei e pelos bons costumes, oriunda da energia humana, podendo ser física ou intelectual.
Importante ressaltar que são elementos para a contratação de prestação de serviço: o preço, o prazo, as obrigações do prestador, as obrigações do tomador - Resumem-se em duas, ou seja, remunerar o serviço contratado na forma, tempo e local combinados, e prover todos os meios necessários no sentido de facilitar a prestação do prestador, determinação acerca da extinção do contrato.
Ocorrendo qualquer forma de lesão a direito, é interessante esclarecer que, devido ao disposto no artigo 27 do Código do Consumidor, o paciente tem cinco anos para ajuizar uma ação de indenização contra o médico visando o ressarcimento de eventual dano por este último causado.
Após tecer comentários acerca dos requisitos e conseqüências do contrato de serviços, especificando, quando possível, o contrato de serviços médicos, passa-se agora a analisar um dos mais importantes princípios para a elaboração de qualquer contrato, o princípio da boa-fé.
O princípio da boa-fé objetiva é, portanto, um princípio limitador do princípio da autonomia da vontade e um elemento criador de novos deveres contratuais, que deve contar, para sua maior efetividade, com sua previsão legal específica.
Trata-se de importante princípio, pois em virtude da delicada relação existente entre médico e paciente este deve ser sempre observado para que não ocorra abusos, principalmente contra o consumidor, pois quando se tem uma doença grave e se exige uma quantia exagerada pelo tratamento o paciente corre o risco de aceitar um contato excessivamente oneroso, pois a vida é o bem maior do ser humano.
Há de se destacar a função integrativa do princípio da boa-fé objetiva, porque, às vezes, os contratantes, ao redigirem o contrato, por omissão, deixam de prever alguma cláusula que poderá interferir no desenvolvimento contratual desejado pela lei e pela real vontade das mesmas partes. Assim, a função do princípio da boa-fé objetiva, nessa hipótese, é acrescentar o que não consta expressamente do contrato, suprindo as falhas contratuais, inclusive atentando-se ao fato de que "nem sempre a vontade por si só é capaz de prever todas as possibilidades do negócio".
Assim, a boa-fé nas relações contratuais, diga-se, é invocada, entre outros motivos: para impor deveres acessórios às partes contratantes; para proteger a parte economicamente mais fraca; contra a lesão contratual e para a revisão dos contratos (teoria da imprevisão).
Outros direitos arbitrados pela lei em favor do consumidor, são de natureza processual, e estão encaminhados a facilitar a defesa de seus direitos, inclusive com a possibilidade de propor a ação de responsabilidade no domicílio do autor, conforme artigo 101 do CDC, e a inversão a seu favor do ônus da prova no processo civil, se a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando o consumidor for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências, conforme artigo 6, VII do CDC.
Em razão do disposto anteriormente, este trabalho justifica-se pela necessidade de esclarecer médicos e pacientes da necessidade de efetivação de uma relação contratual entre as partes, afim de preservar direitos e deveres de ambos, e ainda, baseado na boa-fé objetiva de se preservar aparte mais fraca desta relação, o paciente, contra abusos de diferentes origens, bem como a responsabilização do profissional em caso de erro por ele causado.













REFERENCIAL TEÓRICO


Silvio de Salvo Venosa (2006) define o contrato de prestação de serviço, conhecido como locatio conductio operarum, como o contrato onde um sujeito coloca à disposição de outrem, durante certo tempo, seus próprios serviços, em troca de retribuição. O qual vem disciplinado pelo Código Civil nos arts. 593 a 609. Explica que o objeto deste estudo no campo civil é reservado aos negócios residuais, prestações de serviços não atingidas pela legislação trabalhista ou estatutária, que ainda permanecem regulados pelo ordenamento civil (art. 593). O alcance desta forma de contrato são os chamados serviços gerais nos usos trabalhistas (art. 601) que tem natureza eventual e esporádica, embora esse não seja um critério absoluto de distinção.
No tocante à boa-fé objetivo, princípio geral do contrato o autor afirma que o atual Código constitui um sistema aberto, predominando o exame do caso concreto na área contratual; e que existem três funções nítidas no conceito de boa-fé objetiva: função interpretativa (art. 113); função de controle dos limites do exercício de um direito (art. 187); e função de integração do negócio jurídico (art. 421).
O professor Silvio Rodrigues explica que a boa?fé consiste é um conceito ético, moldado nas idéias de proceder com correção, com dignidade, pautando sua atitude pelos princípios de honestidade, da boa intenção e no propósito de a ninguém prejudicar.
Em relação ao contrato de serviços médicos,a boa-fé torna-se elemento importante em virtude de a maioria destes contratos serem realizados em momentos em que a parte contratante encontra-se debilitada psicologicamente e às vezes fisicamente, tornando complicada a análise dos diferentes pontos tratados no contrato.
O professor da Universidade Católica de Santos, Eduardo Dietrich e Trigueiros em artigo escrito para o site DoutorSAC, fala a respeito das relações médico-pacientes e o Código de Defesa do Consumidor, inicialmente afirmando que ainda muitas vezes essas relações ficam na informalidade:
por conta da admiração secular aos profissionais da medicina, por vezes, as partes não se preocupam em enquadrar sua relação jurídica aos termos da lei. Esquecem-se, em nome do continuísmo da tradição, que, em realidade, é cristalina a relação de consumo existente entre si. Médico e paciente ignoram, em muitos casos, destarte, que se deve, necessariamente, obedecer a certas regras, que são diuturnamente desrespeitadas, não obstante o flagrante caráter consumeirista desse tipo de prestação de serviço, às escâncaras reiterado a cada consulta abreviada e mais comprometida com o manual de cobertura a normativa dos planos de saúde.

Explica ainda alguns casos de desrespeito aos direitos do consumidor, que demonstram a necessidade da formação de um contrato de prestação de serviços pautado na boa-fé e que deve ser efetivamente cumprido:
Um bom exemplo do desrespeito aos mais basilares princípios de Direito do Consumidor reinante nessas relações médico-paciente é o da ausência de um prévio orçamento para a prestação dos serviços médicos. É comum que o paciente recorra a um hospital ou consultório e só se tome conhecimento da dimensão da fatura de seu tratamento após a efetivação do serviço, em franco desrespeito ao que preceitua o artigo 40, do Código de Defesa do Consumidor, que é expresso ao dispor que "o fornecedor de serviço será obrigado a entregar ao consumidor orçamento prévio discriminando o valor da mão-de-obra dos materiais e equipamentos a serem empregados, as condições de pagamento bem como as datas de início e término dos serviços".
Outro exemplo importante é o dos pacientes que se submetem a uma cirurgia em hospital ou clínica. Invariavelmente, após a cirurgia, materializa-se a conta do anestesista, que, em muitos casos, causa espanto ao combalido consumidor, que de nada foi informado adequadamente. É que o anestesista não integra a equipe médica. É à parte. Esse exemplo aponta para a necessidade de prévia e detalhada informação ao consumidor/paciente, para que não se incorra em novo desrespeito à norma do parágrafo 3º do mesmo artigo de lei já citado, que dispõe: "o consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços de terceiros, não previstos no orçamento prévio". Nesse caso, não só não se apresentou prévio orçamento, como ainda se incluiu item não previsto contratualmente.
Mas há casos ainda mais agudos de desrespeito à lei. O dever de informação do prestador de serviços, previsto no artigo 6º, II, da lei 8.078/90, é objeto de questionamento ético constante, mormente quanto à questão da necessidade de se esclarecer ao paciente acerca de sua real condição de saúde versus a práxis centenária de poupá-lo do impacto de uma má notícia.

Laila Marchi Barreto e Larissa Marques Vaz Santana em trabalho publicado na Revista Eletrônica Mensal da Universidade de Direito da UNIFACS abordam o contrato médico como uma relação de consumo, tratando temas basilares como a definição de consumidor e prestador de serviços e determinando as diferentes formas de responsabilização do médico. Trazendo importante posicionamento de Antônio Ferreira Couto Filho e Alex Pereira Souza, sobre a relação médico paciente:
A relação médico/paciente não pode ser considerada mera relação de consumo. É preciso que se faça uma reflexão de transcendental importância de que o serviço de saúde é sui generis, posto que possui uma função social ímpar, incomparável com qualquer outra.
A vida e a saúde não são bens de consumo, não podendo ser comparadas a um produto qualquer. Também não podem ser vistas como serviços prestados oriundos da relação médico/paciente, até porque desta relação não são oferecidos bens de consumo.

Maria Helena Diniz (2003) define a prestação de serviços da seguinte maneira: Se relativa a uma prestação de serviço economicamente apreciável, considerada em si mesma, independente do resultado.






BIBLIOGRAFIA


BARRETO, Laila Marchi; SANTANA, Larissa Marques Vaz. Um olhar sobre erro médico diante da relação de consumo. Disponível em: http://www.unifacs.br/revistajuridica/edicao_fevereiro2004/discente/disc11.doc. Acesso em: 19 de março de 2008, 12:45.

CAMPOS, Roberto Augusto de Carvalho; CAMARGO, Rosmari Aparecida Elias. O direito do consumidor e as cirurgias e procedimentos estéticos. Panóptica, Vitória, ano 1, n. 7, mar. ? abr., 2007, p. 176-179. Disponível em: <http://www.panoptica.org>.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro - Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. 22. ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2006.

FERNANDES, Beatriz. O médico e seus direitos: como lidar com situações de impasse no dia-a-dia. São Paulo : Nobel, 2000.

FIUZA, César. Direito Civil, Curso Completo. 6 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

GÓMEZ, J. Miguel Lobato. A aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao contrato de serviços médicos e à responsabilidade civil dele decorrente . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 387, 29 jul. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5507>. Acesso em: 19 de março de 2008, 11:45.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Contratos e atos unilaterais. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 3. ed. rev., atual, e ampl. São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1998.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil: Teoria geral das obrigações. 20 ed. v. II Rio de Janeiro: Forense, 2003.

RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil: Responsabilidade civil. 19 ed. v. 4. São Paulo: Saraiva, 2002.


TRIGUEIROS, Eduardo Dietrich e. As relações médico-paciente à luz do código brasileiro de defesa do consumidor. Disponível em: http://www.doctorsac.com.br/Artigo10.htm. Acesso em: 19 de março de 2008, 12:21
.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: contratos em espécies, 4ª ed., volume III, São Paulo:Atlas S.A., 2004.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. 6 ed. São Paulo: Editora Saraiva. 2006.