Existem coisas que ainda não digeri sobre os acontecimentos no Egito. Posso estar profundamente enganado, mas penso bem diferente do que a maioria dos meios de comunicação tanto propaga sobre o assunto.
Primeiramente, desde o início os manifestantes, segundo os jornais, estão nas ruas "em defesa de uma democracia". Você se lembra de algum governo que foi derrubado apenas com este discurso? Bom, eu não! A questão do modelo político de uma sociedade é tão teórico que o povo, na prática, não vê sentido. Jamais ouvi dizer sobre qualquer revolta de caráter nacional que não tivesse mergulhada em problemas sócio-econômicos.
A renda média mensal do trabalhador no Egito é equivalente a R$ 86. Quase metade dos egípcios sobrevive com até US$ 2 por dia. A taxa de desemprego é de cerca de 10% (quase o dobro da brasileira). Este quadro não é novo e o país vive um histórico recente de protestos e greves. De 2004 a 2008, foram mais de 1.900.
É natural que os egípcios começassem a pensar em mudanças. Assim como no futebol, na política "time que ganha não se mexe" e "time que perde tem que mudar". Sim, é bem simplista mesmo! Para vencer as dificuldades sócio-econômicas, o Egito exigiu novos ares na política.
O ex-líder Hosni Mubarak não caiu porque era um ditador, e sim porque falhou na tarefa estatal de proporcionar o básico para a sua população. Não obstante, a versão dos jornalistas certamente "vende" uma história bem mais confortante.
Outra coisa que me causa bastante incômodo é a referência aos acontecimentos no Egito como uma "revolução". Quem o diz desconhece a situação no país ou o conceito. Como ensina o professor do Departamento de Oriente Médio da Universidade de Haifa, Israel ? Uri Kupferschmidt -, só há revolução quando há substituição de uma filosofia social-econômica (acrescento, política) por outra. E no Egito, não há ninguém sugerindo um novo caminho, algo que substitua o status quo atual.
Depois da queda da monarquia, em 1952, três militares governaram o Egito, incluindo Mubarak. Hoje, pode-se dizer que o Egito é um país altamente militarizado, o maior dos árabes e um dos maiores do mundo. A ausência de lideranças civis e a simbiose Exército-Estado dão poucas esperanças de que os militares sairão de cena. Hoje (13/02) já chega a notícia de que eles fecharam o parlamento. A ajuda norte-americana, que gira entre 2 a 3 bilhões de dólares anuais, deixa poucas dúvidas que possa surgir um governo anti-americano (e este não era o discurso popular). Com as particularidades dos muçulmanos egípcios (só como exemplos: são sunitas e não têm um "Khomeini" aguardando a entrada triunfal no país, etc), diria que a possibilidade de uma revolução islâmica, nos moldes da iraniana em 1979, é praticamente nula. Isto não passa de um discurso ocidental para o apoio de um "mal menor". A Irmandade muçulmana poderá ter voz num novo regime, mas jamais terá a primazia.
A verdade é que Mubarak se foi, mas o regime ainda é o mesmo.