EDUCAÇÃO E CIDADANIA: O PAPEL DO PROFESSOR NA FORMAÇÃO DO EDUCANDO ENQUANTO SUJEITO CRÍTICO E AGENTE DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL

Daniele Correia de Amorim Silva

 

RESUMO:

A Educação, ao longo de sua história, foi colocada a serviço da classe dominante como instrumento de reprodução dos interesses, valores, concepções que visavam manter a ordem vigente. Em contraposição a educação reprodutora das desigualdades sociais temos a educação libertadora voltada para a cidadania, onde os indivíduos se percebem na realidade a qual estão inseridos e buscam transformar e superar sua condição de oprimido pelo sistema a partir de uma visão crítica da realidade social. A educação cidadã tem como princípio igualdade de acesso para todos, de maneira que promova a democracia e a emancipação humana. Nesse sentido, o presente trabalho traz uma breve discussão sobre a importância da educação voltada para a cidadania e do papel do professor enquanto agente facilitador neste processo. Inicialmente será pontuada a função social da escola considerando os aspectos sociais, políticos e econômicos os quais são determinantes no desenvolvimento da educação seja para reproduzir desigualdades ou para promover cidadania e emancipação. Na segunda parte do trabalho o texto coloca em foco o papel do professor no processo de ensino-aprendizagem e de sua importância enquanto elo fundamental entre o educando e o conhecimento. Com isso, cabe ao professor repensar concepções, planejamento, prática, relação professor-aluno e mais que todos estes fatores essenciais no cotidiano escolar, faz-se necessário que o professor tenham compromisso com os seus alunos e seja ciente que suas ações podem ser determinantes para o desenvolvimento dos mesmos. Por fim, o artigo aponta para as possibilidades de termos a escola como ambiente de transformação, que promove a reflexão da realidade, que prepara os seus alunos para a prática social através da interdisciplinaridade dos conteúdos abordados no cotidiano escolar articulados com as experiências de mundo dos educandos.

Palavras-chaves: educação; cidadania; prática pedagógica; transformação social.

  1. INTRODUÇÃO:

 

Nos dias atuais podemos perceber que existem inúmeras diferenças entre os indivíduos, e isso pode ser constatado através da nossa sociedade capitalista, na qual é visível as desigualdades sócio-culturais e econômicas.

É imprescindível ressaltar que é nessa sociedade repleta de desigualdades que está inserida a escola, sendo a mesma tida na maioria das vezes com um instrumento de reprodução dessas desigualdades. Dessa forma, podemos observar que com o passar do tempo a escola vem desempenhando um papel socializador, pois, é um espaço onde crianças e adolescentes de diferentes classes sociais interagem num processo de permanente construção de conhecimento. Nesse sentido,

A instituição escolar tem, portanto, por função repassar, organizar o saber e viabilizar a todos os membros de uma sociedade o acesso aos instrumentos de produção cultural, científica e política da sociedade em que esses indivíduos vivem.(RODRIGUES,1988, p. 83)

Cabe a Escola, enquanto espaço socializador e gerador de conhecimento, a responsabilidade de construir no cotidiano escolar espaços de reflexão e de conexão entre os conteúdos ministrados e a realidade econômica, social, política e cultural onde estamos inseridos. Com isso há uma necessidade de se renovar a prática pedagógica, a qual implica um novo modo de enfocar o processo educativo, de modo transitório na medida em que muda e se diferencia em função dos diferentes grupos sociais e das diferentes experiências de vida que circulam na escola, sem no entanto, alterar o permanente e essencial na educação escolar e que se constitui como meta: dotar os educandos de instrumentos de análise, compreensão, inserção no mundo e participação no mundo cultural, político e de produção econômica.

Pelo fato de que a escola produz essa competência técnica e política, através dos atos pedagógicos relativos ao ensino e ao desenvolvimento intelectual e políticos dos educandos pela posse do saber universal, ela deve ter como alvo e objetivo central o desenvolvimento dessa competência em todos os educandos. (RODRIGUES, 1987, p.12)

Essa função social e política se determina no seu papel de formadora do indivíduo para o exercício da cidadania, e compreende a sua formação cultural, intelectual, política e profissional. Para que essa formação seja alcançada, todos os atos escolares precisam se revestir de significação, exigindo da escola um novo modo de encarar a questão pedagógica, desde o aspecto administrativo até o planejamento curricular e o modo de executar a tarefa do ensino. Para isso há de se buscar novas formas de trabalho na escola, superando os individualismos, as competições internas e a estrutura de poder hoje montada, que reflete a cultura ditatorial enraizada na consciência dos educadores.

É necessário o resgate da tarefa originária da pedagogia, o ensino, ou seja, a condução pelos caminhos de aquisição e da produção do saber. Em nome do ensino assumido na estigmatização metodológica, enquanto simples transmissão de saberes cristalizados entendidos como prontos e acabados, a atividade pedagógica tem perdido a dimensão do ato pedagógico enquanto aquele ato que conserva-transformando o conhecimento e a experiência do mundo do educando, e que faz germinar, do que ele conhece, o novo que ele ainda desconhece.

O que se torna indispensável é fazer da ação educativa um processo suficientemente consciente, de tal modo que eleve o nível de consciência das classes populares para o seu papel histórico na luta pela transformação da sociedade, e que, nessa luta, elas não se encontrem despidas das armas e do conhecimento do terreno onde essa luta se dá na história. Por isso, a renovação da prática pedagógica não se resume unicamente a reformular técnicas de ensino ou currículos e programas, mas também a uma nova visão do método de trabalho da escola, em função do papel político a ser desempenhado pela educação. (RODRIGUES, 1987, p.19)

            Há de se instaurar uma prática pedagógica que tenha seu ponto de partida na experiência vivida pelo educando. É a sua experiência que revela o que ele vive e, a partir de sua fala sobre a vida, instaura-se a direção do ensino, possibilitando ao educador construir junto com o educando o conhecimento de formação de consciência, o desenvolvimento da competência de analisar criticamente o mundo, a história, a ciência, a cultura, o processo de trabalho.  

            Somente a compreensão dessa dimensão da tarefa educativa da escola, nos seus diversos graus, poderá induzir a sociedade inteira, dos pais aos mestres, dos dirigentes educacionais aos intelectuais, dos líderes políticos locais aos líderes nacionais, a compreender o lugar que é reservado à educação escolar, hoje na formação do cidadão consciente e participativo. E que, para isso, a escola tem de cumprir com competência a sua função social e política. E esse comprometimento não se fará pelo isolamento de suas ações, nem pelo esfacelamento de seu trabalho, mas pela articulação de toda ação educativa.

  1. Desenvolvimento

Dentre as várias leituras que foram feitas sobre o processo educacional, vimos que existem inúmeras questões tratadas por diversos autores, contudo, buscamos fazer referências no que diz respeito à função social da escola, a escola que necessitamos: voltada à educação cidadã, papel do professor no processo de ensino-aprendizagem e a escola enquanto ambiente de transformação, uma vez que tais questões vão subsidiar a nossa prática pedagógica.

2.1. Educação e Cidadania

            O conceito de cidadania tem origem na Grécia clássica, sendo usado então para designar os direitos relativos ao cidadão, ou seja, o indivíduo que vivia na cidade e ali participava ativamente dos negócios e das decisões políticas. Cidadania, pressupunha, portanto, todas as implicações decorrentes de uma vida em sociedade. Ao longo da história, o conceito de cidadania foi ampliado, passando a englobar um conjunto de valores sociais que determinam o conjunto de deveres e direitos de um cidadão. Segundo Dalmo Dallari:

A cidadania expressa um conjunto de direitos que dá à pessoa a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social. (DALLARI, 1998, p. 14)

A cidadania esteve e está em permanente construção; é um referencial de conquista da humanidade, através daqueles que sempre buscam mais direitos, maior liberdade, melhores garantias individuais e coletivas, e não se conformando frente às dominações, seja do próprio Estado ou de outras instituições.

No Brasil ainda há muito que fazer em relação à questão da cidadania, apesar das extraordinárias conquistas dos direitos após o fim do regime militar (1964-1985). Mesmo assim, a cidadania está muito distante de muitos brasileiros, pois a conquista dos direitos políticos, sociais e civis não consegue ocultar o drama de milhões de pessoas em situação de miséria, altos índices de desemprego, da taxa significativa de analfabetos e semianalfabetos, sem falar do drama nacional das vítimas de violência.

Nesse sentido, é o instrumento que possibilita a cada indivíduo, membro da sociedade, o provimento dos meios de sua sustentação em condições justas de sobrevivência. Ela deve possibilitar a criação de condições adequadas para uma vida digna e o desenvolvimento das capacidades naturais, intelectuais e profissionais dos cidadãos, de modo suficiente para que cada um possa se habilitar ao exercício das funções sociais (cívicas) a que tem direito de ser chamado a exercer.

A exigência da escola se incorpora à vida de todo cidadão. Não há como a sociedade preparar os indivíduos para a participação social e política, para a incorporação dos valores morais e culturais, para a aquisição de uma profissão adequada às necessidades de sobrevivência e bem-estar de modo isolado ou informal. Se a constituição da escola ocorre como decorrência de necessidades vitais da própria sociedade, ela se converte num direito dos indivíduos e num dever de toda a sociedade.

2.2. Função Social da Escola

 

            A organização e a vida social tendem a se tornar cada vez mais complexas. Há valores que extravasam as relações individuais e grupais, tornando-se valores universais. Há relações culturais que não se limitam às existentes entre grupos sociais restritos, pois são extensivos a toda sociedade. Há conhecimentos impossíveis de serem alcançados pela competência ou esforço solitário. O progresso da ciência, das técnicas, da cultura, das relações sociais e políticas modernas tende a universalizar as suas formas de acesso, de domínio, de controle e de difusão. Há portanto, exigências, necessidades e potencialidades que se dimensionam apenas quando compreendidas no universo social.

            Nesse sentido, enquanto a escola se torna, cada vez mais, um centro dinâmico de construção de conhecimento, da produção do saber, da difusão de novas técnicas, da organização cultural, ela cumpre uma tarefa que contempla expectativas de uma sociedade inteira.

Para compreendermos a função exercida pela escola atualmente é imprescindível destacar as grandes transformações pelas quais a sociedade tem passado e conseqüentemente a sua função tende a ser revista.

Por isso, é de suma importância lembrar que a escola representa a instituição que a humanidade criou para socializar o saber sistematizado (PENIN & VIEIRA, 2002, p.14). Além disso, a sua função tem variado com o tempo, pois tende a acompanhar os diferentes momentos da história.

Considerando que esta instituição possui um caráter tanto no que diz respeito à construção de meios para que ocorra a transformação social quanto para a propagação e legitimação da ideologia dominante.

Nesse caso,

a escola está inserida numa certa realidade da qual sofre e exerce influência. Ela não é apenas o local onde se reproduzem os interesses, os valores, a cultura, a ideologia. Também pode influenciar a ideologia, os valores, a ciência, a política e a cultura na sociedade em que está inserida. (RODRIGUES, 1988, p.57)

 

Atualmente em nossa sociedade sabemos que a escola não é a única instituição onde ocorre a educação, mas é neste espaço que o ser humano pode encontrar condições privilegiadas para a sua formação como sujeito histórico-cultural.

Nesse sentido Freire afirma que,

a escola onde tem lugar de destaque a apreensão crítica do conhecimento significativo através da relação dialógica, é a escola que estimula o aluno a perguntar, a criticar, a criar, onde se põe a construção do conhecimento coletivo, articulando o saber popular e o saber crítico, científico, mediador  pelas experiências do mundo ( 1991, p.83).

 

Desse modo a escola deve ser entendida como um local de formação do sujeito crítico e consciente do  seu papel político no processo de produção/ construção do conhecimento e como afirma  Esteban:

A escola, assim é um lugar político-pedagógico que contribui para a interseção da diversidade cultural que a circunda e a constitui, sendo espaço de significar, de dar sentido, de produzir conhecimentos, valores e competências fundamentais para a formação dos que ensinam e dos que aprendem (2003, p.9)

                   É de suma importância destacarmos que nos dias atuais assistimos a mudanças profundas na sociedade e na vida privada das pessoas a partir dos avanços das novas tecnologias e meios de comunicação e isto de alguma forma tem “interferido” na função social da escola, pois, ao passo que tais avanços facilitam a comunicação entre várias pessoas no mundo, por outro lado acaba aumentando os índices de marginalização e exclusão social. Como definem Penin & Vieira (2002, p.26) vivemos um período no qual a informação está, a um só tempo, disponível como nunca esteve e contraditoriamente, inacessível a grandes parcelas da nossa população. Devido aos avanços tecnológicos que tem ocorrido, a escola necessita formar cidadãos capazes de utilizar essas novas tecnologias para que assim possam transformar a sua realidade.

                   De acordo com Neidson Rodrigues:

A consciência da necessidade de trabalho das classes populares, e a necessidade de se estabelecer uma preparação emergencial para o suprimento dessa necessidade, acaba por colocar na preparação pra o trabalho o cerne da ação educativa, e, no mercado de trabalho, o horizonte ao qual ela se dirige. Isso, ao lado de transformar a educação escolar em uma central de treinamento de recursos humanos para o universo empresarial, acaba por inibir as funções educativas ligadas ao desenvolvimento cultural, político e intelectual, pois as delineia como de suprimento de tempo dispinível no processo considerado principal: a formação de trabalhadores. (1987, p.20)

 

Contudo, faz-se necessário romper com as barreiras impostas pelo setor econômico na educação para que assim a escola não se limite à mera transmissão de conteúdos e possa oferecer uma educação de qualidade objetivando formar cidadãos críticos e não apenas capacitar trabalhadores para atender às demandas do sistema capitalista. A preparação para o trabalho deve ser um dos objetivos e não o cerne da questão educacional.

2.3. A escola que necessitamos: voltada à educação cidadã.

           

O processo educacional deveria ter como princípio norteador a expansão da cidadania, para que assim o conhecimento e os saberes possam ter uma relação significativa com a vida dos educandos. De acordo com Silva

O sujeito precisa ser visto numa multiplicidade de relações e todas interligadas formando uma rede de relações. É necessário pensar que a cidadania é uma construção social e política, que envolve relações de poderes (2007, p.17).

 

Desse modo, o conceito de cidadania envolve as dimensões políticas, sociais e culturais. Existem muitos conceitos de cidadania, mas, para Rodrigues

(...) A cidadania é expressão que indica a qualidade da pessoa, que estando na posse plena da capacidade civil, também se encontra investida no uso e gozo de seus direitos políticos, que indicam, pois, o gozo dessa cidadania (2001, p.166).

Sendo assim, é imprescindível que a escola possa ter como principal objetivo construir conhecimentos e saberes que possibilitem os alunos a lutar por melhores condições de vida. Para isso, a escola é fundamental, como defende Freire

Uma das tarefas mais importantes da prática educativa crítica é propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de raiva porque é capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque é capaz de reconhecer-se como objeto (1999, p.46).

 

Por isso, é importante educar para fomentar os educandos na participação ativa da vida social e política. Dessa forma, a prática pedagógica deve estar voltada a libertação e emancipação. Pois, A libertação dos educandos, (...) dos preconceitos, dos estereótipos resulta na formação de subjetividades com mais possibilidades de emancipar-se, com consciência do seu papel no processo histórico (SILVA, 2007, p.20).

 

Assim, uma educação que promova a cidadania necessita de um professor que tenha uma perspectiva política libertadora e que conscientize os seus alunos do papel que devem exercer na sociedade para que assim, não sejam vistos apenas como um simples consumidor restrito ao mercado de trabalho e sim como um sujeito crítico que procura fazer uma análise reflexiva de sua realidade buscando modificá-la. Nesse caso,

Um dos papéis políticos fundamentais do educador é contribuir com a força da especificidade de uma situação pedagógica para transformar a escola conforme os interesses, as necessidades e os valores dos indivíduos, dos grupos e das classes que fazem a escola (FREIRE, 1986, p.27).

 

Diante disso a escola voltada para à educação cidadã deve possibilitar a construção de conhecimentos que sejam relevantes para orientar os educandos no mundo da vida. Por isso, esta não deve ser restringir à mera transmissão de conteúdos, ou como afirma Freire (1996) não é [apenas] transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção (p.22, grifo do autor).

Portanto, uma educação para a cidadania deve contemplar o estímulo ao pensamento crítico utilizando-se dos conteúdos como meio para articular idéias que visem melhores condições de vida dos seus educandos. Por outro lado, os educadores encontram dificuldades de colocar em prática tais questões.

 Segundo Costa (2007, p.47),

 Articular o pensar tem sido ao que nos pareceu, o maior medo dos professores, a dificuldade de colocarem em prática aquilo que defendem no plano ideal, ou seja, uma educação que contribua para a democratização das relações, que estimule a participação, que seja veículo de exercício de cidadania, que seja, enfim, desveladora, problematizadora, um ato crítico de conhecimento, de leitura da realidade, uma experiência de libertação humana.

 

Diante de tais pressupostos, faz-se necessária uma abordagem analítica do papel do professor no processo de ensino-aprendizagem.      

 

 

2.4. O papel do professor no processo de ensino-aprendizagem

Para que ocorra o desenvolvimento humano em nossa sociedade é obrigatória à passagem de crianças e adolescentes pela escola. Diante da tamanha diversidade sócio-político-cultural dos alunos que freqüentam a escola, o professor deve buscar o melhor dos métodos de ensino, além disso, cabe a ele levar o conhecimento ao aluno e contribuir para o desenvolvimento da criticidade dos mesmos.

Nesta perspectiva, o professor deve colocar-se como mediador entre o aluno e a matéria estudada levando ele a participar ativamente do processo de ensino-aprendizagem.

Outro aspecto importante é a prática interdisciplinar, que segundo Libâneo (2003, p.31), (...) é a interação entre duas ou mais disciplinas para superar a fragmentação, a compartimentalização de conhecimentos, implicando uma troca entre especialistas de vários campos do conhecimento na discussão de um assunto (...)

Sendo assim, com a atitude interdisciplinar as barreiras entre as disciplinas e as pessoas são eliminadas havendo a construção coletiva do conhecimento e desse modo o aluno passa de um mero espectador a um participante ativo na construção do conhecimento.

De acordo com esta visão do professor como mediador do conhecimento e do aluno como ser participante o processo de ensino-aprendizagem deverá se pautar no planejamento das atividades

de forma dialética-pedagógicas. Dessa forma, para que haja um planejamento eficiente é necessário que

todos os elementos que fazem parte da escola estejam envolvidas para discutir e avaliar as atividades planejadas conjuntamente.

Entretanto, percebemos que para muitos planejamento é entendido como um plano de curso ou disciplina pedida anualmente pela direção da escola sem nenhuma utilidade. No entanto, para Masetto (...) a organização das ações da entidade mantenedora, da direção, dos professores, do conselho de pais e mestres, dos funcionários e dos alunos, buscando alcançar metas e objetivos educacionais bem definidos (1997, p.76).  

Como vimos, o planejamento é um processo que consiste em preparar um conjunto de decisões para atingir determinados objetivos, como afirma Vasconcelos (Apud. MANATA, 2004, p.10), (...) planejar é antecipar mentalmente uma ação a ser realizada e agir de acordo com o previsto, é buscar fazer algo incrível, essencialmente humano (...)

Dentro do planejamento docente encontramos o plano de aula, que se caracteriza pela apresentação de todas as atividades e elementos necessários para o desenvolvimento de uma disciplina. Segundo Masetto (1997, p.86) (...) o plano é um documento escrito que materializa um determinado momento de um planejamento, ou seja, ele é a apresentação de um conjunto de decisões.

   Dessa forma, para ser eficiente, o plano de aula precisa ser elaborado de maneira clara e objetiva, uma vez que, é um instrumento de comunicação com a escola. Entretanto, é preciso que o mesmo seja flexível para introduzir possíveis alterações no calendário, de novos temas e a diferenciação entre as turmas e os grupos a partir das necessidades do processo ensino-aprendizagem.

Por isso, o professor que planeja continuamente sua prática docente demonstra está atualizado com o seu tempo, construindo e reconstruindo o saber.

Nesse sentido, o educador utiliza-se da avaliacão para acompanhar o progresso do educando no processo de ensino e aprendizagem, esta deve tornar-se uma ação inserida no cotidiano escolar ligada as atividades diárias de sala de aula. Por outro lado, sabemos que em algumas escolas, a avaliação ainda é utilizada apenas como uma forma de classificar os alunos. Segundo Masetto, comumente a avaliação é entendida como o resultado de testes, provas, trabalhos ou pesquisas que são dadas ao aluno e aos quais se atribui uma nota ou conceito. Este aprova ou reprova (1997, p.98)     

É imprescindível que este tipo de avaliação seja modificada, para que assim esse processo possa ser colocado como um elemento integrador e motivador e o professor seja capaz de descobrir as necessidades e dificuldades dos seus alunos.

Nesse sentido, o processo ensino-aprendizagem pode ser desenvolvido através da

Pedagogia de Projetos a qual estimula a introdução de atividades cooperativas baseadas no diálogo professor/professor, professor/aluno, aluno/aluno. Possibilitando dessa forma que os alunos decidam, opinem sobre diversos temas e assim construam sua autonomia.

Dessa maneira, com esta pedagogia os conteúdos disciplinares deixam de ter um fim em si mesmo e passam a ser meios para ampliar a formação dos alunos e sua interação com a realidade de forma crítica e dinâmica. Pois, segundo Estebam (2001, p.86), a pedagogia de projetos tem como fundamento a compreensão da aprendizagem como ato dinâmico, compartilhado, múltiplo e processual.

Por fim, a prática pedagógica do professor deve ser baseada de acordo com a realidade dos alunos não esquecendo de considerar o conhecimento que os mesmos adquirem no meio em que vivem e, como define Freire

O educador democrático não pode negar-se o dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão (...) É exatamente neste sentido que ensinar não se esgota no “tratamento” do objeto ou do conteúdo, superficialmente feito, mas se alonga à produção das condições em que aprender criticamente é possível (...) Nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo (1996, p.26).

 

Não podemos deixar de mencionar que é indispensável para os docentes melhores condições de trabalho, salário justo, entre outros para que assim, eles possam fazer com que a educação seja problematizadora, ou seja, possibilitando aos alunos questionarem sobre o meio no qual estão inseridos. 

2.5. Repensando a Escola enquanto formadora de cidadãos

                   A educação de qualidade atua na perspectiva de emancipação dos sujeitos sociais, contribuindo para a formação dos estudantes nos aspectos culturais, antropológicos, econômicos e políticos, para o desempenho como cidadão no mundo.

                   É na sala de aula que se pode verificar, verdadeiramente, a qualidade da educação, ou seja, o que os alunos aprendem. É a partir desta análise que se pensa o projeto pedagógico, a seleção dos conteúdos, os procedimentos de ensino, o modelo de formação de professores, as práticas de avaliação, etc.

                   Segundo Libâneo (2014):

Escola com qualidade educativa é aquela que assegura as condições para que todos se apropriem dos saberes produzidos historicamente e se desenvolvam cognitiva, afetiva e moralmente. É desse modo que a escola promove justiça social: buscando o desenvolvimento das capacidades intelectuais e a formação da personalidade de todos os estudantes, já que a superação das desigualdades sociais se dá também pelo acesso ao conhecimento e pela ampliação do desenvolvimento mental. (pag. 50)

                   Esta concepção não dispensa a atenção às diferenças, implicando a interface da escola com as práticas socioculturais vivenciadas pelos alunos. Mas estas devem estar conectadas ao processo de ensino aprendizagem dos conteúdos e de desenvolvimento do pensamento conceitual. Qualidade de ensino é, basicamente, qualidade cognitiva e operativa das aprendizagens escolares, condição para inserção ativa e crítica do mundo do trabalho, da cultura, da política, enfim, para o exercício da cidadania. É para isso que devem ser formuladas as políticas, os projetos pedagógicos, os planos de ensino, os currículos e os processos de avaliação.

                   É papel dos processos de ensino-aprendizagem promover interação entre os saberes vivenciais e os saberes instituídos, problematizando a realidade vivida. O conteúdo é concebido como meio de compreender cientificamente a realidade, indicando alternativas para superar desafios e instigando nos educandos a reflexão e a participação na vida em sociedade de forma crítica e também criativa.

                   Tudo isto, requer do educador uma formação integrada e articulada pelas diversas área do conhecimento e que os mesmos tenham ampla abertura para buscar a construção de uma sociedade justa, democrática e solidária.

                   A escola deve preocupar-se com o desenvolvimento integral da criança, sendo um ambiente de desenvolvimento de numerosas capacidades, atitudes e conhecimentos que são essenciais para a vida adulta. Portanto, necessita-se de um currículo que cubra as áreas do desenvolvimento integral dos alunos: o estudo e a intervenção do meio, a música, as artes, a motricidade, a socialização, a solidariedade, a análise crítica, a cidadania, a ecologia, etc.

                   Nesse sentido torna-se crucial a construção de um projeto político pedagógico de caráter emancipatório, tendo por objetivo criar condições para a escola atuar e conseguir atingir seus objetivos pedagógicos e administrativos. Segundo Libâneo (2000, p.10),

(...) o projeto representa a oportunidade de a direção, a coordenação pedagógica, os professores e a comunidade, tomarem sua escola nas mãos, definir seu papel estratégico na educação crianças e jovens, organizar suas ações, visando a atingir os objetivos que se propõem. É o ordenador, o norteador da vida escolar.

Desta forma, o PPP proclama pautar suas práticas a partir dos pressupostos freireanos da Pedagogia Libertadora, onde se buscam relações dialógicas, práticas de construção coletiva onde se façam presentes e sejam considerados os interesses das comunidades onde nossas escolas estão inseridas (SME, 1995).

O projeto político-pedagógico é o fruto da interação entre os objetivos e prioridades estabelecidas pela coletividade, que estabelece, através da reflexão, as ações necessárias à construção de uma nova realidade. É, antes de tudo, um trabalho que exige comprometimento de todos os envolvidos no processo educativo: professores, equipe técnica, alunos, seus pais e a comunidade como um todo.

Essa prática de construção de um projeto deve estar amparada por concepções teóricas sólidas e supõe o aperfeiçoamento e a formação de seus agentes. Só assim serão rompidas as resistências em relação a novas práticas educativas. Os agentes educativos devem sentir-se atraídos por essa proposta, pois só assim terão uma postura comprometida e responsável. Trata-se, portanto, da conquista coletiva de um espaço para o exercício da autonomia.

Tomando por base o ponto de vista das famílias, podemos considerar legítimo o desejo de uma educação de qualidade. No entanto, é importante refletirmos sobre o quanto a opção por uma boa escola é atravessada pelo modelo capitalista vigente em nossa sociedade, na qual a lógica de produção, consumo, descarte e competição acabam por interferir nos modelos educativos. A tensão, nesse caso, é gerada pela expectativa dos pais em garantir o futuro das crianças.

Nessa linha de reflexão, cabe-nos questionar o que de fato é educação de qualidade:

Seria aquela que estabelece a competição e a informação como base? A educação eu promove sentimentos de tensão e de desgaste para conquistar uma vaga e por ter eu sobressair-se em relação aos demais candidatos? A que prepara para o vestibular? A que prepara para o futuro, esquecendo-se do presente? Ou a educação que desenvolve a competência cidadã e democrática? A educação que promove o desenvolvimento da criatividade, da imaginação, da capacidade reflexiva e da indagação? E a criança, se ela pudesse participar das discussões sobre a condução da sua infância, o que ela nos diria? Qual o ponto de vista da criança sobre uma infância que é, cada vez mais, protagonizada pelo aluno e, cada vez menos, pela própria criança? (RONCARATI, 2014,p.80)

                         A criança quer brincar, ser livre, poder errar sem culpa, descobrir seus limites testando-os, poder se expressar e aprender de corpo inteiro. O aluno tem horários pré-determinados para praticamente tudo na rotina educativa. Seus conhecimentos também são definidos pelo adulto, que decide o que cada criança em determinada faixa etária precisa saber. É preciso permitir que a criança construa a sua autonomia e aprenda no cotidiano escolar a lidar com as diferentes situações e experiência, assumindo um papel ativo na construção do conhecimento que irá subsidiá-lo para atuar no meio em que vive de maneira crítica e ciente de seu potencial enquanto ator social.

                   Palou (2008, p.57) considera que “o desenvolvimento e a grandeza das pessoas se baseiam em sua capacidade de comunicar-se, de dispor de ferramentas, símbolos e linguagens que lhes sirvam para estabelecer relações com os demais”. Com isso, é preciso repensar esse sistema educacional eu submete crianças a tamanha pressão. Esse “funil” de vagas, bem como o foco para a avaliação seletiva, parece evidenciar a ausência de uma política pública democrática de educação, a qual todas as crianças teriam garantido seu direito de acesso à educação de qualidade e de permanência nas instituições escolhidas.

                   Na pressa de se produzirem resultados visíveis, os processos subjetivos fundamentais e inerentes ao desenvolvimento qualitativo das aprendizagens são muitas vezes ignorados. O tempo de brincar – não o brincar “pedagogizado” com os bingos e dominós de letrinhas, mas o brincar livre da criança, é compreendido como tempo improdutivo. Da mesma maneira, prefere-se exercícios de treino de “coordenação” do que desenho livre. Para certa concepção escolar, tudo que é livre, sem planejamento rígido, controle absoluto e avaliação sistemática não é produtivo, não é educação. Não se considera que a criança, como qualquer um de nós, é um sujeito sóciohistórico e cultural, que produz na interação com o meio que o cerca.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

            A educação do cidadão compreende a formação para o exercício do trabalho mas, também, compreende o acesso aos valores da civilização e o contato com desenvolvimento da ciência e das técnicas modernas. Compreende, ainda, a preparação política do indivíduo a fim de que ele possa se articular na vida social, dotando-o de condições que o habilitem a compreender, analisar e interpretar sua realidade, em como ascender a postos que lhe permitam participação na construção histórica.

            Nada disso, porém, é universalmente possível fora da educação escolar, pois somente a instituição escolar pode tomar a si essa tarefa, de maneira universal, igualitária e democrática. Vimos que quanto mais complexa for a sociedade em suas relações e formas de produção, tanto maior a necessidade de a educação escolar se tornar o veículo fundamental para a formação da totalidade dos indivíduos.

            Se a exigência do homem educado é uma exigência social, e se a educação é condição de sobrevivência sócia do homem, não há como discutir o direito de todos à educação, e portanto, constitui dever do Estado, como instituição que congrega os interesses diferenciados de toa a sociedade.

Partindo deste pressuposto, a educação voltada para a cidadania precisa ir além da mera ministração de conteúdos e para ser significativa, necessita está inteiramente contextualizada com a realidade, possibilitando ao educando interagir com os conhecimentos abordados. Pois,

(...) o processo conduz o educando ao entendimento mais ampliado, à participação mais efetiva, a uma visão de realidade mais ampla e a uma visão de si e da história de maneira mais organizada, a uma atuação mais efetiva no processo de mudança e de transformação da sociedade onde vive. (RODRIGUES, 1988, p 81)

A reflexão de nossa prática, nos permite pensar numa proposta pedagógica adequada para atender às necessidades da clientela escolar procedente das camadas desfavorecidas, ampliando seus conhecimentos de mundo, tornando-os capazes de analisar criticamente a realidade em que vivem. Nesse sentido, (...) o educando precisa compreender essa realidade, para que possa escolher a forma de atuar na sociedade, dentro dos limites das suas possibilidades. (RODRIGUES, 1988, p. 64).

A atuação docente deve está em processo contínuo de aperfeiçoamento, para acompanhar as transformações sócio-políticas e culturais da sociedade, pois estas refletem diretamente no âmbito escolar. Por isso, o educador precisa ter uma formação estruturada com base teórico-metodológica voltada para uma educação democrática, para assim, compreender as situações sociais nas quais os indivíduos estão inseridos.

Nesse sentido, é importante lembrar que a escola precisa deixar de ser meramente uma agência transmissora de informação num lugar de análises críticas e produção, onde o conhecimento possibilita a atribuição de significado a informação. (LIBÂNEO, 2003, p.23)

Em fim, acreditamos que a escola é praticamente o único vínculo que os indivíduos possuem com o saber sistematizado, e por isso, é grande a responsabilidade que nós educadores temos, pois, é compreendendo a dimensão transformadora de nossas ações, que assumimos a tarefa educativa, atuando democraticamente, a fim de mudar a compreensão que o educando tem de si mesmo e a sua relação com o mundo.

  1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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  2. DALLARI, Dalmo. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998. p.14.
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