Introdução

Este estudo consistirá em adentrar no universo das academias de ginástica[1] a partir de uma perspectiva de investigação que toma como categoria central a noção de prática cuidadosa. Noção que aqui no trabalho corresponde, de maneira ampla, a uma atitude para consigo mesmo e para com os outros, um éthos[2] no sentido dado pelos gregos na Antiguidade tardia. De maneira específica, o termo corresponde ao que os atores sociais focalizados nesse projeto fazem com seus corpos, problematizando “[...] as formas de racionalidade que organizam as maneiras de fazer (aspecto tecnológico) e a liberdade com que atuam nesses sistemas práticos (como reagem, como os modificam – aspecto estratégico)” (CASTRO, 2009, p. 155). Assim, uma prática cuidadosa indica as possíveis transformações que os sujeitos pretendem operar em si mesmos em função de dadas concepções a respeito de suas vidas como, por exemplo, certas imagens de saúde, estética ou bem estar.

O escopo mais amplo consiste, portanto, em apreender aspectos dos processos de subjetivação desencadeados pelo trabalho de professores de educação física na perspectiva da ética do cuidado foucaultiana. Isso porque as academias têm sido, comumente, apontadas como lugares onde os sujeitos investem biotecnologicamente sobre o próprio corpo para ter poder, ou seja, para capitalizar sua experiência somática através de exercícios e práticas que visam melhorar seu desempenho social e biológico. Esse tipo de compreensão decorre do diagnóstico de que as sociedades ocidentais vivenciam uma modificação extrema no sentido da produção de corpos distinta das tecnologias de dominação voltadas à fabricação de corpos disciplinados e dóceis (cf. FOUCAULT, 2004). Trata-se de uma nova tendência que valora a maximização da vida mediante intervenções biotecnológicas sobre o corpo, uma espécie de melhoria calculada do desempenho corporal. Por essa razão,

nossa época tem sido designada como a era dos grandes desenvolvimentos tecnológicos: informática, tecnociência, tecnobiologias, biociências, etc., que permitiram novas descobertas e aplicações no domínio da saúde do homem. Tais descobertas têm possibilitado a fabricação de uma diversidade inédita de aparelhos, serviços, publicações, roupas, cirurgia plástica, moléculas ativas, alimentos dietéticos, bodybuilding e medicamentos destinados, sobretudo, à majoração da saúde. Entretanto, o processo constituinte do corpo eficaz, saudável, belo, jovem etc., ao mesmo tempo em que redefine a doença, a feiúra e a velhice, também revela novas normas e estratégias de controle e conduta (MARTINS, 2008, p. 01).

Como ressalta Michel Foucault (1999; 2006), o culto da “boa forma” resulta de um processo histórico o qual faz do corpo, ele mesmo, um lugar de exercício do poder, cujas consequências sócio-culturais e psico-existenciais têm sido objeto de continuas análises e reflexões (BIRMAN, 1999), haja vista a difusão de um crescente culto performático do corpo.

Contudo, a ideia dessa pesquisa consiste em apreender se e como a prática dos profissionais das academias que são licenciados, ou seja, professores permite ultrapassar o simples ato de exercitar o corpo ou malhar, como se diz costumeiramente nas academias de ginástica, transcendendo a ideia de “exercício físico” como uma “certa racionalidade oriunda das ciências biomédicas, no sentido de projetar o corpo perfeito para uma saúde perfeita” (SILVA, 1999, p. 52). Em outros termos, assumimos que mesmo no espaço estrito das acadêmicas de ginástica é possível vislumbrar práticas propiciadoras de uma relação cuidadosa consigo mesmo e com sua própria corporeidade.

Obviamente, como indicamos acima, não desconsideramos que as práticas corporais fazem parte de uma cultura que, além de difundir imagens de corpos belos como sendo sinônimos de corpos saudáveis, tem abordado a questão da saúde restrita ao seu caráter biológico, desconsiderando sua característica multifatorial. Diante desse fato percebe-se que não se desenvolvem reflexões de experiências formativas que se sustentam na dimensão espiritual do humano, o que traz implicações à constituição de uma formação ética do sujeito enquanto ser em contínuo desenvolvimento em um mundo de experiências e relações.

Pois como afirma Röhr (2008) “pertencem, a essa dimensão, emprimeirolugar, todosos princípioséticose valoreshumanos (p. 06). Elementos vitais para apontar possíveis aproximações de um entendimento de cuidado com o corpo próprio diferente daquele que tem sido hegemônico nas práticas de musculação e seu modelo de estética fisicista.

            Mais diretamente, a pesquisa que se pretende levar a cabo se debruçará sobre a prática de seis professores licenciados que trabalham com musculação em academias de ginástica, com base no seguinte problema de pesquisa: A partir de quais condições, experiências e princípios professores licenciados, ao intervirem especificamente no trabalho com a musculação, tornam possível o desenvolvimento de uma prática cuidadosa em um sentido formativo existencial junto aos alunos/praticantes de academias de ginástica?

            Nossos pressupostos são os seguintes: a) embora as academias de ginástica não se configurem como espaços escolares formais, elas podem ser apreendidas como locais de produção e vivência de práticas educativas não formais, oferecendo “uma gama de reflexões e questionamentos no que se refere ao lugar social do corpo na contemporaneidade” (NOVAES, 2001, p. ); b) as relações entre educação-corporeidade, em nossa sociedade, não são totalmente homogêneas, sendo possível o desenvolvimento de práticas corporais movidas por princípios que levem em consideração uma compreensão multidimensional do humano, mesmo que em caráter de exceção; c) os próprios professores atuantes nas academias de ginásticas podem mover processos formativos resistentes ao ideário biomédico e estetizado de relação com o corpo próprio, incitando outras formas de uso do corpo.

Desse modo, como objetivo geral da pesquisa analisaremos as práticas de seis (6) professores (as) licenciados (as) em educação física que trabalharam com musculação em academias de ginástica do município de Recife, tendo em vista apreender como esses profissionais se relacionam com o corpo na contemporaneidade. Para tanto, especificamente, será necessário identificar na prática destes professores (as), indícios de experiências formativas ancoradas na ativação ética do cuidado, além de delimitar quais experiências poderão estar contribuindo para uma prática cuidadosa em relação ao corpo mesmo no âmbito das acadêmicas de ginástica. Para tanto, nos apoiaremos em uma compreensão pedagógica das ações ali desenvolvidas e nos conteúdos que fundamentarão suas práticas cuidadosas.

 

Do corpo bioidealizado a uma experiência-aproximativa-estético-existencial em academias de ginástica do município de Recife

Tudo indica que, na atualidade, a ênfase na visão biomédica ou anatomofisiologista vem se apresentando com cada vez mais força na educação física brasileira (CUNHA, 2011, p. 92), fazendo inclusive com que aqueles que vem procurar o curso de educação física almejem, antecipadamente, uma “estreita vinculação entre Educação Física/saúde, relacionada apenas com o aspecto biológico, e Educação Física/esporte, relacionada apenas à questão da performance”. Essa situação é um dos principais entraves para que se possa compreender “a dimensão educacional da Educação Física e suas interfaces com diferentes campos de saberes” (PAIVA et al., 2006, p. 216). Em função disso, a formação profissional tem se constituído num campo de tendências contraditórias. Por isso, COSTA (2011, p. 35) entende que hoje a educação física maneja desarticuladamente sua própria história, passando a mostrar facetas diferentes de acordo com as preferências dos profissionais. A ênfase que é colocada ora nas técnicas esportivas, ora nas dimensões pedagógicas.

Nesse quadro, entende-se que seja relevante observar os contextos práticos nos quais o trabalho docente vem se estabelecendo com todas as suas ambivalências, desvelando, nesse mesmo movimento, processos e dinâmicas que se apresentam como espaços privilegiados para problematização dos conhecimentos da formação, desvelando facetas ainda insuspeitas quando se fala na Educação Física como profissão. Mais diretamente: sabemos que o profissional de educação física tem sido requerido para atuar em vários segmentos - academias de ginástica, instituições esportivas, hotéis, clubes, espaços de cultura do corpo, da estética, etc. -, complexificando a atuação desse ator, ampliando o seu campo de exercício profissional para além da Educação Física escolar. Isso parece já estar repercutindo inclusive nas escolhas profissionais dos estudantes, onde grande parte tem demonstrado, por exemplo, o desejo de atuar em academias de ginástica ao saírem das universidades e faculdades.

Em estudo desenvolvido junto a um grupo de futuros profissionais de educação física, alunos do quinto período de um curso de Licenciatura Plena em Educação Física... ao perguntar-lhes sobre o que mais os motivou para a escolha do curso, obteve: para a maioria, o motivo de ingresso no curso foi a prática assistemática de atividades físicas em academias. Esse grupo revelou ter, como expectativa, atuar profissionalmente nesses locais de trabalho (MONTENEGRO, 1994, p. 37, In. COELHO FILHO, 1997, p. 133-134).

Esses dados coadunam com este trabalho na medida em que também percebemos o quanto o desejo dos atores por trabalhar em academias adquiriu um interesse maior em relação a outros campos de atuação como, por exemplo, as escolas. Isso por que as academias tem aparentado ser um dos locais que mais tem gerado desejo de emprego entre os egressos das universidades e faculdades de Educação Física (COELHO FILHO, 1997, p. 134).

Mas, seguindo a ambiguidade instalada nos cursos de formação de professores em educação física, o graduado quando inserido no mercado profissional, normalmente desenvolve suas atividades, na maioria das vezes, sem se preocupar com os aspectos sociais e pedagógicos envolvidos nesses espaços. Hoje, pode-se dizer que a mudança de enfoque do debate da educação física, do meio escolar para a prática corporal em ambientes não-escolares vem modificando as demandadas sociais de trabalho na área da educação física.

Daí que, as academias de ginástica têm sido questionadas sobre seu papel e valor educacional. Muitos estudos tem criticado a relação causal entre atividade física e saúde, uma vez que esta tem sido entendida como consequência direta de efeitos fisiológicos que podem ser medidos quantitativamente, ou seja, produzidos pela prática regular de atividade física (BAGRICHEVSKY; ESTEVÃO, 2005, p. 66).

Uma relação que tem sido pautada pela tradição médico-higienista, onde se reduz ou inexiste uma reflexão sobre os intervenientes sociais, econômicos, culturais e políticos na vida das pessoas, e equivocada simplificação do ato pedagógico que desconsidera, assim, uma série de elementos constituintes vitais do ser humano em sua integralidade.

A prevalência de uma lógica bio-idealizada em relação ao corpo interfere no comportamento e nas relações humanas, das mais variadas formas (ALMEIDA, 2004; CONNELL, 1995; ELIAS, 1993; FRAGA, 2004; MALYSSE, 2002; MARZANO - PARISOLI , 2004; MENEGUELLO, 1996; SABINO, 2004; SANT’ANNA, 2004; SFEZ, 1996; VIGARELLO, 2006), fornecendo uma nova visibilidade a questões como obesidade e magreza, saúde e doença, bem estar e mal estar enquanto vetores que articulam o cotidiano daqueles/as que trabalham e que buscam as salas de musculação das academias.

Dentre as práticas de cuidado com o corpo, nas academias de ginástica, a musculação tem recebido um destaque especial; destaque que tem feito com que a musculação seja considerada como uma das modalidades mais procuradas nas academias atualmente (PEREIRA, NOBRE, FERREIRA & SOUZA, 2007), mobilizando sujeitos de ambos os sexos e com as mais diversas faixas etárias. No trabalho com a musculação a prática tem tido a finalidade de moldar as formas do corpo ressaltando um trabalho de acréscimo do volume muscular e de aquisição da harmonia corporal, alcançado dentro dos limites da normalidade, de acordo com todos os princípios do treinamento físico dando ênfase no princípio da individualidade biológica e maximizando a mobilização corporal.

Esse tipo de situação aponta a urgência por uma nova estética da existência. Uma vez que os espaços das academias também se configuram como lugares de convivência humana, podendo abrir outras formas relacionais. Não se trata de uma visão ingênua ou utópica, pois o próprio caráter vivencial da relação professor-aluno nas salas de musculação pode instituir relacionamentos humanos profundos e duradouros. Relacionamentos que envolvem o cuidado com a pessoa humana em toda sua potencialidade, em sua riqueza de experiências.

Assim, diante das imposições disciplinares e das regulamentações do biopoder no trabalho de professores licenciados com a prática de musculação, o cuidado de si emerge como uma possibilidade pedagógica sui generis, uma espécie de nova lente teórico-analítica capaz de evidenciar linhas de figura e fissuras nas práticas biomedicamentalizadas de relação com o corpo, delineando práticas cuidadosas dos professores que trabalham com a musculação nas academias de ginástica. Isto por que em sua forma mais intensa o cuidado de si “é o zelo por si mesmo – e, consequentemente, de zelo também pelos outros” (FOUCAULT, 1994, p.278).

Uma educação para o cuidado de si implica um auto-cuidado na medida em que mestre e aluno podem efetivar trocas recíprocas de aprendizagem. Essas trocas não se resumem apenas a apropriação dos conhecimentos necessários ao trânsito social, mas a algo bem mais intenso que são as buscas das relações éticas consigo nas práticas existenciais.

Ao dirigir a atenção para si, o que se busca é avaliar o lugar que se ocupa no mundo e o sistema de necessidades no qual o sujeito se encontra veiculado. O cuidado de si configura-se como um princípio ordenador de nossas ações. Longe de nos isolar da comunidade humana, ele aparece como aquilo que mais exatamente nos articula a ela. Um modo preciso de manter nossas ações nos limites e formas consideradas convenientes, ou seja, uma maneira de abordar a formação humana no registro ético (FREITAS, 2010, p. ).

A prática cuidadosa través do princípio do cuidado de si pode ser pensada enquanto pedagógica ao anunciar possibilidades de nos constituirmos como sujeitos de forma autônoma, num caminho inverso ao já posto pelo modelo hegemônico. A proposta é então subverter a ordem dos fatos. A educação poderia caminhar para um nível mais elevado de formação, possibilitando mudanças de práticas e de experiências. Baptista (2006, p. 784) ao ampliar nosso horizonte com relação ao papel que em sua opinião os professores que trabalham em academias desempenham justifica,

Entendemos que os professores de academia são educadores e apresentamos duas justificativas. A primeira é a de que existe uma intencionalidade e aí se estabelece uma relação pedagógica, uma relação de ensino-aprendizagem; assim, está presente neste momento a ação educativa. As relações pessoais e pedagógicas se manifestam pela presença do planejamento das atividades, pelo estudo de novas pesquisas e de novos fundamentos técnicos e metodológicos, pela reunião e discussão entre os professores e entre estes e a direção da instituição, entre outros. Um outro ponto que reforça essa posição está na formação profissional... Todos os conhecimentos reunidos na área, sejam eles técnicos, biológicos, pedagógicos, filosóficos ou sociais, devem ser de domínio do professor na academia, para que a sua práxis possa estar repleta de significado, e, o que é mais importante, que o seu significado possa ser transmitido aos seus alunos.

Mas, educar só tem sentido no momento em que se propõe a dilatar, a expandir e amadurecer as possibilidades humanas e dentro dessa perspectiva, mesmo com o ainda hegemônico modelo bioidealizado de corpo, no trabalho dos professores (as) entrevistados, a prática cuidadosa sob a lente teórica do cuidado de si parece apontar uma condição pedagógica, ética e também ontológica (FOUCAULT, 1994, p.278) para a constituição de indivíduos em sujeitos livres nas salas de musculação. Condição esta que indicará outras formas de cuidado nas salas de musculação, novos modos ou práticas cuidadosas mediadas pela amizade e cujo sentido maior no cuidado do corpo poderá se mostrar envolvido pela espiritualidade.

Metodologia

Nosso olhar epistemológico-ético-político-metodológico do percurso investigativo concentra-se numa postura teórica constituída por esforços para explicitar a prática cuidadosa de professores, licenciados pleno em Educação Física & Esporte, que trabalham com musculação em academias do município de Recife/PE. Ao tomar como atores do presente projeto seis professores (as), objetivamos apreender como esses profissionais se relacionam com o corpo na contemporaneidade.

Nesse percurso, utilizaremos o enfoque genealógico foucaultiano pelo fato dessa perspectiva nos permitir, dentre outras coisas, realizar uma análise ontológica do presente de forma crítica, problematizando as relações dos sujeitos consigo no âmbito educativo das academias de ginástica, mais especificamente no trabalho do professor licenciado com a musculação. Trata-se, portanto, de uma abordagem de natureza qualitativa, um meio para explorar e para entender o significado que os indivíduos atribuem a um problema social ou humano (CRESWELL, 2010). Problema que neste trabalho se apresenta como prática cuidadosa de professores (as) licenciados (as) na musculação.

O processo da pesquisa assim se constituirá numa investigação de caráter aproximativo-exploratório, uma vez que praticamente não existem estudos que abordem nas academias de ginástica a prática de professores na musculação por essa perspectiva. A pesquisa é então, tomada como um caminho de problematização da realidade dessa prática.

Diferente da metodologia cartesiana de pesquisa, a investigação genealógica não procura os aspectos de uma linearidade evolucionista, em que a essência verdadeira das coisas venha a ser revelada, ela “descreve uma história marcada pela descontinuidade dos acontecimentos” (MUCHAIL, 2004, p. 30) em meio aos jogos de verdade presentes na constituição dos sujeitos. O que a noção genealógica procura, portanto, é questionar as “vozes” e os aspectos que não tiveram privilégio na cristalização dos saberes instituídos pelo positivismo. Foucault viu na perspectiva genealógica criada por Nietzsche uma forma de história que busca desenvolver uma gênese no tempo que não se fixa em objetos como apoio, mas “parte dos acontecimentos para explicar como se inventaram esses pontos de apoio” (VEIGA, 2003, p. 58). É por essa razão que a genealogia possui apenas um a priori, que é histórico. Foucault utilizou essa perspectiva para explicar os fatos de forma contingente, na emergência de sua historicidade. A genealogia nos permite problematizar a relação dos sujeitos consigo no âmbito das práticas pedagógicas, valorizando a contingência e a historicidade dos acontecimentos nesse campo.

            Nesse sentido, iremos estudar os (as) professores (as) por meio de suas narrativas, procurando identificar, através destas, seus pensamentos, já que para Foucault (1997a, p. 113, Apud. CANDIOTTO, 2010, p. 18) “pensamento designa ao mesmo tempo modos de ser e de agir [...]”. Estando a par de suas narrativas poderemos compreender como os atores entrevistados irão se constituindo eticamente como sujeitos de uma prática cuidadosa. Prática que no trabalho dos professores com a musculação, poderá apontar indícios de experiências formativas ancoradas na ativação ética do cuidado de si.

Para que possamos realizar a investigação e compreendendo que nenhum fenômeno pode ser estudado à margem do contexto social onde está inserido, assegurando um contato direto do pesquisador com o ambiente natural do objeto e, orientado pela abordagem metodológica, levaremos em conta três ordens de argumentos:

1. A localização geográfica e a inserção de Pernambuco no desenvolvimento geopolítico-educacional da Região Nordeste em relação ao grande universo de academias.

2. As contribuições ao processo de reformulação e/ou criação de cursos de Educação Física Licenciatura e Bacharelado na região e, em especial em Pernambuco, visando este universo de trabalho.

3. A importância de pesquisar onde se vive e de repensar a prática nos espaços em que trabalha.

Devido a tais constatações e convicções, mediadas ainda pelo problema e objetivos elencados e, ainda, considerando o universo pesquisado, optaremos por escolher seis atores sociais, professores (as) licenciados (as) que atuam com práticas de musculação em academias de ginástica localizadas na cidade de Recife, como informantes. Escolha que será definida a partir dos seguintes critérios:

ü    Professores das três universidades mais antigas do Estado de Pernambuco: UPE, UFPE, UNIVERSO que sejam indicados por alunos e egressos como possuam indícios de uma prática cuidadosa;

ü    Professores com formação inicial em Licenciatura em Educação Física;

ü    Professores em Licenciatura em Educação Física que atuam na prática da musculação em academias de ginástica em bairros da cidade do Recife;

ü    Professores integrantes de grupos de estudos e pesquisas;

ü    Professores em Licenciatura em Educação Física que tenham produções acadêmicas abordando o tema prática de musculação em academias;

ü    Professores em Licenciatura em Educação Física que atuam com a prática da musculação em projetos sociais;

ü    Professores em Licenciatura em Educação Física com formação latu sensu e stricto sensu.

Assim, como procedimento de coleta de dados optamos pela entrevista narrativa já que esse procedimento “é um excelente instrumento de pesquisa por permitir a interação entre pesquisador (a) e entrevistado (a) e a obtenção de descrições detalhadas sobre o que se está pesquisando” (OLIVEIRA, 2008, p. 86). Deve-se por entender ainda que [...] “entrevistas constituem uma técnica alternativa para se obter dados em contato direto com a fonte escolhida”[3]. O primeiro contato com os professores atores ocorrerá por meio de uma apresentação pessoal e informal, no qual lhes será feito uma comunicação prévia sobre a possibilidade de puderem indicar ou não seus próprios colegas de trabalho, além da necessidade a partir daí, de haver uma interação do pesquisador com eles em cumprimento aos procedimentos no desenvolvimento e realização do trabalho de pesquisa.

Por enquanto é a partir dessa entrevista narrativa que pretendemos analisar de forma mais aprofundada, e que almejamos levantar problematizações para ensaiar outras formas de constituição da subjetividade em movimento dos sujeitos no presente contexto educativo das salas de musculação. Isso, no que tange a possibilidades de realizar novas formas de relações no plano ético dos sujeitos consigo mesmos e com o mundo que permitam a realização de práticas subjetivas comprometidas com atitudes de liberdade.

 

Referências

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[1] Espaço de práticas adotadas por aqueles que buscam um ‘estilo de vida jovem’, com ‘hábitos saudáveis’... de ginástica... em recintos privados, ‘adequadamente’ aparelhados, as academias de ginástica (COELHO FILHO, 1997, p. 129).

[2] O éthos para os gregos é um modo de ser do sujeito que se traduz em seus costumes, seu aspecto, sua maneira de caminhar, a calma com que enfrenta os acontecimentos da vida. O homem que possui um éthos belo e que pode ser admirado e citado como exemplo é o que pratica sua liberdade de maneira refletida (CASTRO, 2004, p. 154).

[3] (FRANÇA, 2003, p. 98).