EDUCAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA INCLUSÃO OU EXCLUSÃO SOCIAL E POLÍTICA: somos ou não cidadãos?
Lécia Regina Costa de Sousa*
Mercês Rodrigues Costa*
Resumo
O presente artigo tem como objetivo trazer reflexões acerca da educação x cidadania a partir da discussão do texto de Miguel Arroyo Educação e exclusão da cidadania. A metodologia utilizada para a discussão e elaboração do presente trabalho foi leitura bibliográfica do texto acima citado em confronto com outros autores que tratam do tema. O problema chave que se buscou questionar foi o vínculo que houve e que ainda há entre a educação formal e a cidadania como condição para um ser humano ser considerado cidadão. Desde já entendemos que cidadão se refere ao sujeito no gozo de seus direitos civis e políticos dentro de uma sociedade, cumpridor de seus deveres. Assim, ao analisarmos esse conceito estabelecido pelo professor Aurélio, surge uma pergunta que não quer calar: se a educação é condição para sermos cidadãos, quem são aqueles que não têm acesso a ela, ou a tem em “dose” minúscula? Para que pudéssemos fazer uma análise dessa e outras questões a respeito daquele vínculo entre educação e cidadania foi necessário voltar ao passado histórico para tentar compreender os fenômenos que influenciaram direta e indiretamente nesse fato social a qual todos nós fazemos parte. Educação é para todos? Todos são cidadãos? E o ser humano, não é cidadão? O que esperamos da nossa sociedade?
A Educação, em especial a educação brasileira, passou por diferentes momentos durante toda a história, e hoje, muito se alcançou em termos de políticas públicas.
Porém ainda existe grande parte da sociedade que vivem a margem, considerada inapta para a participação na vida social e política do país. Muitas lutas e reivindicações trouxeram também grandes mudanças, mas ainda há muito que se conquistar em termos de educação para alcançar a cidadania e democracia.
Palavras- chave: Educação, Cidadania, Exclusão Social.
*Discente do 7º semestre do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Escola Superior Madre Celeste – ESMAC. E-mail: [email protected].
* Doutora e Mestra em Ciência da educação pela Universidade da Amazônia- UNAMA. Coordenadora Geral da Pós Graduação da Escola Superior Madre Celeste-ESMAC. Professora da disciplina Organização do Trabalho Pedagógico 7º semestre- ESMAC. E-mail: [email protected].
Abstract
This article aims to bring reflections on citizenship education x from the discussion of the text of Miguel Arroyo Education and exclusion from citizenship. The methodology used for the discussion and preparation of this work was reading the literature cited above in comparison with other authors who deal with the subject text. The key problem that we sought to question the link that was there and that there are still between formal education and citizenship as a condition for a human to be considered a citizen. Since we understand that it refers to the individual citizen in the enjoyment of their civil and political rights within a society, dutiful. Thus, in examining this concept established by Professor Aurelio, a question that remains arises: if education is a prerequisite for being citizens, who are those who do not have access to it, or has the "dose" tiny? So we could do an analysis of this and other questions about that link between education and citizenship was necessary to return to the historical past to try to understand the phenomena that influenced directly and indirectly in this social fact which we are all part. Education is for everyone? All are citizens? And the human being, is not a citizen? What we expect from our society? Education, in particular the Brazilian education has undergone different times throughout history, and today, much has been achieved in terms of public policy. But there is still a large part of society that live outside, deemed unfit to participate in social and political life. Many struggles and demands also brought great changes, but there is still a lot to gain in terms of education to achieve citizenship and democracy.
Keywords: Education, Citizenship, Social Exclusion.
1. Introdução
Este artigo apresenta algumas reflexões acerca da temática educação e cidadania, um texto que explora e trás à luz pensamentos, ideias e ideais de cidadania numa perspectiva
histórica, apontando a educação como condição para formação de sujeitos cidadãos, ativos na vida política e social. A mesma educação que, se não recebida em “dose” alta pode gerar exclusão social e política.
Buscamos, nesse trabalho, debater acerca daquela concepção de cidadão e compartilhar da ideia de que a educação é importante e essencial, porém não é ela que pode decidir se um ser humano estar apto ou não, para gozar de seus direitos previstos em lei. Apesar de sabermos que a partir da Constituição de 1988, “Todos são iguais perante a lei” abriu-se espaço para que a sociedade se privilegiasse mais de seus direitos, uma vez que mesmo esses direitos estejam expressos legalmente, o que se percebe é que, infelizmente, existe uma grande contradição, a grande maioria da população está fora da chamada “civilização”, onde se pode ter a plena convicção de que seus direitos fundamentais estão preservados e garantidos, na prática. Mostrando que, na prática, nem todos são iguais perante a lei.
Para que essa reflexão fosse realizada, foi formado um grupo de estudos, fazendo levantamento dos materiais teóricos que tratam do tema, como exemplos têm o texto norteador de Miguel G. Arroyo, “Educação e exclusão da cidadania”, discutido e analisado a partir de outras teorias, vivências, observações e relação com a realidade, em pleno século XXI.
Para nós, estudiosos do campo da educação, é imprescindível refletir sobre que parâmetros se articularam e ainda se articulam a dialética educação e cidadania por duas razões; primeiro, uma vez que para se compreender os fatos sociais hoje, é necessário fazer um passeio aos tempos pretéritos num processo constante de investigação sobre um determinado fato e seus autores, seus status, suas ideias e ideais políticos; segundo, nós acreditamos que assim como a ausência da educação pode excluir seres humanos da vida política e social (uma ideia capitalista), ela mesma pode intervir na sociedade, provocando mudanças de paradigmas sociais e políticos não apenas com a educação formal, mas, com lutas e reinvindicações sociais questionando com autonomia os polos que se formaram no espaço de convívio social tais como: “opressores e oprimidos”, “civilização e bárbaros”, “livres e servos”, “povo e povinho” etc., com o intuito de “quebrar” essas concepções que não condizem com os verdadeiros ideais de cidadania e democracia. Afinal de contas, todos os “cidadãos” são pessoas, seres humanos que pensam, trabalham e enriquecem o país, para não usar o termo “enriquecem a minoria”.
2. Fundamentos à luz das teorias
Miguel Arroyo (2010, p.35) ao fazer análise sobre o tema Educação e exclusão da cidadania mostra que ainda faz parte da memória dos dirigentes políticos que não existe cidadania porque o povo é imaturo. Esse mesmo povo só poderia participar da vida política se se mostrasse apto, competente, “consciente”, “civilizado”, educado. Percebemos que essa “mentalidade” não é de hoje, surgiu desde o tempo do império e tem prevalecido até hoje, embora de forma mascarada, escondida nos escombros da própria ignorância humana.
À luz de todo o texto, observamos uma forte crítica acerca da “falta de democracia e de cidadania”. Numa concepção burguesa e capitalista, se aposta que a culpa por essa ausência se dá porque o povo não é instruído, racional, não tem condições de fazer parte do aparato político porque não sabe sequer “querer”.
Então, aparece a escola como candidata à “redentora” de tal povo, a ela a incumbência de educar, formar-lhe, preparar-lhe o espírito para que sejam salvos até de si mesmos. Um povo sem educação não tem a menor condição de exercer sua cidadania. “O homem só pode ser livre se tiver o espírito culto”. Mas para que possamos compreender como ocorreu esse processo, convidamos você, leitor, para darmos uma volta ao passado histórico.
3. Uma pouco de histórica da educação
Vamos analisar uma comunidade indígena primitiva descrita por PONCE (2010); uma comunidade pequena, composta por pessoas livres, suas terras eram comuns a todos, e tudo que se conseguia era dividido entre todos igualmente. Não havia acumulação de bens porque tudo que era produzido era consumido igualmente entre todos. A educação que havia entre aquele povo era determinada e organizada na prática, na vida cotidiana, sem uma escola formal. Todo aprendizado era voltado para a vida em sociedade e para o bem de todos. Até as crianças acompanhavam os adultos em todos os seus trabalhos, ajudando na medida de suas forças e, como recompensa recebia a sua porção de alimentos como qualquer outro membro da comunidade.
Ou seja, era através da experiência no dia a dia com os adultos que a criança era introduzida nas práticas de seu grupo social. Ainda a esse respeito Ponce (2010) descreve:
O homem das comunidades primitivas também tinha uma concepção de mundo, ainda que nunca a tivesse formulado expressamente. Essa concepção de mundo, que nos parece pueril,
refletia, por um lado, o ínfimo domínio que o primitivo havia alcançado sobre a natureza e, pelo outro, a organização da tribo, estreitamente vinculada a esse domínio. Uma vez que na organização da comunidade primitiva não existia graus nem hierarquias [...].
Esse modelo de educação que era marcante das comunidades primitivas perdeu-se a partir do momento em que foram formando e se transformando em sociedades divididas em classes. Como surgiram essas classes? Segundo Ponce, as classes sociais surgiram a partir do momento em que houve escasso no rendimento do trabalho “braçal”, ou seja, onde era empregada a força física do homem. Outro fator possivelmente responsável foi à troca da “propriedade comum pela privada”.
A partir dessa ruptura e com o surgimento da sociedade em classes, surge também a escola que segundo SAVIANI (2008),
A partir dessa origem a instituição escolar se desenvolverá na Grécia como paidéia, enquanto educação dos homens livres, em oposição à duléia, que implicava a educação dos escravos, fora da escola, no próprio processo de trabalho. Com a ruptura do modo de produção antigo (escravista), a ordem feudal vai gerar um tipo de escola distinto da paidéia grega. Diferentemente da educação ateniense e espartana, assim como da romana, em que o Estado desempenhava papel importante na organização da educação, na Idade Média as escolas trarão fortemente a marca da Igreja Católica. O modo de produção capitalista provocará decisivas mudanças na própria educação confessional e colocará em posição central o protagonismo do Estado, forjando a ideia da escola pública, universal, gratuita, leiga e obrigatória, cujas tentativas de realização passarão pelas mais diversas vicissitudes.
Para compreender essa transição de um período primitivo à formação das classes, é necessário entender que essa divisão surge a partir do momento em que essas sociedades se desenvolvem e a luta por interesses particulares dá-se início. Lutas essas que se dão de forma “obscura e indiciosa” (PONCE, 2010. p 35).
Nas entrelinhas dos textos de Miguel Arroyo, notamos que bem aquém do simples interesse do Estado em “educar para a cidadania”, e a tamanha ênfase na educação do “povo” como condição para uma ordem social e uma cidadania, a educação serviria apenas para fortalecer o poder da minoria sobre a maioria. Como acrescenta Arroyo (2010.p.38),
Por trás dessa relação, sempre defendida na construção da nova ordem, há uma concepção do social e de uma constituição, há ideais políticos que não podem ser ignorados, há concepções e compromissos com a ordem social e econômica, com o Estado e com um modelo de cidadania para as classes inferiores.
Parte-se do pressuposto que o homem é irracional, sem preceitos, sem conhecimento, bárbaro. Quanto a isso, Arroyo especifica o pensamento de Hobbes :
“[...] torna-se manifesto que, durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capazes de mantê-los em respeito, eles se encontram naquela condição que se chama guerra. Uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens”.
O texto desse autor deixa claro que o homem, numa visão passada, não era capaz de viver em harmonia, em paz, sem ter um tutor que o educasse e ensinasse a ser cidadão, pois seu estado normal era o bárbaro, um ser completamente bruto que precisava ser lapidado, conforme os preceitos criados pela elite. Já que o povo não estava apto a participar da cidadania seria necessário que ele se conscientizasse, se mostrasse capaz de entender suas ações. E de que maneira seria melhor para que isso acontecesse? Através da educação, pois ela os tornaria conscientes e cidadãos, pois a educação seria o fator que condicionaria a cidadania.
Com o advento da república essa concepção se fortaleceu, pois a partir daí o povo que escolheria seus governantes, mais precisaria se esclarecer e consolidar-se como cidadãos, porém só iria participaria dessa cidadania quem fosse capaz e estivesse pronto para exercê-la. E a maioria, a massa, não estava pronta, consciente de tal importância, eles precisariam então educar-se para então exercer a cidadania e escolher seus governantes, pois eles não estavam educados o suficiente para serem cidadãos necessitando, portanto, de alguém que os educassem, alguém para protegê-los de si mesmos. Então surge o Estado como responsável para conduzir os “bárbaros” à civilização.
Acreditava-se que o povo só teria igualdade, paz, liberdade, quando houvesse educação de qualidade oferecida pelo Estado. Mas será que essa educação mencionada acima serviria para a igualdade de todos? A elite estava preocupada em educar em massa? Acreditamos que não era o real objetivo, pois, a educação era regrada de acordo com seus propósitos (do Estado), ela não atenderia todos, nem com a mesma força, pois ela era dosada, o povo recebia a dose necessária para a participação, a elite liberal teria o domínio dessa educação, ela selecionaria os que julgasse serem capacitados para participação em sociedade, pois os que não o são, seriam excluídos. A educação de qualidade era para poucos que estavam no poder, o resto era resto, bárbaros, incivilizados.
Ou seja, seres incapazes de pensar, a plebe, a ralé, pessoas definitivamente excluídas da sociedade, que só serviam para fazer perturbações, transtornos, impensantes, segundo
LODKE apud ARROYO (p.236), “quando a mão está acostumada ao arado e a enxada, a cabeça raramente é elevada para as ideias sublimes”. Essa era uma das ideias pregada pela elite para explicar a exclusão, para conformar o povo acerca da pirâmide social, por isso “pregava” a educação salvadora do povo, enganavam o povo dizendo que quem tivesse educação seria cidadão, mais até o ponto que eles achassem ser necessária. E era uma forma de manter o “equilíbrio social”.
4. A Educação e cidadania no Brasil
a) Educação e Cidadania na perspectiva da Constituição de 1988
A nossa Constituição brasileira, especificamente a de 1988, é considerada “Constituição Cidadã” por garantir, em seus artigos, direitos a todos os brasileiros e os estrangeiros residentes no país.
O artigo 205 assim descreve a obrigatoriedade com relação à educação como o texto seguinte: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” Mas em que sentido esse texto fala sobre cidadania? O que dá para compreender é que o referido termo envolve uma relação com nacionalidade onde o “cidadão” tem suas obrigações e direitos e pertence a seu país (SILVEIRA, 2013). Percebemos que há certa contradição quanto ao termo cidadania, uma vez que o seu sentido é um e seu significado real é outro. Ou seja, A Lei esclarece vagamente a palavra deixando-a subentendida. Na prática, não dá para chegarmos a uma conclusão precisa sobre a aplicabilidade desse termo no cotidiano das pessoas. Mais um exemplo dessa contradição é a falta de clareza da própria constituição em como a “educação deve preparar os jovens para o exercício da cidadania”. Se passados anos e ainda hoje temos e vivemos em meio uma sociedade dividida em “classes”, milhões de analfabetos, destarte tantas políticas públicas voltadas para a “Educação”.
b) Educação e Cidadania na perspectiva da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)
Logo no início do documento legal aparece o vínculo entre educação e cidadania da seguinte forma: “A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática
social” (Art. 1 § 2.) com o pressuposto de que a obrigação do Estado para a efetivação da educação se dá através do:
I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II – universalização do ensino médio gratuito;
III – atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade;
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII – oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;
VIII – atendimento ao educando, no ensino fundamental público, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde;
IX – padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem;
X – vaga na escola pública de educação de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar quatro anos de idade.
Analisando o que está explícito nas Legislações específicas da Educação conseguimos relacionar com o que escrevem os autores: “A educação do povo é pensada e recomendada pelos teóricos da economia política para evitar esses possíveis desordens”. Que “desordens” seriam essas? Instruindo povo para que pudessem trabalhar e manter seu tempo ocupado garantindo a sua subsistência, só assim o povo continuará no seu lugar mantendo, assim a “ordem” social e política. “Um povo instruído e inteligente é, além disso, geralmente mais decente e ordeiro do que povo ignorante e estúpido [...] menos suscetíveis de ser encaminhados para qualquer oposição desnecessária à medida do governo”.
Marilena Chaui (2008.p.63) nos acrescenta um comentário a respeito do trabalho:
Aqui a divisão social do trabalho alcança seu ápice: de um lado, os proprietários privados do capital [...] que são também os proprietários do trabalho, e, de outro lado, a massa dos assalariados despossuídos, que dispõem exclusivamente de sua força de trabalho, que vendem como mercadoria ao proprietário do capital.
5. Considerações finais
Durante as discussões do grupo acerca da temática educação e exclusão da cidadania muitas inquietações surgiram. A primeira delas diz respeito às questões que permearam e
permeiam a educação até hoje. Questões essas referentes à política e capitalismo. A segunda inquietação diz respeito às políticas públicas voltadas para a educação. Por quê?
Hoje temos um leque muito grande de oportunidades educacionais que vai desde bolsas de estudos até formação continuada para professores em geral. Aí não entendemos o porquê de tanta exclusão, marginalização, de tantas pessoas, cidadãos fora da vida política e social do país.
Podemos estudar hoje até nos países estrangeiros via Educação a Distância (EaD), por meio dessa ferramenta, muitas pessoas podem ter acesso à educação, oportunidade para estudar, fazer cursos, se especializar. Mas a questão é: Quando é que teremos acesso a pleno à cidadania como estabelece os artigos da nossa Legislação brasileira? Para trabalharmos se exigem estudos, nas mais altas “doses” como diz Arroyo. E quem não a recebe? O Brasil ainda é um país com alto índice de adultos analfabetos.
Por que as camadas mais pobres da sociedade ainda vivem marginalizadas? Ainda tem mais, o que percebemos, também, é que quanto mais se oferecem oportunidade para estudos, mais se aumenta o nível de estudo para determinados cargos e funções no mundo do trabalho. Bem diria os candidatos a concursos públicos e vestibulares. Seria uma melhora no nível de ensino valorizando a capacidade de cada um ou apenas um modo de afunilar as camadas que foram desprovidas de boas condições educacionais?
Outra questão surge, assim como nos tempos dos Barões do Café, onde só os filhos dos “poderosos” tinham oportunidade de estudar na Europa, em bons colégios e universidades, a maioria dos trabalhadores, escravos, negros, mulheres eram excluídas dessa oportunidade.
Hoje temos os sistemas de cotas para negros, índios e tal. Temos o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), o Programa Universidade para Todos (PROUNI), o Financiamento Estudantil (FIES), incentivos do governo para melhorar a educação, mas ainda vemos a maioria da sociedade sem acesso ao ensino superior em termos de pós graduação, mestrado, doutorado etc.
O que ainda nos incomoda é saber que a mesma educação que inclui essa mesma abre as portas para a exclusão de muitos, haja vista que nem todos a podem usufruir em “dose” alta, como assim determina a elite.
Não queremos uma sociedade onde oprimido possa passar a opressor, nem que o opressor continue oprimindo, mas uma sociedade que verdadeiramente mova seus ideais em prol de uma democracia e de uma cidadania, de forma que todos, independentemente do grau de instrução, possam ser respeitados em seus direitos e cumpridores dos seus deveres e tratados igualmente como assim descreve a nossa Constituição brasileira.
6. Referências
A Cidadania Roubada. Disponível em: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=686.
Analfabetismo no Brasil. Disponível em: http://g1.globo.com/educacao/noticia/2014/01/brasil-nao-atingira-meta-para-reduzir-analfabetismo-entre-adultos-diz-inep.html.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lei Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996.
CHAUI, Marilena. O que é ideologia. 2.ed. – São Paulo: Brasiliense, 2008. Coleção primeiros passos. P. 63.
Constituição da república Federativa do Brasil. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.
Educação e Cidadania: Quem educa o cidadão? BUFFA, Ester; ARROYO, Miguel; NOSELLA, Paolo.14.ed.- São Paulo: Cortez, 2010.p.35-62.
Os caminhos da cidadania brasileira. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9361.
PONCE, Aníbal. Educação e luta de classes. Tradução de José Severo de Camargo Pereira. -23. ed.- São Paulo: Cortez, 2010.
SILVEIRA, Renê Jose Trentin. Ensino de filosofia e cidadania: uma abordagem a partir de Gramsci. Rer. Bras. Est. Pedag. Brasília, v. 94, n. 236, p. 53-77, jan./abr. 2013.
SIVIANI, Demerval. História da educação no Brasil: um balanço prévio e necessário. Disponível em:
http://www.uninove.br/PDFs/Mestrados/Educa%C3%A7%C3%A3o/Anais_V_coloquio/Conferencia%20Dermeval%20SAVIANI.pdf.

EDUCAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA INCLUSÃO OU EXCLUSÃO SOCIAL E POLÍTICA: somos ou não cidadãos?
Lécia Regina Costa de Sousa*
Mercês Rodrigues Costa*
Resumo
O presente artigo tem como objetivo trazer reflexões acerca da educação x cidadania a partir da discussão do texto de Miguel Arroyo Educação e exclusão da cidadania. A metodologia utilizada para a discussão e elaboração do presente trabalho foi leitura bibliográfica do texto acima citado em confronto com outros autores que tratam do tema. O problema chave que se buscou questionar foi o vínculo que houve e que ainda há entre a educação formal e a cidadania como condição para um ser humano ser considerado cidadão. Desde já entendemos que cidadão se refere ao sujeito no gozo de seus direitos civis e políticos dentro de uma sociedade, cumpridor de seus deveres. Assim, ao analisarmos esse conceito estabelecido pelo professor Aurélio, surge uma pergunta que não quer calar: se a educação é condição para sermos cidadãos, quem são aqueles que não têm acesso a ela, ou a tem em “dose” minúscula? Para que pudéssemos fazer uma análise dessa e outras questões a respeito daquele vínculo entre educação e cidadania foi necessário voltar ao passado histórico para tentar compreender os fenômenos que influenciaram direta e indiretamente nesse fato social a qual todos nós fazemos parte. Educação é para todos? Todos são cidadãos? E o ser humano, não é cidadão? O que esperamos da nossa sociedade?
A Educação, em especial a educação brasileira, passou por diferentes momentos durante toda a história, e hoje, muito se alcançou em termos de políticas públicas.
Porém ainda existe grande parte da sociedade que vivem a margem, considerada inapta para a participação na vida social e política do país. Muitas lutas e reivindicações trouxeram também grandes mudanças, mas ainda há muito que se conquistar em termos de educação para alcançar a cidadania e democracia.
Palavras- chave: Educação, Cidadania, Exclusão Social.
*Discente do 7º semestre do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia da Escola Superior Madre Celeste – ESMAC. E-mail: [email protected].
* Doutora e Mestra em Ciência da educação pela Universidade da Amazônia- UNAMA. Coordenadora Geral da Pós Graduação da Escola Superior Madre Celeste-ESMAC. Professora da disciplina Organização do Trabalho Pedagógico 7º semestre- ESMAC. E-mail: [email protected].
Abstract
This article aims to bring reflections on citizenship education x from the discussion of the text of Miguel Arroyo Education and exclusion from citizenship. The methodology used for the discussion and preparation of this work was reading the literature cited above in comparison with other authors who deal with the subject text. The key problem that we sought to question the link that was there and that there are still between formal education and citizenship as a condition for a human to be considered a citizen. Since we understand that it refers to the individual citizen in the enjoyment of their civil and political rights within a society, dutiful. Thus, in examining this concept established by Professor Aurelio, a question that remains arises: if education is a prerequisite for being citizens, who are those who do not have access to it, or has the "dose" tiny? So we could do an analysis of this and other questions about that link between education and citizenship was necessary to return to the historical past to try to understand the phenomena that influenced directly and indirectly in this social fact which we are all part. Education is for everyone? All are citizens? And the human being, is not a citizen? What we expect from our society? Education, in particular the Brazilian education has undergone different times throughout history, and today, much has been achieved in terms of public policy. But there is still a large part of society that live outside, deemed unfit to participate in social and political life. Many struggles and demands also brought great changes, but there is still a lot to gain in terms of education to achieve citizenship and democracy.
Keywords: Education, Citizenship, Social Exclusion.
1. Introdução
Este artigo apresenta algumas reflexões acerca da temática educação e cidadania, um texto que explora e trás à luz pensamentos, ideias e ideais de cidadania numa perspectiva
histórica, apontando a educação como condição para formação de sujeitos cidadãos, ativos na vida política e social. A mesma educação que, se não recebida em “dose” alta pode gerar exclusão social e política.
Buscamos, nesse trabalho, debater acerca daquela concepção de cidadão e compartilhar da ideia de que a educação é importante e essencial, porém não é ela que pode decidir se um ser humano estar apto ou não, para gozar de seus direitos previstos em lei. Apesar de sabermos que a partir da Constituição de 1988, “Todos são iguais perante a lei” abriu-se espaço para que a sociedade se privilegiasse mais de seus direitos, uma vez que mesmo esses direitos estejam expressos legalmente, o que se percebe é que, infelizmente, existe uma grande contradição, a grande maioria da população está fora da chamada “civilização”, onde se pode ter a plena convicção de que seus direitos fundamentais estão preservados e garantidos, na prática. Mostrando que, na prática, nem todos são iguais perante a lei.
Para que essa reflexão fosse realizada, foi formado um grupo de estudos, fazendo levantamento dos materiais teóricos que tratam do tema, como exemplos têm o texto norteador de Miguel G. Arroyo, “Educação e exclusão da cidadania”, discutido e analisado a partir de outras teorias, vivências, observações e relação com a realidade, em pleno século XXI.
Para nós, estudiosos do campo da educação, é imprescindível refletir sobre que parâmetros se articularam e ainda se articulam a dialética educação e cidadania por duas razões; primeiro, uma vez que para se compreender os fatos sociais hoje, é necessário fazer um passeio aos tempos pretéritos num processo constante de investigação sobre um determinado fato e seus autores, seus status, suas ideias e ideais políticos; segundo, nós acreditamos que assim como a ausência da educação pode excluir seres humanos da vida política e social (uma ideia capitalista), ela mesma pode intervir na sociedade, provocando mudanças de paradigmas sociais e políticos não apenas com a educação formal, mas, com lutas e reinvindicações sociais questionando com autonomia os polos que se formaram no espaço de convívio social tais como: “opressores e oprimidos”, “civilização e bárbaros”, “livres e servos”, “povo e povinho” etc., com o intuito de “quebrar” essas concepções que não condizem com os verdadeiros ideais de cidadania e democracia. Afinal de contas, todos os “cidadãos” são pessoas, seres humanos que pensam, trabalham e enriquecem o país, para não usar o termo “enriquecem a minoria”.
2. Fundamentos à luz das teorias
Miguel Arroyo (2010, p.35) ao fazer análise sobre o tema Educação e exclusão da cidadania mostra que ainda faz parte da memória dos dirigentes políticos que não existe cidadania porque o povo é imaturo. Esse mesmo povo só poderia participar da vida política se se mostrasse apto, competente, “consciente”, “civilizado”, educado. Percebemos que essa “mentalidade” não é de hoje, surgiu desde o tempo do império e tem prevalecido até hoje, embora de forma mascarada, escondida nos escombros da própria ignorância humana.
À luz de todo o texto, observamos uma forte crítica acerca da “falta de democracia e de cidadania”. Numa concepção burguesa e capitalista, se aposta que a culpa por essa ausência se dá porque o povo não é instruído, racional, não tem condições de fazer parte do aparato político porque não sabe sequer “querer”.
Então, aparece a escola como candidata à “redentora” de tal povo, a ela a incumbência de educar, formar-lhe, preparar-lhe o espírito para que sejam salvos até de si mesmos. Um povo sem educação não tem a menor condição de exercer sua cidadania. “O homem só pode ser livre se tiver o espírito culto”. Mas para que possamos compreender como ocorreu esse processo, convidamos você, leitor, para darmos uma volta ao passado histórico.
3. Uma pouco de histórica da educação
Vamos analisar uma comunidade indígena primitiva descrita por PONCE (2010); uma comunidade pequena, composta por pessoas livres, suas terras eram comuns a todos, e tudo que se conseguia era dividido entre todos igualmente. Não havia acumulação de bens porque tudo que era produzido era consumido igualmente entre todos. A educação que havia entre aquele povo era determinada e organizada na prática, na vida cotidiana, sem uma escola formal. Todo aprendizado era voltado para a vida em sociedade e para o bem de todos. Até as crianças acompanhavam os adultos em todos os seus trabalhos, ajudando na medida de suas forças e, como recompensa recebia a sua porção de alimentos como qualquer outro membro da comunidade.
Ou seja, era através da experiência no dia a dia com os adultos que a criança era introduzida nas práticas de seu grupo social. Ainda a esse respeito Ponce (2010) descreve:
O homem das comunidades primitivas também tinha uma concepção de mundo, ainda que nunca a tivesse formulado expressamente. Essa concepção de mundo, que nos parece pueril,
refletia, por um lado, o ínfimo domínio que o primitivo havia alcançado sobre a natureza e, pelo outro, a organização da tribo, estreitamente vinculada a esse domínio. Uma vez que na organização da comunidade primitiva não existia graus nem hierarquias [...].
Esse modelo de educação que era marcante das comunidades primitivas perdeu-se a partir do momento em que foram formando e se transformando em sociedades divididas em classes. Como surgiram essas classes? Segundo Ponce, as classes sociais surgiram a partir do momento em que houve escasso no rendimento do trabalho “braçal”, ou seja, onde era empregada a força física do homem. Outro fator possivelmente responsável foi à troca da “propriedade comum pela privada”.
A partir dessa ruptura e com o surgimento da sociedade em classes, surge também a escola que segundo SAVIANI (2008),
A partir dessa origem a instituição escolar se desenvolverá na Grécia como paidéia, enquanto educação dos homens livres, em oposição à duléia, que implicava a educação dos escravos, fora da escola, no próprio processo de trabalho. Com a ruptura do modo de produção antigo (escravista), a ordem feudal vai gerar um tipo de escola distinto da paidéia grega. Diferentemente da educação ateniense e espartana, assim como da romana, em que o Estado desempenhava papel importante na organização da educação, na Idade Média as escolas trarão fortemente a marca da Igreja Católica. O modo de produção capitalista provocará decisivas mudanças na própria educação confessional e colocará em posição central o protagonismo do Estado, forjando a ideia da escola pública, universal, gratuita, leiga e obrigatória, cujas tentativas de realização passarão pelas mais diversas vicissitudes.
Para compreender essa transição de um período primitivo à formação das classes, é necessário entender que essa divisão surge a partir do momento em que essas sociedades se desenvolvem e a luta por interesses particulares dá-se início. Lutas essas que se dão de forma “obscura e indiciosa” (PONCE, 2010. p 35).
Nas entrelinhas dos textos de Miguel Arroyo, notamos que bem aquém do simples interesse do Estado em “educar para a cidadania”, e a tamanha ênfase na educação do “povo” como condição para uma ordem social e uma cidadania, a educação serviria apenas para fortalecer o poder da minoria sobre a maioria. Como acrescenta Arroyo (2010.p.38),
Por trás dessa relação, sempre defendida na construção da nova ordem, há uma concepção do social e de uma constituição, há ideais políticos que não podem ser ignorados, há concepções e compromissos com a ordem social e econômica, com o Estado e com um modelo de cidadania para as classes inferiores.
Parte-se do pressuposto que o homem é irracional, sem preceitos, sem conhecimento, bárbaro. Quanto a isso, Arroyo especifica o pensamento de Hobbes :
“[...] torna-se manifesto que, durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capazes de mantê-los em respeito, eles se encontram naquela condição que se chama guerra. Uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens”.
O texto desse autor deixa claro que o homem, numa visão passada, não era capaz de viver em harmonia, em paz, sem ter um tutor que o educasse e ensinasse a ser cidadão, pois seu estado normal era o bárbaro, um ser completamente bruto que precisava ser lapidado, conforme os preceitos criados pela elite. Já que o povo não estava apto a participar da cidadania seria necessário que ele se conscientizasse, se mostrasse capaz de entender suas ações. E de que maneira seria melhor para que isso acontecesse? Através da educação, pois ela os tornaria conscientes e cidadãos, pois a educação seria o fator que condicionaria a cidadania.
Com o advento da república essa concepção se fortaleceu, pois a partir daí o povo que escolheria seus governantes, mais precisaria se esclarecer e consolidar-se como cidadãos, porém só iria participaria dessa cidadania quem fosse capaz e estivesse pronto para exercê-la. E a maioria, a massa, não estava pronta, consciente de tal importância, eles precisariam então educar-se para então exercer a cidadania e escolher seus governantes, pois eles não estavam educados o suficiente para serem cidadãos necessitando, portanto, de alguém que os educassem, alguém para protegê-los de si mesmos. Então surge o Estado como responsável para conduzir os “bárbaros” à civilização.
Acreditava-se que o povo só teria igualdade, paz, liberdade, quando houvesse educação de qualidade oferecida pelo Estado. Mas será que essa educação mencionada acima serviria para a igualdade de todos? A elite estava preocupada em educar em massa? Acreditamos que não era o real objetivo, pois, a educação era regrada de acordo com seus propósitos (do Estado), ela não atenderia todos, nem com a mesma força, pois ela era dosada, o povo recebia a dose necessária para a participação, a elite liberal teria o domínio dessa educação, ela selecionaria os que julgasse serem capacitados para participação em sociedade, pois os que não o são, seriam excluídos. A educação de qualidade era para poucos que estavam no poder, o resto era resto, bárbaros, incivilizados.
Ou seja, seres incapazes de pensar, a plebe, a ralé, pessoas definitivamente excluídas da sociedade, que só serviam para fazer perturbações, transtornos, impensantes, segundo
LODKE apud ARROYO (p.236), “quando a mão está acostumada ao arado e a enxada, a cabeça raramente é elevada para as ideias sublimes”. Essa era uma das ideias pregada pela elite para explicar a exclusão, para conformar o povo acerca da pirâmide social, por isso “pregava” a educação salvadora do povo, enganavam o povo dizendo que quem tivesse educação seria cidadão, mais até o ponto que eles achassem ser necessária. E era uma forma de manter o “equilíbrio social”.
4. A Educação e cidadania no Brasil
a) Educação e Cidadania na perspectiva da Constituição de 1988
A nossa Constituição brasileira, especificamente a de 1988, é considerada “Constituição Cidadã” por garantir, em seus artigos, direitos a todos os brasileiros e os estrangeiros residentes no país.
O artigo 205 assim descreve a obrigatoriedade com relação à educação como o texto seguinte: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” Mas em que sentido esse texto fala sobre cidadania? O que dá para compreender é que o referido termo envolve uma relação com nacionalidade onde o “cidadão” tem suas obrigações e direitos e pertence a seu país (SILVEIRA, 2013). Percebemos que há certa contradição quanto ao termo cidadania, uma vez que o seu sentido é um e seu significado real é outro. Ou seja, A Lei esclarece vagamente a palavra deixando-a subentendida. Na prática, não dá para chegarmos a uma conclusão precisa sobre a aplicabilidade desse termo no cotidiano das pessoas. Mais um exemplo dessa contradição é a falta de clareza da própria constituição em como a “educação deve preparar os jovens para o exercício da cidadania”. Se passados anos e ainda hoje temos e vivemos em meio uma sociedade dividida em “classes”, milhões de analfabetos, destarte tantas políticas públicas voltadas para a “Educação”.
b) Educação e Cidadania na perspectiva da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB)
Logo no início do documento legal aparece o vínculo entre educação e cidadania da seguinte forma: “A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática
social” (Art. 1 § 2.) com o pressuposto de que a obrigação do Estado para a efetivação da educação se dá através do:
I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II – universalização do ensino médio gratuito;
III – atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – atendimento gratuito em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos de idade;
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;
VII – oferta de educação escolar regular para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e permanência na escola;
VIII – atendimento ao educando, no ensino fundamental público, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde;
IX – padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem;
X – vaga na escola pública de educação de educação infantil ou de ensino fundamental mais próxima de sua residência a toda criança a partir do dia em que completar quatro anos de idade.
Analisando o que está explícito nas Legislações específicas da Educação conseguimos relacionar com o que escrevem os autores: “A educação do povo é pensada e recomendada pelos teóricos da economia política para evitar esses possíveis desordens”. Que “desordens” seriam essas? Instruindo povo para que pudessem trabalhar e manter seu tempo ocupado garantindo a sua subsistência, só assim o povo continuará no seu lugar mantendo, assim a “ordem” social e política. “Um povo instruído e inteligente é, além disso, geralmente mais decente e ordeiro do que povo ignorante e estúpido [...] menos suscetíveis de ser encaminhados para qualquer oposição desnecessária à medida do governo”.
Marilena Chaui (2008.p.63) nos acrescenta um comentário a respeito do trabalho:
Aqui a divisão social do trabalho alcança seu ápice: de um lado, os proprietários privados do capital [...] que são também os proprietários do trabalho, e, de outro lado, a massa dos assalariados despossuídos, que dispõem exclusivamente de sua força de trabalho, que vendem como mercadoria ao proprietário do capital.
5. Considerações finais
Durante as discussões do grupo acerca da temática educação e exclusão da cidadania muitas inquietações surgiram. A primeira delas diz respeito às questões que permearam e
permeiam a educação até hoje. Questões essas referentes à política e capitalismo. A segunda inquietação diz respeito às políticas públicas voltadas para a educação. Por quê?
Hoje temos um leque muito grande de oportunidades educacionais que vai desde bolsas de estudos até formação continuada para professores em geral. Aí não entendemos o porquê de tanta exclusão, marginalização, de tantas pessoas, cidadãos fora da vida política e social do país.
Podemos estudar hoje até nos países estrangeiros via Educação a Distância (EaD), por meio dessa ferramenta, muitas pessoas podem ter acesso à educação, oportunidade para estudar, fazer cursos, se especializar. Mas a questão é: Quando é que teremos acesso a pleno à cidadania como estabelece os artigos da nossa Legislação brasileira? Para trabalharmos se exigem estudos, nas mais altas “doses” como diz Arroyo. E quem não a recebe? O Brasil ainda é um país com alto índice de adultos analfabetos.
Por que as camadas mais pobres da sociedade ainda vivem marginalizadas? Ainda tem mais, o que percebemos, também, é que quanto mais se oferecem oportunidade para estudos, mais se aumenta o nível de estudo para determinados cargos e funções no mundo do trabalho. Bem diria os candidatos a concursos públicos e vestibulares. Seria uma melhora no nível de ensino valorizando a capacidade de cada um ou apenas um modo de afunilar as camadas que foram desprovidas de boas condições educacionais?
Outra questão surge, assim como nos tempos dos Barões do Café, onde só os filhos dos “poderosos” tinham oportunidade de estudar na Europa, em bons colégios e universidades, a maioria dos trabalhadores, escravos, negros, mulheres eram excluídas dessa oportunidade.
Hoje temos os sistemas de cotas para negros, índios e tal. Temos o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), o Programa Universidade para Todos (PROUNI), o Financiamento Estudantil (FIES), incentivos do governo para melhorar a educação, mas ainda vemos a maioria da sociedade sem acesso ao ensino superior em termos de pós graduação, mestrado, doutorado etc.
O que ainda nos incomoda é saber que a mesma educação que inclui essa mesma abre as portas para a exclusão de muitos, haja vista que nem todos a podem usufruir em “dose” alta, como assim determina a elite.
Não queremos uma sociedade onde oprimido possa passar a opressor, nem que o opressor continue oprimindo, mas uma sociedade que verdadeiramente mova seus ideais em prol de uma democracia e de uma cidadania, de forma que todos, independentemente do grau de instrução, possam ser respeitados em seus direitos e cumpridores dos seus deveres e tratados igualmente como assim descreve a nossa Constituição brasileira.
6. Referências
A Cidadania Roubada. Disponível em: http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=686.
Analfabetismo no Brasil. Disponível em: http://g1.globo.com/educacao/noticia/2014/01/brasil-nao-atingira-meta-para-reduzir-analfabetismo-entre-adultos-diz-inep.html.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lei Nº 9.394 de 20 de dezembro de 1996.
CHAUI, Marilena. O que é ideologia. 2.ed. – São Paulo: Brasiliense, 2008. Coleção primeiros passos. P. 63.
Constituição da república Federativa do Brasil. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.
Educação e Cidadania: Quem educa o cidadão? BUFFA, Ester; ARROYO, Miguel; NOSELLA, Paolo.14.ed.- São Paulo: Cortez, 2010.p.35-62.
Os caminhos da cidadania brasileira. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=9361.
PONCE, Aníbal. Educação e luta de classes. Tradução de José Severo de Camargo Pereira. -23. ed.- São Paulo: Cortez, 2010.
SILVEIRA, Renê Jose Trentin. Ensino de filosofia e cidadania: uma abordagem a partir de Gramsci. Rer. Bras. Est. Pedag. Brasília, v. 94, n. 236, p. 53-77, jan./abr. 2013.
SIVIANI, Demerval. História da educação no Brasil: um balanço prévio e necessário. Disponível em:
http://www.uninove.br/PDFs/Mestrados/Educa%C3%A7%C3%A3o/Anais_V_coloquio/Conferencia%20Dermeval%20SAVIANI.pdf.